Tacky’s revolt: the story of an Atlantic slave war | Vincent Brown

Na esteira de seus outros trabalhos sobre escravidão e diáspora africana Vicent Brown2, professor da Universidade de Harvard, publicou em janeiro de 2020, Tacky’s Revolt: The Story of an Atlantic Slave War para debater de uma maneira revisionista três revoltas de escravos da Jamaica, dando a elas, especialmente a segunda, liderada por Apongo (nome africano do escravo Wager), que estourou na freguesia de Westmoreland, localizada no ocidente da ilha, uma importância histórica bem mais definida e profunda. A “Rebelião de Tacky”, em St. Mary também na região leste e a “Marcha de Simon”, que se desenvolveu nas regiões centrais da colônia, completam os eventos analisados. Leia Mais

O que há de novo na “nova direita”? identarismo europeu, trumpismo e bolsonarismo | Marcos Paulo dos Reis Quadros

Marcos Paulo dos Reis Quadros Imagem Radio
Marcos Paulo dos Reis Quadros | Imagem: Radio Caxias

O que há de novo na nova direita, de Marcos Paulo dos Reis Quadros, resulta de uma investigação conduzida em seu estágio pós-doutoral, realizado na Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS), onde também cursou doutorado em Ciências sociais. O autor é professor e pró-reitor acadêmico do Centro Universitário Estácio Belo Horizonte (ESTÁCIO BH) e ministra cursos sobre “Direitas” e “Teoria Política” no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUCRS. Seus três livros discutem federalismo, e a relação “soft power” e violência em favelas no Brasil e trajetórias das direitas no Brasil e em Portugal. No seu mais novo trabalho, como explicitam título e subtítulo, sua meta é avaliar “caracteres distintivos dessa nova direita na Europa (os partidos identitários) e no Brasil (o bolsonarismo), fazendo, ainda, considerações sobre o “trumpismo nos Estados Unidos” (p.19). Suas questões são desafiadoras. Elas tocam nas causas da ascensão da direita e exploram a vivência das direitas em quatro planos: “pilares ideológicos”, “plataformas político-eleitorais”; comportamento nos parlamentos e comportamento nos governos. Dada a quantidade de planos, é uma tarefa desafiadora que ele se propõe a cumprir em três capítulos.

O que ha de novo na nova direitaNo primeiro – “Sobre os sentidos das direitas” –, o autor defende a validade da díade esquerda/direita como demarcador ideológico. Seu critério é o de N. Bobbio, ou seja, a relação que as pessoas mantem com o valor da igualdade. Assim, se para a esquerda (representada instrumentalmente por J.-j. Rousseau), o ser humano é bom e aperfeiçoável, sendo legítimos a rebeldia e a mudança. Para a direita (representada instrumentalmente por T. Hobbes), o ser humano é mal e imperfeito naturalmente, sendo legítimos a conservação da herança e a ordem (T. Hobbes). A direita, como se vê, é constituída por um núcleo – conservação da herança – e por conceitos outros como “ordem”, “ceticismo” e “idade do ouro”, acrescidos de outros tantos em determinados contextos. Aliás, fiel a R. Rémon, o autor toma a descrição de direita como um tipo ideal, mas há limites: “Pode existir um conservadorismo de inclinações autoritárias e um conservadorismo de pendor liberal; jamais, sublinhe-se, um conservadorismo progressista.” (p.43). Leia Mais

Como travar o fascismo. História, Ideologia, Resistência | Paul Mason

Paul Mason Foto Antonio Zazueta Olmos 2
Paul Mason | Foto Antonio Zazueta Olmos

O músico e politólogo Paul Mason, além de professor convidado na Universidade de Sheffield, na Inglaterra, atuou como jornalista em diversos meios de comunicação, do The Guardian ao Channel 4. Com diversos livros publicados, quase todos best-sellers no mercado editorial europeu e estadunidense, ficou amplamente conhecido pelos livros Pós-Capitalismo: Guia para o Futuro (2016) e Um Futuro Livre e Radioso (2019). Sua vida pública está envolta em controvérsias, dentre elas a defesa à política do aborto, no Reino Unido, e a declaração de que as políticas reprodutivas não deveriam ser ditadas pelo Vaticano. Mason foi também acusado de antissemitismo por ser membro de um grupo numa rede social que compartilhava postagens contra a comunidade judaica. Em sua defesa, alegou que embora fosse membro do grupo nas redes não endossava suas publicações. Seu novo livro – Como travar o Fascismo: História, Ideologia, Resistência, escrito no período de restrições impostas pela pandemia da Covid-19, foi originalmente publicado no final de 2021 e teve sua versão para português de Portugal lançada em abril de 2022.

Como travar o FascismoA obra foi clamada por pensar ações práticas para combater o avanço do fascismo, caso raro entre as publicações sobre a matéria. O livro de Mason acaba por ser um manifesto político, com forte posicionamento sobre questões transnacionais como a necessidade de união entre a esquerda e o centro político para frear o avanço da escalada autoritária e fascistizante em vários lugares do mundo. Ele retoma a discussão weberiana sobre o monopólio do uso da força e questiona o que faz a sociedade civil quando a extrema-direita quebra esse paradigma, corroendo um dos princípios legitimadores do Estado moderno. Apresenta uma preocupação efetiva sobre as formas e mecanismos de revigorarmos as democracias num momento em que a questão da corrupção e da desilusão da sociedade civil para com elas torna-se latente. Tudo isso escrito em  linguagem simples, com usos massivos de adjetivos e forte apelo com frases em destaque, mas com grande embasamento de bibliografia clássica e alguma atualização historiográfica, por mais que nomes importantes na discussão sobre essa temática hoje não estejam presentes em suas referências. Leia Mais

Fighting the Last War: Confusion, Partisanship, and Alarmism in the Literature on the Radical Right | Jeffrey M. Bale e Tamir Bar-On

Estado Islamico BBC News
Estado Islâmico | Imagem: BBC News

Tudo parece tranquilo entre os investigadores das novas direitas do eixo Europa-América nos últimos cinco anos. Eles divergem conceitualmente (fascismo, neofascismo, posfascismo, ultradireita, nova direita etc.), ocupam-se de objetos distintos (ideologias, partidos, eleições, movimentos, redes, subculturas, líderes, programas, eleições e ações de governo), mas convergem na ideia de que a maior parte dos seus fenômenos-objeto representa ameaças à democracia liberal. Não sem razão, parte deles encerra os seus ensaios ou teses com a clássica alusão ao “que fazer?”, de Vladmir Lênin. Essa harmonia tem chance de ser abalada após a publicação de Fighting the Last War: Confusion, Partisanship, and Alarmism in the Literature on the Radical Right (2022). Nesse ensaio estendido, Jeffrey M. Bale e Tamir Bar-On denunciam a incompetência dos acadêmicos e jornalistas para interpretar fenômenos designados como “direita radical”, “extrema direita” ou “nova direita radical”, e a esperteza de políticos, empresários e oligarcas das Big Tech que tiram proveito dessa espécie de “histeria” intelectual para “deslegitimar e demonizar virtualmente todos os oponentes da atual ideologia ocidental reinante do globalismo progressista” (p.xvi).

Fighting the Last WarJeffrey Bale e Tamir Bar-On são dois experimentados professores universitários e investigadores de movimentos extremistas há décadas. Bale é historiador e especialista em movimentos religiosos e políticos “propensos à violência” e docente no Nonproliferation and Terrorism Studies (NPTS) e no Program at the Middlebury Institute of International Studies at Monterey (MIIS). O sociólogo Bar-On estuda ideologias políticas e novas direitas e é professor na School of Social Sciences and Government e do Monterrey Institute of Technology and Higher Education, no México. Para chamar os colegas às falas, eles apontam preconceitos acadêmicos, uso equivocado de conceitos, desinformação sobre o imperialismo islâmico, sobre seus traços teocrático, fundamentalista e (no caso dos jihadistas) violento.

Leia Mais

The far right today | Cas Mudde

Cas Mudde 2019 Imagem Wikipedia
Cas Mudde (2018) | Imagem: Wikipédia

The far right today é o primeiro livro de Cas Mudde voltado para o público “não acadêmico” interessado no impulso das “novas direitas”, na América e na Europa, nomeada por ele como a “quarta onda”. O caráter de manual está na arquitetura da informação, na brevidade do texto, na ausência de digressões teóricas e de citações diretas, como também na clareza com que apresenta suas proposições e exemplos. Mudde quer apenas oferecer uma visão geral desse período marcada pela ação da  direita (far right) “antissistema e hostil à democracia liberal”, que se configura em dois grupos: a extrema direita (extreme right), que rejeita a “soberania popular e a regra da maioria” (sendo, portanto, revolucionária), e a direita radical (radical right), que aceita a soberania popular e a regra da maioria, mas se opõe à “democracia liberal”, no que diz respeito, principalmente, aos “direitos das minorias”, à legitimidade das leis e à “separação de poderes” (p.19). Sua meta é instrumentalizar o leitor comum a avaliar “os desafios que a far right coloca para as democracias liberais no século XXI” e, consequentemente, defender essa democracia liberal das várias ameaças reais e potenciais listadas ao longo da obra. (p.17).

The far right todayCas Mudde é um cientista político que trabalhou em universidades da Hungria, Holanda, Escócia, Bélgica, Alemanha, Eslováquia, Suécia e Espanha. Nos últimos seis anos, e já radicado nos Estados Unidos da América (EUA), Mudde tem escrito sobre ideologias, movimentos e partidos europeus e estadunidenses de extrema direita e direita radical, além de refinar categorias como o populismo e explorar o fenômeno das ideias extremistas entre jovens (SPIA/UGEO). The far right today reúne grande parte desses estudos em capítulos que contam a história das novas direitas entre 1945 e 2019, suas ideologias, formas de organização, as lideranças, as atividades, os debates sobre as causas e consequências da quarta onda, as respostas dos Estados e, especificamente, as respostas relativas às questões de gênero. Este livro foi traduzido para mais de cinco idiomas apresentando diversas paratraduções em cada uma das suas edições. Leia Mais

O que há de novo na “nova direita”? identarismo europeu, trumpismo e bolsonarismo | Marcos Paulo dos Reis Quadros

Marcos Paulo dos Reis Quadros Imagem Radio Caxias 2
Marcos Paulo dos Reis Quadros | Imagem: Radio Caxias

O que há de novo na nova direita, de Marcos Paulo dos Reis Quadros, resulta de uma investigação conduzida em seu estágio pós-doutoral, realizado na Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul (PUCRS), onde também cursou doutorado em Ciências sociais. O autor é professor e pró-reitor acadêmico do Centro Universitário Estácio Belo Horizonte (ESTÁCIO BH) e ministra cursos sobre “Direitas” e “Teoria Política” no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da PUCRS. Seus três livros discutem federalismo, e a relação “soft power” e violência em favelas no Brasil e trajetórias das direitas no Brasil e em Portugal. No seu mais novo trabalho, como explicitam título e subtítulo, sua meta é avaliar “caracteres distintivos dessa nova direita na Europa (os partidos identitários) e no Brasil (o bolsonarismo), fazendo, ainda, considerações sobre o “trumpismo nos Estados Unidos” (p.19). Suas questões são desafiadoras. Elas tocam nas causas da ascensão da direita e exploram a vivência das direitas em quatro planos: “pilares ideológicos”, “plataformas político-eleitorais”; comportamento nos parlamentos e comportamento nos governos. Dada a quantidade de planos, é uma tarefa desafiadora que ele se propõe a cumprir em três capítulos.

O que ha de novo na nova direitaNo primeiro – “Sobre os sentidos das direitas” –, o autor defende a validade da díade esquerda/direita como demarcador ideológico. Seu critério é o de N. Bobbio, ou seja, a relação que as pessoas mantem com o valor da igualdade. Assim, se para a esquerda (representada instrumentalmente por J.-j. Rousseau), o ser humano é bom e aperfeiçoável, sendo legítimos a rebeldia e a mudança. Para a direita (representada instrumentalmente por T. Hobbes), o ser humano é mal e imperfeito naturalmente, sendo legítimos a conservação da herança e a ordem (T. Hobbes). A direita, como se vê, é constituída por um núcleo – conservação da herança – e por conceitos outros como “ordem”, “ceticismo” e “idade do ouro”, acrescidos de outros tantos em determinados contextos. Aliás, fiel a R. Rémon, o autor toma a descrição de direita como um tipo ideal, mas há limites: “Pode existir um conservadorismo de inclinações autoritárias e um conservadorismo de pendor liberal; jamais, sublinhe-se, um conservadorismo progressista.” (p.43). Leia Mais

Católicos/ reaccionarios y nacionalistas. Política e identidad nacional en Europa y América latina contemporâneas | María Cruz Romeo

Maria Cruz Romeo Imagem Fundacion Juana de Vega
María Cruz Romeo | Imagem: Fundación Juana de Vega

El libro propone un recorrido de larga duración sobre los vínculos entre nación y catolicismo en Europa y América Latina. Fruto de un largo recorrido en común, signado por diferentes proyectos de investigación, las coordinadoras reúnen un conjunto de trabajos que incorporan algunas de las perspectivas más renovadoras. Ante todo, sobresale un explícito apartamiento del “paradigma clásico de la secularización”. Dicho paradigma partía del supuesto de la existencia de una incompatibilidad esencial entre modernidad y religión y, por tanto, auguraba la declinación de lo religioso en el mundo contemporáneo, cuando no directamente su desaparición. Su influencia en las ciencias sociales y en las humanidades fue amplia y persistente hasta las décadas finales del siglo XX. En la historia de América Latina su impacto invisibilizó muchos de los procesos de transformación y reconfiguración de las instituciones religiosas y condujo a la frecuente y arbitraria postulación de “renacimientos” católicos. En las últimas décadas, sin embargo, en parte como consecuencia de la acumulación de fenómenos que escapaban al corsé de la secularización, comenzaron a revisarse de manera más profunda sus bases epistemológicas y a avanzar en diferentes reformulaciones teóricas. En este camino autores como José Casanova, David Martin, Karel Dobbelaere o Danièle Hervieu-Léger, entre otros muchos, contribuyeron no sólo a abandonar los viejos presupuestos, en parte heredados de las filosofías de la ilustración, sino también a dar forma a nuevas conceptualizaciones. En buena parte de ellas, más allá de sus diferencias, se coincidió en redefinir la secularización como un proceso multidimensional de cambio y recomposición de la religión y sus instituciones, dejando definitivamente atrás las ideas de retracción, crisis y declive. Leia Mais

José Antonio Anzoátegui. Accionar y forja de un héroe binacional (1810-2019) | Hancer González Sierralta

José Antonio Anzoátegui. Accionar y forja de un héroe binacional (1810-2019) es una obra robusta en lo heurístico y ambiciosa en lo hermenéutico, que refl eja bien tanto las inquietudes cuanto los logros de la historiografía reciente sobre la fi gura del héroe en Europa y América. Tributario del resurgimiento de la biografía en el marco de la investigación histórica, el estudio de González Sierralta ofrece, además, un detallado recuento de la otra trayectoria del caudillo de la Independencia: su biografía póstuma. Al explicitar sus deudas teóricas e historiográfi cas, el autor nos facilita la tarea de ubicar su propia obra en el contexto de un nutrido revisionismo historiográfi co que, desde fi nales del siglo XX y a lo largo de estas últimas dos décadas, trajo consigo nuevas y sugerentes visiones sobre las guerras de Independencia en América y sus connotados caudillos. La obra de González Sierralta aprovecha, en el mejor de los sentidos posibles, toda aquella historiografía que nos ha ayudado a entender mejor los derroteros de las luchas independentistas, ampliando el ángulo de visión hacia nuevos problemas como la historia social de la guerra; los procesos de articulación de las élites en el contexto de declive de la monarquía hispánica; y los intricados procesos de negociación política que hicieron posible la emergencia y consolidación de los estados nacionales en América, a lo largo del siglo XIX. Al cobijo de las más recientes interpretaciones sobre estos fenómenos, y con el respaldo de una sólida crítica documental, la primera parte de la obra nos explica con todo detalle y rigor la labor militar y política de José Antonio Anzoátegui (entre 1810 y 1819) a la luz de la compleja red de intereses y cambios sociales de esa época convulsa. En la segunda parte de libro, por su parte, se analiza la transmutación heroica del personaje como un factor relevante en la construcción del Estado venezolano y de su propia memoria histórica.

Un aspecto significativo de la obra reseñada, en el contexto más amplio de los estudios recientes sobre el héroe, es la comparación entre las dos grandes matrices de su imagen: la vital y la póstuma. Una y otra son construcciones que el historiador recupera de testimonios contemporáneos (en el primer caso) y de relatos históricos y gestos conmemorativos de diversa índole (en el segundo). La imagen esencialmente marcial de Anzoátegui se revela como el resultado de su aguerrida (a veces incluso despiadada) y disciplinada labor militar, pero también como una consecuencia de su lealtad a la autoridad máxima en que terminó convirtiéndose Simón Bolívar. Sin omitir las opiniones y juicios negativos sobre Anzoátegui, González Sierralta explica su éxito político militar pero también el triunfo de su imagen pública en razón de su férrea lealtad a la autoridad de Simón Bolívar. Dado que la imagen del Libertador se volvió, a la postre, constitutiva de la ideología dominante del Estado venezolano, la memoria en torno a ese personaje y a sus leales representantes, sufrió similar destino. Leia Mais

Blood Matters: Studies in European Literature and Thought/ 1400-1700 | Bonnie Lander Johnson e Eleanor Decamp

Sangue Imagem Classen Rafael EyeEmGetty ImagesSuperinteressante

Sangue | Imagem: Classen Rafael / EyeEm/Getty Images/Superinteressante

This interdisciplinary collection of essays, emerging from a conference held at Oxford University and edited by scholars with interests in literature and medicine in early modern England, seeks to establish how the inhabitants of late medieval and early modern Western Europe defined blood, and to uncover how references to blood were deployed in descriptions of the human condition across various literary forms.  The volume is divided into five thematic sections. As will be discussed later in this review, though, there are connections between essays in different parts of the volume, and around two-thirds of the contributors (11) hold positions in departments of English or Literary Studies, while a smaller number define themselves as cross-disciplinary scholars or reject disciplinary labels completely. Many authors focus on English-language texts produced in England, but several essays draw on evidence from other parts of Western Europe, or incorporate material from texts translated into English from other languages, particularly French, German, and Italian.

Section one, on circulation, begins with Margaret Healy critiquing the work of Christopher Hill, who argued that William Harvey ‘dethroned’ the heart in his writings after 1649 and afforded primacy to ‘democratic’ blood. Healy demonstrates that Harvey in fact emphasised the importance of both heart and blood throughout his career; that ideas about circulation as a beneficial phenomenon dated back to ancient Egypt and were promoted in the Renaissance by Hermetic and Platonic philosophers; and that circulation as a political concept featured in the writings of diverse philosophers, such as Thomas Hobbes, James Harrington, Gerrard Winstanley, and Daniel Defoe. Jumping back in time to Renaissance Italy, Heather Webb explores how the movement of blood and blood-based spirit through and out of the bodies of late medieval Christians was imagined in the writings of Dante and Catherine of Siena as a means of binding individuals into spiritual and social communities, while Katherine Craik uses evidence from 2 Henry IV and Henry V to demonstrate how characters in these plays reinforce and undermine differences of class, with notions that noble blood was more refined and precious being challenged by the ways in which the blood shed by different sorts of men was depicted intermingling on imagined battlefields. Leia Mais

Imagens Interditas: censura e criação artística no espaço ibérico contemporâneo | Diálogos | 2022

Detalhe de capa do Diccionario del Franquismo
Detalhe de capa do Diccionario del Franquismo (2019), de Manuel Vazquez Montalban (Autor) e Miguel Brieva (Ilustrador)

O presente dossiê resulta do primeiro Congresso Internacional Imagens Interditas. Cinema e literatura no espaço ibérico – séculos XX e XXI, que decorreu a 12, 13 e 14 de Abril de 2021, numa organização do CEComp – Centro de Estudos Comparatistas (Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa), em colaboração com o IHA – Instituto de História da Arte (Universidade NOVA de Lisboa) e o CHAM – Centro de Humanidades (Universidade NOVA de Lisboa, Universidade dos Açores).

O evento contou com 33 comunicações de 38 participantes de 15 universidades (Universidade de Lisboa, Universidade NOVA de Lisboa, Universidade de Coimbra, Universidade do Minho, Universidade Lusíada, UNED – Universidad Nacional de Educación a Distancia, Universidade de Brasília, University of the Western Cape, Université Sorbonne Nouvelle Paris 3, Université Paris Nanterre, Universidad de Alcalá, Universitat Pompeu Fabra, Universidade Federal de Santa Catarina, Universidad de Málaga e Universidade de Bergen) de seis países (Portugal, Espanha, Brasil, França, Noruega e África do Sul). Contámos ainda com comunicações de um editor e de um realizador de cinema. As duas conferências plenárias do evento foram proferidas por Ana Cabrera (Universidade NOVA de Lisboa) e Josefina Martinez Alvarez (UNED – Universidad Nacional de Educación a Distancia). Leia Mais

Education and the Body in Europe (1900-1950) | Simonetta Polenghi, András Németh e Tomás Kasper

O livro intitulado “Education and the Body in Europe (1900-1950): Movements, public health, pedagogical and rules and cultural ideas”, escrito em inglês, publicado em 2021 pela editora Peter Lang, é uma obra de importante reflexão realizada pelos editores: professora Doutora Simonetta Polenghi, professor Doutor András Németh, e professor Doutor Tomáš Kasper. A publicação compila 14 capítulos sobre a história do corpo em diferentes países da Europa, a saber: Inglaterra, Bélgica, Alemanha, Hungria, República Checa, França, Suíça, Itália e Espanha.

A primeira parte é composta por 5 capítulos, no qual são: o capítulo “Bodies of the Future – life reform and education as instruments of human evolution” escrito por Ehrenhard Skiera. Os autores Janka Balogh e András Németh produziram o capítulo “Life reform and new body concept of the art of movement”. O capítulo “Body education in the youth movement” foi elaborado pela autora Agnes Trattner. Os autores Dorina Szente e András Németh foram responsáveis pelo capítulo “Changes in women’s body perception and education in the first decade of the twentieth century in the light of Hungarian women’s journals. E a autora Ilaria Mattioni teve o capítulo entitulado “Women’s body, dresses and fashion in Italy. Leia Mais

Ensino de História do Holocausto: itinerários de pesquisas | Boletim do Tempo Presente | 2022

Memorial do Holocausto

Os textos aqui reunidos nesse Dossiê foram selecionados e avaliados a partir do I Congresso Internacional sobre Ensino do Holocausto e Educação em Direitos Humanos, organizado pelo Museu do Holocausto de Curitiba em parceria com a Universidade de Pernambuco e a Universidade Federal do Paraná. Em colaboração com o Boletim do Tempo Presente, da Rede de Estudos do Tempo Presente/Brasil, optamos por fazer a divulgação dos textos num periódico acadêmico, ao invés do modelo tradicional de anais. Acreditamos que esse formato dará aos textos maior visibilidade e acesso. Foram selecionados vinte textos de autores(as) de diversas regiões do país que compõem o que aqui chamamos de “novos itinerários” de pesquisas sobre o Holocausto no Brasil. Os textos foram editados por eixo temático e serão publicados em quatro edições do Boletim do Tempo Presente, sendo essa a primeira edição de 2022. Leia Mais

Ports in the Medieval European Atlantic. Shipping/Transport and Labour | Ana María Rivera Medina

Ports in the Medieval European Atlantic…, editado por Ana María Rivera Medina, recoge las contribuciones de dos grupos de investigación dedicados al estudio del mundo marítimo bajomedieval: Castillas y el Mar en la Baja Edad Media, de la Universidad de La Laguna, y La gobernanza de los puertos atlánticos en la Edad Media (GOBPORT), de la Universidad de Cantabria. La obra contiene un prólogo, una introducción general a la problemática, siete capítulos y una conclusión, en donde cada intervención se encuentra a cargo de destacados especialistas. Cabe resaltar que el libro fue publicado por una prestigiosa editorial británica y el hecho de que fuera editado en inglés abre el campo a las discusiones con otros ámbitos académicos, diferentes a los que habitan los investigadores e investigadoras del ámbito español y portugués, pues es conocido por todos el impacto que produce una publicación en dicha lengua al masificar su alcance a lectores de diversos territorios. Leia Mais

Comparing Transitions to Democracy. Law and Justice in South America and Europe | Cristiano Paixão e Massimo Mecarelli

Ce livre collectif, réunissant quatorze auteurs sous la direction de Cristiano Paixão et Massimo Meccarelli est une contribution innovante à l’étude des transitions démocratiques du XXe siècle en Amérique du Sud, en Espagne, au Portugal et en Italie étudiées sous l’angle de l’histoire du droit, plus particulièrement de l’histoire de la justice dans les périodes de sortie de la dictature et de la difficile reconnaissance des crimes commis avant le processus démocratique. En rappelant le combat récent des familles de victimes pour retrouver les corps de leurs parents disparus et le poster du président Bolsonaro (quand il était membre du Congrès) affirmant que « seuls les chiens recherchaient des os », ce livre montre, s’il en était besoin, combien est vive, chez tous ceux qui ont perdu un être cher dans les crimes des dictatures du XXe siècle, la mémoire de ces tragiques événements et la volonté de connaître la vérité, sinon de voir punis les responsables de ces atrocités. En donnant des évaluations précises du nombre des victimes, de celui (beaucoup plus faible) des actions intentées et de celles (encore moins nombreuses) ayant abouti à des condamnations, en décrivant les obstacles rencontrés par les victimes et leurs familles face aux lois d’amnistie et aux politiques fondées sur l’oubli, cet ouvrage est un salutaire rappel pour les lecteurs du monde entier sur la persistance des crimes contre l’humanité et sur leur poids dans la psychologie de millions de personnes à travers tous les continents.

Au-delà de l’émotion que peuvent ressentir les lecteurs, même ceux bien informés de ces questions dans leur pays, mais ayant eu rarement accès à une étude comparative de cette ampleur, ce livre est un très bel exemple d’histoire du droit à l’époque contemporaine, ou si l’on préfère de l’histoire du temps présent. Dans beaucoup de pays, la discipline de l’histoire du droit s’est d’abord développée pour étudier les traditions nationales, qu’elles remontent à l’Antiquité, au Moyen Âge ou aux Temps modernes. Il a fallu, au cours de ces dernières décennies, des engagements individuels et collectifs de quelques spécialistes de l’histoire du droit pour que l’étude du XIXe , puis du XXe siècle, devienne un objet de recherches et d’enseignements à part entière. Sur la période postérieure à la Seconde Guerre mondiale, il a été longtemps objecté que le recul manquait pour apprécier des événements dont les chercheurs avaient pu être des contemporains, du moins dans leur jeunesse. Depuis longtemps cette objection, qui par nature s’affaiblit d’année en année, a été réfutée par les historiens généralistes qui traitent de la seconde moitié du XXe siècle, qu’il s’agisse de l’établissement des régimes démocratiques en Europe après 1945, de la guerre froide, de la décolonisation ou de la fin de l’URSS. Il n’y a aucune raison pour qu’il en aille différemment pour l’histoire du droit : de la part d’auteurs qui sont pour la plupart séparés des événements analysés par l’espace d’une ou deux générations et qui s’efforcent à l’objectivité en travaillant sur les archives et les discours des acteurs de cette histoire contemporaine, l’on peut trouver la même « objectivité » que chez les historiens étudiant des périodes plus anciennes avec un vocabulaire et un regard qui eux sont nécessairement contemporains. De plus, le sujet traité dans ce livre concerne au plus haut point l’histoire du droit : il s’agit d’analyser le contenu et la portée de textes constitutionnels, de lois (particulièrement de lois d’amnistie), de jugements, de prises de position doctrinales qui constituent autant de pièces de dossiers pouvant être vérifiés ou discutés (« falsifiables » selon le vocabulaire de Popper). Leia Mais

Gender and Diplomacy. Women and Men in European Embassies from the 15th to the 18th Century | Roberta Anderson, Laura Oliván Santaliestra e Suna Suner

1 En marzo de 2016 varios especialistas provenientes de diferentes casas de estudio de Europa y Rusia se reunieron en las instalaciones del Don Juan Archiv (Viena) para reflexionar en torno a la relación entre género y diplomacia entre los siglos XV y XVIII. El evento contó con la coordinación académica de Suna Suner, Laura Oliván Santaliestra y Reinhard Eisendle. El libro que reseñamos, publicado en 2021, recoge los trabajos presentados en el mencionado simposio. Se trata de una publicación de referencia que desarrolla una línea de investigación con notoria actualidad en el mundo académico: la historia diplomática de las mujeres. Leia Mais

El gas de hulla en la Europa Latina hasta mediados del siglo XX, historia, tecnología e innovación | Asclepio. Revista de Historia de la Medicina y de la Ciencia | 2021

INTRODUCCIÓN

El gas que usamos en nuestras casas o en las industrias ya no se fabrica, se extrae de yacimientos lejanos, se transporta en barcos especiales o mediante gasoductos, se distribuye hasta los puntos de consumo, y su principal aplicación es para usos térmicos. Pero, no siempre fue así. Durante mucho tiempo el gas se elaboró mediante procesos de destilación de materias primas combustibles, sobre todo carbón mineral, se distribuyó mediante tuberías, esto, si, más o menos igual que hoy, con otros materiales y se utilizó para el alumbrado.

En Europa, primero comenzó a ser distribuido en Gran Bretaña, en Londres en 1812, y en los países de la Europa Latina, en Francia, en París desde 1818, en Italia, en Milán desde 1837, en España, en Barcelona desde 1841 y en Portugal, en Lisboa desde 1848. Leia Mais

Também os brancos sabem dançar: um romance musical | Kalaf Epalanga

Kalaf Epalanga
Kalaf Epalanga | Foto: J. Carlos/DW

O músico e escritor Kalaf Epalanga Alfredo Ângelo, recém-lançado no mundo da literatura, nasceu em 1987, na cidade de Benguela, em Angola. Ao fugir da Guerra Civil de seu país, mudou-se aos 17 anos para Lisboa, onde desde então vive em alternância com Berlim. Kalaf Epalanga é também autor da coletânea de crônicas (divididas em duas partes): Estórias de amor para meninos de cor (2011) e O angolano que comprou Lisboa (2014). Publica, em 2017, seu primeiro romance: Também os brancos sabem dançar: um romance musical.

Kalaf ganhou notoriedade no âmbito musical através do som frenético e envolvente produzido pelo grupo musical Buraka Som Sistema, do qual é membro. Em entrevista à revista Estante (2015), comenta que virar escritor não estava nos seus planos. Entretanto, o mundo das palavras sempre o seduziu e sua bibliografia, embora ainda pequena, possui enorme representatividade em função de suas obras dialogarem com temas relevantes que marcam a vida do autor, como identidade, migração e angolanidade. Leia Mais

Os impérios ibéricos e a globalização da Europa (séculos XV a XVII) | BartoloméYun Casalilla

1 El autor, que desde hace varias décadas ha investigado sobre la historia del Imperio español, aborda ahora una comparación entre los dos primeros poderes globales: los imperios español y portugués. El libro está basado en ideas expuestas en su Marte contra Minerva (Madrid: Crítica, 2004), a las que se añaden discusiones teóricas más recientes. Esta edición en portugués es una traducción de una versión en inglés publicada en 2019. Esta historia global de los imperios ibéricos gira en torno a tres temas principales: (i) una evaluación de la leyenda negra; (ii) una crítica de recientes explicaciones neoinstitucionales; (3) la globalización vista desde los mundos ibéricos. Estos tres temas guían al autor en su interpretación del ascenso de los estados ibéricos a la preeminencia global, y las consecuencias que este proceso desencadenó en los equilibrios domésticos. El autor examina algunas narrativas que atribuyen a España y Portugal una imagen de atraso económico. Además, busca explicar el ascenso de las potencias ibéricas no como casos excepcionales, sino como vías alternativas a la modernidad. En esta línea, Yun ofrece explicaciones alternativas sobre los procesos de construcción del Estado desde la perspectiva del sur de Europa. Leia Mais

Saberes e poderes no universo ibérico: discursos da cultura escrita na modernidade (Séculos XVI-XIX) |  Revista Maracanan | 2021

Nova typis transacta navigatio Novi orbis Indiae Occidentalis
[PLAUTIUS, Caspar (fl. 1621)]. Nova typis transacta navigatio Novi orbis Indiae Occidentalis… nunc primum e variis scriptoribus in unum collecta… Authore… Honorio Philophono. [Linz], 1621 | Imagem: Christie’s

A partir da década de 1990 houve um significativo crescimento de pesquisas no âmbito da historiografia nacional e internacional voltadas à compreensão da cultura escrita na modernidade. Essas investigações têm abarcado o período compreendido entre os séculos XVI e as independências americanas, no raiar do século XIX, e problematizado a produção, a circulação, o uso e a conservação de manuscritos e impressos vinculados aos seus usos políticos, sociais, religiosos, pedagógicos, culturais tanto na metrópole quanto no território colonial. Intelectuais como Roger Chartier, Robert Darnton, Antonio Castillo Goméz, Fernando Bouza e Diogo Ramada Curto têm contribuído, sobremaneira, para o avanço do conhecimento e da compreensão acerca da circulação de ideias através de seus trabalhos sobre a história do livro e da leitura e da história da cultura escrita global, que interligam manuscritos, impressos e oralidade. Leia Mais

Mobilidade e desenraizamento no Mediterrâneo: introdução | Ler História | 2021

Mapa do Mar Mediterraneo

This paper was financially supported by the COST ACTION project People in Motion: Entangled Histories of Displacement Across the Mediterranean (1492-1923) (PIMo) as a result of the PIMo workshop “Movement and Displacement”, Centro de História, University of Lisbon, 9-10 March 2020.

1 Mobility, immobility and displacement appear as frequent phenomena in the history of the Mediterranean. The twenty-first century has witnessed an increase in public interest in these themes, with the Mediterranean continuing to be a vehicle of mobility for peoples from around the world, in what the scholarly debate and public discourse have often labelled as a “refugee crisis” or “migratory flood”. Growing societal apprehension about mobility in and around the Mediterranean has been at the very core of the Cost Action project People in Motion: Entangled Histories of Displacement across the Mediterranean (1492-1923) (PIMo).[1] This interdisciplinary historical project aims to problematise current views of mobility around the Mediterranean by regarding mobility, immobility and displacement as part of the Braudelian structures of the Mediterranean (Braudel 1949). As a structure, people in motion across the Mediterranean’s liquid space and its extended hinterlands should not be perceived as problematic, but rather as a historical phenomenon substantially impacting on the personal and communal lives of those located in the orbit of this “great sea” (Abulafia 2011).

2 The “refugee crisis” in 2015 has expanded the boundaries of Mediterranean mobility and has affected even countries not traditionally considered to be part of it or in its orbit. Under the emergency relocation scheme initiated by the European Commission, the EU Member States have committed to expressing their solidarity with the frontline Member States (Italy, Greece, Spain and Malta) by agreeing to accommodate asylum seekers whose first step on European soil was in these countries.[2] While the initial plan was for a two-year commitment, this has since been extended multiple times. But as these extensions have, in practice, failed to increase, increment or intensify intra-European solidarity, new policy instruments have been created to further this cause. The “Pact on Migration and Asylum” has been particularly insistent in establishing mechanisms aimed at promoting continuing solidarity among EU Member States on matters of relocation.[3] The changing patterns of mobility in many EU Member States, particularly those further removed from the Mediterranean’s historical paths, have mostly been “welcomed” with ignorance and resistance. Acceptance has been particularly challenging in those states without a long tradition and experience of mobile resettlement and hosting of international migrants. Indeed, recent studies in some of these states suggest an essential need to raise awareness and inform local communities of the “facts about migrants and refugees in order to be persuaded away from anti-immigrants’ attitudes, prejudices, and stereotypes” (Blažytė, Frėjutė-Rakauskienė and Pilinkaitė-Sotirovič 2020, 15).

3 PIMo connects the past and the present, and individual and community experiences, in seeking to understand which factors have contributed to shaping contemporary representation of migration in the Mediterranean region and beyond, as well as explaining similarities and differences in the experiences and emotional expressions of human movement between the fifteenth century and today. In this way, PIMo has been designed to follow the historiographical premises first proposed by Fernand Braudel (1949) and later amplified and diversified by David Abulafia (2011). However, it also innovates through its perspective and framing. The starting point of the project is that individuals departing from their places of origin become uprooted after a specific window of absence. During their journey, they engage in mobility and, as such, contribute to defining their communities of origin as immobile. In this context, reconstructing the departure of one individual or one community translates into three research axes: mobility (of the individual or community moving), immobility (of the community of origin) and displacement (integration of the individual into the host society). This three-dimensional approach thus introduces an individual and communal-centred focus to a theme often portrayed as a collective abstraction.

4 Individual and communal mobilities have an equally transformative effect on their societies of origin as on their host societies. Upon arrival, individuals, even when transient, fit in and integrate through complex processes of adaptation, inclusion and exclusion. In these processes, three elements are crucial for framing the place that individuals assume in the new society. The first of these is the personal experience of mobility as voluntary, forced or traumatic, with this experience formatting the way individuals perceive their own existence. The second reflects the emotions surrounding the experience of mobility (of the self) and immobility (of the group of origin), given that emotions define the extent of tolerance and acceptance of and in the new society (O’Loughlin 2017). The third and final element entails reconstructing a memory of displacement, whereby new identities are forged and belonging is redefined. The ultimate result of this process is the development of construed ergo- and exo-identities, the former referring to the identity conceived of by the “self”, and the latter to the identity assigned by host societies to the individuals or groups (Hoppenbrouwers 2010).

5 For historians, exo-identities can be found in institutional archives (of states, towns, religious institutions and so on). Ergo-identities, by contrast, are more difficult to pinpoint, given that ergo-documents (such as diaries, personal descriptions, personal correspondence and novels) for the period before the eighteenth century do not abound (Antunes 2014). However, the combination of institutional archives and ergo-documents offers a unique window for understanding the emotions individuals experienced while moving, while their feelings of displacement, integration and mobility shed unique light on the human experience of the multiple Mediterranean crossings (Tarantino 2020). In the case of this special issue, religious minorities, maritime groups, diplomats, merchants and writers take centre stage. Even though other groups deserve particular attention, as is the case of armies, captives, refugees or intellectuals, the allotted space of reflection (a total of four articles) imposes some unavoidable analytical constraints.

6 This special issue provides insight into the way different individuals and communities moved and circulated in and around the Mediterranean from the Middle Ages up until the early nineteenth century. It unites four complementary and innovative ways of looking at Mediterranean mobility, immobility and displacement. In the first place, it covers a geographical space that includes the Eastern, Central and Western Mediterranean in its internal dynamics and connections to worlds beyond the “great sea”. This approach highlights the importance of not limiting studies of the Mediterranean to its geographical constraints. The work by Barros and Tavim privileges the circulations between Morocco, Portugal and, to a lesser extent, Spain, with a particular focus on the Moorish and Jewish communities on both sides of the Mediterranean and the way these communities reacted, dealt with and responded to the mobility of specific individuals. Hugo Martins, on the other hand, looks at Mediterranean mobility as a consequence of communal customs and needs of Jewish groups located primarily outside the direct scope of the Mediterranean and, as such, redefines a geographical conceptualisation of the “great sea” well beyond the boundaries imposed by its shores. David do Paço, meanwhile, combines the centrality of the Mediterranean as a space of circulation and connection between empires (Ottoman and Habsburg) in seeking to conceptualise the importance of the sea as a means of imperial integration of political entities perceived as socially and geographically distant. Lastly, Katrina O’Loughlin analyses how the Mediterranean geography was paramount in defining an abstract space for incorporating displacement and establishing who may be perceived as “the other”.

7 Secondly, the authors rethink the Mediterranean geography through the lens of mobility and as a result these articles provide innovative insights into the human experience of motion. All the authors reflect on how historical actors’ mobility determined their fate (historically or fictionally), but also on how the same mobility condemned communities and families left in places of origin to immobility. The articles reflect the many ways in which this dichotomy seems to have weighed heavy in how people perceived, felt and communicated their sense of displacement and, in so doing, greatly influenced the forming of individual and communal identities in the host society. It was this latter process that ultimately determined the levels of integration into, adaptation to or rejection of people’s new social context, thus influencing the core of their identity transformation and reshaping of belonging (Antunes 2014).

8 The third way in which these articles advance scholarly understanding of human motion in and around the greater Mediterranean is by examining how specific individuals framed their mobility as a life experience and, as such, re-created, construed and shaped what Pierre Nora (1984-1992) has long associated with the lieux de mémoire. The articles demonstrate how spaces that Nora would readily associate with a lieu de mémoire were shaped and imagined by the individual and communal experiences of the few and entered the collective memory of the many as truisms. This insight is particularly helpful for historians as the often almost emotional relationship that scholars develop with their historical actors can endanger the neutrality that historians have been required to contemplate ever since Marc Bloch (1949) defined the major principles of the profession.

9 The fourth and final way in which these articles contribute to a new understanding represents a direct response to three historiographical challenges posed by Maria Fusaro, Rogers Brubaker and Joep Leerssen. In revising Braudel’s oeuvre, Fusaro (2010) calls on historians to view the mobility of goods (trade) as being inherent and concomitant to human mobility. This revisionist approach thus envisages a Mediterranean playing its part in a global world of human and material exchanges extending from China to Scandinavia. Although less geographically extensive, the articles in this issue translate the human geography of Mediterranean mobility well beyond the constraints of its shores and, as such, highlight the need to include the Mediterranean in the current historiographical turn towards global history. In adopting this global approach to Mediterranean mobility (here understood as motion, displacement and immobility), the authors reflect on the crucial problem of identity formation and identification. In doing so, they replicate the call by Rogers Brubaker (2004) to rethink and reconceptualise ethnicity as a social phenomenon outside the group and not necessarily aligned with it. The consequence of such realisation is that labelling human mobility as diasporic or communally based falls short when seeking to explain the development of construed identities, identity hybridity and, ultimately, alterity as postulated by Joep Leerssen (2007).

10 The solution that this special issue found for resolving the apparent paradox between answering Brubaker’s call and responding to Leerssen’s premises is to offer a multidisciplinary approach to the identity/hybridity/alterity problem by combining methodologies and scientific queries well known to historians and complementing them with the enriching analytical views of anthropologists and creative writers. This collaboration represents a first step towards rethinking the meaning and impact of mobility in the Mediterranean in both the past and the present. One final note is in order. While preparing this special issue, we learned, discussed and reconceptualised our approaches and the interpretation of the respective primary sources. This was an enjoyable and fruitful exchange that we will cherish moving forward. However, we faced a great loss during the last phase of this project. The sudden passing of Filomena Barros, co-author of one of the articles, left us shocked and stunned, leaving Medieval and Early Modern historiography on mourisco communities in Portugal and elsewhere poorer. This special issue stands partially as a celebration of her work on mobility, displacement and identification of religious minorities.

Notas

1. See www.peopleinmotion-costaction.org.

2. The Council of the European Union. Council Decision (EU) 2015/1523, dated 14 September 2015 (https://eur-lex.europa.eu/legal-content/EN/TXT/?uri=CELEX:32015D1523).

3. The European Commission. Migration and Asylum Package: New Pact on Migration and Asylum, dated 23 September 2020 (https://ec.europa.eu/info/publications/migration-and-asylum-package-new-pact-migration-and-asylum-documents-adopted-23-september-2020_en).

Cátia AntunesLeiden University, The Netherlands. E-mail: [email protected]

Giedrė Blažytė – Diversity Development Group, Lithuanian Centre for Social Sciences, Lithuania. E-mail: [email protected]


ANTUNES, Cátia e BLAZYTÊ, Giedré. Mobilidade e desenraizamento no Mediterrâneo: Introdução. Mobility and Displacement in and around the Mediterranean: An Introduction. Ler História, Lisboa, n.78, p.9-15, 2021. Acessar publicação original [IF]

Acessar dossiê

Masculinity and Danger on the Eighteenth-Century Grand Tour | Sarah Goldsmith (R)

Englishmen have always travelled. According to French Abbé Le Blanc, they travelled more than other people of Europe because `they look upon their isle as a sort of prison; and the first use they make of their liberty is to get out of it’.(1) For young elite males who travelled to France and Italy for up to five years, the Grand Tour was, most historians agree, ‘intended to provide the final education and polish’.(2) There is, however, less agreement about what that ‘education’ entailed. Most scholarly investigations have focused on the fashioning of Grand Tourists’ taste and connoisseurship, or on their learning to develop ‘social ease through exposure to different places and peoples.’(3) Stephen Conway’s suggestion that the Tour was ‘essentially a European education’ is compelling, given that eighteenth-century English aristocracy cultivated a ‘cosmopolitan cultural style’.(4)  The Tour, he argues, encouraged a ‘specifically European outlook’which included polish and refinement, appreciation of classical art and architecture, theatre and music as well as continental cuisine, wine and fashion.(5) Above all, elite youth went on the Grand Tour to perfect their French since it was spoken at all European courts and was the language of diplomacy.(6) No English gentleman could be considered accomplished if he did not speak French. All this education was ultimately meant to shape an individual who would be ‘resolutely British’ and understand classical civilization’s supposed commitment to public spirit’.(7)

Leia Mais

Renzo Laconi. Una biografia politica e intellettuale | Maria Luisa di Felice (R)

Filosofia e Historia da Biologia 11
Maria Luisa di Felice | Foto: FG |

SCOTT The common wind 14Maria Luisa Di Felice, ricercatrice universitaria in Storia contemporanea presso la Facoltà di Studi umanistici dell’Università di Cagliari, oltre ad avere all’attivo una vastissima produzione scientifica e un percorso formativo e professionale in lettere e archivistica, dal 2009 è responsabile scientifico del progetto di ricerca su «Renzo Laconi, il politico e l’intellettuale. Studio e valorizzazione del pensiero e dell’opera». Un progetto di ricerca che ha realizzato l’obiettivo di recuperare, riordinare e inventariare l’archivio privato di Laconi, portando alla luce la rilevanza nazionale del suo contributo intellettuale e politico negli anni di attività all’Assemblea Costituente e alla Camera dei Deputati. Nel corso di tali ricerche, Di Felice ha pubblicato alcune prime monografie: Renzo Laconi. Per la Costituzione. Scritti e discorsi (2010) e Renzo Laconi, la formazione intellettuale e politica. Dagli anni giovanili alla nascita della Repubblica (2011) [1]. Il volume edito nel 2019 da Carocci – articolato in quindici capitoli e 685 pagine – «ha assorbito in sé anche i due precedenti» [2] e rappresenta l’ultima tappa di un lavoro biografico monumentale, corredato da fotografie e disegni realizzati dallo stesso Laconi, a coronamento di una esaustiva biografia intellettuale e politica sull’esponente comunista sardo. La messa a disposizione dell’archivio privato di Laconi e della sua biblioteca[3] ha contribuito in maniera determinante alla realizzazione dello studio. In particolare, il suo archivio personale – conservato presso la Fondazione Gramsci di Roma – rappresenta un’eredità politica e culturale ricchissima, con i suoi oltre cento Quaderni, definiti come un autentico «archivio nell’archivio». Laconi infatti aveva l’abitudine di annotare le proprie riflessioni, organizzandone in maniera sistematica la conservazione. Tra le fonti complementari si annoverano i fondi non ancora sufficientemente esplorati, come quelli del Gruppo parlamentare del Pci e del Consiglio regionale della Sardegna, accanto ad altri più noti (ad esempio: le carte della Direzione del Pci e dell’Archivio storico della Camera dei deputati). Il volume concretizza l’obiettivo di integrare le diverse opere parziali pubblicate nel corso degli anni [4], fornendo un quadro d’insieme, una visione organica di una biografia intellettuale e politica. I primi capitoli sono dedicati all’infanzia di Laconi a Sant’Antioco (CA), agli anni giovanili e universitari vissuti a Cagliari, dove si laurea in filosofia; al periodo in cui è insegnante a Firenze, all’adesione al Pci nel 1942 e all’esperienza come caporale nell’esercito dal 1943. Il libro si sofferma sul periodo di intenso impegno politico per la ricostruzione del Partito comunista nell’isola, all’indomani della caduta del fascismo: sul ruolo di segretario di federazione a Sassari e sulla partecipazione ai lavori della Consulta regionale sarda. L’opera sottolinea con precisione come il percorso di Laconi sia marcato al contempo dalla scelta di Gramsci come maestro, come guida intellettuale e umana [5], e dalla spiccata sintonia politica con la linea togliattiana. Eletto appena trentunenne all’Assemblea costituente (incarico per cui, nonostante la sua attenzione e sensibilità al movimento dei minatori del Sulcis-Iglesiente [6], lascia la fascia di Sindaco di Carbonia a Renato Mistroni), Laconi partecipa alla Commissione dei 75 nonché ai lavori del comitato di redazione, detto «dei 18», che materialmente ha il compito di tradurre le discussioni, svolte nell’Assemblea e nelle tre sottocommissioni, in puntuali enunciati normativi. Tale esperienza – sottolinea a giusto titolo Di Felice – rappresenta «la chiave di volta del suo percorso politico e intellettuale» [7]. Laconi contribuisce in maniera significativa e originale all’elaborazione della Costituzione italiana, facendosi portatore di idee innovative sul regionalismo e sulle tematiche autonomistiche, rivelatesi anticipatrici anche rispetto alla cultura politica del proprio partito. Dopo l’invito rivolto nell’aprile 1945 da Palmiro Togliatti ai «compagni sardi […] a comprendere che non devono avere nessuna paura di essere loro gli autonomisti, perché l’autonomia è una rivendicazione democratica rispondente agli interessi del popolo sardo» [8], Laconi è tra i pochi comunisti insulari a raccogliere l’esortazione del segretario nazionale, nonostante la posizione ferma e indifferente del Pci isolano. La linea autonomista del Pci diventa netta in seguito all’estromissione dei comunisti dalla coalizione di governo nazionale: nel 1947, sostiene Sircana, il partito diventa «paladino del decentramento regionale, considerandolo un fattore di equilibrio democratico perché avrebbe assicurato all’opposizione la possibilità di accesso alla direzione politica di ampie zone dell’Italia» [9]. La svolta in Sardegna è sancita dal II Convegno regionale dei quadri, tenutosi a Cagliari il 25 e 26 aprile 1947, in presenza del segretario Togliatti. È in questa fase che all’Assemblea costituente Laconi sostiene l’«apertura verso l’ordinamento regionale, purché non di tipo federale né omogeneo su tutto il territorio nazionale; differenziazioni tra le regioni; ostilità verso la frammentazione della potestà legislativa; ampia autonomia a Sardegna, Sicilia e regioni di confine con potestà legislativa primaria su alcune materie, escludendo in primo luogo quelle che avrebbero potuto essere oggetto di riforme strutturali; potestà legislativa più circoscritta alle altre regioni; assemblee regionali costituite nel rispetto della piena sovranità popolare […] contributo dello Stato allo sviluppo del Mezzogiorno attraverso la pianificazione economica» [1]0. Su quest’ultimo punto, a partire dal «Congresso del popolo sardo» nel maggio 1950, Laconi e i comunisti insulari si batteranno costantemente al fine di ottenere l’approvazione del «Piano di Rinascita economica e sociale della Sardegna», previsto dall’articolo 13 dello Statuto regionale, che avverrà soltanto nel 1962.

Per comprendere la rilevanza innovatrice del contributo di Togliatti e di Laconi al regionalismo e all’autonomismo sardo del Partito comunista – problematica alla quale l’opera di Maria Luisa Di Felice fornisce un contributo essenziale – può risultare utile la comparazione con la federazione còrsa del Partito comunista francese [11]. Nell’isola, situata a pochi chilometri a nord della Gallura, la distanza sul tema dell’autonomia è notevole (d’altronde, mentre lo statuto della Regione autonoma della Sardegna viene approvato nel 1948, bisognerà attendere il 1982 per il primo Statut particulier della Corsica). All’epoca della svolta autonomista del Pci sardo, la federazione comunista còrsa è manifestamente centralista e giacobina. L’organizzazione partitica ha raggiunto il suo apice, dopo essersi rafforzata esponenzialmente proprio negli anni della clandestinità e della resistenza, combattendo le pretese irredentiste e l’occupazione fascista dal novembre 1942 al settembre 1943. Tuttavia il Pcf còrso, rispetto alle federazioni del continente, presenta dei caratteri di originalità: l’isola viene definita una «piccola patria» all’interno della «grande patria» francese e, secondo la lettura storica dei comunisti insulari, il popolo còrso – mai sottomesso né all’invasione pisana, né a quella genovese e nemmeno alla Francia monarchica – con la rivoluzione del 1789 ha scelto di propria iniziativa di diventare repubblicano e francese.

Chiusa la breve parentesi comparativa, occorre ricordare che, in seguito all’approvazione della Costituzione italiana, Renzo Laconi si divide tra l’impegno di deputato (carica che ricopre senza interruzioni dalla I alla IV legislatura) e gli incarichi regionali. La sua attività politica è intensa e allo stesso tempo tormentata, segnata dall’aspra dialettica con Velio Spano, rivoluzionario di professione durante la clandestinità e segretario regionale del Pci nel decennio 1947-1957 [12]. Nel mese di dicembre del 1957 Laconi gli succede alla carica di segretario e resterà alla guida del Comitato regionale sardo fino al novembre 1963, periodo ampiamente documentato e descritto nei capitoli conclusivi della biografia. Laconi scompare prematuramente a Catania all’età di 51 anni, nel 1967.

Con un lavoro imponente, curato e approfondito, Maria Luisa Di Felice mette a disposizione degli studiosi quest’opera che rappresenta il «degno traguardo di numerosi anni di studio»13. La lettura non sempre è agevole, il testo a tratti risulta fin troppo scrupoloso, con dettagli e precisazioni talvolta evitabili. Ma complessivamente si tratta di un libro indispensabile non solo per la conoscenza biografica di Laconi, ma anche per approfondire la storia politica della Sardegna e del Pci sardo, nonché la questione del regionalismo e dell’autonomismo che ha profondamente marcato la storia insulare e nazionale.

Notas

1. LACONI, Renzo, Per la Costituzione. Scritti e discorsi, a cura di Maria Luisa DI FELICE, Roma, Carocci, 2010; DI FELICE, Maria Luisa, Renzo Laconi, la formazione intellettuale e politica. Dagli anni giovanili alla nascita della Repubblica, Roma, Carocci, 2011.

2. DI FELICE, Maria Luisa, Renzo Laconi. Una biografia politica e intellettuale, Roma, Carocci, 2019, p. 17.

3. LAI, Gianna (a cura di), La biblioteca di Renzo Laconi, Cagliari, Cuec, 2020.

4. LACONI, Renzo, Parlamento e Costituzione, a cura di Enrico BERLINGUER, Gerardo CHIAROMONTE, Roma, Ed. Riuniti, 1969; LACONI, Renzo, La Sardegna di ieri e di oggi. Scritti e discorsi sulla Sardegna, 1945-1967, a cura e con introduzione di Umberto CARDIA, Cagliari, Edes, 1988; SCANO, Pier Sandro, PODDA, Giuseppe (a cura di), Renzo Laconi, Un’idea di Sardegna, Cagliari, Aipsa, 1998.

5. DI FELICE, Maria Luisa, «Il Gramsci di Renzo Laconi», in Studi e ricerche, I, 2008, pp. 213-228.

6. DI FELICE, Maria Luisa, «Fare politica: Renzo Laconi, i minatori e la lezione di Gramsci», in Le Carte e la Storia, 1/2015, pp. 99-116.

7. DI FELICE, Maria Luisa, Renzo Laconi. Una biografia politica e intellettuale, cit., p. 15.

8. Ibidem, p. 97.

9. SIRCANA, Giuseppe, s.v. «Renzo Laconi», in Dizionario biografico degli italiani, vol. 63, Roma, Istituto della Enciclopedia italiana 2004.

10. DI FELICE, Maria Luisa, Renzo Laconi. Una biografia politica e intellettuale, cit., p. 159.

11. Sul tema: DI STEFANO, Lorenzo, Le Pcf en Corse et le Pci en Sardaigne, 1920-1991: implantation militante, histoire électorale, identité insulaire, tesi di dottorato (in corso di redazione dal settembre 2018), UMR CNRS 6240 LISA, Università di Corsica.

12. Sul confronto fra Spano e Laconi: MATTEI, Sebastian, «Autonomia e rinascita. Velio Spano e Renzo Laconi nella Sardegna del secondo dopoguerra», in Studi storici, LIX, 2/2018, pp. 493-523. Su Spano: MATTONE, Antonello, Velio Spano. Vita di un rivoluzionario di professione, Cagliari, Della Torre, 1978; HÖBEL, Alexander, «Velio Spano», in Dizionario biografico degli italiani, Vol. 93, Roma, Istituto della Enciclopedia italiana, 2018; nonché il libro di memorie: GALLICO SPANO, Nadia, Mabrùk: ricordi di un’inguaribile ottimista, Cagliari, AM&D, 2005.

13. MINNUCCI, Virginia, «Recensione a DI FELICE, Maria Luisa, Renzo Laconi. Una biografia politica e intellettuale», in Archivio storico italiano, 2020, pp. 666-667.

Lorenzo DI STEFANO (1989) È dottorando in Storia contemporanea presso l’Università di Corsica “Pasquale Paoli” con una tesi intitolata Le Pcf en Corse et le Pci en Sardaigne, 1920-1991: implantation militante, histoire électorale, identité insulaire. È stato operatore di servizio civile presso la Fondazione Gramsci di Roma, dove si è occupato della catalogazione del fondo librario di Paolo Spriano. Nel 2016 ha conseguito con lode la laurea magistrale in Scienze politiche presso l’Università degli studi di Teramo.


DI FELICE, Maria Luisa. Renzo Laconi. Una biografia politica e intellettuale. Roma: Carocci, 2019, 685p. Resenha de: DI STEFANO, Lorenzo. Diacronie – Studi di Storia Contemporanea, v.45, n.1, mar. 2021. Acessar publicação original [IF].

Burning the Books / Richard Ovenden, The lost library / Dan Rabinowitz

OVENDEN Richard
Richard Ovenden – Foto: Library of Congress /

OVENDEN R Burning booksThe burning of books is a highly emotive subject. The Nazis’ bonfires of Jewish books and other ‘degenerate’ literature in 1933 horrify, and not only because they presaged the incinerators of the Holocaust. From the paradigmatic (and, we learn, probably apocryphal) conflagration of the ancient library of Alexandria, which consumed most of the corpus of Classical literature, to the torching of the Baghdad National Library following the invasion of Iraq in 2003, the destruction of books (and archives) seems to shock more than the loss of any other form of material culture. Why should this be? Although Richard Ovenden does not directly address the question in his excellent Burning the Books, the answer may lie both in the unparalleled capacity of books and archives to preserve the past—they constitute our collective memory—and in their limitless potential to generate new knowledge, Milton’s ‘potencie of life’. Perhaps, as Sappho’s enigmatic ‘you burn me’ fragment intimates, something of ourselves perishes in the destruction of books.

Burning the Books, which has justly garnered considerable critical and popular attention, eloquently and powerfully describes numerous attacks upon knowledge across four millennia, from the destruction of Ashurbanipal’s cuneiform library in 621 BCE to the ‘Windrush’ scandal of 2010 when Home Office officials were revealed to have destroyed records that would have proved migrants’ entitlement to British citizenship. While Burning the Books may not break new ground in the scholarship on libraries and book history—it largely draws upon existing literature—it is meticulously researched and referenced, compellingly argued, and likely to prove a landmark in the history of libraries and the preservation of knowledge.

Leia Mais

Sujeitos e Artefatos: territórios de uma história transnacional da educação | Diana Gonçalves Vidal

Nos últimos anos, é crescente o interesse por abordagens transnacionais no campo historiográfico. Diante da frequência com que o termo tem aparecido em títulos de livros, artigos e palavras-chave, Struck, Ferris e Revel (2011) levantam a possibilidade de a história transnacional representar uma mudança metodológica significativa na historiografia, tal como aconteceu com a história social, a partir dos anos de 1950, e com a micro-história, nos anos de 1970 e 1980. Não surpreende, portanto, que venha recebendo atenção de pesquisadoras e pesquisadores do campo da História da Educação, que, pelo menos desde os anos oitenta, têm buscado o alinhamento e o diálogo com a historiografia.

Demonstrando o potencial das abordagens transnacionais para investigações que tomam como tema a educação e a escola, em suas múltiplas perspectivas e interfaces, foi recentemente publicado, em formato E-book, pela Fino Traço Editora, o livro Sujeitos e Artefatos: territórios de uma história transnacional da educação, organizado por Diana Vidal. A obra é parte da Coleção Estudos Brasileiros, do Instituto de Estudos Brasileiros, e resultado de um conjunto de pesquisas que, desenvolvidas no âmbito do projeto temático Saberes e práticas em fronteiras: por uma história transnacional da educação (1810-…), privilegiam os movimentos, a circulação, os intercâmbios de sujeitos e objetos elucidativos de experiências e processos educacionais, ao longo dos séculos XIX e XX [1]. Leia Mais

Inky Fingers: The Making of Books in Early Modern Europe – Antony Grafton

GRAFTON Anthony 1

Anthony Grafton / Foto: Princeton University /

GRAFTON A The making booksIf it is hard to write a book review, then it is much harder to make a book. Anthony Grafton’s latest monograph, Inky Fingers, puts the difficulties of labour at the centre of this engaging study of book production in early modern Europe and North America (the latter included despite the expected limitations of the subtitle). He directs our attention to a cast of players more usually relegated to the wings of humanistic scholarship: printers, copyeditors, translators, compilers and other ‘native-born son[s] of the new city of books that printing created’ (p. 38).(1) In so doing, he reminds us that the life of scholarship ‘could cramp the hands and buckle the back’ (p. 4), to say nothing of the strain of texts and handwriting on the eyes. Building on the work of scholars including Anne Goldgar and William Sherman, and on Grafton’s own extensive contributions to the intellectual and textual history of humanistic scholarship, Inky Fingers provides a stimulating account of the back-and-forth of making books, and how this process shapes texts’ meanings and reception. Leia Mais

Le travail en Europe occidentale 1830-1939 / Marion Fontaine, François Jarrige e Nicolas Patin

FONTAINE Marion1
Marion Fontaine /

FONTAINE M Le travail en Europe occidentaleLa nouvelle question d’histoire contemporaine au CAPES et aux agrégations porte pour 2021 sur « Le travail en Europe occidentale des années 1830 aux années 1930. Mains-d’œuvre artisanales et industrielles, pratiques et questions sociales ». Les éditions Atlande, indispensables compagnons des candidats depuis plus de vingt ans, consacrent deux volumes au sujet, l’un faisant office de manuel et l’autre proposant de multiples documents. Sous la direction de Marion Fontaine, François Jarrige et Nicolas Patin, ce ne sont pas moins de vingt plumes différentes qui participent au premier ouvrage. Après une présentation sémantique, l’introduction revient rapidement sur une « histoire du travail [qui] est fondamentalement une histoire située » et explique les contours thématiques et chronologiques du sujet.

Son architecture complexe de ce livre en fait aisément le recueil de trois ouvrages différents et complémentaires. Comme les directeurs l’expliquent en introduction, la première partie vise à mettre en place les principaux éléments « dessinant les trajectoires globales de l’évolution du travail des années 1830 aux années 1930 ». En une quarantaine de pages, François Jarrige dresse d’abord un tableau des « mondes du travail et de l’industrie dans l’Europe des années 1830 ». Alors que l’industrialisation se fait à des rythmes décalés, précoce en Grande-Bretagne, plus tardif en Europe du Sud, les contours du monde ouvrier restent flous en 1830 et les statistiques incertaines tant « domine le foisonnement des formes intermédiaires entre l’atelier artisanal et l’entreprise industrielle » (p.37). Le travail à domicile et les « nombreuses nébuleuses proto-industrielles » (p.43) jouent un rôle majeur dans le tissu productif des années 1830, y compris en Angleterre, et, si de nouveaux bâtiments industriels apparaissent, il s’agit surtout de lieux permettant « l’empilement de métiers regroupés sous un même toit, sans division profonde du travail ni mécanisation » (p.49). Le statut et la rémunération des ouvriers sont alors envisagés dans un monde du travail qui voit les corporations remises en cause sans disparaître partout immédiatement. Dans ce moment 1830, la question sociale tend de plus en plus à rencontrer « les enjeux politiques » (p.69), participant à « la prise de conscience des intérêts collectifs des travailleurs » (p.73).

Toujours sous la plume de François Jarrige, un deuxième chapitre s’intéresse à un long milieu du XIXe siècle, période d’accélération de l’industrialisation autant que de l’« irruption dans l’arène publique » (p.79) des travailleurs. Si on excepte l’Europe du Sud, 1848, que l’auteur qualifie de « révolution européenne du travail », s’apparente à l’épicentre de cette « politisation des mondes ouvriers » (p.83). La mécanisation et la concentration des activités de production s’affirment davantage à partir du milieu du siècle, à des rythmes variés selon les pays, l’Angleterre et la Belgique faisant figure d’« ateliers du monde » (p.89), quand l’Italie et l’Espagne sont à classer parmi les « pays « retardataires » et « archaïques » » (p.91). La période est caractérisée par l’ « émergence très lente de la grande industrie » (p.95), à l’origine d’un tissu ouvrier complexe, dont ne sauraient être exclus les femmes et les enfants, comme de paysages d’autant plus marqués par des pollutions atmosphériques majeures que l’utilisation du charbon y est souvent massive. Enfin, à la suite de Charles Tilly, l’auteur souligne que les années 1850 sont celles du « basculement d’un régime d’action ancien, essentiellement local et patronné, consistant en destructions et soulèvements populaires, vers un répertoire « moderne » de plus en plus national et autonome, composé de grèves, de réunions politiques et de meetings, encadré par des organisations et associations en cours d’institutionnalisation. » (p.101)

En s’intéressant aux années 1880 à 1914, Marion Fontaine dessine la perspective d’un « nouveau monde ouvrier » (p.109), que les mineurs et surtout les « métallos » symbolisent désormais davantage que les ouvrier.e.s du textile. La période voit « une véritable recomposition du système technique, autour de l’électricité et du moteur à explosion à base de pétrole » (p.112), qui étend considérablement l’industrialisation et modifie sensiblement l’organisation du travail. Désormais, et malgré le maintien de formes de production plus traditionnelles, le modèle de la grande usine se développe, surtout dans certains types d’industrie, et a, pour de nombreux ouvriers, « l’allure d’un carcan, voire d’un bagne » (p.118). Dès lors se met en place un nouveau prolétariat qui, derrière l’apparente homogénéisation que permettrait la concentration de l’usine moderne, n’est pas sans hiérarchie. C’est dans ce cadre que s’organise le mouvement ouvrier, dont le rôle croissant, dans un contexte de « relative dynamique de démocratisation » (p.135) poussent les gouvernements des différents États à prendre davantage en compte les conditions de vie des travailleurs.

La Première Guerre mondiale constitue « un tournant pour la main d’œuvre et les relations de travail » et « change le monde du travail en profondeur » (p.139). L’État tient une place essentielle dans les économies de guerre qui se mettent en place à partir de l’été 1914, autant dans le financement industriel que dans l’organisation de la production. Les États se montrent aussi, selon les cas et selon les périodes, tantôt « arbitres et négociateurs », tantôt « régulateurs » dans les relations de travail (p.147). Le conflit est aussi l’occasion d’un emploi massif des femmes dans l’industrie, mais « leur place demeure subordonnée » (p.149), comme l’est celle de la main d’œuvre coloniale utilisée par la France et le Royaume-Uni. Dans un contexte industriel de développement de « nouvelles formes d’organisation du travail », la recherche d’une production croissante s’appuie « sur la dérégulation et la contrainte » (p.160), ce qui n’est pas sans expliquer, en partie, le « retour des conflits » du travail en 1917.

Le dernier chapitre de cette première partie s’intéresse à l’entre-deux-guerres, « période frappée du sceau de l’ambiguïté, entre avancées sociales massives […] et répression du mouvement ouvrier » (p.165). Dans un climat révolutionnaire qui voit naître un État communiste, les années de sortie de guerre sont l’occasion de conquêtes sociales importantes, telle la journée de huit heures (sauf au Royaume-Uni). La « grande vague de rationalisation » (p.171) déferle alors sur le monde du travail, au risque de « l’aliénation des ouvriers face à la machine » (p.175). La crise de 1929 voit émerger un chômage de masse inédit, mais aussi de grands conflits sociaux. La question du monde du travail dans l’Italie fasciste et dans l’Allemagne nazie est évidemment posée.

Le sujet est ensuite envisagé sous des angles thématiques. Dans « les mécanismes de l’industrialisation européenne », François Jarrige revient sur l’expression « révolution industrielle » pour lui préférer « industrialisation », qui dit mieux « sa lenteur, son caractère inégal et progressif » (p.196). Marco Saraceno et François Vatin abordent « les savoirs du travail » et montrent le passage de la machinerie du début du XIXe siècle à la quête de « rationalisation psychologique, technique et économique ». Alain Chatriot pose rapidement la question du commandement et s’intéresse aux patrons et aux ingénieurs, avant que Thomas Le Roux n’envisage « les corps ouvriers », entre soumission d’une part, et reconnaissance des risques et des maladies professionnelles d’autre part. Michelle Zancarini-Fournel conclut sa stimulante partie consacrée au « genre au travail » par trois éclairages successifs, sur la proto-industrialisation, sur la Première Guerre mondiale et sur la question de la protection sociale et des organisations syndicales. « Les migrations de travail », présentées par Fabrice Bensimon, sont l’occasion de multiplier les échelles, de temps (des migrations saisonnières aux déracinements définitifs) comme d’espace (des bassins démographiques régionaux aux mouvements transnationaux, voire transcontinentaux). Marion Fontaine étudie les cultures ouvrières, tant celle des métiers et de l’usine, que celles qui voient le jour « hors-travail » et qui ne sont nullement « des entités isolées » (p.338). Dominique Pinsolle s’intéresse aux conflictualités ouvrières et propose une indispensable mise au point sur des militantismes multiples. Ceux-ci sont indissociables de la mobilisation politique du travail, abordée par Emmanuel Jousse, qui donne naissance aux partis ouvriers. Laure Machu précise le rôle de l’État comme protecteur et régulateur des rapports de travail, soumis finalement, avec la dépression des années 1930, à une forte déstabilisation. Enfin, du Champathieu des Misérables de Victor Hugo à Tonine Gaucher de La ville noire de George Sand, de La Forge d’Adolph von Menzel au Débardeur de Constantin Meunier, de La Belle équipe de Julien Duvivier au lambeth walk, Gilles Candar évoque la représentation du « travail et travailleurs en littérature et dans les arts ».

La troisième partie entend mettre à disposition des outils, qu’il s’agisse de cartes, d’une chronologie ou d’une série de monographies collectives. Les notices biographiques, pourtant fréquentes dans les manuels de cet éditeur, sont écartées, les auteurs invitant à juste titre à se référer au richissime Maitron. Ils leur préfèrent de courts portraits de groupes consacrés aux métiers, les couturières, les tisserands, les dockers ou les ouvriers du livre ou de la chaussure. Chaque métier s’inscrit dans des temporalités et des problématiques qui traversent l’ensemble du thème du travail. Les cinq pages consacrées aux mineurs permettent ainsi de comprendre comment les « gueules noires », deviennent des « icônes du prolétariat », alors que le travail au fond de la mine s’industrialise très lentement et que l’extraction du charbon « se fait longtemps par la seule force physique, le mineur arrachant avec son pic le charbon de la veine » (p.450).

Un recueil de documents, introduits et présentés par Florent Le Bot et Audrey Millet, constitue le deuxième volume de l’ensemble. L’ouvrage ne vise évidemment pas l’exhaustivité mais ambitionne « la variété de documents (de textes et d’iconographie […]), inscrits dans la pluralité des séquences chronologiques et des espaces considérés » (p.19). Si certains documents appartiennent à « la sphère des représentations » (p.20), d’autres, tels les témoignages et les enquêtes, permettent en revanche d’entrer davantage « dans le cœur de l’espace du travail, dans l’atelier, dans le domicile, dans l’usine même » (p.21).

Ce sont au total plus de cent-quatre-vingt documents ou ensembles de documents qui sont proposés, répartis en cinq parties : « paysages du travail », « travailler pour vivre, travailler à en mourir ? », « encadrer des main d’œuvre », « sociabilités, engagements et conflits » et « représentations du travail ». Chacune est divisée en chapitres qui répondent, pour certains, aux chapitres du premier volume. Ainsi, les six documents de « mobilités et immigrations » répondent au point sur « les migrations de travail » ou les dix-sept documents et ensembles documentaires sur « les corps ouvriers au risque du travail » permettent de nourrir la lecture du court chapitre sur le même sujet.
Chaque document ou ensemble documentaire est présenté de façon plus ou moins complète par un texte permettant de le replacer dans un contexte plus large et complété non seulement des indications précises de la source mais aussi d’une utile (et courte) orientation bibliographique permettant d’approfondir le sujet. Ainsi, en croisant le manuel et des documents, ce sont de véritables dossiers que peut se constituer la lectrice ou le lecteur.
Dans le premier volume, on regrettera néanmoins la pauvreté du cahier cartographique, dont plusieurs cartes reproduisent celles publiées dans le volume Industrialisation et sociétés. Europe occidentale 1880-1970, paru en 1998, faisant fi de l’apport des représentations territoriales dans le processus d’explication et de mémorisation d’un phénomène, comme d’une « histoire du travail [qui] s’est donc réinventée dans les dernières décennies » (p.28).
Malgré la grande variété du deuxième volume, il est dommage que les reproductions photographiques du document ne soient pas toujours d’une qualité permettant leur exploitation (par exemple, le complexe du Grand-Hornu, p.259, ou les grévistes des Aciéries de Sambre et Meuse, p. 534). On pourra également regretter que, lorsque le document et son introduction n’occupent que deux pages, ils ne soient pas systématiquement placés face à face, même si on comprendra les nécessités techniques qui poussent à les mettre dos à dos. Enfin, de très rares choix sont peu compréhensibles : la photographie de l’équipe de football du Havre Athletic Club (p.271) dit assez peu du travail ou de la place de ce sport dans les cultures ouvrières. D’autres documents auraient été à cet égard bien plus parlants et auraient éventuellement permis de sortir des exemples français, qui dominent légitimement dans ce recueil.

Ce ne sont évidemment là que des réserves minimes tant les deux ouvrages sont riches. Bien sûr très utiles aux candidat.e.s des concours d’enseignement devant travailler des questions pour lesquelles ces volumes sont spécialement conçus, ils le seront également aux professeur.e.s pour renouveler leurs connaissances et leurs approches d’un sujet malheureusement trop peu présent dans les programmes actuels du secondaire. De fait, ce « Travail » en deux volets en est un très beau !

François da Rocha Carneiro – Professeur d’histoire-géographie à Roubaix, Docteur en histoire contemporaine et chargé de cours à l’Université d’Artois, Vice-Président de l’APHG.


FONTAINE, Marion; JARRIGE, François; PATIN, Nicolas (dir.). Le travail en Europe occidentale 1830-1939. Paris: Atlande, 2020. LE BOT, Florent; MILLET, Audrey (dir.). Le travail en Europe occidentale 1830-1939 – documents. Paris: Atlande, 2020. Resenha de: CARNEIRO, François da Rocha. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 10 jan. 2021. Consultar publicação original

Religiões na grécia e roma antigas: contatos, encontros e trocas / História – Questões & Debates / 2021

RELIGIÃO NA GRÉCIA E ROMA ANTIGAS: CONTATOS, ENCONTROS E TROCAS [1]

A natureza fragmentária e variada do Mediterrâneo foi estudada por pesquisadores que se dedicaram, de fato, a entender a região. As ideias revolucionárias da obra pioneira de Fernand Braudel, La Méditerranée et le Monde méditerranéen à l’époque de Philippe II (1949), mudaram o foco do espaço mediterrânico, deslocando-o de suas fronteiras continentais para a bacia marítima, bem como reorientaram a pesquisa histórica da região, encaminhando-a da política para a cultura e a economia. É certo que, depois de Braudel, foram necessários muitos anos para que os estudos na escala mediterrânica se tornassem tendência. A nova contribuição significativa foi feita por Peregrine Horden e Nicholas Purcell, com a publicação The Corrupting Sea: A Study of Mediterranean History (2000), que identificou elementos comuns ao longo dos mais de três mil anos de história no Mediterrâneo. Explorando a extrema fragmentação da região em suas paisagens terrestres e marinhas, os autores produziram uma análise inovadora das relações entre suas diferentes microecologias. Horden e Purcell evidenciaram o peso do elemento da incerteza nos microcosmos mediterrânicos, seja quanto ao clima e à quantidade de precipitação, seja quanto à direção e a intensidade do vento, e ainda quanto à possibilidade de catástrofes vulcânicas e sísmicas. Por outro lado, se o Mediterrâneo passa então a ser pensado enquanto uma área de incerteza, entende-se que ele se constituiu também como região de grande mobilidade, dados seu elevado número de ilhas e a extensão de sua área costeira, a maior do planeta. Com efeito, o fato de seus navegadores raramente perderem de vista a terra e do sol brilhar durante todo o ano fez do Mediterrâneo um espaço de oportunidades, o que encorajou os homens a diversificarem, produzirem e explorarem.

Esse poder que o Mediterrâneo tem de conectar mundos é explorado num outro livro monumental do século XXI, The Making of the Middle Sea (2014). Seu autor, Cyprian Broodbank, utiliza uma vasta quantidade de dados arqueológicos para desvelar a história da região, de um milhão e oitocentos mil anos atrás até o Período Clássico, demonstrando como o mundo mediterrânico, facilmente navegável e ecologicamente fragmentado, evoluiu para uma oecumene através da agência dos habitantes de suas ilhas e costas.

A natureza fragmentária da região mediterrânica é, com efeito, uma de suas características mais distintivas. Ela atua como estímulo histórico para a formação de redes de transporte complexas, responsáveis por ligarem lugares de tamanhos e importância desiguais, da família aos estados imperiais, e por envolverem todo tipo de atores, do comerciante ao monarca (MALKIN; CONSTANTAKOPOULOU; PANAGOPOULOU, 2011). O Mediterrâneo, por isso, permitiu o movimento de multidões em torno da sua vasta área, não só devido à proximidade dos seus locais costeiros e suas ilhas, mas também devido às condições climáticas (ou seja, um verão semi-árido e um inverno úmido) amplamente favoráveis à disseminação de produtos e técnicas (agricultura, perfumaria, cerâmica, navegação) (BROODBANK, 2014). A extensa circulação de pessoas e bens no Mediterrâneo reflete-se também na natureza das práticas religiosas da região. Objetos provenientes de todo o mundo antigo eram apresentados como ofertas em túmulos e santuários pela região mediterrânica. As práticas religiosas, por sua vez, eram transmitidas durante diferentes ciclos de convulsões sociais e migrações, o que envolvia o contato tanto de habitantes de áreas próximas entre si quanto daquelas situadas a grandes distâncias, cuja comunicação se dava por meio da rede de rotas.

Este dossiê apresenta então estudos de caso que enfatizam a diversidade cultural e os intercâmbios religiosos no mundo greco-romano, centrando-se nas relações entre fragmentos da região mediterrânica (MALKIN, 2011). Com nove artigos em múltiplas áreas temáticas, os primeiros cinco se desenvolvem no campo da Arqueologia Clássica, e os quatro seguintes em História e Literatura. As contribuições (feitas em português, inglês e francês) provêm de pesquisadores que trabalham sobre diferentes aspectos da religião no mundo greco-romano. Iniciamos com uma investigação sobre trocas e práticas de culto no coração das Cíclades, onde se deu uma das mais importantes descobertas arqueológicas realizadas na Grécia nos últimos dez anos. Yannos Kourayos e Kornilia Daifa, que dirigem as escavações em Despótiko, apresentam em seu texto um panorama deste que é um importante santuário cicládico, só conhecido a partir de evidências arqueológicas. Localizado no centro da região cicládica, o santuário em questão foi erigido pela poderosa ilha de Paros e revelou uma quantidade impressionante de oferendas votivas originárias de múltiplos pontos das Cíclades e também de partes mais afastadas do Mediterrâneo. O segundo trabalho deste volume, escrito por Elena Korka e membros de sua equipe, divulga alguns dos recentes resultados das escavações em Tenea, situada nos arredores da aldeia de Chiliomodi em Corinto, um local cuja cultura material e ciclo de mitos estão ligados à Guerra de Tróia. Depois de sumarizar o trabalho arqueológico realizado até agora, os autores discutem a principal divindade adorada em Tenea, o deus Apolo, e os artefatos encontrados ali, importantes para a interpretação e o entendimento do antigo culto. Vale destacar que alguns dos objetos escavados têm suas imagens publicadas pela primeira vez neste dossiê. O próximo artigo, escrito por Michael Fowler da East Tennessee State University, examina os quatro monumentos tumulares arcaicos tardios da Necrópole Setentrional do povoado grego de Istros. O autor explora as características desses monumentos comparáveis à descrição das cerimônias heroicas de cremação, tal como narradas na poesia épica (particularmente, no caso do funeral de Pátroclo na Ilíada) e discute, ainda, a possibilidade surpreendente de sacrifício humano. Para além dos hábitos religiosos incomuns entre os gregos e das reconsiderações sobre a Pira A em Orthi Petra (Eleutherna, Creta), a discussão de Fowler inclui também em seu estudo um sítio arqueológico situado no Mar Negro, região que segue pouco estudada fora dos círculos acadêmicos russos. Do Mar Negro, nosso dossiê retorna para Corinto, desta vez às margens do golfo. Dora Katsonopoulou, diretora das escavações em Helike, discute o culto de Poseidon Helikonios com ênfase nos antigos altares ancestrais dos jônicos. Ela examina o estabelecimento do culto de Poseidon Helikonios, trazido pelos aqueus para a costa da Ásia Menor, transmitido em seguida para a já mencionada região do Mar Negro. O próximo trabalho, escrito por Lilian Laky da Universidade de São Paulo, explora a interconectividade do Mediterrâneo examinando a iconografia das moedas com imagens de águias e relâmpagos, atributos de Zeus. A autora utiliza como fontes moedas cunhadas por Crótone na Magna Grécia e por Olympia no Peloponeso para discutir a difusão do culto de Zeus Olympios. Contribuindo para o tema da relação entre Olympia Sicília, o artigo, ademais, dá um importante aporte para os estudos sobre a disseminação regional dos epítetos locais, tema pouco abordado que, porém, está lentamente ganhando a atenção necessária.

Os próximos quatro textos de nosso dossiê examinam os contatos e as trocas entre as religiões gregas e romanas pelas lentes da História e da Literatura antiga. Esta seção é aberta com um artigo de Pierre Ellinger, da Université de Paris. O autor analisa os raptos de estátuas divinas de santuários à beira-mar, a partir de mitos gregos, especialmente o de Ártemis Táurida, tal como elaborado pela tragédia euripideana, enfatizando-o. O texto explora a presença do mar nesses registros antigos, dando destaque às rotas mediterrânicas e sua articulação com determinados pontos, à experiência de partida e de chegada e ao contexto em que tais estórias teriam sido narradas. Ao ressaltar a dimensão marítima dessas fontes, o autor põe em questão a nossa familiaridade com o espaço grego, reorientando nossa perspectiva da visão da cidade para a visão do mar ao longo de suas margens. O artigo, portanto, não só lança luz sobre o culto enigmático de Ártemis Táurida, cujo culto continua a confundir e intrigar os estudiosos modernos, como apresenta uma grande contribuição para os estudos emergentes sobre as religiões mediterrânicas.

Em seguida, o texto de autoria de Lucio Maria Valletta da École Pratique des Hautes Études, discute novos cultos da região do Mar Negro. O autor examina uma passagem de Heródoto sobre o povo cita para refletir sobre a existência de elementos culturais que seriam próprios a povos que viveram e se deslocaram nas regiões circundantes da bacia do Mediterrâneo, incluindo o Mar Negro. O dossiê segue com o trabalho de Júlia Avelar, da Universidade Federal de Uberlândia, que aborda cultos romanos e festivais religiosos do início do Império por meio do trabalho do poeta romano Ovídio. Avellar examina as intersecções entre cultos privados e festivais públicos na Roma antiga. A autora demonstra de que forma os cultos religiosos da poesia ovidiana seriam recriações poéticas que, através de elementos religiosos, provocam reflexões sobre as relações de poder na Antiguidade. Voltando às Cíclades e a Paros, o último trabalho deste volume, escrito por Rafael Silva e Teodoro Rennó Assunção da Universidade Federal de Minas Gerais, parte de fragmentos ditirâmbicos atribuídos a Arquíloco (fr. 120 W, fr. 96 Lasserre) para desenvolver considerações sobre a relação entre o culto de Dioniso e a difusão do ditirambo.

Juntos, os artigos apresentados neste volume expõem a riqueza das trocas religiosas no Mediterrâneo, particularmente no mundo greco-romano. Enquanto alguns revelam pesquisas arqueológicas originais sobre regiões sócio-políticas estratégicas, outros apresentam autênticos quadros teóricos, capazes de iluminar a complexidade dos intercâmbios culturais observados pela disseminação tanto da cunhagem oficial quanto dos mitos vernáculos.

Nota

1. Nós gostaríamos de agradecer o convite para organizarmos este dossiê e toda a assistência durante a confecção do número à Renatta Garraffoni (UFPR) e Priscila Vieira (UFPR), agora à frente da editoria da Revista História: Questões & Debates. Somos também enormemente gratas a Yannos Kourayos, que cedeu os direitos de uso da foto de capa, com o recém-restaurado edifício A do santuário de Despótiko. Estendemos nosso agradecimento ainda a Andrew Gipe Lazarou (Diakron Institute) que produziu a capa e fez a revisão do texto em inglês desta introdução. Qualquer erro que persista é, no entanto, de nossa inteira responsabilidade.

Erica Angliker (Institute of Classical Studies, University of London).

Lorena Lopes da Costa (Universidade Federal do Oeste do Pará).


ANGLIKER, Erica; COSTA, Lorena Lopes da. Introdução. História – Questões & Debates. Curitiba, v.69, n.1, jan. / jun., 2021. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Neomedievalismo em Países Sem Medievo: Idade Média na América | Signum – Revista da ABREM | 2021

Nos anos 70 do século XX, o acadêmico e escritor italiano Umberto Eco escreveu uma série de artigos sobre o interesse no que chamamos de idade média, descrevendo o início de um neomedievalismo contemporâneo. Eco associou esse neomedievalismo a uma grande variedade de elementos do mundo atual, desde parques temáticos como a Disneylândia, capazes de simular um mundo neomedieval dos desenhos animados, até um neofeudalismo de arranha-céus que separava novos senhores dos novos servos com acesso apenas aos andares inferiores. O próprio Eco passou aos anais do neomedievalismo quando escreveu um dos mais famosos e conhecidos romances medievais, O Nome da Rosa. A nomenclatura de Eco, ele próprio um acadêmico dedicado à idade média, claramente separava entre o medievalismo, como área de estudo dedicada aos materiais do chamado período histórico medieval, e o neomedievalismo, como uma área de temática pós-medieval a qual abrange uma ampla gama de produções culturais, artísticas e teóricas.

Paralelamente a Eco, no entanto, na mesma década de 70, o pesquisador independente inglês Leslie Workman também fundou dos Estados Unidos um jornal e uma área de estudos que ele chama de “medievalismo”, a qual é baseada, principalmente no século XIX, nas Ilhas Britânicas e no seu grande interesse nos tempos medievais. Com foco no romantismo de língua inglesa e nos elementos como o revival medieval em torneios, nos artesanatos ou no Movimento Oxford, bem como na literatura medieval e em uma vasta arquitetura neogótica, Workman nomeia o campo por intermédio de um termo usado por John Ruskin no século XIX inglês2. Leia Mais

Fascismos (?): análises do integralismo lusitano e da ação integralista brasileira (1914-1937) | Felipe Cazetta

Filosofia e Historia da Biologia 24
Fascismos… | Detalhe de capa |

SCOTT The common wind 24En la amplíssima literatura dedicada al anàlisis del fascismo, no faltan los trabajos comparativos. A título de ejemplo pueden citarse a Linz, Poulantzas, Nolte. Payne, Levy, Felice y se puede recordar que uno de los primeros congresos, después de la revolución de los claveles, que reunieron a los historiadores portugueses en 1986 [2], recibió las contribuciones de sus colegas (Woolf, Payne, Tusell, Paxton, Gentile, Fischer.Galati. Kühnl….) de otros países que precisamente se habían dedicado a esta labor comparativa. Pero, salvo alguna excepción [3] no abundan las investigaciones que contrastan la evolución del ideario fascista entre Europa y América Latina, y aún menos, estrictamente entre Brasil y Portugal. Por lo tanto, esta ausencia que ahora queda cubierta, sería una primera razón para poner de relieve el valor de la obra de Felipe Acevedo Cazetta

Una segunda razón para resaltar este trabajo es que el realizar esta comparación, permite iluminar con mayor intensidad determinados aspectos, que si solo se hiciera un examen nacional no saldrían a la luz. Una tercera razón es la coherencia y el rigor de este libro que es el resultado adaptado de una tesis presentada en el año 2016

El autor de este libro acierta con su título “Fascismos”, por cuanto como más se profundiza en el análisis del fascismo más se descubre que, sobre un fondo comùn, aparece su carácter heteróclito. Así cada vez está más claro que hubo variadas expresiones fascistas influenciadas por las evoluciones económicas, sociales, políticas y culturales de cada estado, que aun dentro de un mismo país, estas expresiones tenían connotaciones diversas y que fueron adaptando su discurso en las diferentes fases que vivieron. Este es el caso del integralismo lusitano y de su correspondiente brasileño. No solo hubo organizaciones diversas sino dentro de ellas, discursos relativamente heterogéneos, que de todos modos alimentaban un tronco común. Descubrir este tronco común y al mismo tiempo ser sensible a las diferencias no es tarea fácil. Esto es lo que hace esta publicación

Esta característica se pone de manifiesto en este libro por cuanto su principal óptica es la de hacer un análisis teórico doctrinario de los fascismos brasileño y portugués y ver cuales son sus principales similitudes y diferencias y sus mutuas influencias. Para concretar este objetivo, el autor recorre a explicar sintéticamente las biografías de los principales líderes, a estudiar detalladamente sus discursos y publicaciones y a rastrear las referencias que se hacían mutuamente, en sus periódicos y revistas, donde destacan Naçao Portuguesa y América Brasileira

Viajes, contactos, noticias, artículos compartidos y alabanzas mutuas prueban que el Integralismo Lusitano y el Nacional Sindicalismo de este país no estaban tan lejos de la Acçao Integralista Brasileira y aun de la Acçao Imperial Patrianovista Brasileira. Durante un cierto tiempo bebían unos de otros y encontraban una común inspiración en Maurras y el corporativismo que la Iglesia católica preconizaba desde la encíclica Rerum Novarum y que la Qudragesimo Anno de Pio XII reafirmó en 1931. También admiraban los avances de Mussolini en Italia. En cambio, no deja de ser sorprendente que casi no se encuentren referencias a los autores y líderes fascistas españoles o al rumano Manoilescu que fue uno de los divulgadores del corporativismo más conocido en Europa en los años treinta. Parece evidente que la lusofonia y un pasado comùn entre Brasil y Portugal debió jugar un positivo y contradictorio papel entre aquellos movimientos

Contradictorio, porque la afirmación nacionalista y su fijación por reconstruir la historia, propias de estas posiciones, les llevaban a ensalzar la época imperial de Portugal y su dominio sobre Brasil. De ahí que como Cazetta ilustra, algunos líderes brasileiros oscilasen entre la lusofilia y la lusofobia. Pudo más la primera y por lo que parece las relaciones fueron estrechas y positivas. Queda por ahora sin responder la pregunta de hasta que punto estas relaciones fueron favorecidas por los emigrantes portugueses en Brasil y por la propaganda que el Estado Novo hacía en este país [4]. De todos modos, ¿que tenían en común los integralismos brasileño y portugués y sus líderes? En primer lugar, según Cazetta, comparten un pasado literario y hasta cierto punto elitista. Hubiera sido interesante profundizar en el primero ya que el modernismo [5] artístico y literario fue predominante en aquella época y hubiera podido dar algunas claves para entender mejor los origenes culturales de aquellos líderes y de sus expresiones fascistas. No deja de ser curioso que algunos de ellos compartan estudios jurìdicos en las facultades de derecho de Coïmbra y de Recife y Sao Paulo y que allí se forme una identidad de grupo. En el caso portuguès no deja de ser sorprendente que autores tan diferentes como Herculano, Garrett y Antero de Quental sean los referentes anteriores del naciente integralismo

En segundo lugar, ambos movimientos comparten su crítica al liberalismo y a los regímenes parlamentarios a los que adjudican todos los males históricos y reaccionan contra el comunismo. Dios. Patria y Familia podría ser el lema que les une en una concepción tradicionalista que tratan de justificar con una visión histórica peculiar que ellos reconstruyen a su manera. Esta visión les lleva hasta la época medieval en la que florecían organicismo y corporativismo, que constituyen sus fundamentos organizativos para la sociedad que se proponen construir. Un estado fuerte, con ansias expansionistas y centralizado políticamente, pero que otorga poderes administrativos a los municipios les parece ser la mejor fórmula de gobierno. Monárquicos convencidos en su origen, algunos aceptan un cierto republicanismo que no caiga en los defectos de las denunciadas constituciones de 1891 en Brasil y del régimen republicano portugués de 1910

La descripción de estas características es una parte muy substantiva de este libro, que a veces se hace repetitiva como cuando se alarga la presentación del ideario Maurrasiano. Era casi inevitable, ya que, a pesar de pequeñas matizaciones ligadas a itinerarios personales, las expresiones doctrinarias de estas dos corrientes fascistas se parecen y no brillan por su originalidad. Quizás, hubiera sido útil dedicar más espacio a explicar su articulación con el contexto cronológico y politico de cada país. Esto hubiera facilitado la tarea de los potenciales lectores de los dos países. Los brasileños no conocen muy bien la evolución política de Portugal de después de la primera guerra mundial y al revés, no muchos portugueses saben las vicisitudes de la vida política brasileña

Igualmente, si se hubiesen caracterizado mejor a las organizaciones (fuerza, afiliados, modos de organización interna, actividades externas, …) se habría podido pasar a otros niveles de interpretación [6]. Pero esto se escapa a los objetivos del trabajo. El cual hace avanzar en el conocimiento de dos movimientos protofacistas en sus inicios y más declaradamente fascistas en sus respectivas maduraciones, en dos países, tan lejanos y cercanos, como Brasil Y Portugal

Igualmente contribuye a comprender mejor sus relaciones y mutuas influencias, Abre así un estimulante campo, relativamente inexplorado, que hay que esperar sea cultivado por otros investigadores. En cualquier caso, permite sugerir que las expresiones fascistas en Brasil, como en el caso de Mejico [7], no fueron meras copias o mimetismos de lo que sucedía en Europa

Tuvieron sus rasgos específicos. En este sentido, con esta publicación, se da un paso adelante con respecto a las consideraciones que formulaba Helgio Trindade [8] hace casi cuarenta años atrás

Por fin, para finalizar esta nota de lectura hay que constatar como lo hace Felipe Cazetta que en los últimos tiempos los movimientos y las posiciones de extrema derecha han aumentado no solo en su presencia en gobiernos y administraciones en todo el mundo sino también en las practicas cotidianas de muchos ciudadanos y compartir con el, su preocupación por este crecimiento. Conocer mejor sus origenes y despliegues ideológicos se convierte así en una manera de empezar a combatirlo. Es lo que hace este libro que ahora se recomienda

Notas

2. AA.VV. (1987) O estado Novo. Das origens ao fim da dictadura. 1926-1959. Lisboa Ed. Fragmentos. II Vol

3. Larsen, S.U. (Ed.) (2001). Fascism outside europe. N.Y. Columbia University Press7

4. Paulo.E. (2000 ) Aquí tambem é Portugal: a colónia portuguesa no Brasil e o Salazarismo. Coimbra, Quarteto

5. Griffin,R. (2003) Modernism anf fascism. The sense of a beguining under Mussolini and Hitler. N.Y. Palgrave Mac-Millan.

6. Para una interpretación comparativa de las politicas sociales de los fascismos en Portugal, Itàlia, España y Alemania ver Estivill. J. (2020) Europa nas trevas. As politicas sociais nos fascismos. Lisboa Universidad Nova de Lisboa

7. Meyer, J. (1977) Le sinarquisme: Un mouvement fasciste Mexicain. Paris. Ed. Hachette

8. Trindade, H.(1982) El tema del fascismo en America Latina, Revista de Estudios Politicos n. 50

Jordi Estivill – Universidade de Barcelona – Espanha. E-mail: [email protected]


CAZETTA, Felipe. Fascismos (?): análises do integralismo lusitano e da ação integralista brasileira (1914-1937). Jundiaí: Paco editorial, 2019. Resenha de: ESTEVILL, Jordi. Caminhos da História. Montes Claros, v.26, n.1, p.241-244, jan./jun. 2021. Acessar publicação original [IF]

Religiões na Grécia e Roma antigas: contatos, encontros e trocas / História – Questões e Debates/ 2021

Yannos Kourayos. Vista aerea do santuario de Despotiko Foto Historia Questoes e Debates

Apresentação [1]

A natureza fragmentária e variada do Mediterrâneo foi estudada por pesquisadores que se dedicaram, de fato, a entender a região. As ideias revolucionárias da obra pioneira de Fernand Braudel, La Méditerranée et le Monde méditerranéen à l’époque de Philippe II (1949), mudaram o foco do espaço mediterrânico, deslocando-o de suas fronteiras continentais para a bacia marítima, bem como reorientaram a pesquisa histórica da região, encaminhando-a da política para a cultura e a economia. É certo que, depois de Braudel, foram necessários muitos anos para que os estudos na escala mediterrânica se tornassem tendência. A nova contribuição significativa foi feita por Peregrine Horden e Nicholas Purcell, com a publicação The Corrupting Sea: A Study of Mediterranean History (2000), que identificou elementos comuns ao longo dos mais de três mil anos de história no Mediterrâneo. Explorando a extrema fragmentação da região em suas paisagens terrestres e marinhas, os autores produziram uma análise inovadora das relações entre suas diferentes microecologias. Horden e Purcell evidenciaram o peso do elemento da incerteza nos microcosmos mediterrânicos, seja quanto ao clima e à quantidade de precipitação, seja quanto à direção e a intensidade do vento, e ainda quanto à possibilidade de catástrofes vulcânicas e sísmicas. Por outro lado, se o Mediterrâneo passa então a ser pensado enquanto uma área de incerteza, entende-se que ele se constituiu também como região de grande mobilidade, dados seu elevado número de ilhas e a extensão de sua área costeira, a maior do planeta. Com efeito, o fato de seus navegadores raramente perderem de vista a terra e do sol brilhar durante todo o ano fez do Mediterrâneo um espaço de oportunidades, o que encorajou os homens a diversificarem, produzirem e explorarem.

Esse poder que o Mediterrâneo tem de conectar mundos é explorado num outro livro monumental do século XXI, The Making of the Middle Sea (2014). Seu autor, Cyprian Broodbank, utiliza uma vasta quantidade de dados arqueológicos para desvelar a história da região, de um milhão e oitocentos mil anos atrás até o Período Clássico, demonstrando como o mundo mediterrânico, facilmente navegável e ecologicamente fragmentado, evoluiu para uma oecumene através da agência dos habitantes de suas ilhas e costas.

A natureza fragmentária da região mediterrânica é, com efeito, uma de suas características mais distintivas. Ela atua como estímulo histórico para a formação de redes de transporte complexas, responsáveis por ligarem lugares de tamanhos e importância desiguais, da família aos estados imperiais, e por envolverem todo tipo de atores, do comerciante ao monarca (MALKIN; CONSTANTAKOPOULOU; PANAGOPOULOU, 2011). O Mediterrâneo, por isso, permitiu o movimento de multidões em torno da sua vasta área, não só devido à proximidade dos seus locais costeiros e suas ilhas, mas também devido às condições climáticas (ou seja, um verão semi-árido e um inverno úmido) amplamente favoráveis à disseminação de produtos e técnicas (agricultura, perfumaria, cerâmica, navegação) (BROODBANK, 2014). A extensa circulação de pessoas e bens no Mediterrâneo reflete-se também na natureza das práticas religiosas da região. Objetos provenientes de todo o mundo antigo eram apresentados como ofertas em túmulos e santuários pela região mediterrânica. As práticas religiosas, por sua vez, eram transmitidas durante diferentes ciclos de convulsões sociais e migrações, o que envolvia o contato tanto de habitantes de áreas próximas entre si quanto daquelas situadas a grandes distâncias, cuja comunicação se dava por meio da rede de rotas.

Este dossiê apresenta então estudos de caso que enfatizam a diversidade cultural e os intercâmbios religiosos no mundo greco-romano, centrando-se nas relações entre fragmentos da região mediterrânica (MALKIN, 2011). Com nove artigos em múltiplas áreas temáticas, os primeiros cinco se desenvolvem no campo da Arqueologia Clássica, e os quatro seguintes em História e Literatura. As contribuições (feitas em português, inglês e francês) provêm de pesquisadores que trabalham sobre diferentes aspectos da religião no mundo greco-romano. Iniciamos com uma investigação sobre trocas e práticas de culto no coração das Cíclades, onde se deu uma das mais importantes descobertas arqueológicas realizadas na Grécia nos últimos dez anos. Yannos Kourayos e Kornilia Daifa, que dirigem as escavações em Despótiko, apresentam em seu texto um panorama deste que é um importante santuário cicládico, só conhecido a partir de evidências arqueológicas. Localizado no centro da região cicládica, o santuário em questão foi erigido pela poderosa ilha de Paros e revelou uma quantidade impressionante de oferendas votivas originárias de múltiplos pontos das Cíclades e também de partes mais afastadas do Mediterrâneo. O segundo trabalho deste volume, escrito por Elena Korka e membros de sua equipe, divulga alguns dos recentes resultados das escavações em Tenea, situada nos arredores da aldeia de Chiliomodi em Corinto, um local cuja cultura material e ciclo de mitos estão ligados à Guerra de Tróia. Depois de sumarizar o trabalho arqueológico realizado até agora, os autores discutem a principal divindade adorada em Tenea, o deus Apolo, e os artefatos encontrados ali, importantes para a interpretação e o entendimento do antigo culto. Vale destacar que alguns dos objetos escavados têm suas imagens publicadas pela primeira vez neste dossiê. O próximo artigo, escrito por Michael Fowler da East Tennessee State University, examina os quatro monumentos tumulares arcaicos tardios da Necrópole Setentrional do povoado grego de Istros. O autor explora as características desses monumentos comparáveis à descrição das cerimônias heroicas de cremação, tal como narradas na poesia épica (particularmente, no caso do funeral de Pátroclo na Ilíada) e discute, ainda, a possibilidade surpreendente de sacrifício humano. Para além dos hábitos religiosos incomuns entre os gregos e das reconsiderações sobre a Pira A em Orthi Petra (Eleutherna, Creta), a discussão de Fowler inclui também em seu estudo um sítio arqueológico situado no Mar Negro, região que segue pouco estudada fora dos círculos acadêmicos russos. Do Mar Negro, nosso dossiê retorna para Corinto, desta vez às margens do golfo. Dora Katsonopoulou, diretora das escavações em Helike, discute o culto de Poseidon Helikonios com ênfase nos antigos altares ancestrais dos jônicos. Ela examina o estabelecimento do culto de Poseidon Helikonios, trazido pelos aqueus para a costa da Ásia Menor, transmitido em seguida para a já mencionada região do Mar Negro. O próximo trabalho, escrito por Lilian Laky da Universidade de São Paulo, explora a interconectividade do Mediterrâneo examinando a iconografia das moedas com imagens de águias e relâmpagos, atributos de Zeus. A autora utiliza como fontes moedas cunhadas por Crótone na Magna Grécia e por Olympia no Peloponeso para discutir a difusão do culto de Zeus Olympios. Contribuindo para o tema da relação entre Olympia Sicília, o artigo, ademais, dá um importante aporte para os estudos sobre a disseminação regional dos epítetos locais, tema pouco abordado que, porém, está lentamente ganhando a atenção necessária.

Os próximos quatro textos de nosso dossiê examinam os contatos e as trocas entre as religiões gregas e romanas pelas lentes da História e da Literatura antiga. Esta seção é aberta com um artigo de Pierre Ellinger, da Université de Paris. O autor analisa os raptos de estátuas divinas de santuários à beira-mar, a partir de mitos gregos, especialmente o de Ártemis Táurida, tal como elaborado pela tragédia euripideana, enfatizando-o. O texto explora a presença do mar nesses registros antigos, dando destaque às rotas mediterrânicas e sua articulação com determinados pontos, à experiência de partida e de chegada e ao contexto em que tais estórias teriam sido narradas. Ao ressaltar a dimensão marítima dessas fontes, o autor põe em questão a nossa familiaridade com o espaço grego, reorientando nossa perspectiva da visão da cidade para a visão do mar ao longo de suas margens. O artigo, portanto, não só lança luz sobre o culto enigmático de Ártemis Táurida, cujo culto continua a confundir e intrigar os estudiosos modernos, como apresenta uma grande contribuição para os estudos emergentes sobre as religiões mediterrânicas.

Em seguida, o texto de autoria de Lucio Maria Valletta da École Pratique des Hautes Études, discute novos cultos da região do Mar Negro. O autor examina uma passagem de Heródoto sobre o povo cita para refletir sobre a existência de elementos culturais que seriam próprios a povos que viveram e se deslocaram nas regiões circundantes da bacia do Mediterrâneo, incluindo o Mar Negro. O dossiê segue com o trabalho de Júlia Avelar, da Universidade Federal de Uberlândia, que aborda cultos romanos e festivais religiosos do início do Império por meio do trabalho do poeta romano Ovídio. Avellar examina as intersecções entre cultos privados e festivais públicos na Roma antiga. A autora demonstra de que forma os cultos religiosos da poesia ovidiana seriam recriações poéticas que, através de elementos religiosos, provocam reflexões sobre as relações de poder na Antiguidade. Voltando às Cíclades e a Paros, o último trabalho deste volume, escrito por Rafael Silva e Teodoro Rennó Assunção da Universidade Federal de Minas Gerais, parte de fragmentos ditirâmbicos atribuídos a Arquíloco (fr. 120 W, fr. 96 Lasserre) para desenvolver considerações sobre a relação entre o culto de Dioniso e a difusão do ditirambo.

Juntos, os artigos apresentados neste volume expõem a riqueza das trocas religiosas no Mediterrâneo, particularmente no mundo greco-romano. Enquanto alguns revelam pesquisas arqueológicas originais sobre regiões sócio-políticas estratégicas, outros apresentam autênticos quadros teóricos, capazes de iluminar a complexidade dos intercâmbios culturais observados pela disseminação tanto da cunhagem oficial quanto dos mitos vernáculos.

Nota

1. Nós gostaríamos de agradecer o convite para organizarmos este dossiê e toda a assistência durante a confecção do número à Renatta Garraffoni (UFPR) e Priscila Vieira (UFPR), agora à frente da editoria da Revista História: Questões & Debates. Somos também enormemente gratas a Yannos Kourayos, que cedeu os direitos de uso da foto de capa, com o recém-restaurado edifício A do santuário de Despótiko. Estendemos nosso agradecimento ainda a Andrew Gipe Lazarou (Diakron Institute) que produziu a capa e fez a revisão do texto em inglês desta introdução. Qualquer erro que persista é, no entanto, de nossa inteira responsabilidade.

Erica Angliker (Institute of Classical Studies, University of London).

Lorena Lopes da Costa (Universidade Federal do Oeste do Pará).

Imagem: Yannos Kourayos. Vista aérea do santuário de Despótiko / Foto: História – Questões e Debates /

 


ANGLIKER, Erica; COSTA, Lorena Lopes da. Introdução. História: Questões e Debates, Curitiba- PR, v.69, n.1, jan/jun, 2021. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

 

 

 

Las izquierdas latino-americanas y europeas: Ideários/práxis y sus circulaciones transregionales en la larga década del sessenta | Peter Biler, Enrique Fernández Darraz, Clara Ruvituso

Nos últimos tempos, há um movimento de análise crítica dentro das Ciências Sociais sobre a narrativa eurocêntrica de que eventos e marcos históricos ocorridos no mundo foram consequências diretas e única daqueles ocorridos na Europa, como uma via de mão única. É nesse movimento atual que podemos inserir a obra “Las izquierdas latino-americanas y europeas: Ideários, práxis y sus circulaciones transregionales en la larga década del sesenta” (2021), organizado por Peter Biler, Enrique Fernández Darraz e Clara Ruvituso. Este deriva do encontro “Contribuciones del Sur a la Transformación del Norte: América Latina y el movimiento del 68 en perspectiva global”, de maio de 2018, na Fundação Friedrich Ebert, em Berlim, em que debateu-se sobre o exílio e “presença latinoamericana nas esquerdas europeias e, em particular, no caso das Alemanhas” (BILER, DARRAZ, RUVITUSO, 2021, p. 9. Tradução nossa). Ao longo de doze artigos, divididos em duas seções, a proposta dos autores é explorar e trazer à luz não apenas um fluxo inverso de influência, como também um intercâmbio intenso de ideias, como já anuncia o título. Dessa maneira, objetiva-se “pensar a contribuição da América Latina na transformação política, social e cultural do sul e do norte global, e seus olhares sobre o Terceiro Mundo” (p. 11. Tradução nossa), pontuando que a região também foi um agente de influência política e epistemológica para a Europa, especialmente para a esquerda. Para localizar temporalmente essa “descoberta” da América Latina, o livro trabalha a partir da década de 1960, época em que o mundo viveu efervescências políticas e culturais, com Maio de 68 sendo considerado como “gatilho” para muitas mudanças da geração, tanto comportamentais quanto políticas. No entanto, em que lugar os eventos históricos latino-americanos, como a Revolução Cubana e a eleição de Salvador Allende e o golpe sofrido por ele, se colocam? E as teorias pensadas desde essa região? Na esteira da localização da América Latina no centro da política por ser, como Hobsbawm afirmava e Carolina Galindo (2021) traz em seu artigo, um “laboratório de mudança histórica”, a Alemanha teve como política o “desenvolvimento dos saberes sobre a América Latina como região e como objeto de estudo e de prospecções políticas” (BILER, DARRAZ, RUVITUSO, 2021, p. 9. Tradução nossa), tentando superar a assimetria ou a realidade distante entre as localidades, dando agência a vozes da periferia global, que carregavam experiências da região. Logo, houve um intercâmbio de ideias e teorizações sobre o mundo, tal como apontado pelos autores, com abertura e presença nos espaços acadêmicos das então Alemanhas Ocidental e Oriental, na literatura e nas editoras desses países. Ao conhecer uma América Latina sem a lente eurocêntrica, os movimentos da esquerda alemães puderam absorver ações e visões de mundo desta região periférica. Na primeira seção intitulada como “Literatura y Política Intelectuales de izquierda entre revolución y represión”, os autores Matías Fuente, Jasper Vervaeke, Isabel Grillet e Cristian Cipó refletem sobre a cultura e sua posição mediante as novidades políticas, teóricas e sentimentais trazidas a partir da Revolução Cubana de 1959 e de eventos marcantes para e promovida pela esquerda latino-americana, assim como suas repercussões. Com Fuentes em “Encuentros caribeños de la izquierda: el Congreso Cultural de la Habana y la movilidad intelectual en los años sesenta”, a proposta é refletir sobre as mudanças no campo cultural de acordo com o momento e como a comunidade transnacional foi afetada pela política e debates ideológicos. Estabelece como marco Congresso Cultural de Havana (CCH), realizado em 1968, pois considera esse como um ponto de convergência que permite avaliar a “circulações políticas-intelectuais” (p. 19. Tradução nossa), potencializado pela oportunidade de se reunirem em lugar que inspirou não somente um novo momento da América Latina, como também a concretização de uma sociedade socialista, além de considerar a importância do campo editorial para o intercâmbio de ideais, especialmente a Casa de las Américas e Pensamiento Crítico com os demais círculos da esquerda. Da mesma maneira, os círculos eram visíveis na literatura. Vervaeke em “Entre compromiso, crítica y cautela: Kundera, Fuentes, García Marquez y Cortázar en 1968” apresenta como a literatura é um ponto que permite a observação de como a rede intelectual entre latino-americanos e europeus, motivada por acontecimentos latino-americanos, refletia em páginas e contos para a Europa, da mesma forma que Maio de 1968 atingiu a intelectualidade latino-americana. Para isso, traz o encontro promovido pela União de Escritores Tchecos entre Carlos Fuentes, Gabriel García Márquez e Julio Cortazar com o tcheco Milan Kundera, em uma Tchecoslováquia recém invadida pela URSS, e como reagiram aos acontecimentos de 1968. Nessa época, a literatura latino-americana estava em alta, observada pelo cenário internacional, alinhada não somente aos belos escritos, como também pelos acontecimentos políticos a partir da Revolução Cubana, que permitiram uma curiosidade sobre nossa região. Já com Grillet, em “Engrenajes de la cultura protestataria: la izquierda cultural venezoelana a la luz del proyecto interamericano de Nueva Solidariedad y em diálogo com la generación beat”, há uma restituição da história intelectual que conecta as Américas, analisando editoriais e revistas enquanto “espaços de sociabilidade na medida que são redes que definem ou permitem resgatar os fluxos do saber […] através de cartas e poemas” (p. 52. Tradução nossa.). Houve atores (contra)culturais venezuelanos na década de 60, que exprimiam raízes da contracultura latino-americana, e não importadas dos beats dos EUA. Para isso, apresenta o Primer Encuentro de Poetas e a Nueva Solidariedad que permitiram a construção de uma solidariedade interamericana que aparece nessas redes de revistas, demonstrando que também tivemos “maios” traduzidos na representação do Homem Novo pelos poetas, como chance deles mudarem o âmbito social e se emanciparem por meio das ideias, permitindo influenciar também os movimentos da contracultura do Norte. Ao final dessa seção, Capó apresenta em “La narrativa chilena en tiempos de la Unidad Popular: literatura y sociedad” como a literatura chilena explorava eventos entre 1960 e 1970, influenciada pelas mudanças sob o governo de Salvador Allende, além de eventos externos como a Revolução Cubana e Maio de 68. Intelectuais e artistas chilenos entendiam que era necessário apoiar o governo de Allende, o que permitiu aos escritores entenderem a importância do momento de “assimilar, iluminar e interpretar os acontecimentos históricos que operam como referente ficcional” (p. 72. Tradução nossa), tendo duas linhas narrativas: a de valorização da juventude e o que acontecia na política nacional. O autor traz livros importantes que tem como temática a juventude, mesmo com focos de abordagem distintos. Nessas obras, a juventude não é mais romantizada; ela está inserida nas questões políticas e nas mudanças comportamentais da época; nas incertezas pessoais e nas nacionais. Na segunda seção, “América Latina y los tercermundismos alemanes: mitos, proteciones y circulación transregional de idearios políticos y pensamiento crítico”, expõe, ao longo de oito artigos, como as ideias e a personificação do guerrilheiro, a imagem de homens como Che Guevara, Fidel Castro e Camilo Torres Restrepo assumiu uma imediata identificação do homem revolucionário, atravessando as fronteiras dos países latinoamericanos, chegando aos países europeus, especialmente a Alemanha, além da circulação de teorias autóctones e a tentativa de conter o marxismo através de programas educacionais. Carolina Galindo (“El guerrillero como el nuevo sujeto histórico latinoamericano: la experiencia colombiana en los años sesenta”), Dorothee Weitbrecht (“Exploración de un mito. Las estadías de alemanes occidentales del movimiento del 68 en América Latina y el nacimiento de una red transnacional”) e Monika Wehrheim (El debate sobre la lucha armada: la trayectoria de los Tupamaros hacia Alemania”) trabalham em seus respectivos artigos com a imagem e construção do guerrilheiro e da guerrilha, autóctones da América Latina. Galindo parte da análise da figura mítica do guerrilheiro latino-americano e, consequentemente do “homem novo” de Che Guevara e Régis Debray, dentro de suas particularidades, sem deixar de lado as discussões iniciais da Teoria del Partisiano (1962) de Carl Schmitt, para assim compreender e destrinchar como essa figura influenciou o colombiano Ejército de Liberación Nacional (ELN) em seu ideal. Com seu expoente, padre Camilo Torres Restrepo, “el cura Restrepo”, e outros religiosos que se juntaram ao ELN, a vida e participação na luta armada corroboraram para a imagem do guerrilheiro latino-americano remetidos a Che e Fidel. Já Weitbrecht expõe as relações transnacionais entre Europa e Terceiro Mundo, desde intercâmbios de estudantes e trabalhadores latino-americanos para disseminar o anticomunismo através de programas de mobilidade, aeuropeus que buscavam compreender a periferia, especialmente a América Latina, após o “Novo Internacionalismo” e abertura cultural. Essas viagens de jovens europeus para a América Latina tinham o receio das Instituições alemães, buscando um maior controle sobre esses estudantes, para evitar uma “contaminação” comunista. Mas também refletem o romantismo da época, em que não apenas o mundo deveria ser um lugar melhor, como também uma imagem irreal da América Latina carregada na dualidade na nobreza heroica e na inocência do homem rural e do indígena que não teriam sido alienados pelo capitalismo. Suas estadias permitiram uma solidariedade para agendas periféricas e novas epistemologias sobre pesquisas relacionadas à América Latina, ainda considerando que a guerrilha era um meio justificável diante da violência estatal. Com Wehrheim há análise da “translação do conceito de guerrilha urbana desde a América Latina à República Federal Alemã” e “como e por que os Tupamaros adquiriram neste novo contexto tanta importância” (p. 119. Tradução nossa) para a militância na República Federal da Alemanha se inspirar na guerrilha urbana na América Latina. Para isso, a autora perpassa a história dos Tupamaros, guerrilha urbana criada em 1960 no Uruguai, que se diferenciava das propostas e Che e se concentrava em “roubos, assaltos e libertação de companheiros presos” (p. 120. Tradução nossa.), doando o dinheiro roubado, mas sem considerar uma teoria por detrás das ações. A identificação foi facilitada porque os Tupamaros pertenciam à cidade, não às matas fechadas como as que Che Guevara lutou, mas a legitimidade da luta armada nunca foi questionada e sim em qual momento usá-la. Dois artigos trabalham com editoras, dessa vez europeias, para analisar como as ideias e teorias latino-americanas eram recebidas e publicadas. Felipe Lacerda em “Os três encontros da América Latina com o catálogo da Trikont Editorial”, inicia pontuando que Maio de 68 é reconhecido, mas o que levou a ele ainda não recebeu tanta atenção, como agendas caras à periferia exemplificadas pelas lutas descoloniais. Assim, intrigam o autor os “aspectos das mediações culturais que se estabeleceram na recepção das ideias e construção de um imaginário da América Latina pela Nova Esquerda europeia” (p. 139). Para compreender, analisa o caso da editora Trikont Verlag, apresentando os três encontros que esta teve com a América Latina, desde o fim da década de 1960, com publicação de obras escritas pelos líderes das revoluções do Terceiro Mundo até 1975 a 1979, em que voltou-se para os ensinamentos dos povos originários. Nota-se, portanto, que o catálogo de Trikont é um exemplo de como eventos do Terceiro Mundo foram recepcionados na Europa, corroborando que Maio de 1968 foi também um receptor de “um período de transição para todo o sistema de pensamento crítico e ação revolucionária” (p. 154. Tradução nossa). Já o artigo de Clara Ruvituso, “El “outro” boom: la traducción de teoría social latinoamericana en Suhrkamp”, o intercâmbio e circulação intelectual se fazem presentes ao “analisar a mediações que influenciaram na tradução de autores latino-americanos” (p. 161) na coleção da Suhrkamp, entre 1963 a 1980, que permitiu a entrada de textos que traziam a Teoria da Dependência e a Teologia da Libertação. A autora parte da circulação de idiomas da Semi-Periferia para o Centro, em outras palavras da circulação de ideias escritas e pensadas em português e espanhol para o alemão, dando agência à teoria periférica, exponenciando a importância das percepções latino-americanas sobre os princípios e demandas marxistas, que romperam epistemologicamente com a ideia acerca da mesma. Ao trazer uma imagem distinta da anterior acerca da América Latina, pôde-se “repensar toda a história colonial e pós-colonial” (p. 160. Tradução nossa), ao mesmo tempo em que um maior interesse e estudos financiados sobre a região e comparações com as demais partes da periferia aconteciam na Europa e na América do Norte. O trabalho nas universidades também é exposto com os artigos de Klaus Meschkat (“De cómo la Fundación Ford trajo a estudiantes latinoamericanos a Berlin Occidental”) e Jorge Locane (“Adalbert Dessau, la invención estratégica de un continente). Enquanto o primeiro expõe uma tentativa — fracassada, diga-se — de gerar academicamente um sentimento anticomunista em estudantes latino-americanos que foram para Universidade Livre de Berlim (Freie Universität) através do programa de bolsas financiado secretamente pela Fundação Ford; o segundo trabalha com a superação de um ensino com olhar eurocentrista e distópico por Adalbert Dessau, através da criação da Lateinamerika-Institut de Rostock, em 1965, e de sua gerência na Cátedra de Filosofia e Literatura Latino-Americana. Se, conforme exposto por Meschkat, a exigência do domínio da língua alemã permitiram o encontro e identificação com Marx e a Escola de Frankfurt, Locane retrata como a falta de conhecimento ou de iniciativa de conhecer a produção literária da América Latina foi rompida por Dessau, que ao voltar seus estudos para a região inventou uma estratégia para compreender o momento que o mundo vivia, dentro de um imaginário político de libertação, partindo dos acontecimentos marcantes como Revolução Cubana, movimento de maior de 1968 e a queda de Salvador Allende. Ou seja, o desafio da ordem de 1960 permitiu a “expansão do horizonte de pensamento e uma ruptura tanto crítica como estratégica na tradição romanística alemã” (p. 182). Finalizando, Schulz em “La recepción Alemana de la teología de la liberación”, apresenta através do documento produzido pelo Sínodo de Bispos Latino-americanos em Medellín, em 1968, marco temporal do surgimento da Teologia da Libertação. Busca demonstrar que apesar de parecer condizente apenas com essa região, na Europa e especialmente na Alemanha sua percepção foi importante para o Evangelho e suas interpretações para todas as vertentes cristãs, especialmente de religiosos alemães. Pois, com a Teologia da Libertação, o Reino de Deus deixou de ser encarado apenas pertencente ao plano espiritual, mas também como terreno, considerando as dimensões “corporal, temporal, econômica e sociopolítica” (p. 196. Tradução nossa) e voltando-se aos pobres. Os crentes então não apenas deveriam praticar o perdão, como também buscar um mundo mais justo, livre de escravidões. Ao levar a Teologia para a Europa, permite-se a pensar não somente nas questões da periferia e de suas mazelas, como também dos problemas que o neoliberalismo e as barreiras que imigrantes enfrentam em países europeus, procurando superar o Eurocentrismo teológico existente ao dar agência ao marginalizado. Logo, a Teologia da Libertação não acabou quando a ordem mundial se alterou na década de 1990; como o autor nos propôs a refletir, ela está viva em um mundo desigual. Logo, cada artigo que compõe esta obra, apresenta a importância e originalidade da percepção das décadas de 1960 a 1970, em que a América Latina esteve “no centro do debate mundial do século XX”, sendo referência aos “movimentos políticos e expressões culturais no norte global” (p. 9. Tradução nossa). É curioso que os organizadores e alguns autores também vivenciam esse fluxo de ideias, por terem parte de suas carreiras em universidades alemãs e temáticas latino-americanas e seus relacionamentos com a Europa, demonstrando que permanece vivo o debate. Ao longo dos artigos, dois eventos estão como pano de fundo: a Revolução Cubana, de 1959, e Maio de 1968, ocorrido em Paris, França. Podemos, assim, compreender como e quais meios as ideias e ideais latino-americanos ultrapassaram as fronteiras e influenciaram não apenas a esquerda europeia, como também a resposta a isso; o que prova que os eventos ocorridos aqui também assumem o papel influenciador e não apenas um receptor de comportamentos e ideias. Intelectuais puderam realizar redes que permitiram um “descobrimento” da América Latina, não apenas dentro das universidades, como também no dia-a-dia entre livros e editoriais. Uma descoberta que não só foi feita pelos europeus, como também dentro dessa periferia global. Leia Mais

Saberes jurídicos y experiencias políticas en la Europa de entreguerras: la transformación del Estado en la era de la socialización | Sebastián Martín, Federico Fernández-Crehuet e Alfons Aragoneses

O texto organizado por Sebastián Martín, Federico Fernández-Crehuet e Alfons Aragoneses, a partir do Grupo de Investigação “Edouard Lambert” de História Jurídica Comparada, publicado pela Athenaica (Sevilha) no ano de 2021, apresenta um preciso recorte espacial e temporal, quais sejam, a Europa dos anos 1920-1930 (com as devidas elasticidades próprias à historiografia). O objeto que está no centro do apurado debate é o movimento jurídico-político desse espaço-tempo, mediante análise dos aspectos sobre democracia, totalitarismo, teoria do Estado, teoria do Direito, constitucionalismo, direito público, direito privado, cultura jurídica (ciência do direito), e algo em filosofia do Direito2.

Pietro Costa abre o livro com um “capítulo preliminar”, à guisa de prefácio, intitulado Democracia e totalitarismo na Europa de entreguerras: uma introdução. O texto funciona como epígrafe a tudo o que virá, como inspiração ao conjunto ordenado de capítulos posteriores, trazendo o Zeitgeist do objeto da obra toda. E o “espírito do tempo” pode ser sumulado, de acordo com o autor, numa única palavra: guerra. Eis a atmosfera do tempo, do espaço e do livro que aqui estamos a observar. Leia Mais

Key Thinkers of the Radical Right | Mark Sedgwick

SEDGWICK M
SEDWICK Mark. Foto: Rascunho.com /

SEDGWICK M Key thinkers of the radical rightQuando pensamos em uma direita radical, podemos imaginar skinheads e neonazistas usando suásticas. Existem, porém, intelectuais da direita radical que ocupam um espaço cada vez mais relevante e, embora alguns tenham explicitamente apoiado nazistas e fascistas, outros, de fato ou retoricamente, se afastam dos estereótipos mencionados. O livro organizado por Mark Sedgwick, historiador especializado no estudo do tradicionalismo, islamismo, misticismo sufi e terrorismo, busca expor, de forma sintética, os pontos centrais do pensamento de 16 intelectuais ligados à direita radical.

Cada capítulo é escrito por um autor diferente e dedicado a um dos intelectuais, passando por autores clássicos, da chamada Nouvelle Droite, identitários, libertarianos (ou libertários), neoconservadores, paleoconservadores, contrajihadistas, neorreacionários e a denominada alt right.

É importante ressaltar que a obra não é uma apologia dos pensamentos desses formadores de opinião da direita radical, mas uma relevante ferramenta para compreender os argumentos, posicionamentos e táticas desse campo ideológico bastante plural, uma vez que é possível verificar no decorrer do livro uma variação muito grande de pensamento e uma forte discordância entre os autores, o que serve para demonstrar as nuances existentes dentro da direita radical, a qual poderia ser considerada, erroneamente, como monolítica.

O livro é dividido em três partes: Classic Thinkers, Modern Thinkers e Emergent Thinkers. O primeiro capítulo aborda quatro pensadores clássicos: Oswald Spengler, Ernst Jünger, Carl Schmitt e Julius Evola. Todos, exceto Spengler, produziram durante o período em que o nazismo alemão e o fascismo italiano estavam no poder, mas apenas Schmitt foi um membro ativo do partido nazista, enquanto Evola teve aproximações com nazistas e fascistas.

A obra mais conhecida de Spengler [2] é “O declínio do Ocidente” cujo primeiro volume foi publicado logo após o final da Primeira Guerra Mundial. A filosofia histórica de Spengler era baseada em dois pontos: a existência de entidades sociais chamadas de “culturas” como os maiores atores da história, sendo que esta não possuiria objetivo ou sentido metafísico. O segundo ponto é que a evolução dessas culturas corresponderia aos estágios de um ser vivo, tendo uma infância, juventude, idade viril e velhice. A cultura ocidental teria adentrado seu último estágio com a ascensão de Napoleão e as ideias calcadas na tecnologia, expansão, imperialismo e sociedade de massas. Seu declínio se daria a partir do ano 2000. Esse pensamento é responsável por duas ideias importantes da direita radical: a visão apocalíptica de um declínio e o foco em culturas e civilizações em detrimento de nações ou Estados.

Jünger [3], por sua vez, possui como obra de destaque In Stahlgewittern (Tempestades de aço), uma memória de sua participação na Primeira Guerra Mundial e que apresentava um olhar sobre sua atuação na guerra, apresentada como heroica e masculina. Na sua visão, a guerra trazia os homens de volta a um estado natural, revelando os ritmos primordiais violentos da vida que ficavam abaixo do verniz da civilização. As suas ideias de virilidade e luta, bem como uma construção posterior de que a única forma de se proteger de demagogos e tiranos que manipulavam a tecnologia para atingir as massas seria se afastar para um “eu autônomo”, ou, como Jünger coloca, um Anarco, repercutem até hoje nos meios da direita radical.

O jurista alemão Carl Schmitt [4] talvez seja o mais conhecido fora dos círculos de direita, uma vez que foi considerado o jurista principal do nacional-socialismo. Sua maior contribuição para a direita radical é sua distinção entre amigo e inimigo, nós e eles, um pensamento binário ainda facilmente encontrado na retórica extremista. Schmitt também opôs dois conceitos, o “Estado de Normalidade” e o “Estado de Exceção” para argumentar que, em certos casos, seria necessário um governo ditatorial para representar uma comunidade política através de decretos, não da lei, como forma de estabilizar as relações legais. Obviamente esses argumentos possuíam um potencial antidemocrático e foram utilizados pelos nazistas.

O italiano Julius Evola [5] tem forte ligação com o tradicionalismo no sentido dado pelo francês René Guénon [6], apesar de possuírem pontos de discordância. Seu estudo do tradicionalismo é mais bem refletido em sua obra “Revolta contra o mundo moderno”. A tradição integral derivaria de um perenialismo no qual todas as visões metafísicas de mundo e as mais importantes religiões seriam teriam uma origem divina, imutável e inquestionável. O mundo moderno, caracterizado pela civilização ocidental, tecnologia e baseado no materialis materialismo, seria “vindo de baixo”, o exato contrário da tradição. O tradicionalismo poderia ser visto em suas últimas luzes no catolicismo medieval, entrando em declínio durante a Renascença e, especialmente, após a Revolução Francesa. O mundo estaria, portanto, em declínio, e uma recuperação só seria possível após o colapso do mundo moderno, ou seja, seria necessário “cavalgar o tigre” (Cavalcare la tigre, título de sua obra pós-guerra) até que ele desabe.

A segunda parte do livro, destinada aos pensadores modernos, inicia com dois autores franceses ligados à Nova Direita (Nouvelle Droite), Alain de Benoist e Guillaume Faye. De Benoist [7], autodeclarado pagão, assim como Evola, publicou 106 livros e mais de 2 mil artigos. Após a independência da Argélia, de Benoist decidiu deixar de lado o ativismo nas ruas, visto como inútil, e focar na metapolítica, retirando do comunista Antonio Gramsci a ideia de que a hegemonia ideológica é a condição da vitória política. Assim, se alguém quer que suas ideias modelem a sociedade, é necessário trabalhar no plano das ideias antes.

As bases principais nas obras escritas por de Benoist podem ser sumarizadas em três pontos: primeiramente, a crítica à primazia dos direitos individuais, que seriam uma consequência do humanismo do século XVIII e resumidos nas Revoluções Americana e Francesa. A segundo base é que o perigo central que o mundo estaria enfrentando poderia ser visto na hegemonia do capital e na busca de interesses próprios. Sua crítica ao capital não deve ser tomada em um sentido marxista, mas dentro da tradição anticapitalista nacionalista, uma vez que o risco do consumismo e do livre mercado seria o apagamento das identidades dos povos. Por fim, o terceiro ponto é sua oposição ao Estado-nação, favorecendo a ideia de uma Europa federalizada com o reconhecimento de comunidades baseadas na etnia, linguagem, religião ou gênero.

Faye [8], por sua vez, contribuiu para a direita radical com o que chamou de “arqueofuturismo”, a aceitação dos avanços científicos e tecnológicos combinada com uma sociedade que permaneceria tradicional. Após considerar os regimes árabes como aliados naturais da França e criticar o papel dos EUA, Faye se transformou em um defensor do nativismo, discursando contra a imigração e os muçulmanos e em defesa dos interesses étnicos europeus. Os imigrantes estariam colonizando a Europa através de altos índices de natalidade, impondo uma substituição étnica. Seguindo uma ideia pseudodarwinista, a luta pela sobrevivência se daria no plano das civilizações.

Os três autores seguintes explorados no livro são norte-americanos: Gottfried, Buchanan e Taylor. Os dois primeiros são conhecidos paleoconservadores, sendo que Gottfried [9] se destaca pela sua desconfiança em relação às elites globais que, segundo ele, suportariam um “Estado gerencial” contrário às bases tradicionais da sociedade, aproximando-se, portanto, do tradicionalismo.

Buchanan [10] assemelha-se a Gottfried na visão de que a sociedade norte-americana é baseada na sua história e na herança europeia branca, não em princípios universais abstratos. É possível verificar uma visão apocalíptica em seu pensamento, especialmente em sua obra principal, The Death of the West, segundo a qual os EUA e os países europeus estariam na linha de frente de um ataque. Os europeus (brancos) estariam enfrentando uma ameaça comparável à peste negra, uma vez que as taxas de natalidade teriam caído drasticamente. Um dos culpados por essa decadência seria o feminismo, que, somado a outras formas de ataques culturais à tradição ocidental, poderia ser ligado a pessoas com objetivos marxistas ou à Escola de Frankfurt, a qual Buchanan considera um suspeito principal. Sua combinação de um comunitarismo europeu branco, hostilidade às elites globais que não dariam importância às raízes locais e preocupação com a imigração mexicana nos EUA teve impacto nas eleições norte-americanas de 2016.

Jared Taylor [11], de seu lado, possui um foco quase exclusivo na questão racial. Apesar de acreditar em fatores culturais e históricos, Taylor enfatiza o papel da genética e das raças nos tipos de sociedades existentes. Uma das intenções de Taylor é fazer com que as pessoas brancas possam se expressar em relação a si mesmas e à questão racial sem ser demonizadas em relação a isso. Vendo como imprescindível para a nação uma homogeneidade cultural, racial e linguística, argumenta que a maior preocupação nos EUA deveria ser a limitação ou impedimento da imigração de não brancos.

O autor abordado na sequência é Alexander Duguin [12], conhecido ideólogo russo que mistura doutrinas diversas, passando pelo tradicionalismo, a nova direita francesa e o eurasianismo, pregando uma renovação do nacionalismo russo por meio das tradições europeias. Para isso, seu pensamento se apoia em dois conceitos-chave: a questão da Eurásia, através da qual Duguin acredita no papel central da Rússia como Estado e da Eurásia como civilização capaz de regenerar a nação russa. Em segundo lugar, o conceito de uma revolução conservadora. Ao contrário de prezar mudanças graduais, Duguin acredita em uma revolução conservadora para se opor ao liberalismo e avançar as pautas conservadoras. No seu livro The Fourth Political Theory, ele renuncia ao que chama de segunda e terceira teorias políticas (comunismo e nacionalismo/ fascismo) e considera o liberalismo uma ideologia totalitária em virtude de seu caráter normativo. A quarta teoria política viria para negar a modernidade como um todo. Duguin talvez tenha mais impacto fora da Rússia do que dentro, tendo inclusive participado de um debate online com Olavo de Carvalho em 2011.

A última autora abordada é Bat Ye’or [13], proeminente contrajihadista que descreve a existência de uma conspiração envolvendo a União Europeia e países de maioria muçulmana do norte da África e Oriente Médio que buscariam estabelecer o controle muçulmano da Europa, ou “Eurábia”. Seu trabalho inspirou o terrorista de extrema-direita Anders Breivik na Noruega e continua a ser debatido no campo da direita radical em relação a uma “islamização” da Europa.

A terceira e última parte do livro diz respeito aos pensadores emergentes, mais jovens que os tratados anteriormente e que propagam suas ideias principalmente através da internet. Dos cinco autores tratados, quatro são norte-americanos e um é sueco, o que revela que a direita radical europeia ainda está dominada por pensadores da geração anterior, especialmente ligados à nova direita francesa e Duguin.

Mencius Moldbug [14], apelido de Curtis Yarvin, é um ex-libertariano (ou libertário, como preferem se autodenominar no Brasil) que prega a necessidade de se livrar do “controle de pensamento” feito por uma elite progressista e rejeitar o “vírus” da democracia, fazendo uma fusão entre o libertarianismo radical e o autoritarismo no que denomina “neorreação”. O regresso a uma autoridade e hierarquia contra a democracia e o igualitarismo poderia salvar a sociedade do seu declínio. Sua utopia envolve liberdade máxima, exceto na política. A ordem econômica seria gerida por uma sociedade inteiramente privatizada, enquanto a ordem política teria o modelo de uma corporação, com o Estado privatizado encabeçado por um CEO-monarca eleito por grandes proprietários.

Apesar de suas ideias parecerem esdrúxulas, Moldbug possui contatos com o site Breitbart, Steve Bannon e o bilionário Peter Thiel, além de ter boa inserção nos meios jovens ligados à tecnologia, bem como na alt right.

Greg Johnson [15], por sua vez, também esteve próximo do libertarianismo e é editor-chefe do site Counter–Currents, que se propõe a criticar a liberdade liberal na América do Norte à luz do tradicionalismo e das ideias da nova direita europeia. Johnson é mais um pensador que foca seus esforços na questão da metapolítica, visando criar um movimento cultural e intelectual que seja capaz de promover mudanças políticas reais e, finalmente, o estabelecimento de um etno-Estado branco, uma vez que ele é defensor de uma etnopluralidade, segundo a qual todas as raças e etnias deveriam ter sua própria pátria. Johnson é o único entre os autores modernos e emergentes que expressamente revela simpatia pelo nazismo.

O terceiro pensador emergente tratado é o conhecido Richard Spencer [16], presidente do National Policy Institute, um think tank nacionalista branco fundado pelo multimilionário William Regnery II. Spencer se diz responsável pela criação do termo “alt right”. Tamir Bar-On, autor do capítulo sobre Spencer, sintetiza os contornos do seu pensamento:

Uso da internet como o principal veículo para provocar tanto conservadores quanto liberais com ideias e linguagem politicamente incorretas; rejeição do multiculturalismo liberal; desdém pelo capitalismo, já que ele tem a tendência de homogeneizar diversos povos e culturas; apoio a comunidades políticas unidas a identidades europeias brancas; o desafio a elites “heroicas”, brancas e europeias a criar uma revolução nas mentalidades e valores […] contra o multiculturalismo e a imigração; e o desejo de criar etno-Estados brancos homogêneos (“pátrias”) dos dois lados do Atlântico (2019, p. 225).

Como pode ser visto, a questão racial é central no discurso de Spencer, bem como o chamado à ação para uma direita revolucionária, antiliberal e anticapitalista que tenha como foco a metapolítica e as táticas da nova direita.

O capítulo 15 é dedicado a Jack Donovan e seu tribalismo masculino.[17] Donovan acredita que a igualdade é uma farsa, a violência é necessária e que a questão principal não é a raça, mas sim o gênero. Não somente homens brancos, mas todos os homens devem ser livres e fortes. Donovan é abertamente homossexual e prega o tribalismo masculino, uma ideologia de supremacia masculina formada ao redor da ligação entre guerreiros através de rituais de união. Na sua visão, a masculinidade é atacada atualmente por feministas, burocratas e homens ricos que buscam a passividade dos homens. Em 2013, Donovan passou a defender o que denominou de “anarcofascismo”, em que tribos de homens se unem em oposição à ordem institucional feminista, corrupta e antitribal. Donovan possui influência na chamada manosphere, uma subcultura da internet que acredita que as mulheres possuem poder em demasia, e na alt right, que adota sua posição misógina.

O último autor abordado é Daniel Friberg [18], sueco, para quem o método é mais importante do que a própria questão ideológica. Assim como outros autores citados, Friberg acredita que a mudança política só pode ser obtida através da educação, mídia e expressão criativa, ou seja, na metapolítica. Em virtude disso, Friberg tomou diversas inciativas para popularizar obras tradicionalistas, como a Arktos, maior editora de obras da direita radical e tradicionalistas, e o site Metapedia, uma alternativa à Wikipedia. Em 2015, publicou o livro The Real Right Returns, um manual de estratégias para ativistas da direita radical de como se conduzir politicamente e atacar o establishment liberal.

A obra editada por Sedgwick é de extrema importância na atualidade, permitindo compreender a pluralidade de pensamentos existentes dentro de uma direita radical que se torna cada vez mais proeminente em vários países do mundo, especialmente na América Latina, Estados Unidos e Europa.

Assim, o livro se mostra como uma importante ferramenta para todos os que buscam entender as linhas de pensamento da direita radical desde seus primórdios até a atualidade, sem, claro, esgotar todos os autores que impactam nesse meio. René Guénon e Frithjof Schuon, por exemplo, são escritores interessantes para o estudo da ala da direita brasileira encabeçada por Olavo de Carvalho, enquanto David Duke poderia ainda ser visto como uma influência para os supremacistas brancos norte-americanos.

A leitura de Key Thinkers of the Radical Right é bastante agradável; todos os capítulos contam com extensas referências e deixam em aberto um caminho para quem pretende se aprofundar em algum dos pensadores abordados. Certamente historiadores que pesquisam movimentos ligados à extrema radical tirarão bom proveito da obra, uma vez que são raros os livros que tratam de forma séria e criteriosa a respeito do tema.

Notas

3. Capítulo escrito por Elliot Y. Neaman.

4. Capítulo escrito por Reinhard Mehring.

5. Capítulo escrito por H. Thomas Hakl.

6. Os autores tradicionalistas possuem divergências entre si. Para melhor compreensão sugerimos o livro Against the Modern World: Traditionalism and the Secret Intellectual History of the Twentieth Century, também de Mark Sedgwick.

7. Capítulo escrito por Jean-Yves Camus.

8. Capítulo escrito por Stéphane François.

16. Capítulo escrito por Tamir Bar-On.

17. Escrito por Matthew N. Lyons.

18. Capítulo escrito por Benjamin Teitelbaum.

Referências

SEDGWICK, M. (org). 2019. Key Thinkers of the Radical Right: Behind the New Threat to Liberal Democracy. New York, Oxford University Press, 325 p.

SEDGWICK, Mark. 2009. Against the Modern World: Traditionalism and the Secret Intellectual History of the Twentieth Century. New York, Oxford University Press, 2009, 369 p.

Felipe Cittolin Abal –  Programa de Pós-Graduação em História da Universidade de Passo Fundo. BR 285, Bairro São José. 99052-900 Passo Fundo, Rio Grande do Sul, Brasil. E-mail: [email protected]


SEDGWICK, Mark. Key Thinkers of the Radical Right: Behind the New Threat to Liberal Democracy. Resenha de: ABAL, Felipe Cittolin. Os pensadores da direita radical: de Oswald Spengler a Daniel Friberg. História Unisinos, Porto Alegre, v.25, n.1, p.168-171, jan./abr., 2021. Acessar publicação original 

Crítica da Razão Negra | Achille Mbembe (R)

O camaronês Achille Mbembe obteve seu doutorado na Universidade de Sorbonne em 1989 e posteriormente obteve o DEA em Ciência Política no Instituto de Estudos Políticos de Paris. Atua como professor e pesquisador de História e Política no Instituto Wits para Pesquisa Social e Econômica em Joanesburgo, África do Sul, e no Departamento de Estudos Românticos do Instituto de Humanidades Franklin, Duke University. Ele também ocupou cargos na Columbia University, Berkeley, Yale University, na University of California e Harvard.

As obras de Mbembe publicadas no Brasil são: Sair da grande noite: Ensaio sobre a África descolonizada (2019); Necropolítica (2018); Crítica da Razão Negra (2018) e Políticas da Inimizade (2017). A sua produção acadêmica ganhou destaque no campo de estudos pós-coloniais e contribuiu para a abertura de uma nova discussão epistemológica sobre a categoria negro.

Para além de sistematizar conceitos e categorias interpretativas, os estudos pós-coloniais, mas recentemente a decolonialidade, consiste também numa prática de oposição e intervenção contra os desígnios imperialistas. Esse projeto é aquele que, ao identificar a relação antagônica entre colonizador e colonizado, busca denunciar as diferentes formas de dominação e opressão dos povos.

De acordo com o antropólogo venezuelano Fernando Coronil1, é possível afirmar que o pós-colonialismo como termo apareceu nas discussões sobre a decolonização2 de colônias africanas e asiáticas depois da Segunda Guerra Mundial, tendo sido produzido, principalmente, por intelectuais do Terceiro Mundo que estavam radicados nos departamentos de estudos culturais, de língua inglesa, antropologia das universidades inglesas e posteriormente das universidades norte-americanas.

A professora Larissa Rosevics explica que a maior parte das pesquisas pós-coloniais seguiu a trajetória dos estudos literários e culturais, através da crítica a modernidade eurocentrada, da análise da construção discursiva e representacional do ocidente e do oriente, e das suas consequências para a construção das identidades pós-independência.

A preocupação dos estudos pós-coloniais esteve centrada nas décadas de 1970 e 1980 em entender como o mundo colonizado é construído discursivamente a partir do olhar do colonizador, e como o colonizado se constrói tendo por base o discurso do colonizador.3

Achille Mbembe considera urgente debater a razão negra e retomar o diálogo sobre o conjunto de disputas acerca das regras de definição do negro e da problemática da raça. Para o autor, não há colonialismo que não esteja vinculado a uma forte dose de racismo estrutural. Nesse sentido, interessa compreender que, como consequência direta desta lógica dominante, o negro e a raça viraram sinônimos no imaginário das sociedades europeias.

Seguindo o pensamento do psiquiatra martiniquense Frantz Fanon, Mbembe declara que a ideia de raça começa a ser construída a partir da modernidade burguesa com processos de colonização da América e o tráfico de pessoas escravizadas e arrancadas do continente africano. Essa construção da raça se consolida no século XIX, com a hegemonia do capitalismo, e está vigente com algumas transformações na contemporaneidade.

Fanon compreende que a ideia de raça esteve como uma das formas de legitimação das relações de poder e o racismo como um elemento que tem consequência direta na destruição dos valores culturais do grupo colonizado. O autor acredita na necessidade de destruir o signo do negro e do branco para construir uma sociedade onde a cor da pele, o fenótipo, não constituí marcador social estruturante das relações sociais.4

Entretanto, Mbembe tenta renovar e reinterpretar nossa compreensão de poder e subjetividade na África contemporânea e subverter alguns pressupostos dos estudos pós-coloniais. Ele afirma que a África não é mais a colônia que Frantz Fanon descreveu em sua obra Os condenados da Terra. O objetivo do seu trabalho é construir uma forma mais dinâmica de pensar que leve em consideração as complexidades dos povos africanos que emergiram recentemente da experiência da colonização e da violência.

Seguindo a linha de outros pensadores pós-coloniais, Mbembe dialoga com a o conceito de Négritude, de Aimé Césaire5 e de Movimento Pan-Africano de Marcus Garvey. Contudo, o autor acredita que, assim como Frantz Fanon, esses intelectuais resgatam o negro da subalternidade dando-lhe uma identidade própria, mas continuam a manter a raça enquanto conceito diferenciador.

Debater a razão negra é, portanto, retomar o conjunto de disputas acerca das regras de definição do negro na contemporaneidade. Para o historiador indiano Sanjay Seth, a própria ideia de razão se constituiu, em parte, por meio de uma série de exclusões. Assim como a modernidade europeia se consagrou como o futuro de todos, também as tradições intelectuais não-europeias se tornaram antecipações inferiores da Razão universal. O autor argumenta que:

Pluralizar a razão não significa abandonar o raciocínio; negar que existe um ponto arquimédico, a partir do qual é possível exercer a crítica, não é defender o fim da crítica. Mas é, sim, defender uma reconsideração daquilo que pensamos estar fazendo quando redescrevemos o(s) passado(s) dos povos em termos que lhes são alheios. Se o que existe é não a Razão, e sim tradições de raciocínio; não a História e suas representações na escrita da história, e sim muitos passados re-presentados de muitas formas, então não podemos escrever com qualquer presunção de privilégio epistêmico.6

Em defesa à razão negra, Mbembe demonstra a ligação que existe entre a razão kantiana e os conceitos de modernidade e de colonialidade. O autor declara que a razão universal supõe a existência de um sujeito igual, cuja universalidade é incorporada pela sua humanidade. Encontramos o mesmo projeto de universalização na colonização. Esta apresenta-se, pelo menos no plano retórico, como resultado do Iluminismo. Assim, segundo Mbembe, os negros tinham desenvolvido concepções da sociedade que não contribuíam para o poder dessa invenção da razão universal.

É também a razão que faz com que, desde o início, o discurso sobre a identidade negra esteja cativo de uma tensão, da qual tem ainda dificuldade de libertar-se. Daí o autor questionar se o negro faria parte da identidade humana em geral ou deveria antes, em nome da diferença e da singularidade, insistir na possibilidade de figuras culturais diversas de uma mesma humanidade, figuras culturais de vocação não autossuficiente, e cujo destino final é universal.

A formação das identidades africanas contemporâneas não se faz de todo em referência a um passado vivido como um destino lançado, mas a partir da capacidade de colocar o passado entre parênteses, condição de abertura ao presente e à vida em curso. Ao levar em consideração esse conceito, Mbembe menciona a identidade em devir, que se alimenta simultaneamente de diferenças entre os Negros, tanto do ponto de vista étnico, geográfico, como linguístico, e de tradições herdeiras do encontro com Todo o Mundo.

Dessa maneira, a identidade em devir é um processo dinâmico, contínuo e inacabado. Achille Mbembe refere-se a um “devir-negro do mundo”, em que toda a Humanidade subalterna corre o risco de se tornar negra, e em que as desigualdades em que todo o processo assenta correm o risco de se disseminarem rapidamente. O autor amplia a categoria de negro a uma condição universal a que todos estarão sujeitos pelo fato do neoliberalismo,7 na sequência dos novos modelos de exploração que o caracterizam, olhar para todos enquanto negros, com a consequente ideia de submissão associada.

Essa identidade não é fruto da consciência individual. Ela é uma relação social estruturante que transcende o nível do indivíduo. É construída historicamente e concretamente. A identidade parece construir-se no cruzamento entre este ritual de enraizamento e o ritmo de afastamento, na constante passagem do espacial ao temporal e do imaginário ao órfico. O segundo revela uma prática de fronteira determinante entre as identidades itinerantes, de circulação.

Historicamente, Mbembe menciona que a ligação ao território e ao solo em África sempre dependeu do contexto. Em alguns casos, as entidades políticas tinham como delimitação não as fronteiras, no sentido clássico do termo, mas uma imbricação de espaços múltiplos, constantemente feitos, desfeitos e refeitos tanto pelas guerras e conquistas como devido à mobilidade de bens e pessoas.

Escalas muito complexas permitem estabelecer correspondências produtivas entre as pessoas e as coisas, podendo ser convertidas umas nas outras, como aconteceu durante o tráfico de escravos. Poderíamos dizer que, operando por empurrões, destacamentos e cisões, a territorialidade pré-colonial é uma territorialidade itinerante. Da mesma maneira, esta era uma das modalidades de constituição de identidades.

Tudo começa, para Mbembe, por um ato de identificação: «Eu sou um negro». O ato de identificação constitui a resposta a uma pergunta que se faz: «Quem sou eu, portanto?»; ou que nos é feita: «Quem são vocês?». No segundo caso, trata-se de uma resposta a uma intimidação. Trata-se, em ambos os casos, de revelar a sua identidade, de a tornar pública. Mas revelar a sua identidade é também reconhecer- se, é saber quem se é e dizê-lo ou, melhor, proclamá-lo, ou também dizê-lo a si mesmo. O ato de identificação é igualmente uma afirmação de existência. «Eu sou» significa, desde logo, eu existo.

A própria raça é entendida como um conjunto de propriedades fisiológicas visíveis e de características morais discerníveis em Crítica da Razão Negra. São estas propriedades e características que, pensa-se, distinguem as espécies humanas entre si. As propriedades fisiológicas e as características morais permitem, por outro lado, classificar as espécies dentro de uma hierarquia na qual os efeitos da violência são ao mesmo tempo políticos e culturais. É esta negação de humanidade (ou este estatuto de inferioridade) que obriga o discurso dos Negros a inscrever-se, desde as suas origens, numa tautologia: também somos seres humanos.

Notas

1 CORONIL, Fernando. Elephants in the Americas? Latin American pós-colonial studies and global decolinization. In: MORAÑA, Mabel; DUSSEL, Enrique; JÁUREGUI, Carlos (Eds.). Coloniality at large: latin american and poscolonial debate, p. 396-416. Durhan; London: Duke University Press, 2008.

2 O uso do termo “decolonial” ao invés de “descolonial” é uma indicação de Walter Mignolo para diferenciar os propósitos do Grupo Modernidade/Colonialidade e da luta por descolonização do pós-Guerra Fria, bem como dos estudos pós-coloniais asiáticos. Cf.: MIGNOLO, Walter. Cambiando las éticas y las políticas del conocimiento: lógicas de la colonialidad y poscolonialidad imperial. Tabula Rasa, n.3, 2005, pp.47-72.

3 ROSEVICS, Larissa. Do pós-colonial à decolonialidade. In: CARVALHO, Glauber. ROSEVICS, Larissa (Orgs.). Diálogos internacionais: reflexões críticas do mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Perse, 2017.

4 FANON, Frantz. Os condenados da terra. Juiz de Fora: Editora UFJF, 2005.

5 CÉSAIRE, Aimé. Discurso sobre o colonialismo. Lisboa: Sá da Costa, 1978.

6 SETH, Sanjay. Razão ou Raciocínio? Clio ou Shiva? História da Historiografia, Ouro Preto, no. 11, abril 2013, p. 173-189.

7 Por neoliberalismo o autor entende como uma fase da história da Humanidade dominada pelas indústrias do silício e pelas tecnologias digitais. O neoliberalismo é a época ao longo da qual o tempo (curto) se presta a ser convertido em força reprodutiva da forma-dinheiro. Tendo o capital atingido o seu ponto de fuga máximo, desencadeou-se um movimento de escalada. O neoliberalismo baseia-se na visão segundo a qual «todos os acontecimentos e todas as situações do mundo vivo (podem) deter um valor no mercado.

Ana Luiza Rios Martins – Doutora em História pela Universidade Federal de Pernambuco. Atualmente é professora do curso de Licenciatura em História da Universidade Aberta do Brasil/ Universidade Estadual do Ceará. E-mail: [email protected]  ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2627-5144


MBEMBE, Achille. Crítica da Razão Negra. Tradução de Sebastião Nascimento. São Paulo: n-1 edições, 2018. Resenha de: MARTINS, Ana Luiza Rios. Crítica da razão negra e a introdução ao pensamento decolonial. CLIO – Revista de pesquisa histórica. Recife, v.39, n.1, p.514-518, jan./jun. 2021. Acessar publicação original [DR]

Capitali senza re nella Monarchia spagnola. Identità, relazioni/ immagini (secc. XVI-XVIII) / Rossella Cancila

En el contexto de los estudios sobre la monarquía hispánica en la primera Edad Moderna y sobre su naturaleza policéntrica, en los últimos años se ha prestado especial atención a la cuestión del papel de las ciudades como elementos neurálgicos de un sistema de poderes complejo y articulado en constante relación con la corte de Madrid, y sobre las dinámicas de representación simbólica de la figura del rey, sobre todo en los territorios no europeos. El libro Capitali senza re nella Monarchia spagnola es parte de este floreciente debate historiográfico desarrollado a partir de las ciudades, brindando importantes avances sobre algunas realidades urbanas de particular interés tanto por sus características intrínsecas como por el papel desempeñado fuera del reino e internacionalmente. Tal y como explica en la introducción Rossella Cancila —profesora titular de Historia Moderna en la Universidad de Palermo y editora del libro—, el conjunto de trabajos se propone indagar aspectos vinculados a la conformación, en ausencia del rey, de las ciudades como capitales de los distintos virreinatos, a la dialéctica entre centros y periferias y al despliegue de formas y representaciones del poder en el espacio público, con particular atención a los momentos festivos.

Capitali senza re nella Monarchia spagnola. Identità/ relazioni/ immagini (secc. XVI-XVIII) (T)

La obra presenta los resultados de la decimocuarta reunión anual de la Red Columnaria (XIV Jornadas de Historia de las Monarquías Ibéricas), encuentro que tuvo lugar del 27 al 29 de septiembre de 2018 en la Universidad de Palermo, y que formaba parte además de las iniciativas de celebración de la ciudad siciliana como Capital italiana de la Cultura durante ese año. Nacida en 2005, Columnaria es una de las más destacadas y prolíficas redes de investigación de la Edad Moderna, que reúne investigadores europeos y americanos con diferentes enfoques disciplinarios en torno a los espacios policéntricos de las monarquías, basadas en la presencia e interrelación de soberanías múltiples, cada una de ella expresión de los distintos poderes locales en relación con el central. Su estructura se articula a partir de 19 macroáreas de investigación, entre ellas el Nodo Italia Sur, que incluye algunos de los historiadores involucrados en las jornadas palermitanas y en el producto editorial que aquí se presenta.

Se trata de un total de veintitrés trabajos, divididos en dos volúmenes que corresponden a dos grandes vertientes temáticas, siendo la primera la identidad política y social de las ciudades, mientras la segunda corresponde a las estrategias de representación del poder (y poderes) que toman forma en los campos culturales (literario, ceremonial y arquitectónico). Aunque el italiano es el principal idioma adoptado, debido tal vez al origen de dos tercios de los autores y a la propia sede del encuentro, no faltan contribuciones en español, portugués e inglés. Las ciudades de interés pertenecen a diferentes contextos territoriales, y no se refieren solo a los dominios españoles: Palermo, Messina, Nápoles, Cagliari, Milán, Granada, Zaragoza y los otros centros del Reino de Aragón, sino también Lisboa, Goa, Lima, Santiago de Guatemala y Palma. En efecto, no se hace referencia solo a las ciudades con función de capital en aquellos territorios que conformaban los virreinatos, tal y como parece evocar el título, sino también incluye urbes que, pese a no ser capitales, tuvieron un papel destacado en relación con otras poblaciones de un mismo territorio y con centros de poder externos. Por otro lado, llama la atención la escasez de casos específicos del contexto colonial hispanoamericano, a pesar de que fueron contemplados en algunas ponencias presentadas en las jornadas, y a las cuales deseamos que encuentren su pronta publicación. En cualquier caso, está claro que el propósito del libro ha sido, más que pretender abordar la totalidad de las ciudades capitales, enseñar los resultados de las investigaciones sobre algunas de ellas.

El primer bloque comienza con un trabajo de Juan Francisco Pardo Molero sobre los principales centros de la Corona de Aragón, donde pone a Zaragoza en relación con Barcelona, Valencia, Cagliari y Mallorca y analiza el uso y función de los edificios designados como sede de gobierno virreinal. La ciudad de Granada y el papel del linaje de los Mendoza en el control de la Capitanía General es el tema del texto firmado por Antonio Jiménez Estrella, centrado en la fase posterior a la batalla de Alpujarras y en un momento de inflexión de la ciudad granadina frente al desarrollo de otros centros como Málaga. Elisa Novi, Giulio Sodano y Giuseppe Mrozek dedican su atención al Reino de Nápoles, respectivamente al proceso de edificación de los Quartieri spagnoli, al papel de las autoridades locales (Eletti della città y Seggi) en el gobierno del virreino, y a la actividad del Parlamento hasta 1642. Durante el reinado de Felipe IV, Palermo y Messina se enfrentaron en distintas ocasiones para ejercer su control sobre la isla siciliana, tal y como detalla Rossella Cancila en su contribución, asunto que se relaciona con el siguiente tema de Stefano Piazza sobre la conformación urbana de la ciudad de Palermo.

A continuación, tres trabajos se dedican a poner el acento en las peculiaridades económico-financieras de dos ciudades estrictamente relacionadas con la monarquía.

Matteo Di Tullio, Davide Maffi y Mario Rizzo presentan un pormenorizado análisis de la fiscalidad de Milán en relación con otros centros del ducado. Como demuestra Giovanna Tonelli, Milán era una destacada capital del comercio local e internacional; sin embargo, por su favorable posición geográfica, fue sin duda la ciudad lisboeta el principal puesto de comunicación hacia el Atlántico y en el Mediterráneo, así como explica Benedetta Crivelli. Las últimas dos contribuciones del primer volumen presentan dos significativos casos de declive y ascenso de dos capitales fuera del contexto europeo, Goa y Santiago de Guatemala. Ángela Barreto y Kevin Carreira se ocupan de la primera, aportando una nueva lectura del proceso de cesación de su rol como ciudad global, pero sin perder al menos su importancia regional. Por el contrario, la capital guatemalteca se convirtió durante el siglo xvi en sede de la Audiencia y de la Caja de Hacienda Real, según muestra Martha Atzin.

Las mismas ciudades examinadas en la primera parte de la obra, retornan como objeto de reflexión en el segundo bloque, pero ahora desde la perspectiva de la Historia Cultural y de las estrategias simbólicas vinculadas a las esferas del poder.

Manfredi Merluzzi pone en contexto la Historia de la fundación de Lima del jesuita Barnabé Cobo, obra publicada en 1639, y tan central en la configuración de la ciudad como capital del virreinato de Perú. La presencia/ausencia del rey en Lisboa durante las últimas décadas del siglo xvi y hasta la revuelta, es el tema elegido por Ana Paula Megiani mientras realiza una sugerente lectura de la vista de la ciudad fechada 1613 que se conserva en el castillo alemán de Weilburg. Al despliegue simbólico de la ciudad de Granada, sede del Panteón de los Reyes Católicos y de la Real Cancillería, se dedica el siguiente trabajo de Francisco Sánchez-Montes González, mientras que Maurizio Vesco propone una análoga lectura para los edificios públicos de Palermo y Mesina. La ciudad de Cagliari, pese a no ser considerada en la primera parte, recobra aquí la atención que merece, con cuatro ensayos elaborados respectivamente por Nicoletta Bazzano, Carlos Mora Casado, Fabrizio Tola y Alessandra Pasolini, en los que analizan diferentes fuentes literarias, artísticas y ceremoniales relativas a la historia de la capital de Cerdeña a lo largo del siglo xvii.

En cuanto a Nápoles, el trabajo de Valeria Cocozza se centra en el papel del Cappellano Maggiore, figura hasta ahora poco estudiada, y sin embargo fundamental en las dinámicas políticas de la corte virreinal. El tema de las redes diplomáticas entre las ciudades de la monarquía constituye el eje trabajado por Ida Mauro, quien aborda la cuestión a partir de varios episodios que relacionan ciudades italianas y españolas. Finalmente, Eduardo Pascual Ramos analiza el papel del Ayuntamiento de Palma en las Cortes durante la etapa borbónica.

Por lo que respecta a la edición, la obra constituye la trigésimo sexta contribución de la colección Quaderni de la Associazione no profit “Mediterránea”, realidad editorial palermitana que desde su fundación en 2004 está haciendo una encomiable labor en la publicación (impresa y en formato electrónico Open Access) de investigaciones sobre el contexto histórico del área mediterránea desde la Edad Media hasta la actualidad. Instituida por un grupo de académicos de la Universidad de Palermo y con sede en el Dipartimento Culture e Società, se ocupa también de la edición de una revista trimestral llamada Mediterranea – Ricerche Storiche, que en los últimos años se ha convertido en una publicación puntera a nivel italiano e internacional.

Milena Viceconte – Università degli Studi di Napoli “Federico II”. [email protected].


CANCILA, Rossella (a cura di). Capitali senza re nella Monarchia spagnola. Identità, relazioni, immagini (secc. XVI-XVIII). Palermo, Associazione no profit “Mediterranea”. 2020, 2 vols., 542 págs. (Colección Quaderni, 36). Resenha de: VICECONTE, Milena. Memorias – Revista Digital de Historia y Arqueología desde el Caribe. Barranquilla, n.43, p.171-174, ene./abr., 2021. Acessar publicação original [IF].

Une histoire sociale de l’industrie en France 1830-1930 / Pierre Judet

JUDED Pierre
Audrey Milltet e Pierre Judet / Foto: Académie François Bourdon /

JUDET P Une histoire sociale de lindustrie en FrancePierre Judet, maître de conférences émérite d’histoire contemporaine à l’Université Grenoble-Alpes, explore, dans cet ouvrage de synthèse, l’histoire sociale des mondes ouvriers des années 1830 aux années 1930 en France. Cet ouvrage s’inscrit, comme il est indiqué dès l’avant-propos, dans le cadre de la nouvelle question d’histoire contemporaine au programme du CAPES, du CAFEP et des agrégations externes intitulée « Le travail en Europe occidentale des années 1830 aux années 1930 » et est une version remaniée d’un cours que Pierre Judet professé à l’université de Grenoble. Cet ouvrage fait le tour de la question ouvrière en mobilisant une historiographie vaste et mise à jour et en traitant d’un très grand nombre de thèmes concernant cette question. Il parvient à remettre en perspective les mondes ouvriers français dans le contexte européen et multiplie les comparaisons avec les autres pays d’Europe occidentale.

Pierre Judet est un spécialiste du monde ouvrier et de l’industrie, en particulier en France ; il a travaillé sur les systèmes productifs industriels locaux (notamment montagnards), objets qu’il mobilise de nombreuses fois comme exemples dans son ouvrage. Sa thèse, publiée dans la même collection en 2004, pourrait également s’avérer très utile aux étudiants des concours car riche en exemples locaux et au cœur des bornes chronologiques du programme (Horlogeries et horlogers du Faucigny (1849-1934). Les métamorphoses d’une identité sociale et politique, PUG, La pierre et l’écrit, 2004).

Même si cet ouvrage est avant tout centré sur la France, il reste très utile aux préparationnaires des concours qui pourront y trouver des connaissances, des chiffres, une vaste bibliographie bien organisée mais surtout des exemples pertinents et intéressants. Quant aux enseignants d’histoire-géographie, ils pourront le mobiliser aussi bien au collège et au lycée qu’en classes préparatoires ou à l’université, notamment grâce aux nombreuses statistiques et aux documents proposés. En quatrième, il offre ainsi une bonne lecture pour les collègues abordant le thème 2 du programme : « L’Europe et le monde au XIXe siècle » et notamment le premier chapitre : « l’Europe et la Révolution industrielle » puisque Pierre Judet revient largement sur l’historiographie autour de cette notion de « révolution industrielle ». Les collègues enseignant en classe de 1re professionnelle pourront aussi utiliser l’ouvrage dans le cadre du premier thème sur les « hommes et femmes au travail du début du XIXe au début du XXe siècle ». Ils trouveront des exemples détaillés et originaux intéressants pour les lycéens : le compagnonnage, le corps et la santé des ouvriers, les crises sanitaires notamment la crise du choléra de 1832… Ensuite, les collègues enseignant en première générale ou technologique pourraient se servir de l’ouvrage pour le chapitre sur l’industrialisation et l’accélération des transformations économiques et sociales en France, l’ouvrage traitant de l’ensemble des problématiques au cœur du programme de première (transformation des modes de production, importance du monde rural, la question sociale…). Encore une fois, des études de documents intéressantes et originales pourraient être prises dans cet ouvrage : le tableau du nombre des indigents à Lille de 1825 à 1833 (p.130) et le texte qui suit extrait des mémoires de Martin Nadaud (p. 131) pourraient ainsi être étudiés par des élèves de première. Enfin, les collègues du supérieur y trouveront une synthèse mise à jour historiographiquement par un des spécialistes français de la question, ainsi qu’une riche bibliographie et des exemples pertinents à étudier avec leurs étudiants.

Classiquement, cet ouvrage suit une progression chronologique. Il est découpé en deux grandes périodes : des années 1830 aux années 1870, Pierre Judet traite « des classes dangereuses à la classe ouvrière » puis des années 1880 aux années 1930 « l’industrie et ses mains d’œuvre industrielles ». A l’intérieur de ces parties, les chapitres thématiques (et parfois chronologiques) permettent une vision d’ensemble de la question. Avant ces deux parties, une introduction revient sur le sujet, ses acteurs, son historiographie et les principales problématiques au cœur de la question.

Tout d’abord, la première partie est consacrée au passage des classes dangereuses à la classe ouvrière des années 1830 aux années 1930. Le premier chapitre revient sur la notion de « révolution industrielle », son historiographie et les avancées récentes sur la question, puis petit à petit sur la manière dont la France a vécu et a adapté cette révolution industrielle. Plus original, le deuxième chapitre part de l’épidémie de choléra de 1832 et est profondément un chapitre d’histoire sociale, il est l’un des chapitres les plus intéressants du livre aussi bien pour les préparationnaires que pour les enseignants qui peuvent en faire une étude de cas pour comprendre les enjeux sociaux de la révolution industrielle au début de la période. Le troisième chapitre, s’il semble très statistique, revient aussi sur le quotidien des ouvriers : leurs métiers, la pluriactivité, les lieux du travail. Enfin, le dernier chapitre de cette première partie revient sur le passage du paupérisme à la question sociale durant la période en insistant sur le rôle des acteurs : les ouvriers, les patrons, l’Etat. Cette première partie est riche en documents statistiques précieux pour les préparationnaires (notamment des statistiques comparatives avec le reste de l’Europe occidentale). Elle revient sur des points classiques mais mis à jour historiographiquement (par exemple sur les ouvrières, la place et la vie dans les usines…) mais aussi plus originaux : l’hygiénisme en France, la vision des élites de la pluriactivité, des exemples de systèmes productifs locaux au début du XIXe siècle, le compagnonnage.

La seconde partie est consacrée à l’industrie et à ses mains-d’œuvre des années 1880 aux années 1930 ; cette partie est largement plus chronologique. La partie commence par une réflexion très présente dans l’historiographie sur le « triomphe de l’usine ». En revenant classiquement sur cette question, l’auteur aborde des exemples intéressants, sur les banlieues industrielles avec Saint-Denis ou, de manière plus originale, sur la houille blanche dans les Alpes tout en présentant de nombreux acteurs du monde ouvrier (le vagabond…). Les réflexions portées sur l’immigration et les étrangers dans le monde ouvrier sont particulièrement intéressantes et entourées de documents statistiques précieux pour le préparationnaire. Le chapitre suivant s’interroge sur « l’affirmation de la classe ouvrière et la construction du champ social » en abordant des points classiques (les grèves, le syndicalisme, le tournant social de la Troisième République). Ce chapitre synthétique serait intéressant pour les collègues de première travaillant sur le thème 3 du programme sur la Troisième République avant 1914. Ensuite, le septième chapitre sur « la guerre et les mains-d’œuvre industrielles » est particulièrement pertinent, aussi bien pour les préparationnaires que les collègues de troisième ou de première (générale ou professionnelle). Cette synthèse sur la définition, le rôle et les caractéristiques de la main-d’œuvre durant la Grande Guerre est complète et permet, une nouvelle fois encore, des perspectives stimulantes avec les élèves. La fin du chapitre est consacrée à la Réforme et la protection sociale (notamment sur les grèves durant la guerre). L’avant-dernier chapitre sur les années 1920 « des mondes ouvriers en mutation » et le dernier chapitre sur « crises, espoir et déception » sont plus chronologiques et synthétiques, mais permettent une compréhension rapide des mondes ouvriers lors de ces deux décennies clés.

Pour conclure, cet ouvrage particulièrement fluide, bien écrit, organisé et problématisé, constitue un bon complément pour les préparationnaires de la question « le travail en Europe occidentale des années 1830 aux années 1930 », il permet de compléter les cours et les manuels avec des exemples classiques mais aussi originaux, tout en mettant à jour les données statistiques. Les préparationnaires regretteront, mais ce n’était pas l’objectif du livre, la concentration uniquement sur l’exemple français. Pour les enseignants, cet ouvrage est synthétique et bien mis à jour, s’il n’est pas révolutionnaire dans son contenu, il permet au professeur d’avoir accès à un grand nombre d’informations sur le sujet. Enfin, on peut féliciter la qualité matérielle de l’ouvrage qui rend la lecture encore plus fluide, mais qui explique son prix relativement élevé (39 euros).

Louis Andouche – Professeur d’histoire-géographie au Lycée Sainte-Marie de Beaucamps-Ligny.


JUDET, Pierre. Une histoire sociale de l’industrie en France. Du Choléra à la Grande crise (Années 1830-1930). PUG, 2020.Resenha de: ANDOUCHE, Louis. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 18 déc. 2020. Consultar publicação original

I sepolti vivi / Gianni Rodari e Silvia Rocchi

RODARI Giane nellURSS 1979 LaPresse www fanpage it
Giane Rodari nell’ URSS, 1979. La Repubblica /

RODARI G I sepolti vivi“Sotto terra va il minatore, /Dove è buio a tutte le ore “. Sono versi di Gianni Rodari inseriti in I luoghi dei mestieri, ( Torino, Einaudi, 1960), una filastrocca fatta per i bambini, per la scuola, per imparare e anche per divertire. Ma alle spalle di quei versi, come spesso gli accadeva, c’era una storia vera. Alcuni anni prima, nel 1952, nelle vesti di cronista del settimanale “Vie nuove”,  egli aveva raccontato lo sciopero dei minatori di Cabernardi, provincia di Ancona, la più grande miniera di zolfo d’Europa. Lì 300 persone si erano asserragliate a 500 metri di profondità per difendere il loro lavoro.  Con la diligenza del cronista il giovane Rodari indica i fatti, elenca i numeri,  traccia un quadro della politica industriale del colosso Montecatini nel contesto della nuova Europa: produttività, modernizzazione…

Ma a un certo punto del racconto abbandona il filo della cronaca e segue la storia di Ernesto e Maria, due giovani sposi, separati dallo sciopero. Lui chiuso nelle viscere della terra, lei tenuta lontana dalle cure per il loro bambino e per il vecchio padre, ma anche dalla pressione delle forze dell’ordine che impedivano contatti diretti, rendendo pesante perfino la consegna del cibo. Rodari concentra l’attenzione su come quei giovani stessero vivendo non un’avventura, né una disgrazia, ma l’impegno per fare del proprio lavoro il mezzo con cui costruire Il loro futuro. Ma anche il loro disperato bisogno di vedersi, solo per uno sguardo, per una parola e immagina Ernesto rischiare la lunga, faticosa e pericolosa risalita per una ’uscita di sicurezza’ dalla miniera, non controllata dalla polizia perché ritenuta impraticabile. Un cunicolo da percorrere a tratti strisciando, fatto di gradini appena accennati e addirittura di arrampicate con funi, lungo un percorso che sembrava non finire mai e sempre con un rischio incombente.  Scrive Rodari : “Cinque ore di strada per nulla fece Ernesto Donini, un giovane minatore di Pergola, domenica, ventidue giugno. Voleva rivedere la moglie, dopo ventiquattro giorni, almeno per un istante. Maria non c’era. Ernesto gridò a qualcuno che l’andasse a chiamare, forse stava attorno alla miniera. Ma  alla fine dovette rassegnarsi e ridiscendere”. Per trovarsi all’appuntamento convenuto, la giovane moglie aveva lasciato il bambino di un anno al vecchio padre dalla salute malferma e aveva percorro 12 km a piedi. Ma, al momento opportuno, la polizia impedì loro di incontrarsi e anche solo di parlarsi.

Così Rodari racconta ciò che non era visibile della lotta operaia: l’umiliazione, con cui chi ha il potere cerca di sfibrare la resistenza di chi potere non ne ha.Hanno fatto bene Ciro Saltarelli e Silvia Rocchi a riprendere e valorizzare questo vecchio reportage, costruendo un libro ( Gianni Rodari, Sepolti vivi, da un’idea di Ciro Saltarelli e illustrazioni di Silvia Rocchi, con un pensiero di Gad Lerner, Torino, Einaudi, 2020)  che grazie ai disegni di Silvia Rocchi permette di tornare a riflettere con più calma sul senso del lavoro di Rodari. Perché questo libro non parla del passato. L’umiliazione come strumento di oppressione, oggi più che mai, è all’ordine del giorno in tutte le latitudini della terra. Ma attuale è anche l’impegno per combatterla. E su questo versante l’opera di Rodari è preziosa.  Per comprendere l’importanza di quello che era pur sempre uno dei tantissimi episodi di conflittualità economico-sociale dei cruciali anni 50, occorre ricordare che erano passati solo pochi anni dall’entrata in vigore della Costituzione repubblicana con al primo articolo il suo fondamento nel lavoro.Se per difendere il salario era necessario ricorrere a forme di lotta che mettevano a rischio la salute e la vita; se la polizia interveniva rendendo più difficile la resistenza, parteggiando così per una delle parti in conflitto, allora cos’era cambiato rispetto al fascismo? Quale discontinuità aveva introdotto l’assetto repubblicano? Qual era il senso vero della Repubblica fondata sul lavoro?Era chiaro che le recenti conquiste politiche non erano la fine, ma solo l’inizio di un nuovo cammino. Di un lungo cammino, per il quale necessitavano forze nuove e nuovi strumenti. Era questo il fronte su cui Rodari impegnò tutta la sua forza creativa. Lo disse espressamente presentando La grammatica della fantasia (1972): insegnare “tutte le parole a tutti, non perché tutti siano artisti, ma perché nessuno sia schiavo”.

Il senso politico del lavoro narrativo dedicato ai bambini di Rodari non sta nel denunciare ingiustizie dolore e umiliazione di chi lavora, né di dare voce a chi non l’ha mai avuta. Molto più radicalmente egli elabora strumenti di lotta, mezzi che servano a chi li usa per difendersi e contrastare chi fa della parola e della cultura uno strumento di dominio. E come campo di battaglia scelse, lui maestro elementare, la scuola e i bambini che la vivevano. A loro ha dedicato la vita, scrivendo cose la cui bellezza da sola testimonia amore e dedizione. Così come, in questo testo, le tavole di Silvia Rocchi.

Franco Martina

Link per acquisto del libro: https://www.edizioniel.com/prodotto/i-sepolti-vivi-9788866566243/


RODARI, Gianni. I sepolti vivi. Da un’idea di Ciro Saltarelli. Illustrazioni di Silvia Rocchi. Resenha de: MARTINA, Franco. L’attualità di Gianni Rodari: “Insegnare le parole a tutti, perché nessuno sia schiavo”. Clio’92, 13 dic. 2020. Acessar publicação original

The War of Words: The Language of British Elections / Luke Blaxill

BLAXILL Luke
Luke Blaxill / Foto: University of Birmingham /

BLAXILL L The war of wordsLuke Blaxill’s book deserves to be seminal. Its unassuming title conceals a bracing methodological challenge: an argument for the application of specific digital techniques to the study of electoral politics. It deploys ‘corpus linguistics’—the computerised compilation and interrogation of massive databases of millions of words—to intervene in a series of debates about the language of the platform in late-Victorian and Edwardian Britain. And it does so with enormous conviction. The War of Words builds its case so patiently, carefully, and politely, that even the most hardened traditionalists may find themselves struggling to dig up objections. Certainly, the public language of parliamentary candidates is a genre peculiarly suited to the analytical tools Blaxill deploys, and work on other spheres of politics may not be able to benefit from the sustained application of ‘text-mining’ methods to the same extent. But the book offers an object lesson in how to present an argument about method.

The War of Words has been trailed in a series of journal articles and book chapters over the last decade, so some readers will already be familiar with the techniques involved, and a number of the more striking reinterpretations the book offers. But having everything presented together—and supported by an imposing array of statistical tables (36) and figures (44), a ‘technical glossary’, and 68 pages of methodological and statistical appendices—lends the research a powerful cumulative effect. As this suggests, the volume’s embrace of digital methods goes well beyond the searches for ‘hits’ on particular keywords, and the Google Ngrams, which are already part of the historian’s armoury. What does the book mean to do? Leia Mais

La Spagnola in Italia 1918-1919 / Eugenia Tognotti

TOGNOTTI E Eugenia
Eugenia Tognotti / Foto: La Stampa /

TOGNOTTI E La Spagnola in ItaliaMisure di distanziamento sociale, sospensione delle riunioni pubbliche, divieto di assembramento, limitazione all’uso dei mezzi di trasporto, chiusura di scuole, chiese e teatri: il lockdown di un secolo fa. La storia delle pandemie ci riporta, con il libro di Eugenia Tognotti, al biennio 1918-’19, nel pieno della terribile Spagnola; in effetti, gli echi di una malattia che sembrava sfuggire a ogni possibilità di intervento umano non sono poi così differenti da quelli riportati dai media oggi. La difficoltà diagnostica legata alla scarsa specificità del quadro sintomatico, simile a quello di altre malattie influenzali, ma ben più letale, l’elevato potenziale contagioso, la concomitanza con la guerra fecero rapidamente delinearsi il quadro di una tragedia collettiva.

“… Fame, peste, guerra. In tutta Italia vi è una grande epidemia chiamata febbre spagnola che anche capitò a Monterosso, non vi potete immaginare quanta gioventù muore, se dura ancora non restiamo nessuno […]. Si muore come l’animali senza il conforto di parenti e amici”. Il tono tragico di questa come di altre lettere, inviate da cittadini italiani a congiunti e amici residenti all’estero e richiamate nel volume, non lascia dubbi sulla gravità della situazione venutasi a creare a seguito della diffusione della Spagnola. Tuttavia, la documentazione ufficiale di quegli anni non fornisce un riscontro corrispondente, né permette di rilevare le reali dimensioni del problema; anzi, ci restituisce l’immagine di un dramma che si delinea a tinte flebili, almeno nella prima fase. E se anche oggi non è raro trovare memoria orale della terribile malattia, meno presente e più sfumata è la versione dei canali divulgativi ufficiali, apparati ministeriali, trattati scientifici, organi di informazione; tanto che molti interrogativi ancora rimangono in attesa di una risposta. Sui giornali dell’epoca le tracce della prima ondata dell’epidemia sono ineffabili, la tragedia che si consuma ha ancora tratti deboli e contorni sfocati. Quasi nulla riesce a trapelare della reale diffusione, delle incertezze del mondo accademico e scientifico, delle disfunzioni del sistema sanitario.

Come mai tale silenzio? Evidentemente, c’erano buoni motivi perché la realtà fosse taciuta o sottostimata. Nell’Italia lacerata dal primo conflitto mondiale, la morsa della censura dello Stato che proibiva la pubblicazione di informazioni militari si strinse, nel momento più drammatico della guerra, anche attorno alla Spagnola, la guerra sanitaria: fornire al nemico austro-ungarico informazioni sulla gravità della situazione reale era considerato contrario agli interessi nazionali, soprattutto nel momento in cui si stava preparando l’offensiva decisiva. Le direttive governative erano ferree per quanto riguarda il controllo dell’informazione: prevedevano addirittura il sequestro per le testate che avessero pubblicato articoli esplicativi. In realtà, ben prima dell’arrivo della Spagnola i giornali si erano esercitati a tacere ogni notizia che potesse avere un effetto demoralizzante sulla popolazione, aggredita già da diverse malattie epidemiche, come il colera, il tifo e il vaiolo.

Dopo il negazionismo del primo periodo – tutt’al più trafiletti tranquillizzanti, brevi note dai tratti ironici sulle pagine locali – finalizzato al consenso e al sostegno al mondo economico e produttivo necessario per la gestione della contingenza bellica, si rileva l’evidente difficoltà delle agenzie governative nel controllo e nell’orientamento della stampa; il diritto del cittadino all’informazione rimase, comunque, fortemente limitato, anche se risultò impossibile nascondere totalmente la realtà quando l’epidemia raggiunse l’acme.

Il saggio di Eugenia Tognotti, pubblicato nel 2002 e aggiornato nell’edizione del 2015, fornisce nuove conoscenze sulla pandemia influenzale del 1918. L’autrice ricorre a una molteplicità di fonti per ricostruire gli aspetti epidemiologici e socio-sanitari, ripercorrendo la cronologia di quegli anni: carteggi amministrativi, provvedimenti delle Autorità sanitarie, relazioni ministeriali. Ma sono presenti e riccamente documentati, grazie alla ricerca effettuata sui quotidiani dell’epoca e negli archivi di scrittura popolare, anche altri tratti che possono efficacemente contribuire alla costruzione del quadro storico del periodo, come le relazioni sociali, i comportamenti dei soggetti, le credenze e le idee ricorrenti: l’impatto che il dilagare della malattia esercitò sull’immaginario e che trovano, in modo sorprendente, una forma di continuità nelle crisi epidemiche, dai tempi lontani alla contemporaneità.

Chi non ricorda la mesta colonna dei carri militari diretti al cimitero di Bergamo, recentemente proposta dai media? Allo stesso modo, le immagini delle salme trasportate con mezzi speciali, delle inumazioni senza la presenza delle famiglie, dei depositi di feretri presso il cimitero monumentale e la stazione tranviaria di Porta Romana di Milano ebbero, negli anni 1918-’19, un enorme impatto sociale. “Non più preti, non più croci, non più campane” riferiva desolata una donna foggiana al genero. Le principali componenti dei rituali funebri, le cerimonie per elaborare il lutto, la condivisione del dolore nell’ambito familiare, l’intreccio fra la dimensione privata e quella pubblica erano cancellati dalla morte per Spagnola. Le fonti epistolari esprimono lo sconvolgimento del vissuto, lo smarrimento e l’angoscia di fronte ai divieti. “E’ una malattia brutta e schifosa che non ti portano nemmeno in Chiesa”, scriveva un abitante di Bedonia in una lettera diretta a New York. Ancora più della morte, sembrava incutere paura la desacralizzazione del corpo, il suo essere considerato un fardello pericoloso di cui disfarsi prima possibile.

Sono stati “i prigionieri dell’isola dell’Asinara a portare il tifo, il colera e altre malattie contagiose. Le autorità non erano riuscite a isolarle come avrebbero dovuto”; quindi, “i venditori ambulanti che bazzicavano di nascosto gli appartamenti” li introducono nelle case. Le parole del prefetto di Alghero nell’anno 1915 ci ricordano che, anche prima che si manifestasse la Spagnola, un’epidemia assume i tratti del dispositivo di emarginazione. Accade oggi, succedeva in un passato ben più lontano, avvenne anche in quel difficile biennio. La necessità dell’igiene e della disinfezione diventava un’ossessione e, almeno in alcuni strati della società, nascondeva la fobia del contatto con quelle parti sociali – quasi sempre gli abitanti dei quartieri popolari delle città – che si sottraevano all’imperativo delle norme igieniche e che venivano, quindi, considerate a rischio. Si trattava dei soggetti socialmente fragili, che occupavano misere case e angusti tuguri, in vie marginali e cosparse di rifiuti. Se non era più possibile, in pieno XX secolo, l’allontanamento coatto delle masse minacciose dei derelitti fuori del contesto urbano, rimaneva, però, lo stigma contro i portatori di germi, pericolosi vettori della Spagnola, incapaci di adeguarsi alle norme igieniche dominanti.

In realtà, scrive la Tognotti, l’aggressione epidemica del 1918 costituisce un’eccezione a una costante sociale: non operò distinzioni di classe. Tuttavia, la prospettiva storica ci restituisce una novità sul piano demografico e sociale: particolarmente bersagliate dalla malattia, con una mortalità superiore a quella degli uomini, erano le donne. L’epidemia non si era incaricata di porre rimedio all’ineguaglianza di fronte ad una morte di genere, quella in guerra, che mieteva solo vittime maschili; altrove dovevano essere ricercate le ragioni di un fenomeno che colpiva la comunità ma che, all’epoca, non furono subito chiare: l’epidemia infierì in modo particolare sulle giovani donne e sulle ragazze che si erano appropriate quasi in esclusiva del compito di assistenza e di cura dei malati, nelle famiglie e fuori. Una rilevante presenza femminile si stagliava con forza sullo scenario pubblico e si concretizzava nella partecipazione alle riunioni operative, nella distribuzione dei generi alimentari, nel confezionamento dei dispositivi di protezione civile. Le donne, inoltre, supplivano la componente lavorativa maschile impiegata nella guerra, assicurando una funzione insostituibile nelle attività produttive: erano perciò particolarmente esposte al rischio del contagio.

La Spagnola, nelle tre ondate con le quali infierì su buona parte della popolazione mondiale, mieté quasi 20 milioni di vittime; una tragedia che si aggiunse a quella della guerra, nel cui contesto – le linee dei diversi fronti, nella loro condizione di debilitazione e di malnutrizione – trovò l’ambiente giusto per prosperare. Una tragedia, tuttavia, che, come si è detto, ha lasciato scarse tracce di sé nella storiografia; per questo ha un particolare valore il libro della Tognotti. La sua documentatissima ricerca può risultare utile innanzitutto alla storia della medicina, come fa notare Gilberto Corbellini nella presentazione del volume; può rendere consapevole il futuro medico che a monte delle conoscenze e delle pratiche correnti esiste un bagaglio straordinario di esperienze, fatto sia di successi sia di errori, e che egli stesso deve essere pronto a cambiare per apprendere le nuove spiegazioni a fronte dei progressi continui del sapere e delle connessioni fra le discipline mediche. L’autrice mette in evidenza il fatto che molti interrogativi sulla patogenesi, sulle caratteristiche epidemiologiche, sui modelli di mortalità specifica per età restano ancora senza risposta, mentre la comunità scientifica pone la sua attenzione all’emergere di virus influenzali percepiti come minacce capaci di sconvolgere il mondo globale e di renderlo ancora più vulnerabile sul piano economico e sociale. La comparazione con l’attualità proposta implicitamente dal volume contribuisce a formare un clima di consapevolezza culturale in relazione alle conquiste della scienza medica, ma anche alle correlazioni che vengono a istituirsi tra medicina e vivere sociale.

Il volume della Tognotti guarda al passato e centra l’attenzione sul nostro Paese, senza dimenticare le istanze che, necessariamente, una pandemia pone sul piano mondiale. E questo è senz’altro uno dei suoi elementi di forza anche sul piano formativo, allorché si voglia ricostruire eventi trascorsi per facilitare la comprensione di ciò che può accadere in caso di riproposizione del fenomeno. Si tratta di un progetto educativo ambizioso – fa notare ancora Corbellini -, che mira a reintegrare il valore culturale ed etico-sociale della medicina attraverso il recupero della dimensione storica del sapere medico. In effetti, le dinamiche delle pandemie influenzali sembrano essere esempi emblematici di come un interesse storico, articolato a più livelli, dalle ricerche paleomicrobiologiche alle reazioni socio-culturali, possa avere ricadute sul presente.

La ricerca della Tognotti contribuisce a colmare le zone d’ombra conseguenti alla rimozione della memoria, di cui molti manuali sono esempi. Fornisce una magistrale dimostrazione di come si elabora e diffonde sapere storiografico, dal momento che le origini e le caratteristiche della crisi pandemica forse più grave dell’umanità vengono ricostruite attraverso un’approfondita ricerca d’archivio, un attento esame della letteratura medica e un’estesa ricognizione dei mezzi d’informazione; il risultato è di sicuro interesse e fruibilità da parte del mondo della scuola. Mettendo in luce il rapporto tra guerra e malattie infettive, il libro mostra come i conflitti siano luoghi dell’esistenza che travalicano ogni linea di confine per intaccare le esistenze di tutti.

Le pandemie sono eventi che si ripetono nel tempo e ricorrono spesso con le stesse modalità, anche se mai in maniera del tutto uguale: il libro fornisce utili strumenti di analisi interpretativa e permette una riflessione approfondita e a tutto tondo su un argomento di grande attualità e di interesse globale.

Enrica Dondero


TOGNOTTI, Eugenia. La Spagnola in Italia. Storia dell’influenza che fece temere la fine del mondo (1918-19). Milano: FrancoAngeli, 2015. Resenha de: DONDERO, Enrica. Il Bollettino di Clio, n.14, p.157-160, dic., 2020. Acessar publicação original 

Infographie de la Rome antique / John Scheid e Nocolas Guillerat

SCHEID J Infographie de la Rome DETALHE1
Detalhe de capa de Infographie de la Rome antique /

GUILHERAT N Inforgraphie de la Rome antiqueDeux ans après l’Infographie de la Seconde Guerre mondiale, la maison d’édition Passés Composés publie L’Infographie de la Rome antique en octobre 2020. C’est la première fois que l’histoire romaine est racontée par le recours à la datavisualisation. Cet ouvrage est le fruit du travail de John Scheid, appuyé par Milan Melocco et Nicolas Guillerat qui s’est occupé du data design.

John Scheid est professeur émérite au Collège de France, responsable de la chaire « Religion, institutions et société de la Rome antique » de 2001 à 2016. Il est l’auteur de nombreux ouvrages qui ont marqué l’étude de la religion et de la pratique religieuse à Rome, comme récemment Rites et religions à Rome en 2019. Milan Melocco, ancien élève de l’École normale supérieure et agrégé d’histoire, est doctorant à Sorbonne Université et réalise une thèse intitulée « Histoire d’une route de l’Attique à l’Hellespont. L’impérialisme athénien et l’intégration d’un espace maritime du VIe s. av. J.-C. au Haut-Empire romain ». Nicolas Guillerat est data-designer, déjà aux commandes de la précédente infographie publiée chez Passés Composés.

Ce livre intéressera un public divers : aussi bien les non-spécialistes pour faire une mise au point sur l’histoire romaine, les professeurs pour avoir accès à des documents fiables et inédits utilisables avec les élèves et surtout les étudiants de licence et de CPGE, les candidats aux concours de l’enseignement qui peuvent y trouver à la fois un moyen de se mettre à niveau sur l’histoire romaine et des documents à utiliser dans les épreuves didactiques ; et enfin évidemment tout passionné d’histoire romaine.

L’avant-propos de l’ouvrage rappelle quelques problèmes spécifiques à l’histoire romaine. L’un des premiers repose sur le choix d’une chronologie précise à l’intérieur d’une histoire romaine très longue allant de sa fondation supposée en 753 av. J.-.C. jusqu’à la chute de Constantinople en 1453. Les auteurs ont décidé de se consacrer « essentiellement à l’État de Rome, la Res publica du peuple romain, comment les habitants du monde romain se définissaient ». Une fois le cadre chronologique arrêté, Ve s. av. J.-C. au IVe s. apr. J.-C., se pose la question des sources spécifiques à l’histoire romaine. De fait, les sources pour les périodes les plus anciennes sont peu nombreuses et peu compatibles avec une utilisation chiffrée. Cette spécificité explique donc un traitement « sommaire et rapide » des premiers siècles de Rome. A partir IVe s. av. J.-C., les sources deviennent plus nombreuses et plus fiables permettant à l’historien de les exploiter dans plusieurs domaines. Toutefois, à la différence de la Seconde Guerre mondiale, les sources pour la période romaine sont avares en informations chiffrées et il est difficile d’évaluer la fiabilité de celles qui nous sont parvenues.
Malgré les limites posées par les sources pour la réalisation de cet exercice, l’ouvrage, d’une belle facture comme le précédent, est divisé en trois parties thématiques, elles-mêmes divisées en plusieurs chapitres. La première partie s’intitule « Territoires et populations de l’Empire », la deuxième « Gouverner, vénérer les dieux, pourvoir aux besoins », et la troisième « La puissance militaire romaine ».

La première partie pose le cadre de l’histoire romaine en mettant en évidence la croissance du pouvoir et du monde romain. Le premier chapitre porte sur le passage progressif d’une cité-état à la constitution d’un véritable empire territorial. L’ouvrage offre plusieurs cartes intéressantes pour montrer l’évolution de la superficie de Rome et des territoires contrôlées par l’Vrbs au fil des années . Il y a également un développement centré uniquement sur l’Vrbs avec une carte de la ville de Rome au IVe siècle ap. J.-C. accompagnée d’une présentation des différentes régions urbaines. Il y a également une partie sur les fora de Rome avec une carte p. 21 très intéressante qui présente les bâtiments et la nature de ceux-ci dans les différentes places.

Le deuxième chapitre revient sur la constitution multiforme de ce que l’on peut appeler par commodité le « peuple romain », mais qui est surtout marqué par une profonde diversité. Il y a tout d’abord une présentation de l’évolution de la population de Rome qui ne met pas de côté les difficultés et les débats de la démographie antique. Une deuxième partie s’intéresse aux différents statuts juridiques avec une infographie sur les droits corrélés aux statuts civiques dans l’empire. Ce document est plus qu’utile pour faire comprendre ces différences aux étudiants de licence, mais il peut également être utilisé, en simplifiant peut-être certains éléments, avec des élèves de lycée. Une troisième partie bienvenue porte sur les clientèles sociales et politiques, phénomène particulier du fonctionnement romain, parfois difficile d’accès.

L’illustration proposée est d’ailleurs limpide permettant une bonne compréhension avec le développement écrit. Ce deuxième chapitre se termine par une présentation des structures sociales du « peuple romain ». Nous saluons l’infographie p. 32 intitulée « Les saisons de la vie d’une femme romaine » permettant de mieux comprendre le destin de la femme romaine au sein de cette société présentée comme patriarcale.
Le dernier chapitre composé d’une double page explique l’expression devenue courante de « mosaïque de cités » en remplaçant dans son contexte historique cette notion spécifique de la cité antique à travers deux exemples : la Gaule et de la Gaule Belgique.

La deuxième partie est consacrée au fonctionnement de ce vaste ensemble, en commençant par les institutions de Rome sous la République et l’Empire, sans oublier la figure si spécifique de l’empereur romain. Le premier chapitre explique le système politique romain d’un point de vue chronologique. Nous retenons l’infographie p. 39 qui permet d’expliquer clairement le fonctionnement des comices et des élections. C’est là aussi un document qui sera utile pour les étudiants. L’infographie sur la double page 42 et 43 porte sur « La naissance d’une loi sous la République et l’Empire ». Celle-ci est magnifiquement réalisée permettant de mieux comprendre ce phénomène complexe du droit romain faisant appel à toutes les composantes de la société, illustrant l’imbrication entre politique et religieux. Une dernière partie revient sur le cursus honorum.

Le deuxième chapitre porte plus précisément sur le pouvoir impérial. Il débute par une analyse de la titulature impériale et donc de l’analyse des pouvoirs de l’empereur, à partir de l’exemple de Trajan, faisant écho aux exercices d’épigraphie réalisés en histoire romaine. Il y a ensuite une explication du fonctionnement de l’administration impériale, de la garde prétorienne, devenue centrale au fil des ans, et une présentation des résidences impériales témoignant de l’évolution de l’Empire. La fin de ce chapitre est consacrée à une présentation des principales dynasties impériales par des arbres généalogiques permettant de mieux saisir les relations entre chaque empereur.

Le troisième chapitre porte sur les religions avec une présentation très savante. Ce chapitre intéressera grandement les étudiants préparant les concours de l’enseignement pour réviser certains points, mais surtout comme réservoir de documents utilisables à l’oral. Il y a tout d’abord une présentation essentielle des cultes publics et privés, ainsi que des principales divinités romaines et leur apparition d’un point de vue chronologique. La double page 60 et 61 propose une synthèse riche et claire des principaux officiants romains dans les cultes. Il y a également une étude de cas sur les Jeux séculaires qui peut s’avérer utile pour les concours. Enfin, la dernière partie s’intéresse aux monothéismes dans l’empire romain : le judaïsme et le christianisme.

Le dernier chapitre présente l’économie romaine, souvent déroutante pour le lecteur contemporain et au cœur de débats historiographiques. Ce chapitre arrive à rendre clair et accessible des spécificités romaines parfois obscures. Le premier temps explique le fonctionnement de l’économie romaine, il y a ensuite une description des besoins de Rome, de l’Italie et de l’Empire. La double page 72 et 73 offre une magnifique carte présentant les principales voies de communication ainsi que les ressources de l’Empire.

La troisième partie analyse « La puissance militaire romaine ». C’est également la partie la plus développée de cet ouvrage (environ 50 pages). Le premier chapitre revient sur les légions comme instrument de la domination romaine en commençant par un aperçu chronologique du fonctionnement de l’armée romaine des premiers siècles jusqu’à l’empire. Là encore, cette double page (p. 78-79), sera utile pour faire comprendre ce fonctionnement aux étudiants, notamment les changements qui s’opèrent à la fin de la République. Il y a également toute une description des camps et du fonctionnement d’une légion au combat qui raviront les connaisseurs d’histoire militaire. Ensuite, l’ouvrage présente les légionnaires, les cavaliers et leurs panoplies. La carte sur la double page 96-97 offre au lecteur une présentation de la répartition des légions romaines sur le territoire impérial jusqu’en 215 ap. J.-C.

Le deuxième chapitre analyse la force maritime de Rome qui a dû la développer « par la force des choses » (p. 100). Le chapitre s’ouvre sur une présentation toujours intéressante des familles des navires antiques. La page 104 porte exclusivement sur la bataille d’Actium de 31 av. J. C.

Le dernier chapitre de l’ouvrage, le dixième, revient sur les différentes guerres et campagnes qui ont marqué l’histoire de Rome. Il n’est donc pas étonnant que ce chapitre s’ouvre par un retour sur les guerres civiles romaines de l’époque républicaine avec une présentation simple, mais claire, des optimates et des populares. Il y a ensuite une analyse des guerres contre Carthage, moments également centraux dans l’histoire de la République romaine, avec une double page p. 112-113 offrant une carte retraçant les trois guerres puniques. La guerre des Gaules est également développée à la suite des guerres puniques avec une présentation cartographique et chronologique des campagnes de César. Enfin, l’ouvrage se termine sur la campagne contre Spartacus, aussi appelée troisième guerre servile, de 73 à 71 av. J.-C.

Les dernières pages de l’ouvrage proposent une bibliographie succincte pour les néophytes qui souhaiteraient approfondir certains aspects mentionnés dans cette infographie.

En définitive, cet ouvrage propose un savoir toujours savant et érudit présenté sous forme pédagogique et accessible. Il constitue une lecture agréable et stimulante pour ceux qui cherchent à approfondir leurs connaissances sur l’histoire romaine. Mais c’est aussi un outil de travail formidable pour l’enseignement et rendre accessible les spécificités de l’histoire romaine. La qualité graphique est indéniable ainsi que la volonté de donner le plus d’informations, au risque parfois de proposer des infographies un peu chargées. Ce livre offre ainsi une nouvelle façon, aussi érudite que ludique, de présenter l’histoire de Rome.

***

Et pour lire des extraits en ligne sur le site de l’éditeur, c’est par ici !

Noémie Lemennais – Professeure agrégée en lycée, doctorat en histoire romaine à l’Université de Lille, membre du bureau de la régionale APHG Nord-Pas-de-Calais.


SCHEID, John; GUILLERAT, Nicolas. Infographie de la Rome antique. Passés composés, 2020. Resenha de: LEMENNAIS, Noémie. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 27 nov. 2020. Disponível em: <https://www.aphg.fr/John-Scheid-Infographie-de-la-Rome-antique-Passes-Composes-2020>Consultado em 11 jan. 2021. Consultar publicação original

Atlas de la France médiévale. Hommes, pouvoirs et espaces du Ve au XVe siècle – Antoine Destemberg

DESTEMBERG Antoine
Antoine Destemberg / Foto: Book Note /

DESTEMBERT A Atlas de la France medievaleDESTEMBERG, Antoine. Atlas de la France médiévale. Hommes, pouvoirs et espaces du Ve au XVe siècle. Paris: Autrement, 2017. rééd. 2020. 96 p. Resenha de: PIERROT, Loïc. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG) 20 nov. 2020. Disponível em: Disponível em < https://www.aphg.fr/Antoine-Destemberg-Atlas-de-la-France-medievale-Hommes-pouvoirs-et-espaces-du>Consultado em 11 jan. 2021.

Parmi le flot de publications de la rentrée académique, on a pu apercevoir une nouvelle édition de l’Atlas de la France médiévale conçu en 2017 par Antoine Destemberg, maître de conférences en histoire médiévale à l’Université d’Artois, en collaboration avec le cartographe Fabrice Le Goff. La première édition avait en effet connu un juste succès et appelait un nouveau tirage. L’édition de 2020 comporte peu de modifications hormis quelques actualisations de la bibliographie, mais l’occasion est bonne pour rappeler la qualité de ce travail de synthèse riche de près de soixante-dix cartes.

Conçu dès l’origine comme un complément de l’Atlas de la France médiévale (2005) d’Olivier Guyotjeannin et Guillaume Balavoine, l’Atlas d’Antoine Destemberg propose de parcourir les dix siècles du Moyen Âge en se focalisant sur les aspects politique, économique, social et culturel de la période. Les cartes se distinguent par leur précision et leur clarté que complètent habilement quelques graphiques soignés. L’historien et le cartographe proposent une approche multiscalaire en donnant à voir aussi bien des cartes régionales que locales, voire quelques plans simplifiés de bâti. Ces derniers ne concernent toutefois que des espaces bien connus des médiévistes – ainsi l’Île de la Cité à Paris, le palais des papes d’Avignon ou l’abbaye de Cluny – et, en dépit de leur intérêt pédagogique, on regrette que d’autres tentatives de représentation à une échelle locale n’aient pas été esquissées. Quoi qu’il en soit, la conception de l’Atlas ne manque pas de recul critique et rend compte de la difficulté d’appréhender l’espace au Moyen Âge. Le jeu d’échelles cartographiques, commenté au fil des pages par A. Destemberg, permet de faire remarquer que les notions de « territoire » et de « frontière » n’étaient pas aussi nettement définies au Moyen Âge qu’aujourd’hui. Il rappelle aussi que toute production cartographique a son histoire et sa perspective et que ni la carte ni les concepts ne sont anodins. Il faut ainsi souligner l’efficacité du dialogue entre les figurés et les explications historiques : c’est là que l’atlas trouve sa pertinence et son utilité. Les textes se veulent accessibles à un
public large, historien ou non, et l’ensemble peut servir de matériau solide pour les étudiants et les enseignants. Antoine Destemberg se dit conscient des limites de son ouvrage, ayant renoncé ici et là à l’exhaustivité en privilégiant l’intelligibilité de la synthèse, mais cet aveu l’honore : c’est bien d’un plaidoyer pour une vulgarisation scientifique avertie dont il s’agit. Une de ces entreprises éditoriales dont notre discipline a besoin, autant que des études scientifiques de fond.

Loïc Pierrot – Élève à l’École nationale des Chartes, étudiant à l’École normale supérieure de Paris.

Consultar publicação original

[IF]

 

The Identitarians: The Movement Against Globalism and Islam in Europe | José Pedro Zúquete

Em 2010, às vésperas da avalanche de protestos provocada pela crise econômica de dois anos antes, José Pedro Zúquete, pesquisador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, publicou Struggle for the World: Liberation Movements for the 21th Century (Zúquete e Lindholm 2010). Escrito em parceria com o antropólogo norte americano Charles Lindholm, o livro traça um grande panorama dos principais movimentos sociais e organizações políticas que se opunham ao que os autores chamam de globalização capitalista. Fossem de esquerda, como os zapatistas no México, ou de extrema direita, como o Front National francês, a publicação destaca como esses grupos operavam a partir de uma forte crítica ao estrangulamento dos modos de vida e de identidades locais.

As duas décadas que se seguiram ao fim da Guerra Fria foram marcadas pela integração do mundo em blocos regionais e pela criação de instituições supranacionais para administrá-los. Até que a expansão progressiva e desenfreada sofreu inesperadamente um grande choque. As fissuras na ordem estabelecida já existiam, é verdade, mas elas nunca ficaram tão claras quanto nos anos que se seguiram à crise de 2008. E foi seguindo personagens que viviam nessas fissuras que Zúquete passou a acompanhar a atuação de grupos políticos radicais contemporâneos. Em artigos e livros dedicados a grupos tão diversos como os praticantes da tática black block e skinheads portugueses, o sociólogo português construiu uma obra robusta sobre alguns dos principais movimentos de contestação no mundo hoje. Leia Mais

Intellectuals In The Latin Space During The Era Of Fascism: Crossing Borders | Valeria GAlimi e Annarita Gori

Na década de 2010, especialmente após a onda internacional de protestos que teve início com a Primavera Árabe em 2011, tornou-se clara uma ascensão de movimentos, ideologias, culturas políticas, partidos e governos de extrema-direita, alguns abertamente (neo)fascistas, com um poder de influência sobre a política europeia que não era visto desde os anos 1930 (Löwy 2015, 653). Nos Estados Unidos, o cenário das eleições presidenciais de 2016, em que foi eleito o candidato republicano Donald Trump, também se caracterizou pela emergência de grupos de direita radicais que vão desde a direita institucionalizada com o Tea Party do Partido Republicano, até discursos mais radicais na alternative right e nos movimentos neofascistas/neonazistas, que se tornaram atores da mais alta relevância sob o governo Trump (Alexander 2018, 1009). No Brasil, a eleição de Jair Bolsonaro em 2018 demarcou essa guinada à direita radical, armamentista, evangélica e tecnológica que se difunde rapidamente pela internet.

Entre hoje e o século passado, as direitas radicais, e especialmente os fascismos e neofascismos, guardam em comum o nacionalismo chauvinista e xenófobo, articulado para a exploração dos “pânicos de identidade” que surgem nos campos conservadores, com a violência cultural com que o capitalismo transforma estruturas socioeconômicas e formas de vida, gerando sentimentos “antissistema”, “anti-cosmopolitas”, “antidemocráticos”, “anti-pluralistas”, “anticomunistas”, “anti-globalistas”, etc. Majoritariamente, são favoráveis a políticas autoritárias de segurança pública, como a introdução ou reabilitação da pena de morte. (Löwy 2015, 654). Em resumo, para utilizarmos uma expressão de Francisco Carlos Teixeira da Silva (2000, 179) inspirada na interpretação de Zeev Sternhell (Cf.: Sternhell 1995, 3-35) do fascismo como cultura política, a “negação do outro” continua a ser a tônica dos discursos e práticas fascistas ao longo do tempo. Leia Mais

Una historia de la verdad en Occidente: ciencia, arte, religión y política en la conformación de la cosmología moderna | Mauricio Nieto Olarte

Un destacado historiador de la ciencia es el autor de este libro, un colombiano quien previamente había producido valiosos análisis sobre las expediciones científicas y el naturalismo en España y América en las postrimerías del período colonial ( Nieto Olarte, 2006 , 2007 ). En este ambicioso trabajo analiza el desarrollo del conocimiento racional y la emergencia del eurocentrismo político, cultural y científico a partir del siglo XVIII. La mayoría de los 21 capítulos de este estudio se concentran en los saberes producidos en Europa durante la Edad Moderna (1492-1789). Es decir, se ocupan de temas como el Renacimiento italiano, la astronomía de Galileo, el empirismo de Francis Bacon y la física de Isaac Newton. Los capítulos iniciales se remontan a las discusiones filosóficas de Platón y Aristóteles sobre los límites y la esencia del conocimiento, así como a la noción de una única verdad del monoteísmo cristiano. En sus capítulos finales aborda la construcción del carácter enciclopédico de la obra de Alexander von Humboldt y hace un recuento del positivismo de Auguste Comte. Para encontrar una obra de envergadura parecida en América Latina es necesario remontarse a Aldo Mieli (1952) , el inmigrante italiano que publicó en varios volúmenes una historia de la ciencia europea en la Argentina de los años 1950. Luego de este esfuerzo, la mayoría de los historiadores latinoamericanos de la ciencia y de la medicina nos ocupamos de la recepción, la negociación y la participación de investigadores latinoamericanos en circuitos internacionales del conocimiento. Leia Mais

Simon de Montfort (c. 1170–1218). Le croisé, son lignage et son temps – AUREL et al (FR)

AUREL, Martin; LIPPIATT, Gregory; MACÉ, Laurent (dir.). Simon de Montfort (c. 1170–1218). Le croisé, son lignage et son temps. Turnhout (Brepols) 2020. 286p. Resenha de: BALARD, Michel. Francia-Recensio, Paris, v.4, 2020.

Figure controversée de son temps et jusqu’au nôtre, Simon de Montfort méritait incontestablement que les historiens d’aujourd’hui reprennent en toute sérénité l’étude de son action dans la croisade albigeoise, de son lignage tant en France qu’en Angleterre, et des idéaux à la base de ses faits et gestes. Un colloque tenu à Poitiers en mai 2018 y pourvut et les communications qui y furent présentées constituent le présent ouvrage, conçu en trois parties: la croisade albigeoise, l’homme, son entourage et ses représentations, enfin le lignage et sa culture.

Jean-Louis Biget, spécialiste reconnu de l’histoire religieuse en Occitanie, analyse la croisade contre les Albigeois, à partir du 15 août 1209, date à laquelle Simon de Montfort en prend la direction. Ce fut une guerre sans merci, mue par un esprit de croisade, de réforme morale et de purification spirituelle, qui cherche à éliminer les hérétiques, jugés pires que les Sarrasins. L’auteur montre les difficultés de la conquête, dues au manque d’effectifs et de moyens financiers, rendant illusoire le gouvernement des villes et des territoires conquis. Aux années triomphales (1214–1215) conclues par le IVe concile du Latran qui accorde au vainqueur tout le pays conquis, succède l’échec marqué par l’incapacité d’occuper le territoire occitan, la révolte de Toulouse et la mort de Simon devant la ville qu’il assiégeait (1218). D’heureuses cartes permettent de suivre la marche des croisés et l’organisation de leurs conquêtes.

C’est à cette tâche que dès 1212 le vainqueur s’adonne en faisant publier par un parlement croisé les »Statuts de Pamiers«. Largement inspiré de la réforme morale néo-grégorienne, ce texte cherche à imposer au Midi occitan la coutume française en matière de fief, de mariage, de statut des clercs, de corvées et de taille, tout en interdisant l’ordalie, la vengeance privée et les exactions seigneuriales. Gregory Lippiatt en compare les clauses avec d’autres textes contemporains, les »Assises d’Antioche«(avant 1219), le »Livre au Roi« (vers 1200) la »Bulle d’or« promulguée en 1222 par le roi André II de Hongrie ou les »Assises de Capoue« dues à Frédéric II (et non à Frédéric Ier, p. 43). À la différence de ces derniers, les »Statuts de Pamiers« établissent avec la »Bulle d’or« une étroite connexion entre croisade et réforme morale, mais ils n’auront qu’une éphémère application.

Martin Alvira retrace les rapports entre Simon de Montfort et Pierre II d’Aragon, depuis leur première rencontre en novembre 1209, jusqu’à la bataille de Muret (13 septembre 1213) où le »comte du Christ«, comme le dénomment certains chroniqueurs, serait venu s’apitoyer sur le cadavre du roi d’Aragon, tué par des chevaliers croisés. Le désir de revanche animera désormais les vaincus, faisant de Simon le bourreau de leur peuple.

La mort de Pierre II fait de son jeune fils, Jacques, otage de Simon de Montfort dès avant Muret, l’héritier du trône d’Aragon. Le légat pontifical, Pierre de Bénévent, recueille le jeune prince et en assure la protection face au conseil de régence. Damian Smith montre comment les nobles aragonais vont se préoccuper plutôt de leurs intérêts dans le Sud de la péninsule, face aux Almohades, que de leur implication dans les affaires de l’Occitanie.

Les démêlés de Simon de Montfort en Angleterre font l’objet de l’exposé, quelque peu confus, de Nicholas Vincent. Comte de Leicester jusqu’en 1209, Simon est privé de ses droits sur son comté par Jean sans Terre, les retrouve en plusieurs occasions, les perd à nouveau, de sorte qu’il devient l’inspirateur des barons anglais hostiles au roi. L’engagement de Simon dans la croisade albigeoise serait la conséquence directe de ses déboires concernant le comté de Leicester. Son fils, Simon VI, bénéficie à son tour de la faveur des barons anglais, en cultivant le souvenir et les relations de son père.

Laurent Macé étudie ensuite les sceaux successifs du lignage des Montfort, dont il donne des descriptions précises, sans malheureusement montrer autre chose que deux petites illustrations. Son exposé ainsi que le précédent (p. 125–126), auraient nécessité plusieurs clichés des types sigillaires successivement adoptés par Simon de Montfort et ses descendants.

Que devient la croisade après la mort de son chef devant les murs de Toulouse en 1218? Daniel Power, déplorant des sources moins nombreuses sur les événements postérieurs, rappelle la mort de Guy de Montfort lors du siège de Castelnaudary en 1220, la prise de Montréal par les Toulousains en février 1221, la participation d’Hugues de Lusignan, la fondation de l’ordre de la Foi en Jésus-Christ, puis en 1224 la trêve conclue avec les comtes de Toulouse et de Foix, par Amaury de Montfort, laissant au roi Louis VIII le soin de poursuivre la croisade dans le Midi.

Les relations des Montfort avec les Capétiens sont rendues difficiles par leur position ambivalente entre France et Angleterre. Lindy Grant retrace l’ascension du lignage depuis Simon Ier (entre 1060 et 1087): à partir d’une petite seigneurie dans la forêt royale des Yvelines (Montfort), la famille grâce à des mariages heureux acquiert le comté d’Évreux, puis celui de Leicester, mais est victime du conflit entre Capétiens et Plantagenêt. Renonçant à ses droits sur le Languedoc en 1224, Amaury, fils de Simon, est accueilli à la cour de Louis VIII, cède ses possessions anglaises à son frère Simon VI, et devient l’un des principaux conseillers de Blanche de Castille, durant sa régence. Il participe en 1239 à la croisade des barons dans le royaume de Jérusalem, est fait prisonnier en Égypte. Racheté, il meurt en Pouille sur la route du retour.

Sophie Ambler s’attache ensuite à décrire l’influence prépondérante de Simon V sur son fils Simon VI. Mu par les mêmes idéaux, faisant de la guerre sainte sa raison d’être, adoptant un sceau semblable à celui de son père (p. 199: pas d’illustration), Simon VI devient le leader de la révolution menée par les barons anglais contre le roi Henri III et son fils Édouard, mais est tué par les fidèles du roi à la bataille d’Evesham le 4 août 1265.

C’est à son expérience de gouverneur de la Gascogne anglaise que s’intéresse Amicie Pélissié du Rausas. Ayant épousé Éléanor, sœur d’Henri III, Simon VI en 1248 est dépêché par le souverain en Gascogne en pleine anarchie. Conscient d’une mission politico-religieuse et d’un souci de bon gouvernement, mais s’opposant avec violence aux coutumes et aux droits ancestraux des Gascons, Montfort se met rapidement à dos les seigneurs locaux, le peuple et l’archevêque de Bordeaux, Géraud de Malemort. Rappelé à Londres en 1252, à la suite des »dépositions gasconnes« rédigées contre lui, il est désavoué par le roi, ce qui explique sans doute son rapprochement avec les barons anglais hostiles au souverain.

Pendant moins d’un an (1265), le comté de Chester est devenu possession de Simon VI. Soutenu par des propriétaires terriens locaux, mais rejeté en raison de son gouvernement autocratique, comme le montre Rodolphe Billaud, Montfort le perd définitivement à sa mort en août 1265, au profit du futur Édouard Ier, suffisamment habile pour s’imposer en confirmant les droits et coutumes du comté.

Le dernier article, dû à Caterina Girber, étudie l’héraldique imaginaire des Montfort, oscillant entre flatteries et diffamations dans le roman arthurien ou dans deux manuscrits de l’Apocalypse.

Vient enfin une lumineuse conclusion de l’ouvrage par Martin Aurell qui développe trois thèmes illustrant la vie du lignage: Simon V et son fils représentent deux figures controversées qu’il convient de comprendre en les situant dans la société de leur temps. Mus par une ambition princière, écartelés entre Capétiens et Plantagenêt, ils échouent à garder un domaine de part et d’autre de la Manche. Aurell insiste enfin sur la ferveur religieuse du lignage, embu d’un idéal chevaleresque cléricalisé, mais aussi lieu de transmission de savoirs et de valeurs culturelles. L’extrême ambition de ses membres, pour lesquels la guerre sainte est une affaire de famille et un moyen d’expansion territoriale, les place dans une situation inconfortable, tantôt au service des souverains, tantôt à la tête d’une conjuration hostile au pouvoir royal.

De ce bel ouvrage émerge une image nuancée de Simon V et de ses descendants. Il est dommage qu’il y manque un exposé sur leurs participations aux croisades d’Orient (1204 pour Simon V, croisade des barons pour Amaury). Un tableau généalogique aurait été d’une grande utilité pour suivre la stratégie matrimoniale, moyen de leur ascension. On peut enfin déplorer la quasi absence de toute illustration et d’un index indispensable dans tout ouvrage de cette qualité.

Michel Balard – Paris.

Acessar publicação original

[IF]

 

Troyes 1420. Un roi pour deux couronnes – BAUDIN; TOUREILLE (FR)

BAUDIN, Arnaud; TOUREILLE, Valérie (dir.). Troyes 1420. Un roi pour deux couronnes. Gand (snoeck), 2020. 408p. Resenha de: OBERSTE, Jörg. Francia-Recensio, Paris, v.4, 2020.

Am 21. Mai 1420 wurde in der Kathedrale von Troyes ein Friedensvertrag zwischen England und Frankreich besiegelt, der schon von den französischen Zeitgenossen mit gemischten Gefühlen aufgenommen und von der französischen Historiografie seit dem 18. Jahrhundert als »honteux traité« disqualifiziert wurde. Die Ergebnisse dieses Staatsaktes waren für alle Beteiligten, insbesondere die Königshäuser der Valois und Lancaster, aber auch für die Position Herzog Philipps des Guten von Burgund von unmittelbarer und einschneidender Wirkung: Der Dauphin verlor seinen Erbanspruch auf den französischen Thron; der in der Schlacht von Azincourt 1415 siegreiche englische Herrscher, Heinrich V., übernahm als »Regent in Frankreich« faktisch die Regierungsgeschäfte in Paris; die in Troyes vereinbarte und wenige Wochen darauf vollzogene Ehe Heinrichs mit Katharina von Valois sollte den Grundstein für eine neue Dynastie englisch-französischer Doppelmonarchen legen; der Herzog von Burgund schließlich gewann durch sein Bündnis mit den Lancaster eine bis dahin ungekannte und autonome Machtstellung in Frankreich.

Bis heute erfreuen sich der Vertrag von Troyes und die darauf folgende Phase der englischen Besetzung größerer Teile Frankreichs einschließlich der Hauptstadt Paris einer deutlich breiteren Resonanz in der englischen und internationalen Forschung als in der französischen. Daher ist es hervorzuheben, dass dieses Ereignisses am Ort des Geschehens unter der wissenschaftlichen Leitung von Valérie Toureille (Université de Cergy-Pontoise) und Arnaud Baudin (Université Paris 1) in einer großen Ausstellung (vom 4. September 2020 bis 3. Januar 2021) gedacht wird. Zu diesem Anlass wurde ein wissenschaftlicher Katalog vorgelegt, in dem die politischen, sozio-ökonomischen und kulturellen Kontexte des Vertrags von führenden französischen und internationalen Forscherinnen und Forschern aufgedeckt und zugleich die vielfältigen Exponate der Schau großformatig in beeindruckender Qualität gezeigt werden.

Während sich die drei einführenden Beiträge von Philippe Pichery, dem Präsidenten des Conseil départemental de l’Aube, den wissenschaftlichen Organisatoren sowie von Philippe Contamine mit der höchst unterschiedlichen Rezeption und Interpretation des Geschehens von Mai 1420 in seinen Auswirkungen auf das zeitgenössische Machtgefüge in Europa und in der langen Perspektive bis heute befassen, folgt die weitere Einteilung des über 400 Seiten umfassenden Bandes den Sektionen der Ausstellung: »Der politische Kontext (1407–1419)«, »Der Vertrag von Troyes«, »Leben in der Champagne in der ersten Hälfte des 15. Jahrhunderts«, »Krieg und Rückeroberung« sowie abschließend: »Die Erinnerung an den Vertrag von Troyes«.

Mit Anne Curry und Christopher Allmand sind zwei herausragende Vertreter der englischen Forschung an der Rekonstruktion der Kontexte beteiligt: Zunächst verfolgt Édouard Bouyé skizzenhaft die lang währende englische Obsession einer englisch-französischen Doppelmonarchie von der Zeit König Eduards III. (1327–1377) bis ins frühe 19. Jahrhundert. Vor diesem Hintergrund wird klarer, dass die Ereignisse von Troyes den Punkt in einer Jahrhunderte währenden Beziehung markieren, an dem zum einzigen Mal eine Realisierung dieser Idee greifbar nahe schien.

Bertrand Schnerb übernimmt es, die korrodierende Herrschaft in Frankreich in den späten Jahren König Karls VI. zu umreißen, die von Attentaten in der Königsfamilie, dem eskalierenden Bürgerkrieg zwischen Bourgignons und Armagnacs und von der zunehmenden Unfähigkeit Karls VI., seine Herrschaft auszuüben, geprägt war. Ein wichtiges Resultat dieses Beitrags liegt in der Erkenntnis, dass bereits vor der Niederlage von Azincourt der Herzog von Burgund zur bestimmenden Figur der französischen Politik avanciert war.

Christopher Thomas Allmand stellt in seinem Beitrag klar, dass bereits die zeitgenössischen Bewertungen der Ursachen der »guerre de Cent Ans« durchaus variierten: als Lehnskonflikt zwischen dem französischen Lehnsherrn und seinem rebellischen Lehnsmann auf dem englischen Thron, als Erbfolgekonflikt um den französischen Thron oder als Territorialkonflikt zweier aufstrebender europäischer Nachbarreiche. In seinem Fazit hebt er die besonderen militärischen Talente und Erfolge Heinrichs V. als Hauptursache für die dynamischen politischen Entwicklungen der Jahre 1415–1420 hervor. Alain Marchandisse verfolgt schließlich die Rolle der burgundischen Herzöge im Umfeld des Vertrags von Troyes. Dieser Teil wird abgeschlossen durch insgesamt 14 knappe Objektskizzen zu so unterschiedlichen Exponaten wie dem Schädel des 1419 ermordeten Herzogs Johann Ohnefurcht oder einem Portrait Heinrichs V. aus dem frühen 16. Jahrhundert.

Das eigentliche Geschehen im Mai 1420 in Troyes ordnen Cléo Rager, Anne Curry, Martin Kintzinger, Ghislain Brunel, Philippe Contamine und andere ein. Die Präsenz der unterschiedlichen Höfe, die aus Troyes die Kulisse für einen bedeutenden europäischen Staatsakt machte, wird hier ebenso beleuchtet wie das politische Tauziehen um einzelne Klauseln oder diplomatische und archivalische Aspekte der beiden überlieferten Vertragstexte (in französischer und lateinischer Sprache).

Unter den eindrücklichen Exponaten, die jeweils im Mittelpunkt eines Beitrags stehen, ragt unter anderem eine durch Anne Curry besprochene Truppenliste mit Verstärkungen für König Heinrich V. von Frühjahr 1420 hervor, die eindringlich klar macht, dass die englische Position trotz des Siegs von Azincourt und der burgundischen Unterstützung keineswegs unangefochten war. Ein anderes Leitobjekt stellt eine Goldmünze König Heinrichs VI. mit dem charakteristischen Doppelwappen aus fleurs de lys und den Lancaster-Löwen auf dem Revers dar. Zur Herrschaft dieses ersten und einzigen englisch-französischen Doppelmonarchen (1431–1435) gibt es außer einer kurzen Bildbesprechung leider keinen weiteren Beitrag.

Mit der regionalen Perspektive auf die burgundische Champagne im frühen 15. Jahrhundert führt der Band vom vorrangig politischen Interesse am Staatsakt von 1420 weg und leistet eine breite sozial-, wirtschafts- und kulturhistorische Einführung anhand einer großen Bandbreite von Exponaten und Dokumenten: Arnaud Baudin widmet sich der historischen Landschaft Champagne, Aurélie Gauthier der blühenden urbanen Kultur, Élisabeth Lusset der Kirchenorganisation, Véronique Beaulande-Barraud der Frömmigkeitspraxis und eine Reihe weiterer Beiträge und Objektskizzen der reichen materiellen Kultur und Schriftüberlieferung.

Auch die folgende Sektion zu »Guerre et Reconquête« geht von der besonderen Lage der Champagne zwischen den burgundischen Kernterritorien und der Île-de-France aus. Laurent Vissière, Olivier Renaudeau, Brice Collet, Alain Morgat und Aleksandr Lobanov beleuchten zunächst militärische Aspekte wie die Ausstattung der rivalisierenden Heere mit Waffen oder den Aufbau eines Netzes englischer Garnisonen in der Champagne. Zu den zentralen politischen Episoden in der Folge des Vertrags von Troyes zählen die Regentschaft des Herzogs Johann von Bedford in Frankreich, der in diesem Amt seinen 1422 in Vincennes verstorbenen königlichen Bruder beerbt, sowie das Auftreten Johannas von Orléans und das Wiedererstarken der Valois. Mit Anne Curry und Valérie Toureille kommen hier zwei der besten Kennerinnen der Materie zum Zuge. Unter den vielfältigen Exponaten beeindruckt der erhaltene Krönungsbaldachin Karls VII., dessen politische Ikonografie Élisabeth Antoine-König als »anti-traité de Troyes« charakterisiert.

Mit der Rezeption des Vertrags von Troyes schließlich befassen sich vier abschließende Beiträge, die so unterschiedliche Themenfelder eröffnen wie den Blick auf Heinrich V. im Werk William Shakespears (Line Cottegnies), den Frieden von Amiens im März 1802 zwischen Großbritannien und dem napoleonischen Fankreich (Patrice Gueniffey), das französisch-englische Bündnis von Juni 1940 (Jenny Raflik) oder den Hundertjährigen Krieg im Kino (François Amy de La Bretagne).

Ein etwa 100 Jahre altes Foto vom Vorplatz der Kathedrale von Troyes erinnert an die Feierlichkeiten zu Ehren von Jeanne d’Arc, die hier 500 Jahre zuvor begeistert empfangen worden war. Nach dem Ersten Weltkrieg trug die Pucelle zur Versöhnung von Republikanern und Katholiken in Frankreich bei, wie Nicolas Dohrmann ausführt. Sorgfältige Register und eine Bibliografie runden diesen aufwändig gestalteten Katalogband ab, der die wissenschaftlichen Perspektiven und materiellen Überlieferungen zu einem wichtigen Datum der europäischen Geschichte auf eindrucksvolle Weise zusammenführt.

Jörg Oberste – Regensburg.

Acessar publicação original

[IF]

El Trienio Liberal. Revolución e independencia (1820-1823)

O bicentenário do triênio liberal (1820-1823-2020-2023) espanhol ensejou comemorações e lançamentos menores do que o impacto dos eventos de duzentos anos atrás. Se ninguém mais afirma, como Menéndez Pelayo, que foi um tempo “patológico” na história espanhola [3], a atenção concedida ainda é pequena, principalmente se comparada aos conflitos atlânticos da década anterior.

A “Espanha de Fernando VII” voltou a ser estudada com afinco ao menos desde a célebre obra de Artola, [4] mas o triênio liberal ainda tinha como seu livro mais conhecido um opúsculo do começo da década de 80, a síntese de Alberto Gil Novales [5]. Desde então, houve uma renovação historiográfica gigantesca, principalmente na história política. Ganharam maior fôlego os estudos sobre territórios específicos, sobre a imprensa, novas sociabilidades e, principalmente, aqueles que “desnacionalizavam” os episódios [6].

Dentro dessa perspectiva “internacionalista”, o triênio liberal tem dois atrativos únicos. O primeiro é seu inegável impacto europeu, pois o levantamiento de Riego foi feito numa Europa que, no começo de 1820, era dominada pela Santa Aliança e pelas monarquias restauradas. Ao impulso espanhol, houve também revoluções importantes em Portugal e nos territórios italianos. O segundo é sua faceta atlântica. Se no começo da década de 20 se concretizaram as independências na América, também foi naqueles anos que mais uma vez se colocou em jogo a possibilidade de uma nação atlântica, experiência fundamental tanto para o mundo hispânico quanto para oportuguês [7]:

La revolución española de 1820 tuvo desde el inicio una repercusión que trascendía al espacio peninsular. En primer lugar, porque habiendo estallado en el seno de las tropas reunidas en Andalucía para combatir la insurrección de los territorios de ultramar, su triunfo supuso la paralización de la política de expediciones militares que pretendía devolver los territorios de América a la obediencia de la monarquía española. (…) Y, en segundo lugar, porque el triunfo del movimiento en España colocó en el primer plano de la actualidad el valor de la Constitución de 1812 como instrumento para transformar las monarquías en regímenes liberales. (p. 155)

É justamente no esforço de desnacionalizar o período que a nova obra de Pedro Rújula e Manuel Chust faz sua maior contribuição ao condensar em poucas páginas um apanhado das últimas contribuições historiográficas dos dois lados do Atlântico. A envergadura espacial da obra também resulta, em parte, das trajetórias individuais dos dois autores. Ao passo que Chust tem enveredado pelo tema americano, Rújula é especialista nas questões aragonesas entre o triênio liberal e as guerras carlistas [8].

O resultado é um livro único que atualiza o objetivo de Gil Novales nos anos 80, o de fazer uma obra de referência para os estudos do triênio liberal, agora juntando a questão americana, antes ausente. De fato, não apenas adiciona o tema das independências, mas o toma como um dos mais importantes para definir os rumos do Triênio.

Há um esforço de distanciamento dos antigos preconceitos acerca do Triênio, de ter sido um intervalo liberal de pouca profundidade, com baixa popularidade entre as classes populares e tomado pelo caos das facções. Para isso, enfatiza principalmente a experiência política que significou, extrapolando o caráter parlamentar e difundindo novas culturas políticas tanto entre os liberais – exaltados e moderados [9] – como entre os absolutistas:

el marco constitucional establecido por la revolución de 1820 permitió la aparición de una esfera pública donde los ciudadanos comenzaron a participar según sus posibilidades y sus intereses. El Gobierno moderado hubiera deseado que la política se hiciera en el seno de las instituciones, pero existían otros actores que habían experimentado la posibilidad de actuar en el terreno político y que no estaban dispuestos a renunciar a potenciales parcelas de poder. El debate fue muy intenso. (p. 46)

Como é negada a tese reacionária de que a Constituição de 12 e o primeiro liberalismo eram ideias importadas, exógenas à Espanha, resta aos autores pincelar respostas a questões inevitáveis para o triênio. Por que fracassou? Qual a relação entre os liberais e as independências na América?

A resposta que os autores oferecem para explicar o “fracasso liberal” passa pela atuação do rei Fernando VII e pela reação estrangeira. A tentativa liberal de reformar a monarquia, desde as propostas moderadas de instituir uma segunda câmara, tendo os exemplos ingleses e franceses como mote, até as mais revolucionárias, com as Sociedades Patrióticas e a diminuição do poder da nobreza e da Igreja, criava uma ameaça institucional permanente às monarquias mais absolutistas. Daí que foi justamente a Rússia a dar maior apoio a Fernando VII para abolir qualquer tipo de Constituição. Ao mesmo tempo, a invasão francesa de 1823 servia para reposicionar a monarquia bourbônica na balança internacional de poder, enfraquecida como estava após as derrotas napoleônicas.

É perceptível que a resposta de Chust e Rújula nega a própria ideia de “fracasso liberal”. O triênio acabou não por seus erros internos, mas por um verdadeiro golpe reacionário europeu. A inversão procedida pelos autores também é uma negação da historiografia que visava mais as questões socioeconômicas da época, muitas vezes crítica à ineficiência prática das medidas liberais. [10]

Quanto à questão americana, os autores também se alinham com a nova história política, principalmente na negação das nacionalidades pré-existentes [11]. Logo, não se poderia explicar as independências como luta da nação mexicana para se libertar da Espanha. Com a tomada do poder pelos liberais, os autores também negam que houvesse uma arbitrariedade por parte da Espanha em relação aos americanos, visto que a igualdade estava concedida pela Constituição, que transformava o Império num gigantesco Estado-Nação. Essa tese igualitária tem mais oponentes historiográficos, como Portillo Váldes.[12]

Recusando as explicações tradicionais, os autores mais uma vez se voltam às questões políticas, pensando principalmente o caso novohispano, o de maior repercussão ao longo do Triênio e também aquele sobre o qual Manuel Chust tem mais familiaridade.[13] Com base na análise do Plano de Iguala [14], a conclusão do livro é que um dos principais motivos para a independência foi o caráter revolucionário da Constituição de Cádis, que tirava poder da elite Criolla para distribuir a outros setores sociais, com destaque para o voto indígena. Sendo assim, a independência ganhava contornos moderados e até reacionários, em perspectiva já ensaiada também para o caso brasileiro:

Para la insurgencia fue mucho más difícil enfrentarse políticamente al liberalismo doceañista que al monarquismo absolutista, dado que ahora podían participar de los mismos presupuestos ideológicos, pero no políticos ni nacionales. Y además estaban los intereses particulares de las diversas fracciones del criollismo, cada vez más proclives a la independencia. No porque esta solo estaba ganando por las armas, sino porque su creciente moderantismo le podía asegurar un control social y político que el liberalismo doceañista podía poner en duda al ser más progresista en bastantes medidas políticas y sociales como, por ejemplo, dar voto a los indígenas universalmente (p. 112).

Livro de entrada nos estudos do período e de síntese de uma nova perspectiva política, El Trienio Liberal é uma defesa do período do liberalismo espanhol do início do século XIX. É notável a simpatia dos autores com os protagonistas estudados, como se escrever a história deles fosse também escrever a defesa de sua luta. Poucas épocas hispânicas foram vividas tão passionalmente quanto aqueles anos, daí que esse resgate histórico não deixa de ser um tributo àqueles sonhos e ilusões.

Notas

3MENÉNDEZ PELAYO, Marcelino. Historia de los heterodoxos españoles. Alicante: Biblioteca Virtual Miguel de Cervantes, 2003, p. 1362. Vide DURÁN LÓPEZ, Fernando. “Menéndez Pelayo contra Blanco White, o la heterodoxia como patología.” TEJA, Ramón; ACERBI, Silvia. (org.). Historia de los heterodoxos Españoles”. Estudios. Santander: PubliCan, Ediciones de la Universidad de Cantabria, 2012.

4. ARTOLA, Miguel. La España de Fernando VII. Madri: Espasa, 1999 [1968].

5. GIL NOVALES, AlbertoEl trienio liberal. Madri: Siglo XXI, 1980.

6. ROCA VERNET, JordiPolítica, liberalisme i revolució. Barcelona, 1820-1823. 840 f. Tese (Doutorado em História Moderna e Contemporânea). Universitat autònoma de Barcelona, Barcelona, 2007; El argonauta español, nº 17, 2020. Exemplar dedicado a “El trienio liberal en la prensa contemporánea (1820-1823); RUIZ JIMÉNEZ, MartaEl liberalismo exaltado. La confederación de comuneros españoles durante el trienio liberal. Madri: Fundamentos, 2007. LA PARRA, Emílio. RAMÍREZ ALEDÓN, Germán (coord.) El primer liberalismo: España y Europa, una perspectiva comparada. Valencia: Colección literaria, 2003.

7. BERBEL, Márcia Regina. “A constituição espanhola no mundo luso-americano (1820-1823). Revista de Indias, vol. LXVIII, nº 242, 2008.

8. HUST, Manuel. La cuestión nacional americana en las Cortes de Cádiz. Valencia: Centro Francisco Tomás y Valiente UNED Alzira-Valencia. Fundación Instituto Historia Social/ Instituto de Investigaciones Históricas de la Universidad Nacional Autónoma de México, 1999; Pedro Victor Rújula. Constitución o muerte: el Trienio Liberal y los levantamientos realistas en Aragón (1820-1823). Zaragoza: Edizións de l’Astral, 2000.

9. pesar dos nomes já consagrados, os estudos específicos sobre cada um desses “liberalismos”, inclusive para apontar seus muitos pontos de fricção internos, são bastante recentes. Vide MORANGE, ClaudeEn los Orígenes del moderantismo decimonónico. El Censor (1820-1822): promotores, doctrina e índice. Salamanca: Universidad de Salamanca, 2019; e BUSTOS, SophieLa nación no es patrimonio de nadie. El liberalismo exaltado en el Madrid del trienio liberal (1820-1823): Cortes, Gobierno y Opinión Pública. Tese (Doutorado em História). Universidad Autónoma de Madrid, Madri, 2017.

10. A crítica vinha desde os próprios liberais exilados, passando depois por Marx e sua famosa análise: “en la época de las Cortes, España se encontró dividida en dos partes. En la Isla de León, ideas sin acción; en el resto de España, acción sin ideas”. New York Daily Tribune, 27/10/1854. Disponível em MARX, Karl; ENGELES, Friederich. La Revolución española. Artículos y crónicas, 1854-1873. Madri: AKAL, 2017. A crítica foi atualizada para os termos mais técnicos da historiografia na influente visão de FONTANA, JosepLa crisis del Antiguo Régimen, 1808-1823. Barcelona: Crítica, 1979.

11. As referências para o assunto, por vezes em vieses muito diferentes, são GUERRA, François-XavierModernidad e independencias. Ensayos sobre las revoluciones hispánicas. Cidade do México: Fondo de Cultura Económica e Fundación MAPFRE, 1992; e RODRÍGUEZ, JaimeThe independence of Spanish America. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.

12. PORTILLO VÁLDES, José MaríaCrisis Atlántica – Autonomía e independencia en la crisis de la monarquía. Madri: Marcial Pons Historia, 2006.

13. Embora Chust tenha organizado livros sobre a independência em toda a América, nos artigos costuma trabalhar mais com a do México, como emCHUST, Manuel; SERRANO, José Antonio. “El ocaso de la monarquía: conflictos, guerra y liberalismo en Nueva España. Veracruz, 1750-1820”. Ayer, nº 74, 2009.

14. Sobre o Plan de Iguala, em abordagem também bi-hemisférica, vide FRASQUET, Ivan. Las caras del águila. Del liberalismo gaditano a la república federal mexicana. Castellón: Universitat Jaume I – Instituto Mora – Universidad Autónoma de México – Universidad Veracruzana, 2008.

Referências

ARTOLA, Miguel. La Espana de Fernando VII. Madri: Espasa, 1999.

BERBEL, Marcia Regina. “A constituicao espanhola no mundo luso-americano (1820-1823). Revista de Indias, vol. LXVIII, nº 242, 2008.

BUSTOS, Sophie. La nacion no es patrimonio de nadie. El liberalismo exaltado en el Madrid del trienio liberal (1820-1823): Cortes, Gobierno y Opinion Publica. Tese (Doutorado em Historia). Universidad Autonoma de Madrid, Madri, 2017.

FONTANA, Josep. La crisis del Antiguo Regimen, 1808-1823. Barcelona: Critica, 1979.

GIL NOVALES, Alberto. El trienio liberal. Madri: Siglo XXI, 1980.

GUERRA, Francois-Xavier. Modernidad e independencias. Ensayos sobre las revoluciones hispanicas. Cidade do Mexico: Fondo de Cultura Economica e Fundacion MAPFRE, 1992;

LA PARRA, Emílio RAMIREZ, ALEDON, German(coord.) El primer liberalismo: Espana y Europa, una perspectiva comparada. Valencia: Coleccion literaria, 2003.

MORANGE, Claude. En los Origenes del moderantismo decimononico. El Censor (1820-1822): promotores, doctrina e indice. Salamanca: Universidad de Salamanca, 2019.

PORTILLO VALDES, Jose Maria. Crisis Atlantica – Autonomia e independencia en la crisis de la monarquía. Madri: Marcial Pons Historia, 2006.

ROCA VERNET, Jordi. Política, liberalisme i revolucio. Barcelona, 1820-1823. 840 f. Tese (Doutorado em Historia Moderna e Contemporanea). Universitat autonoma de Barcelona, Barcelona, 2007.

RODRIGUEZ, Jaime. The independence of Spanish America. Cambridge: Cambridge University Press, 2006.

RUIZ JIMENEZ, Marta. El liberalismo exaltado. La confederacion de comuneros espanoles durante el trienio liberal. Madri: Fundamentos, 2007.

Lucas Soares Chnaiderman1;2 – Possui graduação em História – Universidade de São Paulo, mestrado em história pela mesma universidade (2015) e atualmente cursa o doutorado. Universidade de São Paulo. São Paulo – São Paulo – Brasil.


RÚJULA, Pedro; CHUST, Manuel. El Trienio Liberal. Revolución e independencia (1820-1823). Madri: Catarata, 2020. Resenha de: CHNAIDERMAN, Lucas Soares. Em defesa da experiência liberal. Almanack, Guarulhos, n.25, 2020. Acessar publicação original [DR]

Regalismo no Brasil colonial: a Coroa portuguesa e a Ordem do Carmo – Rio de Janeiro 1750-1808 | Leandro F. L. Silva

Superando a tradicional concentração de estudos nas atividades da Companhia de Jesus, as historiografias portuguesa e brasileira produziram nas últimas décadas uma quantidade significativa de trabalhos sobre a atuação de outras ordens religiosas na Época Moderna.[3] Apesar disso, no que tange ao impacto das medidas adotadas na segunda metade do século XVIII para reforçar a autoridade da Coroa face às corporações regulares, o caso paradigmático da expulsão dos jesuítas dos territórios lusitanos em 1759 continua a ser visto como evento quase exclusivo da prática regalista naquela esfera. Nesse quadro, o trabalho de Leandro Ferreira Lima da Silva oferece novas luzes para a compreensão mais ampla das medidas de controle da Coroa portuguesa sobre as ordens religiosas daquele período. Defendida originalmente em 2013 como Dissertação de Mestrado no Programa de Pós-graduação em História Social da Universidade de São Paulo, a obra foi contemplada em 2016 com o prêmio História Social do referido Programa.

Duas características se destacam na investigação do autor: a abrangência da análise e o caráter minucioso da reconstituição de diferentes contextos que atravessam o período em exame. A consequência é o ambicioso plano da obra, desdobrando-se em quinze capítulos divididos em cinco partes, num total de 556 páginas. A matéria-prima para a análise proveio de diferentes acervos documentais. Devido à perda de grande parte da documentação da antiga Província Carmelitana Fluminense, o autor montou um repertório documental procurando recompor um quebra-cabeça cujas fontes estavam dispersas em arquivos tão distintos e distantes como o Arquivo Central da Província Carmelitana de Santo Elias, em Belo Horizonte; o Arquivo Nacional, o Arquivo Geral da Cidade e o Arquivo da Cúria Metropolitana, no Rio de Janeiro; e diferentes fundos documentais digitalizados do Arquivo Histórico Ultramarino de Lisboa. A impressão que fica é que o autor praticamente esgotou as fontes disponíveis no Brasil, restando por analisar apenas os arquivos europeus.

A historiografia também recebeu cobertura extensiva no livro. Dialogando com as obras de Evergton Sales Souza e José Pedro Paiva, para mencionar apenas alguns, Leandro Silva se mostra atualizado com relação à produção luso-brasileira sobre as questões da Igreja católica, da Ilustração, da Coroa e da colonização portuguesas no século XVIII. Com base na historiografia, Leandro Silva define o regalismo praticado nos domínios portugueses na segunda metade do século XVIII segundo uma dupla dimensão: a subordinação da Igreja e do clero aos poderes temporais da Coroa, “erradicando privilégios e imunidades”; e a manutenção do catolicismo como religião oficial do Estado, livrando-se, não obstante, das pressões da Santa Sé (p. 27). O tema da reforma regalista na Província do Carmo do Rio de Janeiro não é novo na historiografia. Inaugurado por Francisco Benedetti Filho, foi continuado por Sandra Rita Molina, cuja leitura o rigoroso escrutínio do autor deixou escapar.[4] As questões da administração dos bens da Província, da limitação do quantitativo de religiosos e do relaxamento moral dos carmelitas atravessam as três investigações sobre o tema. Mais recentemente, outro trabalho de Sandra Molina estendeu a análise dos referidos pontos até o final do período imperial, mostrando a continuidade da política regalista do Império do Brasil em relação às medidas adotadas anteriormente pela Coroa portuguesa.[5]

O diálogo com a historiografia internacional é relativamente pequeno na obra de Leandro Silva. Em que pese a lembrança do importante livro coletivo organizado por Ulrich Lehner e Michael Print, como também do já clássico estudo de Samuel Miller, o trabalho carece de referências mais amplas sobre o impacto de medidas de teor regalista que, adotadas por diferentes monarquias europeias na segunda metade do Setecentos, tiveram consequências diretas sobre as atividades das ordens religiosas em seus territórios.[6] Por fim, não existe a tentativa de efetuar um balanço historiográfico das mudanças estimuladas pelas reformas bourbônicas no campo da administração eclesiástica dos domínios hispano-americanos, cujo exame comparativo poderia constituir uma frutífera via de análise para o autor.Mesmo assim, o trabalho possui abrangência e profundidade incomuns para um projeto desenvolvido no âmbito do Mestrado. É o momento de se retomar essa dupla característica, aproximando-se agora do objeto. Trata-se de uma pesquisa que tem como objetivo assinalar os efeitos de diferentes medidas regalistas tomadas pela Coroa portuguesa com relação à Província do Carmo do Rio de Janeiro. Fundada em 1720, a Província do Carmo do Rio de Janeiro constituía desde 1595 uma vice-província que se encontrava até então dependente da Província de Portugal. A fundação fluminense abrangia os conventos do Rio de Janeiro, do Espírito Santo, de Angra dos Reis, de Santos, de São Paulo e de Mogi das Cruzes, bem como o hospício de Itu. Em informação remetida à Corte em 1763, o bispo do Rio de Janeiro denunciava que a própria fundação da Província ocorrera “com o dinheiro angariado através de negociações nas Minas e em outras regiões do Brasil”, com cujos recursos fr. Francisco da Purificação, o primeiro provincial, “soube merecer o agrado dos religiosos de Roma, onde tudo se compra” (p. 146, grifos do autor).

O recorte necessariamente monográfico da pesquisa não impede comparações com outros contextos. O autor traz à análise a recepção de medidas de teor análogo ocorridas nas províncias do Carmo da Bahia e na reformada de Pernambuco. Paralelamente, no que tange à capitania do Rio de Janeiro, o autor discute seu tema à luz de outros quadros, como as medidas de reforma empreendidas pela Coroa junto aos frades capuchos da Província Franciscana da Imaculada Conceição e o papel de carmelitas e franciscanos no mencionado território após o afastamento dos missionários jesuítas. A primeira parte da obra, abrangendo um único capítulo intitulado “A mentalidade regalista setecentista e o clero regular no Império Português”, anuncia o caráter amplo da abordagem do autor. Nessa parte, busca em textos basilares da Ilustração portuguesa, como o Testamento político de D. Luís da Cunha, um conjunto de argumentos que depois seriam postos em prática, ao longo dos reinados de D. José I e de D. Maria I, para o controle das corporações regulares. No discurso dos estrangeirados, a ênfase recai sobre o acúmulo de bens efetuado pelas ordens religiosas, quase sempre pela via de legados testamentários; o ingresso muito numeroso de noviços nas fundações conventuais; a ociosidade dos religiosos; as isenções relativas aos poderes seculares; e a falta de observância das regras. No processo da reforma dos frades carmelitas do Rio de Janeiro, tais pontos reapareceram com força nas ações das autoridades da Província.

A fina reconstituição dos contextos representa o que há de mais valioso no trabalho de Leandro Silva. A segunda parte, a maior da obra e que abrange seis capítulos, intitula-se “A Província de Nossa Senhora do Carmo do Rio de Janeiro e o ‘tímido’ regalismo pombalino (1750-1778)”. Na verdade, o material tratado no capítulo é mais amplo do que o indicado no recorte cronológico. O autor examina inicialmente a sublevação ocorrida no Convento do Carmo do Rio de Janeiro em 1743, quando lutas de facções davam o tom da administração da Província, dividindo ocupantes dos cargos em dois grupos opostos: os “filhos do Rio”, que abrangiam os religiosos naturais da referida capitania, e os “filhos de fora”, que, em sua maior parte, agrupavam os religiosos nascidos em Portugal e nas demais capitanias da Colônia (p. 106). Ao longo da segunda parte, o autor desenvolve um argumento muito convincente. Apesar da existência de sérios conflitos na Ordem, e da edição de numerosas medidas que, idealizadas por Sebastião José de Carvalho e Melo na década de 1760, destinavam-se a limitar a entrada de noviços e a diminuir o volume dos bens que ingressavam nas corporações regulares, ao longo do reinado de D. José I as diferentes autoridades coloniais não tomaram medidas rígidas de controle sobre os frades carmelitas do Rio de Janeiro. No contexto em pauta, os poderes coloniais sediados na capitania encontravam-se inteiramente envolvidos nas disputas de limites com a Espanha na região sul da Colônia, que foram apenas solucionados com o Tratado de Santo Ildefonso, em 1777.

A terceira parte da obra abrange dois capítulos. Conforme o seu argumento principal, “se o consulado pombalino deu embasamento teórico às políticas regalistas e aos poderes dos bispos na Igreja nacional e frente à Santa Sé, no reinado mariano a Coroa aprofundou essas posições”. (p. 378). Seguindo, assim, as tendências da historiografia mais recente, o autor não identificou mudanças significativas na política regalista após a saída do Marquês de Pombal, em 1777. Além disso, as autoridades coloniais encontravam-se na ocasião já desembaraçadas dos problemas nas fronteiras do sul. Após a suspensão das eleições da Província em 1783, o vice-rei do Estado do Brasil apresentou à rainha D. Maria I um dossiê, “para fazer conceito do miserável estado em que se acha uma Corporação Religiosa que só serve de descrédito à Religião e de peso e mau exemplo ao Estado” (p. 259). No documento, que pautou os rumos da reforma que seria iniciada dois anos depois, acusa-se uma sucessiva quebra das regras religiosas e dos fundamentos da economia da Província: religiosos adquiriam em Roma ou em Lisboa privilégios honoríficos, afastando-se dos atos litúrgicos e do trabalho em comum; possuíam grande número de escravos pessoais para lhes servir, em contrariedade aos votos de pobreza; e tinham até concubinas, por vezes estabelecidas publicamente em residências próximas às sedes dos conventos, contrariando os votos de castidade. O vasto patrimônio imobiliário da Província, constituído por dezenas de moradias urbanas e fazendas, era mal administrado, chegando ao ponto de não produzir alimento suficiente para os próprios religiosos.

A quarta parte da obra estende-se por cinco capítulos. Após o envio da denúncia do vice-rei à Corte, D. José Joaquim Mascarenhas Castelo Branco, o bispo do Rio de Janeiro, foi nomedo como visitador e reformador da Província do Carmo. A atuação reformadora deste se direcionou principalmente a combater as irregularidades já apontadas pelo vice-rei. Suas ações visaram aprimorar o rendimento econômico das fazendas dos conventos, combater a concessão de distinções pessoais de caráter honorífico e regulamentar as atividades da comunidade, obrigando os frades à celebração dos atos litúrgicos e à assistência no refeitório coletivo. Além da intervenção direta de poderes externos à Ordem, a reforma na Província do Carmo do Rio de Janeiro se distinguiu por sua longa duração se comparada a iniciativas semelhantes introduzidas em outras ordens regulares. Após a resistência dos religiosos, e em aliança com poderes locais, como a Câmara do Rio de Janeiro, a reforma foi encerrada em 1800. A atuação do bispo promoveu um verdadeiro expurgo nos quadros da Província. Seu quadro de religiosos passou de 180 para 47 entre 1780 e 1799.Da perspectiva metodológica, a obra leva em conta que as inúmeras cartas produzidas pelos agentes administrativos envolvidos na reforma da Província Carmelita Fluminense – tais como o bispo do Rio de Janeiro, o vice-rei, os frades representantes da Província, o Senado da Câmara e o Conselho Ultramarino – podem ser vistas simultaneamente como instrumento de dominação da Coroa e como veículo “de negociação de súditos instalados nos mais longínquos pontos do ultramar” (p. 47). Recentemente, essa linha de estudos se revelou importante para um expressivo conjunto de historiadores, que sistematizou o funcionamento dos canais de comunicação política que uniam os diferentes poderes em funcionamento na monarquia portuguesa, nos dois lados do Atlântico.[7]

Introduzida na América Portuguesa em 1580 para cuidar da catequização do gentio e atender demandas espirituais dos colonos moradores na capitania de Pernambuco8, a Ordem do Carmo estabelecida no Rio de Janeiro não foi mais considerada capaz de realizar aquelas tarefas na segunda metade do século XVIII. Analisando os avanços e recuos das iniciativas de reforma, as relações estabelecidas entre os agentes seculares e eclesiásticos, bem como as bases teológicas e canônicas que fundamentaram a iniciativa da Coroa, a obra de Leandro Silva merece figurar ao lado de outras que constituem pontos de partida obrigatórios para o tema, como o clássico trabalho de Caio César Boschi, ou a recente coletânea organizada por Francisco Falcon e Cláudia Rodrigues.9

Notas

3. Com relação à América Portuguesa, a título ilustrativo: AMORIM, Maria Adelina. Os franciscanos no Grão-Pará e no Maranhão: missão e cultura na primeira metade de Seiscentos. Lisboa: Centro de Estudos de História Religiosa: Universidade Católica Portuguesa, 2005; SOUZA, Jorge Victor de Araújo. Para além do claustro: uma história social da inserção beneditina na América portuguesa, c. 1580 – c. 1690. Niterói: Eduff, 2014.

4. BENEDETTI FILHO, Francisco. A reforma da Província Carmelitana Fluminense (1785-1800). 1990. 190f. Dissertação (Mestrado em História), Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1990. MOLINA, Sandra Rita. (Des)obediência, barganha e confronto: a luta da Província Carmelita Fluminense pela sobrevivência (1780-1836). 1998. 338f. Dissertação (Mestrado em História), Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998.

5. MOLINA, Sandra Rita. A morte da tradição: a Ordem do Carmo e os escravos da Santa contra o Império do Brasil (1850-1889). Jundiaí: Paco Editorial, 2016. Esta obra foi resenhada por BARBI, Rafael José. Catolicismo, escravidão e a resistência ao Império: Um outro olhar. Almanack, n. 15, 2017, pp. 366-370.

6. LEHNER, Ulrich L.; PRINT, Michael (Dir.). A Companion to the Catholic Enlightenment in Europe. Leiden: Brill, 2010; MILLER, Samuel J. Portugal and Rome (c. 1748-1830). An Aspect of the Catholic Enlightenment. Roma: Universitá Gregoriana Editrice, 1978; BEALES, Derek. Prosperity and Plun der. European Catholic Monasteries in the Age of Revolution, 1650-1815. Cambridge: Cambridge University Press, 2003.

7. FRAGOSO, João; MONTEIRO, Nuno Gonçalo. Um Reino e suas repúblicas no Atlântico: comunicações políticas entre Portugal, Brasil e Angola nos séculos XVII e XVIII. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2017.

8. HONOR, André Cabral. Envio dos carmelitas à América portuguesa em 1580: a carta de Frei João Cayado como diretriz de atuação. Tempo, v. 20, 2014, p. 1-19.

9. BOSCHI, Caio César. Os leigos e o poder: irmandades leigas e política colonizadora em Minas Gerais. São Paulo: Ática, 1986; FALCON, Francisco; RODRIGUES, Cláudia (Orgs.). A “época pombalina” no mundo luso-brasileiro. Rio de Janeiro: FGV: Faperj, 2015.

Referências

AMORIM, Maria Adelina. Os franciscanos no Grao-Para e no Maranhao: missao e cultura na primeira metade de Seiscentos. Lisboa: Centro de Estudos de Historia Religiosa: Universidade Catolica Portuguesa, 2005.

BARBI, Rafael Jose. Catolicismo, escravidao e a resistência ao Imperio: Um outro olhar. Almanack, n. 15, 2017, pp. 366-370.

BEALES, Derek. Prosperity and Plunder. European Catholic Monasteries in the Age of Revolution, 1650-1815. Cambridge: Cambridge University Press, 2003.

BENEDETTI FILHO, Francisco. A reforma da Provincia Carmelitana Fluminense (1785-1800). 1990. 190f. Dissertacao (Mestrado em Historia), Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de Sao Paulo, Sao Paulo, 1990.

BOSCHI, Caio Cesar. Os leigos e o poder: irmandades leigas e politica colonizadora em Minas Gerais. Sao Paulo: Atica, 1986.

FALCON, Francisco; RODRIGUES, Claudia (Orgs.). A “epoca pombalina” no mundo luso-brasileiro. Rio de Janeiro: FGV: Faperj, 2015.

FRAGOSO, Joao; MONTEIRO, Nuno Goncalo. Um Reino e suas republicas no Atlântico: comunicacoes politicas entre Portugal, Brasil e Angola nos seculos XVII e XVIII. Rio de Janeiro: Civilizacao Brasileira, 2017.

HONOR, Andre Cabral. Envio dos carmelitas a America portuguesa em 1580: a carta de Frei Joao Cayado como diretriz de atuacao. Tempo, v. 20, 2014, p. 1-19.

LEHNER, Ulrich L.; PRINT, Michael (Dir.). A Companion to the Catholic Enlightenment in Europe. Leiden: Brill, 2010.

MILLER, Samuel J. Portugal and Rome (c. 1748-1830). An Aspect of the Catholic Enlightenment. Roma: Universita Gregoriana Editrice, 1978.

MOLINA, Sandra Rita. A morte da tradicao: a Ordem do Carmo e os escravos da Santa contra o Imperio do Brasil (1850-1889). Jundiai: Paco Editorial, 2016.

MOLINA, Sandra Rita. (Des)obediência, barganha e confronto: a luta da Provincia Carmelita Fluminense pela sobrevivência (1780-1836). 1998. 338f. Dissertacao (Mestrado em Historia), Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1998.

SOUZA, Jorge Victor de Araujo. Para alem do claustro: uma historia social da insercao beneditina na America portuguesa, c. 1580 – c. 1690. Niteroi: Eduff, 2014.

William de Souza Martins – Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Rio de Janeiro – RJ – Brasil. Professor Associado da Área de História Moderna do Instituto de História da UFRJ, onde atualmente ocupa a função de vice-diretor. Membro permanente do Programa de Pós-graduação em História Social da UFRJ, atuando como editor associado da Topoi: Revista de História. Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (2001) com a tese Membros do corpo místico: ordens terceiras no Rio de Janeiro (c. 1700 – 1822), que foi publicada em 2009 pela Edusp. Participa dos grupos de pesquisa Ecclesia (UNIRIO), ART (Antigo Regime nos Trópícos – UFRJ) e Sacralidades (UFRJ).


SILVA, Leandro Ferreira Lima da. Regalismo no Brasil colonial: a Coroa portuguesa e a Ordem do Carmo, Rio de Janeiro, 1750-1808. São Paulo: Intermeios/USP; Brasília: CAPES, 2018. Resenha de: MARTINS, William de Souza. Monarquia portuguesa e política regalista: ordens religiosas no final do setecentos. Almanack, Guarulhos, n.25, 2020. Acessar publicação original [DR]

Perdas e ganhos: exilados e expatriados na história do conhecimento na Europa e nas Américas, 1500-2000 | Peter Burke

Em Perdas e ganhos: exilados e expatriados na história do conhecimento na Europa e nas Américas, 1500-2000, o historiador inglês Peter Burke retoma temáticas já aventadas em seus estudos anteriores, buscando discutir as contribuições de sujeitos exilados e expatriados para a história do conhecimento. Publicada em 2017 pela editora Unesp, a obra procura compreender os impactos sociais e culturais da migração em diferentes contextos, espaços e motivações. O autor – professor emérito da Universidade de Cambridge e autor de obras como Cultura popular na Idade Moderna: Europa, 1500-1800, A fabricação do rei: a construção da imagem pública de Luís XIV e Testemunha ocular – é reconhecido por suas pesquisas na área de História Moderna, História da Mídia e História Cultural. Em sua mais recente publicação no Brasil, o historiador parte de conceitos como trânsitos culturais, mediações, transculturação e hibridismo para compreender o local social desses sujeitos.

Apesar de reunir reflexões e conferências apresentadas pelo autor em diferentes momentos de sua carreira, o livro não é apenas uma obra motivada pela pesquisa acadêmica. Na apresentação da obra, o historiador destaca que muitas das questões levantadas e o foco nas noções de “exilados” e “expatriados” vieram de sua trajetória pessoal e de contatos durante a formação e atuação profissional com sujeitos que se identificavam com uma ou ambas as categorias. Apesar do recorte temporal e espacial bastante extenso – quase 500 anos de trajetórias de indivíduos migrantes –, a obra elenca temas centrais e algumas trajetórias em específico, focando nos sujeitos e em suas contribuições e/ou enfrentamentos muito mais do que na visão totalizante da história. Leia Mais

Histoire des élèves en France. Volume 1. Parcours scolaires, genre et inégalités (XVIe-XXe siècles) – CONDETTE; CASTAGNET LARS; Histoire des élèves en France. Volume 2. Ordres, désordres et engagements (XVIe-XXe siècles) – KROP; LEMBRÉ (APHG)

CONDETTE, Jean-François; CASTAGNET-LARS, Véronique (dir.). Histoire des élèves en France. Volume 1. Parcours scolaires, genre et inégalités (XVIe-XXe siècles). Villeneuve d’Ascq: Presses universitaires du Septentrion, coll. « Histoire et civilisations », 2020. 566p. KROP, Jérôme; LEMBRÉ, Stéphane (dir.). Histoire des élèves en France. Volume 2. Ordres, désordres et engagements (XVIe-XXe siècles). Villeneuve d’Ascq: Presses universitaires du Septentrion, coll. « Histoire et civilisations », 2020. 376p. Resenha de: BELLA, Sihem. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 28 août 2020. Disponível em: < https://www.aphg.fr/Histoire-des-eleves-A-propos-des-deux-volumes-diriges-par-J-F-Condette-V>Consultado em 11 jan. 2021.

Les deux volumes de l’Histoire des élèves en France, respectivement dirigés par Jean-François Condette, Véronique Castagnet-Lars pour le premier volume et Jérôme Krop et Stéphane Lembré pour le second volume, sont parus aux presses universitaires du Septentrion en juin 2020. Ils regroupent des contributions fondées sur des communications prononcées en 2016 lors de journées d’étude à l’université d’Artois. Ils posent des jalons essentiels en histoire de l’éducation, de l’enfance et de la jeunesse dans le contexte scolaire, et renouvellent l’historiographie des élèves aux périodes moderne et contemporaine en France.

Placer les élèves au centre : ainsi s’affirme d’emblée l’ambition des vingt-cinq contributeurs de l’Histoire des élèves en France. Jalonnées par de nombreuses études de cas s’inscrivant dans le temps long (du XVIe au XXe siècle), ces ouvrages constituent une somme riche pour envisager les élèves comme des acteurs à part entière du système éducatif français. Les deux volumes sont organisés thématiquement, privilégiant ainsi une perspective diachronique ; le premier volume porte sur les parcours scolaires, le genre et les inégalités, alors que le second volume s’intéresse davantage aux questions d’ordres, de désordres et d’engagements. Une bibliographie détaillée et organisée thématiquement est adjointe aux volumes, constituant un excellent support pour explorer l’historiographie des élèves. La construction rigoureuse de l’ouvrage et la clarté des introductions et des conclusions rendent la lecture aisée et les liens entre les contributions limpides. L’ensemble du territoire national français est a priori concerné, avec par exemple des études portant sur les petites écoles de Lyon aux XVIIe et XVIIIe siècles (Aurélie Perret, volume 1, p. 35), les lycées parisiens au tournant des XIXe et XXe siècles (Stéphanie Dauphin, volume 1, p. 409) aussi bien que sur les écoles primaires rurales du Nord et du Pas-de-Calais au XIXe siècle (Séverine Parayre, volume 2, p. 149). L’accent est cependant mis sur le milieu urbain et sur la France métropolitaine, sans propos spécifique sur les élèves de l’empire colonial ou de l’outre-mer. Les contributions sont de mêmes moins nombreuses sur l’Ancien Régime et la Révolution française que sur le XIXe et le XXe siècle.

Les contributions du premier volume sont principalement consacrées à la description des déterminismes sociaux, économiques, culturels ou encore géographiques dont les élèves ont été les objets. La liberté de choix des élèves et de leur famille est également envisagée. Éminemment politiques, les enjeux éducatifs sont eux-mêmes en prise, de près ou de loin, avec les événements agitant la société de leur temps. Les élèves, contrairement aux femmes par exemple, ne sont pas des oubliés de l’histoire à proprement parler ; ils sont cependant souvent relégués à l’arrière-plan, considérés comme de simples personnages et essentialisés (en atteste l’emploi récurrent du singulier « l’élève »). Le biais des sources existantes, en grande partie produites par l’institution scolaire, laissent peu de place aux individualités et à la notion de parcours. Les statistiques et considérations générales de l’administration doivent ainsi être contrebalancées par les travaux, récits et témoignages d’élèves ou encore par les registres d’inscription ou de sanction. L’exploration de représentations répandues et persistantes doit nécessairement être menée selon les auteurs : l’opposition manichéenne entre bons et mauvais élèves, les stéréotypes genrés ou encore les figures stéréotypées comme celle du boursier méritant doivent être nuancés. Ainsi les historiens des élèves ont la possibilité de s’appuyer sur des récits littéraires, comme ceux de Marcel Pagnol exaltant la figure romanesque du boursier, qui sont des sources importantes pour reconstituer un système scolaire ségrégué. Outre la question des représentations à dépasser, la question de la définition même de l’élève pose question. La difficulté du critère de l’âge est par exemple relevée par les auteurs : à partir de quand et jusqu’à quand est-on considéré(e) comme élève ? Carole Christen livre par exemple une contribution sur les élèves adultes, déconstruisant certains préjugés à cet égard (volume 1, p. 345).

De même, le premier volume s’interroge sur la place à accorder aux choix personnels et familiaux dans les scolarités des élèves et à la place des déterminismes et des solutions mises en place par l’institution pour les réduire. Il s’organise en trois parties : la première porte sur les logiques institutionnelles qui organisent le système éducatif, la deuxième sur une approche sociologique et spatiale des trajectoires des élèves et la troisième sur l’expérience scolaire des élèves. Ne pouvant rendre compte de la totalité des contributions, deux ont retenu notre attention dans le volume 1 : celle de Jean-François Condette sur la lutte contre l’absentéisme à partir du cas des écoles primaires du Nord et du Pas-de-Calais entre 1882 et 1914 (p. 151) et celle de Patricia Legris sur la séparation des sexes à partir du cas des écoles normales primaires des Ardennes entre 1945 et 1969 (p. 459).

Jean-François Condette étudie l’absentéisme dans les écoles primaires du Nord et du Pas-de-Calais entre 1882 et 1914 en envisageant les formes et les motifs de ce qui est pour lui une remise en cause de l’école républicaine, ainsi que les stratégies des administrations pour y mettre fin. Son étude s’appuie notamment sur des données statistiques exhaustives, des images d’Épinal donnant à voir des élèves ou encore des rapports d’incident. Malgré la loi Ferry du 28 mars 1882, l’absentéisme persiste en effet dans la région, notamment parce que les élèves restent associés au monde du travail dans les milieux précaires. D’autres raisons sont avancées par l’historien : les raisons médicales avec la persistance des maladies et épidémies dans les mêmes milieux, ou encore l’influence du contexte politique. En effet, le conflit idéologique entre école publique laïque et école privée catholique a donné lieu à de véritables guerres scolaires, Jean-François Condette évoquant particulièrement les « guerres de manuels » (p. 182). L’enlisement des projets de lois de lutte contre l’absentéisme s’explique en partie par la guerre entre les deux écoles.

Patricia Legris a quant à elle étudié la séparation des sexes à partir du cas des écoles normales primaires des Ardennes entre 1945 et 1969, en se concentrant de fait sur les élites des classes populaires et moyennes. Selon elle, la remise en marche des écoles normales primaires ayant été difficile après la guerre, le caractère genré des formations persiste de manière très marquée alors que la mixité est toujours plus répandue dans le reste du système scolaire. Si quelques activités extrascolaires sont mixtes, comme le théâtre, celles-ci sont l’objet de chaperonnage par les professeurs qui veillent notamment à réprimer farouchement la sexualité des élèves. La persistance de cette non-mixité s’explique notamment par une volonté de la part des autorités scolaires de « garantir le prestige » des écoles normales primaires (p. 468), afin d’éviter la fuite des élèves pour les plus prestigieux baccalauréats de philosophie ou de mathématiques d’autres établissements. Alors que les flirts comme les blue jeans sont pendant une longue période interdits, la fin des années 1960 marque une rupture nette. Les mobilisations de Mai 68, l’influence des grèves et des idées politiques de gauche porteurs d’émancipation pour les jeunes finit par favoriser la mixité dans ces écoles.

Le second volume vise davantage encore à considérer les élèves comme des acteurs à part entière du système éducatif, dans la mesure où il rassemble des contributions portant sur les ordres, les désordres et les engagements relatifs aux élèves. Les enjeux politiques nombreux autour de l’éducation sont disséqués avec précision. Pour former, informer et conformer les élèves, l’école s’est faite à la fois le reflet et le produit de la société française. Aussi, les phénomènes d’adhésion autant que de contestation de l’ordre scolaire sont prioritairement étudiés. L’usage de sources permettant de faire entendre la parole des élèves est particulièrement souligné : des écrits de pédagogues, des extraits de presse lycéenne, les traces des activités des associations d’anciens et anciennes élèves, ou encore des textes règlementaires et des sources orales ont été employés dans les recherches présentées.

Les auteurs soulignent notamment la difficulté d’écrire une histoire des élèves dans une société quasi intégralement passée par l’école : ils parlent de « l’évidence du passé d’élève » (p. 18). La chronologie des politiques éducatives laisse en effet peu de place aux élèves en histoire de l’éducation, sauf « quelques heureuses exceptions » comme les travaux de l’historienne de l’enfance et de l’adolescence dans la Première Guerre mondiale Manon Pignot (p. 17). Il s’agit par ailleurs de ne pas négliger l’idée que l’institution scolaire est également « appropriée et transformée par ses usagers » (p. 17). Ainsi les auteurs reprennent à leur compte le concept d’agency ou liberté d’action des acteurs (p. 21), à l’honneur dans un grand nombre de champs historiographiques actuellement, au sujet des élèves. Le but du second volume est finalement d’interroger les modes de participation des élèves à la vie des établissements, en accordant de fait une place plus grande aux adolescents, et notamment aux lycéens. Par conséquent, la surreprésentation de l’enseignement secondaire contraint les auteurs à s’intéresser à une élite sociale essentiellement masculine. A rebours d’une idée répandue, les auteurs affirment qu’en matière de participation des élèves à la vie de leur établissement, Mai 68 n’est pas qu’un « point de départ » mais une « étape dans une longue histoire du rôle des acteurs dans les continuités et les changements que connaissent ces établissements » (p.20). Si les années 1960 constituent un tournant, il ne s’agit donc pas de considérer la période comme une rupture nette. L’ouvrage s’organise en trois temps : les formes de la participation des élèves à la vie des établissements sont d’abord explorées, avant une analyse des normes scolaires et disciplinaires au quotidien. Enfin, la place des élèves dans la cité, leurs contestations et leurs engagements sont étudiés dans un troisième temps. Ne pouvant rendre compte de la totalité des contributions, deux ont retenu notre attention dans le volume 2 : celle de Véronique Castagnet-Lars sur les violences dans le cadre scolaire durant les affrontements confessionnels aux XVIe et XVIIe siècles (p. 225) et celle de Jérôme Krop sur la contestation lycéenne à la télévision en 1968-1969 (p. 299).

Les violences dans les collèges catholiques et protestants durant les affrontements confessionnels aux XVIe-XVIIe siècles peuvent-elles être qualifiées de « scolaires » ? La question guide la réflexion de Véronique Castagnet-Lars dans sa contribution. Si l’on considère l’importance du contexte social, politique et culturel, il est en effet difficile de distinguer les violences dues au cadre proprement scolaire et les violences confessionnelles entre catholiques et protestants pénétrant dans le cadre scolaire. L’historienne constate l’incapacité des règlements successifs à proscrire le port d’armes des élèves, discutant notamment l’idée répandue selon laquelle l’école participe de la « disciplinarisation » des sociétés. Les écoliers apparaissent en effet comme une « population citadine turbulente » (p. 232), susceptible de se constituer en bandes ou en troupes pour commettre des violences. L’autrice analyse également le fonctionnement des autorités répressives, en notant par exemple que l’échelle des peines est globalement empruntée au droit des adultes – lequel se trouvait, sous l’Ancien Régime, sous le regard de Dieu. Ainsi l’amende honorable et les punitions corporelles avec usage du fouet figurent par exemple dans l’éventail des sanctions encourues par les élèves violents (p. 240).

La contribution de Jérôme Krop sur la contestation lycéenne à la télévision en 1968-1969 se situe à la jonction de l’histoire de la jeunesse et des élèves et de l’histoire des médias. L’historien s’interroge sur la place de la télévision dans la contestation lycéenne en étudiant trois magazines : Dim, Dam, Dom, Les Chemins de la vie et Panorama. Dim, Dam, Dom est selon l’auteur « l’unique exemple d’une expression télévisuelle dans le sens des discours contestataires » (p. 307), alors que Les Chemins de la vie permet des débats entre militants lycéens et représentants de l’Éducation nationale. Panorama est quant à lui un magazine donnant lieu à des échanges entre lycéens et journalistes. Jérôme Krop note la rareté de la présence lycéenne contestataire dans un média comme la télévision, sous une tutelle politique forte en 1968. La disparition de leur présence à la télévision coïncide avec la fin du dialogue avec la jeunesse contestataire.

En conclusion, la somme ambitieuse que représente cette Histoire des élèves en France parue aux Presses universitaires du Septentrion apporte un éclairage riche, construit et extrêmement instructif, ponctué d’études précises sur des acteurs et actrices au cœur des préoccupations des professeurs non seulement d’histoire-géographie mais également des professeurs d’autres disciplines et des administrateurs des enseignements primaire, secondaire voire supérieur en France. Pour l’attention et la précision portées à cette historicisation des élèves, il s’agit d’une lecture nécessaire : l’histoire des élèves paraît constituer un levier pour le renouvellement de l’histoire de l’éducation. Si l’étude s’arrête à la fin du XXe siècle, il est indéniable que ces contributions posent les jalons prometteurs de recherches sur l’histoire des élèves du XXIe siècle, jusqu’à ceux des temps présents. L’influence du numérique, les conséquences sur les élèves du contexte exceptionnel engendré par l’épidémie de Covid-19 en 2020 sont autant de pistes pouvant s’inscrire dans la continuité de l’entreprise d’histoire des élèves dirigée par J.-F. Condette, V. Castagnet-Lars, J. Krop et S. Lembré.

Liens utiles :
Présentation des deux volumes par l’éditeur :
http://www.septentrion.com/fr/livre…
http://www.septentrion.com/fr/livre…

Sihem BellaProfesseure d’histoire-géographie au lycée Jean Moulin à Roubaix (59).

Consultar publicação original

[IF]

Una politica senza religione – De LUNA (CN)

De LUNA, Giovanni. Una politica senza religione. Torino: Einaudi, 2013, p. 137. p. Resenha de: GUANCI, Vicenzo. Clio’92, 7 ago. 2019.

“Per risvegliarci come nazione, dobbiamo vergognarci dello stato presente. Rinnovellar tutto, autocriticarci. Ammemorare le nostre glorie passate è stimolo alla virtù, ma mentire e fingere le presenti, è conforto all’ignavia e argomento di rimanersi contenti in questa vilissima condizione”

Con queste parole di Giacomo Leopardi, G. De Luna conclude il suo saggio sulla mancanza di una “religione civile” nella nazione italiana e sui tentativi (sporadici) di costruirne una nel corso dei centocinquant’anni di storia unitaria.

In premessa, l’autore esplicita cosa intende per religione civile: “uno spazio in cui gli interessi che tengono insieme un paese si trasformano in diritti, in doveri civici, in valori consapevolmente accettati, nel nome dei quali i cittadini italiani sono sollecitati ad abbandonare le nicchie individualistiche o comunitarie, quei progetti esistenziali racchiusi nel terribile slogan ‘tengo famiglia’ e ‘mi faccio i fatti miei’, condividendo un universo di simboli in grado di legare il singolo e la società in un rapporto di dipendenza e di identificazione”.

Si tratta quindi di uno spazio in continua costruzione, attraverso l’invenzione di tradizioni e il loro consolidamento mediante simboli riconosciuti che creano una realtà pubblica di appartenenza e di cittadinanza. E questo chiama in causa direttamente le Istituzioni e la Politica.

L’autore svolge il rotolo della storia unitaria d’Italia incontrando prima i fallimenti del “fare gli italiani” dell’Italia liberale di fronte al trasformismo della politica, poi quelli  del “ciascuno al suo posto” della gerarchia fascista che non riuscì a imporre un vero totalitarismo perché non affrancata da una “marcata subalternità nei confronti di quelli che erano i valori proposti dalle gerarchie cattoliche” ( p. 29).

Il momento nel quale gli italiani furono sul punto più vicino a costruire una loro religione civile fu senza dubbio quello della realizzazione  della Costituzione nata dalla Resistenza. Largo spazio G. De Luna dedica all’impegno del Partito d’Azione, individuando nei loro esponenti gli autentici ispiratori di un pensiero laico in grado di farsi civilmente religioso. Piero Calamandrei “cercava di sottrarre il paradigma di fondazione della nostra Repubblica all’ipoteca (che gli appariva effimera) dei partiti antifascisti per riconsegnarla direttamente al vissuto e all’esperienza collettiva di tutti gli italiani. Di qui la sua insistenza sul ‘carattere religioso’ della lotta partigiana…

A fondamento di un nuovo spazio pubblico in cui ci si potesse riconoscere come cittadini di uno stesso Stato nel nome di valore condivisi, Calamandrei chiamava così ‘il popolo dei morti’ (di quei morti che noi conosciamo uno a uno, caduti nelle nostre file, nelle prigioni e sui patiboli, sui monti e sulle pianure, nelle steppe russe e nelle sabbie africane, nei mari e nei deserti) presentato non nella dimensione ‘vittimaria’ dell’innocenza e dell’inconsapevolezza, ma come fonte attiva di una nuova legittimazione dello Stato” (pp. 40-41).

Il tentativo naufragò sugli scogli del clericofascismo democristiano, favorito dall’art. 7 della Costituzione che integrandovi i Patti Lateranensi creò un “pericoloso innesto confessionale” nella costruzione della Repubblica.

Nel luglio 1960 l’Italia del boom economico scoprì l’antifascismo. Manifestazioni e scontri cruenti con la polizia impedirono il congresso del partito neofascista MSI a Genova, medaglia d’oro della Resistenza, e causarono le dimissioni del governo Tambroni, un monocolore democristiano con l’appoggio esterno del MSI.  Si aprì una stagione di importanti riforme: la scuola media unica, la nazionalizzazione dell’energia elettrica, lo Statuto dei Lavoratori, la chiusura dei manicomi. Ciò nonostante, sostiene De Luna, “il rilancio della Costituzione nel suo significato di testo fondamentale della nostra religione civile fu una grande occasione mancata” (p. 60) perché la stagione si esaurì presto e gli anni Ottanta si aprirono con la famosa intervista a E. Scalfari, nella quale Enrico Berlinguer poneva alla politica tutta la “questione morale”. I partiti ormai non provvedevano più a formare la volontà popolare, non svolgevano più alcuna funzione pedagogica, di dibattito tra le masse. Essi erano diventati pure macchine per l’occupazione del potere.

L’Italia si stava avviando verso una condizione nella quale l’unica “religione” poteva essere quella cattolica vaticana, affiancata, seppur tra mille problemi, da quelle dei nuovi immigrati; non vi sarà più spazio per alcuna religione civile.

O meglio.

L’unica vera, trionfante, religione sarà quella officiata dal “mercato” a cui la politica si sottometterà. Berlusconi sarà il suo eroe.  Tutto sarà immerso nella religione dei consumi. E gli italiani, memori di secoli di povertà, si immergeranno in un benessere fondato su consumi indotti massicciamente dai nuovi media, soprattutto dalla televisione invadente. Tutto, ma proprio tutto, sarà ordinato dai totem dell’audience, dello share, della pubblicità, della visibilità, del culto dell’immagine. A questo proposito De Luna ricorda opportunamente come neanche il Vaticano si sottrarrà alle leggi del mercato: basti pensare alle figure degli ultimi tre pontefici, al carisma di Giovanni Paolo II di cui fu perfino spettacolarizzata la lunga agonia, al coup de theatre delle dimissioni si Benedetto XVI, alla capacità meravigliosa di tenere la scena di papa Francesco.

Acessar publicação original

[IF]

 

Um feminismo decolonial / Françoise Vergés

Finalmente temos no Brasil o lançamento de um dos livros da cientista política e historiadora Françoise Vergès: Um feminismo decolonial, publicado pelo Ubu Editora. A tradução chega até nós um pouco mais de um ano após o seu lançamento em francês, e se mantém completamente atual – inclusive por conta do prefácio à edição brasileira, no qual a autora recoloca suas reflexões em meio à pandemia de Covid-19. Nascida em Paris, Vergès cresceu na Ilha da Reunião, um departamento francês localizado a leste de Madagascar, no Oceano Índico, e traz a experiência da colonização francesa no ultramar para o cerne de seu pensamento crítico.

Olhando a França a partir da África, a autora questiona o feminismo civilizatório que, em sua matriz burguesa e eurocêntrica, tem disseminado discursos sobre os direitos das mulheres e a igualdade entre os sexos, sem que as verdadeiras raízes das desigualdades sejam enunciadas e enfrentadas. Esse feminismo, que reivindica melhores postos de trabalho e direitos universais, tem se mostrado interessado no sucesso profissional e libertação das mulheres brancas, de classes médias e altas, e não tem encontrado maiores obstáculos em sua inserção na lógica neoliberal – sistema econômico e de valores que transforma o feminismo em mercadoria, a diversidade em retórica empresarial e se utiliza do trabalho das mulheres e dos homens racializados no exercício das tarefas que homens e mulheres brancas, que tiveram acesso à educação formal, se negam a fazer.

O feminismo proposto pela autora se opõe drasticamente ao cenário descrito acima. Vergès defende um feminismo capaz de enxergar as trabalhadoras e os trabalhadores que o capitalismo deseja que sejam invisíveis, mas que realizam o trabalho do qual depende toda a engrenagem do sistema. A autora nos fala das mulheres que exercem as tarefas de cuidado e reprodução: a limpeza, a alimentação e o cuidado com as crianças, os enfermos e os idosos. Mulheres em sua maioria racializadas, vivendo às margens da sociedade de consumo e sendo exploradas até a exaustão de seus corpos. Como as mulheres brasileiras que trabalham como empregadas domésticas, entre elas, mais de 70% ainda não têm os seus direitos assegurados. São principalmente mulheres negras, que não recebem hora extra, que ainda dormem em “quartinhos de empregadas”, que cuidam das crianças, cozinham e limpam a sujeira para que seus empregadores se dediquem a carreiras muitas vezes mais rentáveis do que o ofício ao qual elas dedicam a vida.

O feminismo decolonial proposto por Françoise Vergès nos possibilita compreender as bases dessa hierarquia social e os mecanismos para sua contestação. Um feminismo insurgente, que denuncia as mazelas da colonização europeia, seja nas Américas, na África ou na Ásia. Que reconhece o racismo como uma invenção destes processos históricos, uma peça fundamental para a consolidação do capitalismo como um sistema internacional de divisão do trabalho a partir da noção de que os povos do Sul global e seus saberes poderiam ser usados e descartados ao gosto dos povos do Norte. Um feminismo decolonial que reivindica o reconhecimento da racialização dos corpos como uma ferramenta de dominação e o epistemicídio, ou seja, a o extermínio de saberes, crenças e culturas como uma política deliberada de apagamento de povos e suas existências.

Para um feminismo que ainda seja potência de transformação da nossa realidade, Vergès nos fala de um movimento que não apenas reivindique a igualdade entre homens e mulheres – afinal, quem são os homens e quem são as mulheres que podem ser iguais? – mas, sobretudo que possa estar engajado na luta anti-imperialista, antirracista e anti-capitalista. E as armadilhas serão muitas em nosso caminho. Como nas décadas de 1980 e 1990, quando organismos internacionais como a Organização das Nações Unidas realizaram várias conferências para discutir os direitos das mulheres e das populações e entre as propostas de empoderamento das mulheres constava a difusão do microcrédito. O empreendedorismo era o código para a expansão neoliberal sobre as mulheres dos países do Sul, empobrecidas pelo colonialismo e pelo imperialismo. Expansão e lucro para os bancos, endividamento para as mulheres.

Qual o lugar dos feminismos na sociedade brasileira atual? Como as mulheres são muitas e vivem em condições muito diferentes, também os feminismos precisam ser plurais. Contudo, se torna cada vez mais necessário um feminismo que reconheça o protagonismo das mulheres que sofrem com o cruzamento do machismo, do racismo, da misoginia, da transfobia, da homofobia e da exploração de classe. Um feminismo que saiba que “(…) a democracia ocidental não nos protegerá mais quando os interesses do capitalismo forem de fato ameaçados”. (VERGÈS, 2020: 37).

Géssica Guimarães – Professora Adjunta de Teoria da História e História da Historiografia da UERJ.


VERGÉS, Françoise. Um feminismo decolonial. São Paulo: UBU Editora, 2020. Resenha de: GUIMARÃES, Géssica. Humanas – Pesquisadoras em Rede. 20 jul. 2020. Acessar publicação original [IF].

Fascismos e novas direitas | Cantareira | 2020

Observamos, nos últimos anos, vitórias como a de Boris Johnson, no Reino Unido; a ascensão de Jean-Marie Le Pen, como grande figura na França; Viktor Orbán, porta-voz da anti-imigração na Hungria; a reeleição de Sebastián Piñera no Chile; o retorno de partidos neofascistas na Alemanha; Rodrigo Duterte, o fascista das Filipinas; e, entre muitos outros, as expressivas vitórias de Donald Trump e Jair Bolsonaro. Essa guinada nos alerta para uma tendência na configuração da política mundial.

Em um contexto de crescimento de movimentos de extrema-direita pelo globo, as temáticas dos fascismos e das novas direitas vêm ganhando cada vez mais destaque e relevância nos debates acadêmicos. Seria o fascismo uma atitude desviante? Uma doença? Uma anomalia do sistema? Um retorno nostálgico a um passado “glorioso”? Além disso, seriam todas as direitas mais radicais, fascistas? Esta discussão foi objeto de grandes nomes dentro da historiografia e das ciências humanas e sociais, como Leandro Konder, Daniel Guerin, Ian Kershaw, William Reich, Antônio Gramsci, Umberto Eco, Hannah Arendt, Robert Paxtone e até mesmo, José Carlos Mariátegui. Cada um, a partir de diferentes abordagens –aproximadas ou discordantes –, elaboraram as suas perspectivas muitas vezes ancorados nas questões anteriormente apontadas.

A despeito das diferentes abordagens, bem como das análises de conjunturas, há um ponto em comum entre os autores: essas correntes, em geral, encontram terreno e se ampliam em cenários de crise, momento em que a classe dominada se sente atacada em todas as suas frações. Acreditamos que, diante da falta de horizonte, perda de status e déficit econômico, é comum que ideias salvacionistas sejam tentadoras. A percepção das causas de tantas perdas é deixada de lado em prol de uma luta contra seus efeitos.

Discursos que ressaltam problemas como: as crises econômicas e moral, a perda de status social e incompetência, a traição e fragilidade do governo etc., tornam-se demasiadamente atraentes para setores da sociedade que não se identificam com as transformações recentes. Assim, todos os medos sentidos são estereotipados na figura do “outro”, o qual, por muitas vezes, será compreendido como inimigo a ser combatido.

Ao analisar a ascensão tanto política, quanto eleitoral, de movimentos de extrema-direita, racistas, xenófobas ou, até mesmo, inteiramente fascistas na atualidade, Michael Löwy ressalta que a crescente emergência desses movimentos tem se dado principalmente em países inseridos no processo de internacionalização da economia e da tecnologia. No ápice do neoliberalismo e, portanto, da transnacionalização do grande capital, as tecnologias e os meios de comunicação também se desenvolveram de modo que abarcasse as novas dimensões das demandas impostas pelos interessados nesta transnacionalização e em suas novas dinâmicas funcionais. Antes, se por um lado, os meios de comunicação operavam de maneira verticalizada, partindo de um para muitos, e sendo unidirecional – como os grandes jornais impressos e os canais de radiodifusão. A internet, por outro, se conforma como uma enorme rede digital de troca de informação maciça, sendo menos centralizada, horizontal e multidirecional. É o que Manuel Castells denomina como “Mass Self-Communication”. Devido ao interesse dos movimentos de direita e extrema-direita contemporâneos em trazer a política para o cotidiano, esses grupos aplicam seus investimentos em canais populares de difusão da informação. Assim, expandem sua ação para a mídia digital, por ser moderna, de fácil acesso, de custo relativamente baixo de produção e ilimitada capacidade de difusão.

Ao considerar o papel das historiadoras e dos historiadores na análise destes fenômenos, o objetivo do dossiê é refletir, conceituar e problematizar a questão do fascismo e das novas direitas, reunindo pesquisas que os discutam e identifiquem suas particularidades, rupturas, continuidades etc. Agrupamos, desta maneira, uma coletânea de seis artigos – que perpassam desde as experiências do século XX até o tempo presente, em distintas partes do Globo –, diretamente associados aos temas centrais. Devido a sua pluralidade, estas produções estão ancoradas em distintas visões e tradições teóricas, com vista a ampliar um rico e diverso debate.

Contamos, no primeiro bloco de artigos, com fascículos acerca da experiência alemã, de essencial importância para a temática. Os autores, habilmente, levantaram questões de extrema relevância para qualquer discussão acerca do nazismo alemão e seus estudos, feito de maneira criteriosa. Karina Fonseca em Como a democracia em Weimar morreu: antirrepublicaníssimo e corrosão da democracia na Alemanha e a ascensão do Nazismo, relaciona a derrocada da República de Weimar aos discursos e práticas políticas antirrepublicanas e antidemocráticas que circulavam durante o período. Luiz P. Araújo Magalhães, em Intelectuais de extrema direita e a negação do Holocausto nos EUA dos anos 1960, analisa a formação de uma rede de intelectuais de extrema-direita estadunidense em torno da prática de negação do Holocausto. O texto defende a hipótese de que essa negação incorpora, informa e é informada por valores, visões do passado, esquemas de percepção e hábitos de pensamento desse campo político. Dessa forma, essa falsificação do passado nazista aparece como criadora ou reprodutora de comunidades de sentido e unidades potenciais de ação.

Breno César de Oliveira Góes oferece uma rica aproximação interdisciplinar entre história e a literatura no que concerne à experiência do Salazarismo em Portugal, fortalecendo o tema deste dossiê com o artigo Os fascistas que liam Eça de Queirós: estratégias da propaganda salazarista em torno de uma celebração literária. O texto analisa o plano original das celebrações oficiais do primeiro centenário de Eça de Queirós em 1945 e os motivos que causaram os descontentamentos da base de apoio do regime em relação a esse projeto. Dessa forma, o autor traz à luz o estudo de ditaduras fascistas na Península Ibérica, muitas vezes posposto pelas produções do nazismo alemão e do fascismo italiano de Mussolini.

O segundo e último bloco de texto se articula a partir da temática do avanço conservador e a articulação da direita no Brasil. Com o delicado e necessário debate sobre a educação em tempos de conservadorismo brasileiro, Eduardo Cristiano Hass da Silva e Gabbiana Clamer Fonseca Falavigna dos Reis, analisam em Avanço conservador na educação brasileira: uma proposta de governo pautada em polêmicas (2018) a superficialidade e apresentação polêmica das propostas educativas presentes no plano do atual governo brasileiro e retomam a importância do papel do intelectual no Brasil.

Na esteira das análises sobre a ascensão do conservadorismo brasileiro, os autores Giovane Matheus Camargo, Pedro Rodolfo Bodê de Moraes e Pablo Ornelas Rosa trazem à tona a importância que a Internet e o ciberespaço tomaram no campo político na contemporaneidade. A (des)construção da memória sobre a ditadura pós-1964 pelo governo de Jair Bolsonaro analisa as estratégias no meio digital para a difusão de uma determinada memória, ancorada no revisionismo histórico que as novas direitas brasileiras têm defendido para sustentar seus projetos de sociedade.

Finalmente, apresentamos duas entrevistas de conteúdo mais estritamente teórico. A primeira, apresenta o diálogo entre o entrevistador Sergio Schargel e o pesquisador multidisciplinar neerlandês e filósofo cultural Rob Riemen. As perguntas, levantadas por Schargel, esclarecem a abordagem do diretor do Nexus Institute, que através de uma tradição teórica consistente e calcada no liberalismo, recuperar a importância do conceito de fascismo e sua utilização na atualidade. A segunda, realizada pelas organizadoras do presente dossiê, foi realizada com docentes de países, vivências e perspectivas teóricas diferentes. A professora italiana Fulvia Zega (Università Ca’Foscari Venezia), e a professora brasileira Tatiana Poggi (IH / UFF), relataram suas posições sobre a ascensão conservadora no mundo, as possíveis particularidades no contexto da América Latina, a utilização do conceito fascismo e neofascismo, bem como de outros aprofundamentos.

O dossiê Fascismos e Novas direitas, nesta edição da Revista Cantareira, nasceu em meio à pandemia do coronavírus (COVID-19), uma crise sanitária internacional que, no contexto brasileiro, ganha o reforço de um Estado suicidário, para fazer menção às palavras de Vladimir Safatle. Como em outros governos – que vêm demonstrando uma preocupação desproporcional com a Economia –, o Brasil pretere a vida humana em nome de uma pretensa preocupação com os números. O intuito, portanto, é contribuir com a análise de acontecimentos recentes, discussões teóricas pertinentes e recuperação histórica das ciências humanas em geral, essenciais para a compreensão crítica do mundo em que vivemos. Através das ilações dos nossos autores, percebemos que não somente há um avanço fascista na política mundial, mas um intento de consolidar uma narrativa conservadora sobre a sociedade civil e a política, bem como das organizações alternativas mais conservadoras. Estes aspectos não são uma novidade do século XXI; tampouco, algo exclusivo ao século passado.

Boa Leitura!

Bárbara Aragon – Mestranda do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense.

Milene Moraes de Figueiredo – Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em História da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.


ARAGON, Bárbara; FIGUEIREDO, Milene Moraes de. Apresentação. Revista Cantareira, Niterói- RJ, n.33, jul / dez, 2020. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

 

From Franco to Freedom. The Roots of the transition to Democracy in Spain, 1962-1982 | Miguel Ângel Ruiz Carnicer

CARNICER M A R
David Alegre Lorenz e Miguel Ãngelo Ruiz Carnicer (direita). Foto: La Esfera de los libros 2018 /

CARNICER M A R From Franco to FreedomLa transformación política surgida de las entrañas de la estructura estatal, en el contexto legislativo, socio-cultural e institucional del tardofranquismo, es uno de los marcos de trabajo de investigación más complejos que puedan existir a día de hoy por muy diferentes motivos. El presente libro, en formato de obra colectiva, pretende clarificar una serie de cuestiones relativas a la motivación del cambio político. Asimismo, la investigación busca la apertura de nuevos espacios temáticos, para arrojar luz sobre los factores desencadenantes de la transformación interna. La planificación del proceso de reciclaje institucional y la adopción de nuevos roles por parte de las magistraturas del Estado buscaron el establecimiento de unas pautas de comportamiento programadas (por algunos integrantes de la cúpula política de la dictadura) para evitar que el proceso de transición a la democracia se descontrolase. En términos de puridad metodológica, el periodo histórico que va desde 1962 a 1982, hace posible que el trabajo de investigación sea sólido, con fundamentos comparativos y descriptivos muy amplios.

Miguel Ángel Ruiz Carnicer (Departamento de Historia, Universidad de Zaragoza), editor de From Franco to Freedom1 (RUIZ CARNICER, 2018), realiza una labor de coordinación e integración de trabajos notable. En líneas generales, el conjunto de las contribuciones busca la implementación de un contexto de originalidad y proporciona nuevos puntos de vista sobre la fase final de la dictadura, mediante el estudio de los condicionantes externos y los contextos internos que influyeron en los lentos ritmos del cambio. Como en el resto de su trayectoria de investigación, el editor pone el foco en la transformación de las mentalidades colectivas y el escenario socio-cultural. Los diferentes aportes a la investigación tienen una clara naturaleza multidisciplinar y una estructura bastante equilibrada (en su dimensión y en forma). El cuerpo del texto se compone de ocho capítulos, cada uno de ellos cuenta con una conclusión y un epígrafe de referencias documentales. En la parte final existe un aparatado con la información biográfica de los investigadores participantes y el índice alfabético. El trabajo no cuenta con una conclusión final conjunta. Leia Mais

Mulheres e caça às bruxas: da Idade Média aos dias atuais | Silvia Federici

Silvia Federici nasceu em Parma, Itália, em 1942 e vem ganhando cada vez mais leitores e leitoras no Brasil. Em seus trabalhos discute sobre mulheres, gênero, trabalho e como a reprodução – e o trabalho doméstico/reprodutivo – são as chaves para compreender a desvalorização das mulheres na sociedade capitalista.

No livro “Mulheres e caça às bruxas”, lançado no Brasil em 2019, Federici faz uma retomada da discussão desenvolvida no livro “O Calibã e a Bruxa” de 2004, traduzido para o português pelo Coletivo Sycorax e publicado pela Editora Elefante em 2017. Naquele momento, Federici (2017) se preocupava em demonstrar como o processo de acumulação primitiva do capital foi alcançado também a partir da caça às bruxas da era moderna, num amplo e profundo processo de perseguição e disciplinarização dos corpos femininos, da sociabilidade e da reprodução, a incidir sobre a divisão sexual e na desvalorização (e não remuneração) do trabalho doméstico e reprodutivo. A proposta dela era alçar a caça às bruxas ao hall de elementos expostos por Marx sobre a acumulação primitiva, tais como a expropriação agrária dos cercamentos ingleses, o colonialismo, a pirataria e a usura (MARX, 1985). Apesar da centralidade nas relações sociais e no trabalho, não há um consenso se Federici efetivamente avança com as teses de Marx , porém, n’O Calibã, o acúmulo de fontes e experiências daquele processo extensamente analisado revelam, no mínimo, que o capital não teria tamanha força social sem a diminuição proporcional do poder horizontal e comunitário das mulheres. Leia Mais

A short history of European law: the last two and a half millennia | Tamar Herzog

Dentre os gêneros da literatura jurídica, manuais e textos introdutórios ocupam uma posição bastante singular: por se tratar de uma primeira leitura sobre determinado tema, eles não devem adotar uma complexidade que assuste o leitor iniciante, ao mesmo tempo que precisam se afastar de lugares comuns, de visões metodologicamente ultrapassadas e mesmo de conteúdo materialmente pouco aprofundado. Não é incomum se deparar com o argumento de que, como os manuais são uma leitura inicial, podem deixar pontos abertos (ou mesmo sem uma precisão integral em tudo o que se pretenda abordar) a serem preenchidos por estudos mais específicos, os quais só seriam feitos por quem necessitasse ou optasse pelo aprofundamento do conhecimento na área.

Ao adotarem essas estratégias, muitos autores de manuais apresentam textos deficientes que frequentemente refletem um déficit também na sua formação, o que se torna facilmente perceptível ao leitor mais atento. O resultado acaba materializando um ciclo vicioso, pois manuais fracos dificilmente inspirarão alunos a se tornarem pesquisadores na área. Por outro lado, manuais publicados por autores com uma formação sólida tendem a ter a qualidade necessária para o duplo objetivo de qualquer obra com essa natureza: servir como ponte para o aprofundamento da minoria que decidir se especializar e, para a maioria, fornecer subsídios mínimos para uma compreensão ampla e adequada das principais discussões da área específica. Leia Mais

Authoritarianism and corporatism in Europe and Latin America: crossing borders | A. C. Pinto e F. Finchelstein

Para aqueles que se aventuram em entender os corporativismos do século XX, impressiona a amplitude e a diversidade da documentação produzida sobre o assunto, assim como da literatura nas ciências sociais que desde então tentou interpretar o fenômeno. O interesse, que faz deste um tema clássico nas ciências sociais, não é de todo fortuito. Os modelos corporativistas formularam respostas teóricas e institucionais para um dos problemas fundamentais da política moderna: a conciliação da diversidade dos interesses sociais com a unidade do Estado, então, há pouco mais de um século, diante do surgimento de grupos organizados de uma sociedade de massas (Gagliardi, 2014). Na definição conhecida de Philippe Schmitter, recuperando a previsão confiante de Mihail Manoilescu, o século XX parece ter sido o século do corporativismo (Schmitter, 1974). Leia Mais

Rock cá/ rock lá: a produção roqueira no Brasil e em Portugal na imprensa – 1970/1985 | Paulo Gustavo da Encarnação

Bichos escrotos saiam dos esgotos

Bichos escrotos venham enfeitar […]

Bichos, saiam dos lixos

Baratas me deixem ver suas patas

Ratos entrem nos sapatos

Do cidadão civilizado

(TITÃS, 1986).

Nas favelas, no Senado

Sujeira pra todo lado

Ninguém respeita a Constituição

Mas todos acreditam no futuro da Nação

(LEGIÃO URBANA, 1987)

O primeiro fragmento citado compõe a letra da música “Bichos escrotos”, do álbum Cabeça Dinossauro da banda Titãs. Ainda que apresentada em shows desde o começo da década de 1980, a música foi gravada apenas em 1986. O motivo: a censura imposta no regime militar. Já o segundo excerto compõe o disco Que país é este, da banda Legião Urbana. Lançado no álbum de 1987, a música, igualmente intitulada “Que país é este”, rapidamente se transformou num hit da banda e embalou gerações. Ambas foram oficialmente lançadas nos anos iniciais do processo de redemocratização do Brasil. Contêm críticas profundas ao período e aos fundamentos da Nova República, denominação cunhada para tratar do período iniciado com o fim da ditadura militar (FERREIRA; DELGADO, 2018).

Elas foram (e são) entoadas por jovens de diferentes gerações como canções de protesto e contestação à ordem política vigente e à estrutura social. Embora trintonas, são extremamente atuais para pensarmos o cenário político brasileiro, as relações entre Executivo e Legislativo e, principalmente, as práticas políticas adotadas. Afinal, atualmente ainda sobram “bichos escrotos” que desrespeitam a Constituição, mas, apesar da dura realidade enfrentada pelo cidadão brasileiro, entoam fábulas encantadoras sobre o “futuro da Nação”.

Não obstante, as canções também possibilitam aprofundar a discussão acerca das complexas relações entre história, rock, mídia e política. E suscitam outras importantes indagações, tais como: O que é rock? É um gênero nacional ou estrangeiro? É popular ou elitista? É música de caráter alienante ou música de protesto? É expressão de posturas progressistas ou conservadoras? Como é comumente classificado por agentes do campo midiático?

Esses são alguns dos problemas argutamente debatidos pelo trabalho recém-publicado por Paulo Gustavo da Encarnação, doutor em história pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e com estágio pós-doutoral realizado na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Fruto da sua tese de doutorado, sob a orientação do professor doutor Áureo Busetto, e com estágio de pesquisa em Portugal, o historiador publicou o livro intitulado Rock cá, rock lá: a produção roqueira no Brasil e em Portugal na imprensa (1970-1985).

A obra apresentada se inscreve no horizonte da chamada “história política renovada”, que, como formulado por René Rémond (1996), concebe a amplitude dos objetos enfocados pela história política. Toma o rock como objeto com potencial para o conhecimento de práticas políticas diversas e múltiplas dimensões da identidade coletiva — perspectiva que possibilita adentramos “terrenos que, mesmo aparentemente apresentados como paisagens desérticas e estéreis, são searas para serem trilhadas pelo historiador do contemporâneo” (ENCARNAÇÃO, 2018, p. 32). O autor do livro observa a “relação rock/política como resultado de um feixe de relações sociais, cujos subsídios principais podem ser percebidos em discursos, nos comportamentos e, inclusive, nas aparentes ausências de elementos e ingredientes da política” (ENCARNAÇÃO, 2018, p. 32).

Com tais preocupações, Paulo Gustavo da Encarnação procura demonstrar as proximidades entre o rock brasileiro e o lusitano entre as décadas de 1970 e 1980. Aponta semelhanças entre os países; por exemplo, os períodos de ditadura. Mas também cuida das particularidades. Munido de uma perspectiva comparativa, afasta-se de visões totalizantes, hegemônicas e uniformes para pensar os agentes e expedientes dos universos roqueiros brasileiro e português. Como bem lembrou Marc Bloch sobre o trabalho do historiador (2001, p. 112), “no final das contas, a crítica do testemunho apóia- se numa instintiva metafísica do semelhante e do dessemelhante, do Uno e do Múltiplo”.

Assim, o livro busca refletir comparativamente acerca das características do rock lusitano e do brasileiro. Para tanto, leva em conta parâmetros linguístico-poéticos e musicais na análise de canções com críticas sociais e políticas. Procura demonstrar como o gênero foi classificado, respectivamente, por agentes brasileiros e portugueses, ocupando-se especialmente das definições e dos estereótipos formulados pelos integrantes do universo midiático, assim como da constituição e atuação da crítica musical veiculada em cadernos jornalísticos específicos e/ou em revistas especializadas. Portanto, historiciza o rock e o modo como o gênero foi tomado pela imprensa nos universos brasileiro e português.

Com relação à imprensa, concebe as diferentes e, por vezes, antagônicas facetas que conferem existência a uma empresa midiática. Compreende o estatuto das suas fontes e explica, detalhadamente, os passos trilhados para a realização do estudo. Apresenta, por exemplo, o modo como constituiu quadros temáticos para realização da pesquisa documental e para o trabalho com a bibliografia — expediente que possibilitou estruturar uma narrativa fluente e pouco afeita apenas à exposição cronológica e linear dos fatos.

Com base nos dados obtidos em pesquisa documental de fôlego e a partir da consulta crítica e assertiva à ampla e diversificada bibliografia, o pesquisador expõe consistente tese sobre o tema:

O rock produzido em língua portuguesa, no Brasil e em Portugal, desde os anos 1950 vinha num processo de nacionalização que culminaria, a partir da década de 1970 e, com especial destaque, para os anos 1980, no denominado rock nacional. […] defendemos a tese de que o rock produzido durante o período de 1970-1985 expressou e lançou mensagens musicais e críticas políticas. Ele se tornou, por conseguinte, um catalisador e um difusor de anseios e visões de mundo de uma parcela da juventude que não estava disposta a ver suas expectativas com relação à vida cultural e à política encerradas nas dicotomias: nacional/ estrangeiro, popular/elitista, capitalismo/socialismo (ENCARNAÇÃO, 2018, p. 25).

Além de fértil e sólida tese, o leitor terá a oportunidade de conhecer o trabalho de um pesquisador incansável que minerou e lapidou dados e elementos históricos. Ademais, o livro de Paulo Gustavo da Encarnação é leitura obrigatória para pesquisadores que apreciam a constituição de séries no trabalho de pesquisa documental, a organização do material e sua exposição numa narrativa envolvente, sem, contudo, renunciar ao enfretamento de densas e qualificadas questões teórico-metodológicas. Ao longo dos quatro capítulos, o leitor terá a chance de conhecer a história do rock e, também, uma potente análise sobre as relações desse gênero musical com a mídia e a política no Brasil e em Portugal.

Se, por um lado, o trabalho de Paulo Gustavo nos ensina sobre um objeto específico e a operação do historiador num recorte temporal definido, comparando práticas em dois espaços distintos, por outro lado, chama atenção para a importância de entendermos o universo político para além das leituras simplistas sustentadas por visões duais e dicotômicas de mundo. Essa não seria, aliás, uma necessidade da nossa frágil democracia? Que a leitura de Rock cá, rock lá fomente a reflexão e o debate. E que os leitores experimentem mais do que visões binárias e esquemáticas de mundo. Afinal, como o autor colocou, o rock “é uma miscelânea de difícil definição”, mas como “posicionamentos que buscam criticar os pilares da sociedade”, expressando, “muitas vezes, elementos, mensagens e linguagem contestadoras” (ENCARNAÇÃO, 2018, p. 267-8).

Referências

BLOCH, Marc. Apologia da história ou o ofício do historiador. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

ENCARNAÇÃO, Paulo Gustavo da. Rock cá, rock lá: a produção roqueira no Brasil e em Portugal na imprensa – 1970/1985. São Paulo: Intermeios; Fapesp, 2018.

FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucila de Almeida Neves (Org.). O tempo da Nova República: da transição democrática à crise política de 2016 – Quinta República (1985-2016). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018. v. 5.

LEGIÃO URBANA. Que país é este. In: LEGIÃO URBANA. Que país é este. Rio de Janeiro: EMI-Odeon Brasil, 1987. 1 áudio (2 min. 57).

RÉMOND, René. Por uma história política. Rio de Janeiro: UFRJ/FGV, 1996.

TITÃS. Bichos escrotos. In: TITÃS. Cabeça Dinossauro. Rio de Janeiro: Warner, 1986. 1 áudio (3 min. 17).

Edvaldo Correa Sotana – Mestre e doutor em História pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP/Assis). Professor da Graduação e do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). E-mail: [email protected]


ENCARNAÇÃO, Paulo Gustavo da. Rock cá, rock lá: a produção roqueira no Brasil e em Portugal na imprensa – 1970/1985. São Paulo: Intermeios/Fapesp, 2018. Resenha de: SOTANA, Edvaldo Correa. Rock, mídia e política: história numa perspectiva comparada. Albuquerque – Revista de História. Campo Grande, v. 12, n. 24, p. 225-228, jul./dez., 2020.

Acessar publicação original [DR]

Viandante nel Novecento. Thomas Mann e la storia | Domenico Conte

Já definido como “monumental”, “rico”, “policromático” e “diverso”, o recente e imponente livro de Domenico Conte, intitulado Viandante nel Novecento. Thomas Mann e la storia, reúne, dividido em quatro partes (“História e mito”, “Política e primitivismo”, “Natureza e espírito”, “Benedetto Croce e Thomas Mann”), vinte e dois ensaios publicados pelo autor no período entre 2009 e 2018.

E precisamente o tempo, protagonista destas páginas juntamente com Mann, faz com que o tom do historiador da cultura napolitano em direção ao escritor de Lübeck, seja, sim, cheio de admiração, mas nunca subserviente ou temeroso, tornando-se cada vez mais familiar, tanto que se dirige a ele não apenas com o nome de batismo, Thomas, mas com o diminutivo Tommy. O que, como é evidente, representa uma marca de proximidade, uma intimidade cujas raízes devem ser procuradas no passado ou, aqui talvez seja mais adequado dizer: mais para lá, mais abaixo. De fato, o vínculo que une Conte a Mann é, como ele próprio confessa, “uma espécie de fidelidade”. Leia Mais

Sulla vocazione per la politica. Max Weber e le “Politische Stimmungen” di Karl Jaspers | Edoardo Massimilla

Publicado em 2019, o ensaio de Edoardo Massimilla, Sulla vocazione per la politica. Max Weber e le “Politische Stimmungen” di Karl Jaspers, inaugura, retomando uma ideia originária de Pietro Piovani, a nova série dos “Quaderni di storia della cultura” da antiga e prestigiosa “Accademia di Scienze morali e politiche” de Nápoles.

Nele, partindo da “ampla” introdução à “excelente” antologia dedicada a Weber como pensador político de Francesco Tuccari, Massimilla propõe uma comparação crítica, articulada e minuciosa, entre as reflexões de Max Weber sobre a ação política e as de Karl Jaspers, que nunca deixou de observar as reflexões de Weber. E, para tanto, depois de ter percorrido facilmente os “três níveis de articulação da reflexão política weberiana” apontados por Tuccari – o relativo à sociologia do poder; o outro dedicado à política alemã da época, e o terceiro, relativo à elaboração de uma teoria geral da política moderna” (5-6) – o autor identifica no último destes aquele em que, mais do que nos outros, são presentes elementos que permitem uma comparação fecunda, na esfera política, entre os dois pensadores (16). Leia Mais

La mamma, Collana L’identità italiana – D’AMELIA (BC)

D’AMELIA, Marina. La mamma, Collana L’identità italiana. Bologna: Il Mulino, 2005. 311p. Resenha de: TIAZZOLDI, Livia. Il Bollettino di Clio, n.13, p.124-127, lug., 2020.

Marina d’Amelia, docente di storia moderna all’Università “La Sapienza ” di Roma e appartenente alla Società Italiana delle Storiche, si propone con questo libro di rispondere a un interrogativo ben preciso: quando nasce in Italia lo stereotipo della mamma responsabile della mancanza di senso civico da parte di cittadini educati al protagonismo individuale più che al senso del bene comune? Un rapporto madre-figlio per descrivere il quale, negli anni ’50, Corrado Alvaro introduce il termine mammismo.

L’autrice si propone di dimostrare che questa immagine materna nasce col nuovo stato italiano, poco più di due secoli fa. Non vi è traccia infatti di madri iperprotettive nella civiltà romana, caratterizzata dalla centralità del padre, dove le donne delle famiglie più ricche si facevano sostituire dalle balie nella cura dei figli e ne affidavano l’educazione a istitutori e maestri. La tradizione giurid ica romana della patria potestà si è tramandata per un lunghissimo periodo informando di sé i codici di comportamento delle strutture familiari medievali e moderne.

Solo a partire dal tardo Settecento la mentalità collettiva comincia a guardare in modo nuovo alla relazione madre-figlio. Si fa strada una nuova visione del matrimonio, della famiglia e la consapevolezza dell’importanza del legame materno soprattutto con il figlio maschio.

Nel corso dell’Ottocento la cultura romantica, centrata sulla rivalutazione del sentimento e degli affetti privati, riscopre il femminile, attribuendo alla madre un ruolo privilegiato nella formazione sentimentale dei figli e anche un importante ruolo pubblico.

Nel volume, corredato da un’amp ia bibliografia illustrata e commentata, l’autrice delinea i tratti dell’immagine della madre italiana ripercorrendo i momenti fondamenta li del suo definirsi dal Risorgimento alla II guerra mondiale, rievocando molte figure femminili, molte testimonianze, scritture pubbliche e private.

Le madri risorgimentali

L’identità della madre italiana nasce nel Risorgimento ed è caratterizzata da un rapporto quasi simbiotico con il figlio, dall’ammirazione per tutto ciò che fa, da un eccesso di protezione nei suoi confronti e dall’intromissione nella sua vita privata.

È importante ricordare come il matrimo nio per le donne di quell’epoca non fosse frutto di una libera scelta, ma dell’obbedienza a una decisione paterna. La maternità invece era vista come vocazione e missione legata alla “rigenerazione della patria” attraverso l’educazione dei figli agli ideali di libertà, dedizione e senso del sacrificio, valori che saranno alla base della nuova Italia.

La figura della madre del patriota risorgimentale, dedita a sostenerlo durante l’esilio o nelle guerre di indipendenza, nasce negli ambienti patriottici mazziniani.

Dopo il 1848 si registra un maggio re coinvolgimento delle madri a favore dell’indipendenza italiana: organizzano campagne di propaganda con giornali e manifesti volti a mobilitare l’opinio ne pubblica.

Maria Drago, madre di Giuseppe Mazzini, e Adelaide Cairoli e i suoi numerosi figli si affermano come l’asse portante del mito di un Risorgimento che ne riconosce l’importanza pubblica in quanto capaci di mettere in moto grandi emozioni collettive.

Dopo l’Unità d’Italia, nel momento in cui si tratta di riscrivere la storia, l’icona della madre sacrificale viene posta alla base di un nuovo sentimento nazionale: diviene mito fondativo, emblema di una comune madre patria che unisce tutti i suoi figli in un comune vincolo di fratellanza.

La madre angelo del focolare nell’età liberale

In un momento storico in cui la maggioranza della popolazione italiana viveva in precarie condizioni di vita il pensiero positivista assegna alle madri il compito di rigenerare il patrimonio fisico e razziale della nazione, facendosi promotric i dell’allenamento ginnico sia dei figli che delle figlie e garantendo l’igiene dell’ambiente in cui li crescono. Si tratta di abbassare il tasso di mortalità infantile e di innalzare quello di alfabetizzazione.

Il nuovo modello è dunque quello della madre totalmente dedita alla casa, al benessere familiare, disponibile ad accogliere le indicazioni degli esperti sull’allevamento e sull’educazione dei bambini.

Le materie di igiene ed economia domestica entrano a far parte del currico lo scolastico dal 1899; proliferano inoltre manuali, riviste dedicate al pubblico femminile che insegnano alle donne come fare le madri.

In tal modo, osserva giustamente l’autrice, la presenza e l’ingerenza della madre nella vita del figlio diventa ancor più indiscutibile, fondata com’è su basi scientifiche.

Lo Stato si premura comunque di ribadire la preminenza della volontà paterna nella vita dei figli, ma questo non impedisce di perpetuare in altra forma l’idea di una relazione materna appagante di per se stessa, all’interno della quale le donne possono sublimare una vita fatta di subalternità e insoddisfazione coniugale.

L’amore materno è insomma un sentimento esclusivo, molto diverso da quello paterno, che non lascia spazio ad altro. Deriva da un compito preciso assegnato dalla Natura alla donna in quanto conservatrice della specie e somiglia ad una lava sempre rovente che ribolle continua nel vulcano del cuore. Solo dopo Freud, aggiunge l’autrice, ci si interrogherà su quali ambivalenze si nascondano dietro tanta dedizione materna.

Ben radicata rimane la centralità della maternità nel primo decennio del Novecento e se ne trovano molte testimonianze nelle riviste femminili che, pur riconoscendo il diritto all’emancipazione femminile , insistono sulla specificità della donna latina , contenta di essere donna grazie alla missio ne ricevuta dalla Natura di mettere al mondo un figlio.

La maternità si impone dunque come elemento fondante e irrinunciab ile dell’identità femminile, contrappo sto all’egomania che connota l’unive rso mentale maschile.

La madre cattolica

La Chiesa cattolica non si sottrae al compito di indicare le caratteristiche della madre ideale, incaricata dell’educazione religiosa dei figli, chiamata a difendere il suo sacerdozio d’amore, così lo definisce Beppe Fenoglio nel libro La vera madre di famiglia, dalle richieste di uguaglianza e parità, dalla pericolosa concorrenza di dottrine laiche , dalla tentazione di seguire le mode straniere del tempo.

Caratteristica peculiare della madre cattolica è quella di dover essere una presenza silenziosa, capace di controllare le proprie emozioni. Le parole che non siano preghiere sono giudicate superflue e immodeste. Va coltivata anche la virtù del non rivendicare mai le proprie ragioni, pur sapendo di averle, ma di soffocare gli scontri in un sospiro, di nascondere e dissimulare le pene. Il Papa Pio X nel 1906 dichiara che la donna non deve votare, ma deve votarsi a un’alta idealità di bene umano.

Degli ideali di emancipazione femmin ile si fanno carico nel frattempo associazioni e movimenti di ispirazione socialista che si battono per l’istruzione, la parità salaria le fra uomo e donna e il suo diritto al voto.

I primi anni del Novecento vedono un importante cambiamento nelle direttive cattoliche che incoraggiano sia l’istruz io ne che la partecipazione femminile alla vita pubblica. Si riconosce alle donne il ruolo missionario di difesa dei valori cristia ni nella società.

Madri e Grande guerra

In piena continuità con il modello sacrificale proposto in età risorgimentale, la guerra chiede alle madri italiane di appellarsi al proprio senso del dovere e di sostenere i figli impegnati nello sforzo bellico, sintonizzandosi con il loro vissuto emotivo soprattutto attraverso lo scambio epistolare che raggiunge quasi i quattro miliardi di lettere e cartoline, con una media di circa tre milioni al giorno. Ne risulta un’immagine di madre disposta a penare silenziosamente, centrata sul desiderio di rispecchiare le aspirazioni dei figli e percepita come un talismano, come presenza salvifica, ultimo rifugio dallo smarrimento.

La guerra attiva inoltre molti organismi di solidarietà e di mobilitazione civile che riconoscono un ruolo centrale alle madri, ruolo ribadito alla fine del conflitto quando lo Stato italiano decide di celebrarne l’eroismo e il sacrificio con un monume nto , La Pietà di Libero Andreotti, collocato nella Chiesa di Santa Croce a Firenze e idealmente collegato con quello del Milite Ignoto a Roma.

L’enfatizzazione di questo specifico ruolo della donna lascia troppo nell’omb ra , secondo l’autrice, alcuni elementi chiave della vita femminile di questi anni come le manifestazioni contro la guerra, la diffusione del lavoro femminile, la crescente fatica di sopravvivere di molte donne diventate capifamiglia e l’impossibilità di dare voce a sentimenti e angosce repressi in nome della coerenza.

La figura della madre in epoca fascista

Alla celebrazione della maternità il fascismo dedica una festa particolare: la Giornata della madre e del fanciullo, grande “rito di amore e orgoglio nazionale” avente lo scopo di sollecitare l’incremento della popolazione.

Vi si celebra l’immagine della donna sposa e madre prolifica esemplare, tenace custode della morale sessuale tradiziona le , soprattutto nei confronti delle figlie femmine, anche se i confini di ciò che è lecito vengono definiti dal padre. Il comportamento autoritario della famiglia ha come conseguenza quella di reprimere il desiderio di affermazione e indipendenza delle figlie.

Il partito fascista cerca in ogni modo di evitare qualunque possibile commistione fra maschi e femmine sia in ambito scolastico che durante le manifestazioni pubblic he riservate ai giovani.

Comunque, grazie alle adunanze, alla divisa, alle decorazioni, le ragazze scoprono la possibilità di una sia pur piccola liberazione dal controllo familia re , alimentando in se stesse il desiderio di un’emancipazione futura.

Il modello ideale proposto dal regime fascista è quello di Rosa Maltoni, la madre del Duce, donna semplice ma ricca di spiritualità , trasformata nel mito celebrativo della donna capace di sostenere l’ascesa sociale dei figli, opponendo un fermo rifiuto a tutti i mali che possono disgregare la famiglia. Predappio, luogo natale di Mussolini diviene meta di pellegrinaggi per onorare in lei tutte le madri della Nuova Italia.

La figura della madre nella seconda guerra mondiale e nella Resistenza

Mentre il Risorgimento e la Grande guerra avevano fatto leva sull’ero ismo silenzioso delle madri comuni disposte al sacrificio pur di sostenere la causa patriottica, la seconda guerra mondiale ne esalta questa caratteristica soltanto fino all’ 8 settembre 1943 che vede il disgregarsi improvviso dell’esercito.

Le madri non vengono risparmiate dall’orrore di quanto accade successivamente ed è difficile per loro superare la barriera delle opposte appartenenze dei propri figli.

Alcune si ritrovano ad essere madri di partigiani o partigiane esse stesse pronte ad impegnarsi e lottare nella Resistenza, altre si schierano con il fronte dei Repubblichini di Salò arruolandosi nel servizio ausilia rio femminile.

Il pensiero della madre percepita come rifugio rassicurante accomuna invece il sentire dei due schieramenti, a conferma di una fratellanza che la logica di guerra nega, ma anche di uno stretto collegamento fra istinto di sopravvivenza e bisogno di protezione.

Livia Tiazzoldi

Acessar publicação original

[IF]

Storia della famiglia in Europa – BARBAGLI; KERTZER (BC)

BARBAGLI, Marzio; KERTZER, David I. (a cura di). Storia della famiglia in Europa. Roma: Il Novecento; Bari: Laterza, 2005. Resenha de: RABUITI, Saura. Il Bollettino di Clio, n.13, p.127-130, lug., 2020.

Questo volume sul Novecento, è l’ultimo dei tre volumi della Storia della famiglia in Europa, la fortunata opera curata da Marzio Barbagli e David I. Kertzer. Nel 2002 e nel 2003 erano usciti i due precedenti volumi: Dal Cinquecento alla Rivoluzione francese e Il lungo Ottocento.

Ogni volume è aperto da una corposa introduzione dei curatori e raccoglie dieci saggi, articolati in quattro sezioni (economia e organizzazione della famiglia; lo Stato, la religione, il diritto e la famiglia; forze demografiche; relazioni familiari) che individuano gli ambiti considerati dalla ricerca, da quelli economici a quelli demografici, culturali, giuridici e sociali.

In questo terzo volume sul Novecento è particolarmente approfondita l’analisi delle politiche familiari, sia nei regimi dittatoria li (Le politiche sulla famiglia dei grandi dittatori di Paul Ginsborg e Famiglie socialiste? di Alain Blum) che democratici (Politiche sociali e famiglie di Chiara Saraceno) che in tempo di guerra (La famiglia in Europa e le due guerre mondiali di Jay Winter). Forte è anche l’attenzione al ruolo delle donne in rapporto all’economia, al lavoro, alle politic he governative e ai legami intergenerazio na li (Trasformazione economica, lavoro delle donne e vita familiare di Angélique Janssens; I legami di parentela nella famiglia europea di Martine Segalen).

Il volume si chiude fotografando il passaggio, soprattutto nell’ultima parte del secolo, dalla famiglia alle famiglie, alla varietà delle forme di famiglia (La famiglia contemporanea: riproduzione sociale e realizzazione dell’individuo di François de Singly e Vincenzo Cicchelli; Angéliq ue Janssens; I legami di parentela nella famiglia europea di Martine Segalen).

Nel suo complesso l’opera indaga le trasformazioni della famiglia nel lungo arco temporale di cinquecento anni e nel vasto spazio di tutta l’Europa, “intesa come continente di circa 10 milioni di chilometri quadrati, delimitato a ovest dall’oceano Atlantico, a est dalla dorsale degli Urali e dal fiume Ural, a nord dal mare Artico e a sud dal mare Mediterraneo, il mar Nero e il mar Caspio. Un continente che all’inizio del Cinquecento aveva circa 81 milioni di abitanti e oggi ne ha 730 milioni” (p. V) L’intento dichiarato dai curatori non è solo quello di esaminare in una prospettiva comparata “i modi in cui le famiglie si formano, si trasformano, si dividono, la frequenza dei matrimoni e l’età a cui li si celebra, le regole di residenza dopo le nozze, le relazioni fra mariti e mogli, genitori e figli, la fecondità, la frequenza delle separazioni legali e dei divorzi.” È anche quello di cercare i nessi tra i cambiamenti nella sfera domestica e le trasformazioni economiche, sociali, politiche e soprattutto di arrivare a individuare “se, e in che misura, le società europee siano diventate più simili o più dissimili riguardo alle caratteristiche della vita domestica” (pp. V-VI) nell’arco dei cinque secoli considerati.

A questo interrogativo i curatori offrono una risposta conclusiva nelle quaranta pagine dell’Introduzione ai saggi che compongono questo terzo volume, là dove individ uano processi di convergenza e di divergenza fra le società europee. A conclusione del percorso di ricerca e in estrema sintesi, Barbagli e Kertzer ritengono infatti di poter affermare che “nei primi tre secoli [considerati] siano prevalse le tendenze alla divergenza” (p. 32), ovvero che siano cresciute, alla fine del Settecento, le differenze tra i vari paesi e regioni d’Europa (volume 1); che nell’Ottocento invece si siano registrate tendenze sia divergenti che convergenti e che siano continuate ad esistere, fra le diverse aree, differenze enormi (volume 2); che Il Novecento sia da considerarsi infine “il secolo della convergenza”, un secolo che ha visto “il mondo domestico dei vari paesi europei sempre più simile” (p. 38) Forti convergenze fra i paesi europei si sono avute per tutto il Novecento per quel che riguarda le strutture degli aggregati familiari.

Da questo punto di vista infatti nel corso del secolo si è affermata la famiglia nucleare e coniugale: è diminuito ovunque e continuativamente il numero medio di persone per famiglia e il numero di persone che dopo le nozze andava ad abitare con i genitori del marito o con parenti ed è cresciuto ovunque, soprattutto nella seconda metà del secolo, il numero di quelle che vivono sole, in conseguenza del più alto livello sia del reddito che della speranza di vita.

Ancora più forte, seppur assai discontinua, è stata poi la convergenza sul declino della fecondità, un processo che ha investito, con forti oscillazioni nei periodi bellici e postbellici, la popolazione europea di tutti gli strati sociali e fedi religiose, sia delle città che delle campagne. Altrettanto forte e discontinua è stata la tendenza all’aumento delle separazioni legali e dei divorzi, che nel corso del Novecento sono diventati un fenomeno di massa, mentre nei secoli precedenti avevano riguardato un numero molto limitato di coppie.

Meno netta e ancor meno lineare è stata la convergenza su altri aspetti quali ad esempio la nuzialità (rispetto alla quale l’Europa occidentale si differenzia ancora da quella orientale) o il divorzio o la convivenza more uxorio. In questo caso è l’Europa nord occidentale che si differenzia da quella mediterranea (vedi il saggio Una transizione prolungata: aspetti demografici della famiglia europea di Theo Engelen).

Nel corso del secolo, le somiglianze sono cresciute anche per quel che riguarda la divisione del lavoro e la distribuzione del potere all’interno delle famiglie (fra mariti e mogli, genitori e figli), il diritto di famiglia, le norme sul matrimonio, i rapporti patrimonia li fra i coniugi, le successioni, il divorzio, lo stato dei figli un tempo “illegittimi”.

La riduzione (e non certo l’azzeramento ) delle differenze tra aree geografiche e sociali dell’Europa non è il risultato di un processo lineare. Solo alcune delle trasformazioni che sottendono le convergenze sono state continue e lineari (ad esempio la semplificazione delle strutture familiari). Altre invece (come ad esempio il declino della fecondità) hanno oscillato fra accelerazioni, rallentamenti e anche inversioni di tendenza.

Le profonde trasformazioni della vita familiare che il Novecento ha conosciuto sono state a volte precedute mentre altre volte hanno fatto seguito a cambiamenti del diritto che (vedi Il diritto di famiglia in Europa di Paola Ronfani), all’inizio del secolo, in tutti i paesi, attribuiva in ambito domestico particolari poteri al marito (capofamiglia, con potestà maritale e patria potestà, col diritto di controllare e gestire il patrimonio familia re …). Queste trasformazioni hanno intaccato ma non eliminato diseguaglianze di genere e si sono accompagnate e intrecciate con due tendenze di convergenza generalizzabili in tutta Europa: l’aumento delle donne occupate in attività extradomestica retribuita e l’invecchiamento della popolazione.

Infine va ricordato che la riduzione delle differenze fra aree geografiche e sociali non ha riguardato tutti i molteplici aspetti del mondo familiare, neppure tutti quelli indagati nei saggi che compongono il terzo volume. La fine del secolo registra insomma ancora importanti differenze nella vita familiare dei vari paesi, alcune di antichissima origine altre più recenti.

Per quel che riguarda le prime, basti ricordare ad esempio che risalgono alla seconda metà del Cinquecento i diversi atteggiamenti, basati sul credo religioso, rispetto al divorzio, ancora meno frequente nei paesi mediterranei. (Alla fine del ‘900, il numero dei divorzi/separazio ni legali andava da 10 a 20 su ogni 100 matrimo ni in Italia, Spagna, Grecia, Portogallo mentre era superiore a 40 in molti paesi dell’Europa settentrionale e orientale).

Fra le differenze di origine più recente, basti ricordare ad esempio quelle riconducibili alle nettamente diverse politiche sociali e familiari perseguite dai paesi nord occidentali e da quelli del Mediterraneo. Italia, Spagna, Grecia, Portogallo poco sostengono il costo dei figli o la cura degli anziani e poco aiutano a concilia re lavoro e famiglia, scaricando i compiti di cura e di riproduzione sociale quasi esclusivamente sulla famiglia o per essere più precisi sul lavoro domestico non pagato delle donne. Non a caso, alla fine del secolo, la quota di donne con un lavoro retribuito era nei paesi mediterranei assai più bassa che nei paesi nord occidentali.

Dalla pubblicazione del volume sul Novecento sono trascorsi quindici anni, durante i quali la ricerca sulla famiglia ha continuato a rinnovarsi. I meriti dell’inte ra opera comunque rimangono tutti e stanno innanzitutto nella ricca e chiara sintesi che offre sul tema, in una prospettiva comparata, su un lungo arco temporale e un vasto spazio territoriale. Stanno anche nell’ approccio multidisciplinare che ha visto all’opera studiosi di storia, sociologia, antropologia, demografia, economia, diritto, ambiti tutti necessari per delineare il complesso e variegato quadro delle famiglie, oggi come ieri. Stanno infine – e penso ovviamente ad un suo possibile utilizzo a scuola- nel mostrare il ‘900 non solo come il secolo delle guerre mondiali, delle crisi economiche, delle dittature, dei totalitarismi, dei genocidi, ma anche come il secolo dei diritti civili e sociali, dell’avvento dello Stato di welfare, delle profonde trasformazioni della vita familia re che hanno modificato in particolare la condizione delle donne, i loro diritti e quelli del lavoro.

Saura Rabuiti

Acessar publicação original

[IF]

Histoire de la fête des Mères. Non, Pétain ne l’a pas inventée ! – JAQUEMOND (APHG)

JAQUEMOND, Louis-Pascal. Histoire de la fête des Mères. Non, Pétain ne l’a pas inventée !. Rennes: Presses Universitaires de Rennes, 2019, 240p. Resenha de: CARNEIRO, François da Rocha. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 7 jun. 2020. Disponível em: < https://www.aphg.fr/Histoire-de-la-fete-des-Meres-Non-Petain-ne-l-a-pas-inventee>Consultado em 11 jan. 2021.

Dans un ouvrage qui assume la très longue durée, Louis-Pascal Jacquemond en éminent spécialiste de l’histoire des femmes qu’il est, étudie cette journée si particulière qu’est la fête des Mères.

Remontant aux déesses-mères antiques, il souligne la double-assignation initiale attribuée à la divinité, caractérisée à la fois par la naturalité et le maternalisme. Envisagé par l’auteur comme étant « la plus ancienne religion du monde » (p.22), le culte de la Déesse-mère connaît de multiples visages dans toutes les civilisations anciennes. Dans les panthéons nordiques et germaniques, ce sont Freyja, chez les Vanes, et Frigg, chez les Ases, qui jouent ce rôle de divinité à la fois de l’amour et de la maternité, tandis que Dana chez les Celtes est « la mère primordiale des anciens elfes », célébrée elle aussi par une « fête de la nuit des Mères » (p.24). L’auteur voit dans l’identification de Marie à une Déesse-mère chez les premiers chrétiens comme le résultat d’un glissement homothétique, peut-être dans l’héritage du culte rendu à Cybèle, qui était pour les Romains la Mater magna. De fait, le culte marial s’impose dans le christianisme au point que s’installe, autour du XIIe siècle, l’appellation « Notre-Dame », à qui sont dédicacées de nombreuses églises de pèlerinage.

À l’époque moderne, en Angleterre et dans les colonies américaines, apparaît la tradition du Christian Mothering Sunday. Ce rituel oblige le fidèle à servir un dimanche de Carême dans sa paroisse de naissance. Une fois par an, l’église-mère réunit ainsi tous ses enfants et, par analogie, permet à la mère biologique d’être au centre des attention de sa progéniture qui doit alors lui offrir des fleurs et un gâteau. Cette tradition protestante s’implante jusqu’aux colonies américaines avant d’y tomber en désuétude. Il faut la mobilisation des féministes Julia Ward Howe (1819-1910), Juliet Calhoun Blakeley (1818-1920), Mary Towes Sasseen (1860-1906) et surtout Anna Jarvis (1864-1948) pour qu’une journée rendant hommage aux mères soit de nouveau instituée. Voté en 1913, le Mother’s Day fait immédiatement du deuxième dimanche de mai une fête nationale aux États-Unis.

Étrangère à cette culture protestante du monde anglophone, la France connaît sa propre voie. Le Code civil impose la vision familialiste, assignant à la femme les seules fonctions conjugale et maternelle. À l’autre bout du XIXe siècle, les hommes de la IIIe République défendent la cause démographique au non de la défense de la Nation. Parmi d’autres, l’Alliance nationale, que fonde Jacques Bertillon en 1896, défend ardemment cette ambition nataliste. Si les mouvements féministes qui apparaissent alors ne sont que rarement antinatalistes, ils n’en placent pas moins la maternité « au cœur de leur définition de la différence des sexes » (p.59). Quant aux anarcho-syndicalistes, beaucoup invitent au néo-malthusianisme « pour ne pas entretenir un capitalisme avide de bras bon marché » (p.60).

C’est dans le contexte nataliste de la IIIe République que prend place l’expérience d’Artas, où l’instituteur Prosper Roche, lui-même père de sept enfants, lance en 1906 la première fête des Mères de famille nombreuse, organisée par la très masculine Union fraternelle des pères de famille méritants qu’il a fondé en 1904. Le dimanche 10 juin 1906 donc, deux mères de famille artasiennes de neuf enfants sont mises à l’honneur. Les festivités empruntent au cérémonial républicain, avec défilé, réception à la Mairie, banquet de plus de 200 convives et remise de la somme de 25 francs à chacune des deux récompensées.

La Première guerre mondiale et les secours des Américains sont l’occasion de transférer sur le Vieux continent, dans les régions occupées du Nord de la France et en Belgique, la jeune tradition du Mother’s Day. L’arrivée des soldats américains diffuse encore plus largement ce rituel qui inspire jusqu’au nom la Journée des Mères donnée à Lyon du 14 au 16 juin 1918. Le dernier jour permet de féliciter douze femmes enceintes déjà mères d’au moins cinq enfants. En 1920, peu après la création du Conseil supérieur de la natalité, Theodore Steeg, ministre de l’Intérieur, autorise la « Journée nationale des mères de famille nombreuse ». Malgré la tenue de cette fête le 19 décembre 1920, « la fête des Mères n’a pas encore pris sa place dans le calendrier annuel » (p.82) et aucune journée nationale n’a lieu dans les années qui suivent, l’organisation relevant de l’échelon local.

Avec l’introduction de la démographie dans les programmes scolaires à partir de la fin des années 1920, une politique familiale se met en place, fondée sur le modèle traditionnel, autour de la Mère au foyer et de l’autorité du père qui ramène l’argent à la maison. Comme l’écrit l’auteur, « la petite musique du « Travail, Famille, Patrie » est déjà à l’œuvre » (p.84). La fête des Mères du régime de Vichy n’est donc que l’aboutissement d’un long processus. Dans cette liturgie pétainiste, la Mère mise à l’honneur devient l’icône de la Révolution nationale. Pourtant, comme le montre Louis-Pascal Jacquemond, les mouvements de Résistants, communistes en tête, se saisissent du décalage entre le discours du pouvoir en place et les souffrances du quotidien pour faire de cette fête un outil de mobilisation. Les tracts sont alors nombreux appelant les mères à rejoindre « l’armée des ombres ».

Après la Seconde guerre mondiale, la fête des Mères s’installe dans le cadre républicain et particulièrement à l’école. Néanmoins, cette pratique scolaire est de plus en plus remise en cause, tant elle implique de se calquer sur un idéal familial et maternel contesté. Cette fête connaît par ailleurs une marchandisation en même temps que la société goûte de plus en plus à une consommation effrénée. L’auteur distingue quatre temps de la « récupération mercantile » (p.136) de cette fête. Le premier XXe siècle voit la commercialisation massive des fleurs et des cartes de vœux, la mère se voyant au centre d’un intérêt qui n’est pas sans rappeler le désir amoureux masculin. À partir des années 1930, la promotion de l’électroménager domestique attribue à la mère une image de modernité technique. Les dernières décennies du XXe siècle et les cadeaux comme les parfums ou la lingerie érotisent sensiblement l’image de la mère. Enfin, au début du millénaire, cette fête semble s’appuyer sur les modes de communication actuels et « met en scène des femmes substituts » (p.143).

Critiquée dès l’entre-deux-guerres, la fête des Mères se retrouve dans la ligne de mire des féminismes des années 1970 comme des années 2000, ce qui pousse l’auteur à poser la question de son « obsolescence programmée » (p.167). Cependant, sa popularité n’est guère remise en cause et la Journée internationale des Femmes du 8 mars ne parvient guère à l’effacer du paysage.

L’auteur achève son étude par un rapide tour du monde des fêtes équivalentes, « chrétienne et nationale » en Amérique Latine, importée en Afrique et au Proche-Orient, acculturée dans les mondes asiatiques. Il conclut ainsi une réflexion riche et stimulante qui permet de déconstruire autant les stéréotypes genrés que les légendes urbaines.

François da Rocha Carneiro – Professeur d’histoire-géographie à Roubaix, Docteur en histoire contemporaine et chargé de cours à l’Université d’Artois, Vice-Président de l’APHG.

Consultar publicação original

[IF]

Resistência: memória da ocupação nazista na França e na Itália – ROLLEMBERG (HU)

ROLLEMBERG, D. Resistência: memória da ocupação nazista na França e na Itália. São Paulo: Alameda Editorial, 2016. 376 p. Resenha de: CODARIN, Higor. “Resistencialismo” e resistência: as tensões entre história e memória. História Unisinos 24(2):334-337, Maio/Agosto 2020.

A trajetória intelectual da historiadora Denise Rollemberg, professora e pesquisadora da Universidade Federal Fluminense (UFF), é indissociável das temáticas, das tensões e dos dilemas envolvendo o passado recente, em específico relacionado às experiências autoritárias ao redor do globo, ao longo do século XX. Em um primeiro momento, sua produção acadêmica edificou-se através de análises consistentes a respeito dos caminhos e descaminhos das esquerdas brasileiras diante da ditadura civil-militar, seja a partir da construção analítica a respeito da perspectiva de revolução difundida por essas esquerdas, ou pela vigorosa análise a respeito do exílio experimentado por esses militantes ao longo da ditadura.2 Contudo, a partir de então, a historiadora, influenciada por parte da historiografia francesa empenhada em renovar as análises a respeito da resistência à ocupação nazista e/ou em relação à construção social do regime instaurado em Vichy, das quais falaremos adiante, passa a centrar seus esforços em outros aspectos dos regimes autoritários, buscando iluminar sua compreensão através de duas linhas centrais: por um lado, de que modo esses regimes foram construídos socialmente e se mantiveram por longos anos? Por outro, e de modo mais importante para o objetivo desta resenha, como se relacionam memória e história na construção do conhecimento a respeito dessas experiências? Mais especificamente: de que modo a construção da memória coletiva sobre esses regimes buscou criar oposições binárias entre Estado e Sociedade, sedimentando a perspectiva de sociedades oprimidas, manipuladas e, sobretudo, resistentes a esses regimes? Confirmação dessa nova vereda analítica são as obras organizadas em conjunto com a também historiadora da UFF Samantha Quadrat – A construção social dos regimes autoritários (2010); História e memória das ditaduras do século XX (2015) – e Resistência: memória da ocupação nazista na França e na Itália (2016).

Neste que é seu mais recente livro, Rollemberg busca, como objetivo central, analisar o movimento de constante construção e desconstrução dos discursos memoriais a respeito das experiências de resistência francesa e italiana às ocupações nazistas que ocorreram durante a II Guerra Mundial. Dividido em cinco capítulos, Resistência parte de um consistente balanço historiográfico indicativo dos esforços e das dificuldades em conceituar o termo “resistência” (capítulo 1), para, em seguida, passar ao exercício analítico de sua ampla gama de fontes: os museus e memoriais franceses (capítulo 2), as cartas de despedida dos resistentes e reféns fuzilados (capítulo 3), que constroem a primeira parte do livro, dedicada à França, e, por fim, os museus e memoriais italianos (capítulo 4), com especial destaque à construção da memória e historiografia a respeito da trajetória da família Cervi, e do fuzilamento dos sete irmãos – os Sette Fratelli – integrantes da Resistência3 italiana (capítulo 5).

De modo inicial, é importante ressaltar, Rollemberg indica que as populações dos países ocupados “experimentaram comportamentos que variaram de país para país, ao longo do tempo, num amplo campo de possibilidades desde a colaboração mais aguerrida com os vencedores até a resistência mais combativa” (Rollemberg, 2016, p. 17). Nessa perspectiva, a autora, como cerne da argumentação que permeia todo o livro, busca desconstruir não apenas a visão maniqueísta entre Estado e Sociedade, conforme citamos anteriormente, mas também a visão que opõe, drasticamente, resistentes e colaboradores, como se resistir ou colaborar fossem as únicas possibilidades de atuação dentro desses contextos históricos. Para isso, inspira-se, essencialmente, no historiador Pierre Laborie, mais especificamente em seus conceitos de zona cinzenta e pensar-duplo, que realçam o amplo espaço de atuação entre os dois polos, marcado por contradições e ambivalências.4 Enveredando pela discussão conceitual, a autora busca explicitar que as experiências variadas de país para país deram origem, também, a conceituações diferentes. Assim, distingue as discussões historiográficas realizadas na França, Itália e Alemanha.

Sobre a França, campo com que Rollemberg tem maior familiaridade, a discussão é robusta. Demonstra, como prelúdio, que logo após o fim da ocupação, 1944, o termo resistência iniciou um processo de naturalização no seio da sociedade francesa, por intermédio da memória oficial que ia sendo desenvolvida pelo governo surgido do processo de libertação, comandado por Charles de Gaulle.

Criava-se, então, o mito da resistência, ou “resistencialismo”, no neologismo de Henry Rousso (2012). Ou seja, o mito de que a sociedade francesa havia, em sua totalidade, resistido aos alemães e ao governo instaurado em Vichy, sob o comando de Philippe Petain. Por muitos anos, o termo ficou sob o domínio dessa memória, estando fora dos objetivos e anseios dos historiadores. Realizando uma genealogia do conceito, a historiadora demonstra que a historiografia francesa se voltou à “resistência” apenas em 1962, com a tese de Henri Michel, que abre os debates acadêmicos a respeito do termo, ainda sob forte influência do processo de mitificação. Contudo, é com o livro de Robert Paxton, Vichy France (1972), que há uma guinada no debate. A revolução paxtoniana, como ficou conhecido o impacto da tese de Paxton, abriu novas temáticas e interpretações, pois deu início a uma corrente historiográfica indicativa de que o Estado de Vichy era produto da própria sociedade francesa e não uma marionete da Alemanha de Hitler. Iniciava-se, portanto, o processo historiográfico de problematização do mito da resistência.

Passeando com propriedade pelas contribuições de François Bédarida, Pierre Azéma, Pierre Laborie, Jacques Sémelin, François Marcot, Henry Rousso e Denis Peschanski, a historiadora apresenta, de forma nítida, reflexões a respeito da criação do mito de resistência como “necessidade social” (Rollemberg, 2016, p. 33) e, sobretudo, tentativas de conceituar o termo. Em uma diversidade de propostas de conceituação que, conforme diz a própria autora, engolfam-se, por vezes, em “excessivas filigranas e retórica” (Rollemberg, 2016, p. 37), vemos emergir a problemática fundamental do debate: resistência é apenas expressão coletiva, consciente, organizada e clandestina contra um invasor estrangeiro, como propõem alguns autores, ou também podem ser considerados resistentes as expressões individuais, cotidianas e anônimas, seja contra o regime alemão instaurado na zona ocupada ou contra o regime de Vichy? Cria-se, assim, um dilema, bem sintetizado por Jacques Sémelin: “ou bem se mergulha nas profundezas do social, mas sua especificidade [da resistência] tende a se diluir; ou bem se define exclusivamente através de suas [da resistência] estruturas e ações e ele se reduz à sua dimensão organizada” (Rollemberg, 2016, p. 32). Apesar de parecer intransponível, a historiadora apresenta um caminho possível para sua resolução, demonstrando a importância das propostas teóricas de Laborie para sua análise: A zona cinzenta, o pensar duplo, o homem duplo, segundo a perspectiva de Pierre Laborie que considera comportamentos ambivalentes nuançados entre resistir e colaborar, por outro lado, talvez seja a solução para o impasse levantado por Sémelin (Rollemberg, 2016, p. 148).

Seja como for, adotando-se ou não as posições de Laborie para resolver o impasse sintetizado por Sémelin, o exercício reflexivo que o desencadeou, segundo Rollemberg, demonstra, per se, a importância e a necessidade de reflexão a respeito do conceito de resistência, pois concei tuá-la “é mais lidar com as possibilidades e os limites das próprias definições, aproveitando as tensões e riquezas que são intrínsecas ao dilema observado por Sémelin, do que buscar resolvê-lo” (Rollemberg, 2016, p. 37).

Para o caso italiano, a discussão é menos densa. Segundo a autora, isso se deve ao fato de que para a historiografia italiana importa menos definir “o que foi e o que não foi resistir”, centrando os esforços, em contrapartida, no “papel de seus atores, principalmente das lideranças ou de militantes destacados” (Rollemberg, 2016, p. 47). Apesar da não importância da conceituação, a historiadora alerta que as contribuições historiográficas têm buscado desconstruir, também, o mito da resistência.

Por fim, finalizando o primeiro capítulo, está a reflexão a respeito do conceito de resistência proposto pela historiografia alemã. Rollemberg oferece destaque à definição proposta por Martin Broszat. Esta, ao contrário de utilizar o termo resistência (Widerstand), prefere utilizar Resistenz, cuja tradução é imunidade, termo devedor da biologia, que diz respeito a “reações espontâneas e naturais dos organismos vivos a micro-organismos como vírus e bactérias” (Rollemberg, 2016, p. 52). Assim, com essa nova definição, procurou-se jogar luz sobre a “resistência a partir de baixo”, como bem sintetizou Klaus-Jürgen Müller a respeito da definição proposta por Broszat.

Nos capítulos seguintes, sejam relacionados ao contexto francês ou italiano, notamos, com clareza, dois aspectos predominantes: por um lado, o esforço analítico da autora, buscando demonstrar e desenvolver as relações tensas e mutáveis entre história e memória, por intermédio, essencialmente, dos museus e memoriais como corpus documentais de análise. Por outro, o realce e a recorrência, ao longo de todo o texto, na importância de compreender as ações dos sujeitos que fizeram parte desse processo histórico a partir de suas ambivalências e contradições, buscando problematizar as visões romantizadas e heroicizadas construídas sobre esses indivíduos. Assim, a historiadora reforça a necessidade de compreendê-los sem operar distinções binárias e estéreis. Nas palavras da própria Rollemberg a respeito da criação de museus e homenagens aos resistentes:

A homenagem precisa incorporar a complexidade, as contradições, as ambivalências da realidade. A produção do conhecimento, resultado da incorporação das múltiplas dimensões dos acontecimentos e dos homens e mulheres neles envolvidos, submetidas à interpretação crítica, é a melhor homenagem que se possa fazer. A sacralização da memória afasta o herói de todos nós, condena-o ao desconhecimento, mesmo que inúmeros museus e memoriais sejam erguidos em seu nome (Rollemberg, 2016, p. 97).

Portanto, perseguindo essa trilha, Rollemberg empreende uma análise ampla acerca de 15 museus/memoriais ao redor da França, 130 cartas de resistentes ou reféns5 prestes a serem fuzilados e, por fim, analisa oito museus/memoriais italianos. É digno de nota demonstrar a metodologia empregada pela historiadora na construção dos museus/memoriais como corpus documentais para discussão das questões propostas na obra. Seguindo a senda proposta por Jacques Le Goff, a respeito do conceito documento/monumento6, a historiadora compreende a criação e, consequentemente, os próprios museus/memoriais através dessa dinâmica. Assim, a disposição dos museus/memoriais, os locais onde foram construídos, seus acervos, suas narrativas, dinâmicas e relações com o poder público são importantes ao olhar analítico da autora.

Todos os aspectos, constituintes da criação e perpetuação dos museus/memoriais, são vistos como esforços “das sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente – determinada imagem de si própria” (Rollemberg, 2016, p. 90). Outrossim, constatando que os museus/memoriais são criados com uma dupla-função, informativa e comemorativa, a historiadora compreende- os como espaços privilegiados de manifestação das tensões entre história e memória, analisando, assim, de que modo esses espaços incorporam ou recusam os avanços e novos temas propostos pela historiografia (Rollemberg, 2016, p. 90).

Sobre a França, vale ressaltar que a autora deslinda de que modo foi construído o “resistencialismo”. Apresenta a importância da memória nesse processo, a memória como construção social, como maneira de “lidar com a história, reconstruindo-a” (p. 84), formulada no período pós-ocupação, “comportando a lembrança, o esquecimento, o silêncio” (Rollemberg, 2016, p. 84), como aponta Beatriz Sarlo (2007), a memória como captura do passado pelo presente; o mito da resistência, o mito que explica a ausência, ao menos na grande maioria dos museus, de informações a respeito da colaboração dos franceses com os nazistas e com o regime de Vichy; o “resistencialismo” tornando ausente das narrativas dos museus “a zona cinzenta, o pensar duplo, a ambivalência” (Rollemberg, 2016, p. 142).

Com relação à Itália, deve-se atentar para a valiosa trilha percorrida pela historiadora ao confrontar a história e a memória do caso dos Sette Fratelli. Realizando uma genealogia da criação do mito, que remonta a dois textos de Italo Calvino publicados em 1953 (Rollemberg, 2016, p. 335), Rollemberg expõe as relações de legitimação dos mais diversos setores da sociedade italiana com a criação e manutenção de uma narrativa romantizada acerca dos sete irmãos fuzilados em 1943. Aponta não apenas para a necessidade do Partido Comunista Italiano (PCI) em vincular- se à história dos irmãos, mas, também, a necessidade do próprio governo italiano, simbolizado na recepção de Alcide Cervi, pai dos sete irmãos, pelo primeiro presidente eleito pós-ocupação, Luigi Enaudi, em 1954, no Palácio Quirinale, em Roma, além de diversas medalhas de honra que Alcide recebeu como representante dos filhos (Rollemberg, 2016, p. 318). A história dos irmãos resistentes e, consequentemente, da superação do sofrimento de um pai que teve a família devastada como símbolos da história italiana recriada pela memória, a Itália resistente, a exemplo dos sete irmãos, livre do nazifascismo, que buscava superar o sofrimento, como Aldo Cervi buscava superar a perda dos filhos.

Resistência, portanto, cumpre os objetivos a que se propõe, descortinando as relações problemáticas e, ao mesmo tempo, férteis entre história e memória em meio à construção da memória coletiva na França e na Itália a respeito das ocupações nazistas ao longo da II Guerra Mundial. Mais do que isso, o livro da historiadora é um interessante ponto de vista metodológico para os interessados em compreender as complicadas questões vinculadas à História do Tempo Presente.7 Se vivemos, como aponta o historiador François Hartog (2017), um regime de historicidade presentista, em que a Memória busca destronar a História de seu lugar privilegiado como intérprete hegemônica do passado, Resistência é uma contribuição fundamental à historiografia brasileira para aqueles que buscam fugir às armadilhas da Memória, que opera, na maioria das vezes, por intermédio de uma cultura binária de demonização ou sacralização de indivíduos e/ ou períodos históricos. Rollemberg, portanto, em seu novo caminho analítico, do qual Resistência é a reflexão mais profunda até o presente momento, apresenta os desafios dos historiadores que trilham as temáticas envolvendo experiências sociais traumáticas do passado recente. Ao buscar recolocar os personagens em seus respectivos contextos históricos, questionando as construções memoriais e realçando a importância de lançarmos luz às zonas cinzentas, contradições e ambivalências dos sujeitos históricos, a autora deixa-nos – aos historiadores – um sinal de alerta: o dever do historiador é compreender o passado, não o mitificar.

Referências

HARTOG, F. 2017. Crer em História. Belo Horizonte, Autêntica, 252 p.

LABORIE, P. 2010. 1940-1944: Os franceses do pensar-duplo. In: S.

QUADRAT; D. ROLLEMBERG (org.), A construção social dos regimes autoritários: vol. I, Europa. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, p. 31-44.

LE GOFF, J. 2013. História e Memória. 7ª ed. Campinas, Editora da Unicamp, 504 p.

PAXTON, R. 1973. La France de Vichy. Paris, Seuil, 475 p.

QUADRAT, S.; ROLLEMBERG, D. (org.) 2010. A construção social dos regimes autoritários. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 3 vols.

QUADRAT, S.; ROLLEMBERG, D. (org.) 2015. História e memória das ditaduras do século XX. Rio de Janeiro, Editora FGV, 2 vols.

ROLLEMBERG, D. 2000. Exílio: entre raízes e radares. Rio de Janeiro, Record, 375 p.

ROLLEMBERG, D. 2016. Resistência: memória da ocupação nazista na França e na Itália. São Paulo, Alameda Editorial, 376 p.

ROUSSO, H. 2012. Le Régime de Vichy. 2ª ed. Paris, PUF, 128 p.

ROUSSO, H. 2016. A última catástrofe: a história, o presente, o contemporâneo. Rio de Janeiro, Editora FGV, 341 p.

SARLO. B. 2007. Tempo passado: cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo, Companhia das Letras / Belo Horizonte, Editora da UFMG, 129 p.

2 Referimo-nos aqui, respectivamente, à sua dissertação de mestrado (A ideia de revolução: da luta armada ao fim do exílio (1961-1979)) e à tese de doutorado (Exílio. Entre raízes e radares), esta última publicada pela Editora Record (1999).

3 O termo Resistência, com letra maiúscula, consolidou-se na historiografia como modo de referir-se a posições e ações ligadas a organizações, partidos e movimentos (p. 175).

4 Para maior aprofundamento a respeito dos conceitos, cf. Laborie (2010).

5 “Reféns” denominam-se os indivíduos presos, seja na França ocupada ou na França de Vichy, em represália às ações da Resistência.

6 Para maiores detalhes, cf. Le Goff (2013).

Higor Codarin – Universidade Federal Fluminense. Rua Prof. Marcos Waldemar de Freitas Reis, s/n. 24210-201 Niterói, Rio de Janeiro, Brasil. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). Número do processo: E-26/201.860/2019. E-mail: [email protected].

Plínio Salgado: um católico integralista entre Portugal e o Brasil (1895-1975) | Leandro Pereira Gonçalves

O filósofo da ciência Karl Popper (1980) costumava afirmar que o conhecimento científico é, acima de tudo, uma luta contra o marasmo e as supostas verdades preestabelecidas dentro do próprio campo científico. Podemos compreender esse “marasmo” e as “supostas verdades estabelecidas”, em parte, como os próprios estudos científicos que marcam época e criam um establishment em determinada área de pesquisa. Leia Mais

O comércio de marfim no mundo atlântico: circulação e produção (séculos XV a XIX) | Vanicléia Silva Santos, Eduardo França Paiva e René Lommez Gomes

Lançada em 2018 pela Clio Gestão Cultural e Editora, a obra O comércio de marfim no mundo atlântico: circulação e produção (séculos XV a XIX) integra o sétimo volume da série Estudos Africanos, promovido pelo Centro de Estudos Africanos da Universidade Federal de Minas Gerais (Diretoria de Relações Internacionais). A proposta da série é fomentar um pensamento multidisciplinar e etnicamente diverso ao criar e fortalecer parcerias entre pesquisadores brasileiros e estrangeiros em diferentes áreas de atuação. Sônia Queiroz, professora do departamento de Letras da UFMG e membra do Centro de Estudos Africanos (CEA), na apresentação da série, afirma ser pretensão do volume “dar materialidade à cooperação Brasil-África” (SANTOS; PAIVA; GOMES, 2018, p. 10).

O livro faz parte de uma consistente parceria de pesquisa entre a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade de Lisboa (UL), que objetiva realizar o levantamento de novas fontes e dados sobre a produção, circulação e usos do marfim no contexto atlântico. Tal parceria foi criada em 2013 e reafirmada em 2015 no projeto Marfins Africanos no Mundo Atlântico: uma reavaliação dos marfins luso-africanos, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) de Portugal. A intenção do projeto, e das produções acadêmicas financiadas por ele, como o volume em questão, é compreender a circulação atlântica dos marfins africanos e suas articulações com o Índico; investigar a diversidade de centros produtores de objetos de marfim na África e suas linguagens artísticas; complexificar os estudos do marfim africano em seus aspectos cultural, intelectual e material; e trazer novas informações a respeito da multiplicidade de intercâmbios culturais estabelecidos em diversas áreas do Atlântico e do Índico. Os pesquisadores buscam, assim, preencher a lacuna historiográfica sobre o tema em relação ao Brasil, à África em suas diversidades culturais e econômicas e às rotas atlânticas. Leia Mais

Perdas e ganhos: exilados e expatriados na história do conhecimento na Europa e nas Américas, 1500-2000 – BURKE (S-RH)

BURKE, Peter. Perdas e ganhos: exilados e expatriados na história do conhecimento na Europa e nas Américas, 1500-2000. São Paulo: Editora Unesp, 2017. Resenha de: SANTOS, Jair. O conhecimento sem pátria. SÆCULUM – Revista de História, João Pessoa, v. 25, n. 42, p. 222-226, jan./jun. 2020.

Todos os que acompanham a atualidade política sabem que um tema em particular está quase sempre presente no debate público, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos: a imigração. A polêmica discussão é animada não somente pelos jornalistas e atores políticos, com posicionamentos nem sempre apaziguadores, mas também pelos intelectuais. São inúmeros os acadêmicos – filósofos, historiadores, sociólogos, cientistas políticos, juristas – que tentam, através de uma análise mais serena e por meio dos instrumentos fornecidos pela ciência que professam, analisar a imigração como um fenômeno social complexo, com diferentes causas e diversas consequências para a sociedade. O último livro de Peter Burke, fruto de conferências proferidas na Historical Society of Israel em 2015, é um belo exemplo de como um historiador, de quem se costuma esperar apenas um olhar crítico sobre o passado, também pode enriquecer a reflexão acerca de problemas atuais. A obra Perdas e ganhos: exilados e expatriados na história do conhecimento na Europa e nas Américas, publicada em 2017, estuda um tipo específico de imigração: a dos intelectuais que deixaram seu país natal, de modo espontâneo ou forçado, e prosseguiram a sua produção intelectual em outras terras. A partir desse grupo seleto de imigrantes, o autor examina os efeitos do encontro – ou eventualmente do choque – entre duas culturas na produção e difusão do conhecimento. Este é o pressuposto central do livro: a imigração é um fato social de efeitos recíprocos, isto é, tanto os indivíduos que imigram quanto a sociedade estrangeira que os acolhe são de algum modo afetados e transformados pelo intercâmbio que se opera. Está claro, portanto, que o livro refuta o argumento, às vezes invocado em âmbito político, segundo o qual a influência estrangeira é necessariamente nociva para a cultura nacional. Leia Mais

Si je reviens un jour… Les lettres retrouvées de Louise Pikovsky – TROUILLARD; LAMBERT (APHG)

TROUILLARD, Stéphanie, LAMBERT, Thibaut. Si je reviens un jour… Les lettres retrouvées de Louise Pikovsky. Paris: Des Ronds dans l’O, 2020. Resenha de: CHANOIR, Yohann. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 30 avr. 2020. Disponível em: <https://www.aphg.fr/Si-je-reviens-un-jour-Les-lettres-retrouvees-de-Louise-Pikovsky-4019> Consultado em 11 jan. 2021.

Un livre, une histoire, l’Histoire

Tout livre, même dessiné, a une histoire. Celui-ci encore plus que les autres. En 2010, dans un lycée parisien, sont retrouvées des lettres et des photographies appartenant à une ancienne élève, Louise Pikovsky. Arrêtée le 22 janvier 1944, transférée à Drancy avec ses parents, elle est déportée à Auschwitz, d’où elle ne reviendra pas. Le destin de Louise et de sa correspondance épistolaire avec sa professeure de latin-grec est en soi déjà émouvant. Mais il l’est davantage encore par la suite. Retrouvées, les lettres sont lues, mises en valeur dans le lycée de Louise, où une plaque commémorative sur les élèves déportés a pu être posée. Elles ont servi ensuite à nourrir un webdocumentaire réalisé par Stéphanie Trouillard en 2017, auteure que nos lecteurs connaissent bien avec son très beau livre Mon oncle de l’ombre, sur son grand-oncle exécuté en 1944 par les Allemands. Elles sont devenues aujourd’hui une bande dessinée. On retrouvera d’ailleurs quelques-unes de ces lettres et photos à la fin de l’album.

La vie d’une jeune lycéenne parisienne

Née en 1932, Louise est une élève dont la maturité surprendra plus d’un lecteur. Non seulement par la beauté de son raisonnement, par son souci des autres, mais aussi par sa prescience en 1944 que son destin est scellé et qu’elle accepte avec une incroyable résolution. Louise est cependant une jeune fille, comme bien d’autres, avec ses amitiés, ses inimitiés. Elle est aussi une de ces élèves, toujours trop rares, qui saisissent la beauté d’un texte, qui s’accaparent l’enseignement donné, le questionnent, le transforment et lui donnent une plus-value. De fait cet album est aussi celui d’une rencontre, entre une élève et son enseignante. La classe n’épuise pas évidemment la vie de Louise. On plonge dans son quotidien, les repas avec la famille, les chamailleries avec les sœurs et son frère. Le dessinateur a su rendre le caractère spartiate du logement par les couleurs plutôt ternes (seuls les rideaux rouges sous l’évier cassent la palette chromatique). Il a su également l’enrichir par une foule de petits détails, ces « effets de réel » dont parlait Roland Barthes : le torchon qui enveloppe le pain (p. 23), le seau pour les détritus (p. 19) etc. Le sérieux du propos n’exclut pas l’humour. Nos lecteurs attentifs retrouveront le clin d’œil à Hergé et aux aventures de Tintin, une allusion référentielle typique de l’école belge.

La guerre en arrière-plan

Drame singulier en même temps qu’expérience collective subie par des millions de personnes, le destin de Louise n’est pas décontextualisé. Par petites touches, à la manière d’un impressionniste, le dessinateur place des éléments de contexte dans les planches. On y découvre un Paris bien sûr occupé, avec la présence de soldats allemands, un Paris déjà martyrisé par les bombardements (p. 49) mais aussi une capitale où la mort sociale de la population juive est mise en œuvre, avec le dessin bien connu d’une pancarte dressée devant un parc à jeux réservé aux enfants mais interdit aux Juifs (p. 34). L’album offre ainsi un résumé saisissant de la politique de collaboration des autorités avec les nazis : policiers français qui saluent, au détour d’une rue, une patrouille allemande, policiers français qui viennent arrêter Louise et sa famille pour les emmener à Drancy, antichambre de la mort, policiers enfin qui livrent les familles aux nazis. En quelques images, sans le renfort de cartouches, tout est montré, tout est dit. Ces images sont d’autant plus poignantes que les grands-parents de Louise avaient quitté la Russie pour échapper aux pogroms et qu’ils pensaient être libres, heureux, en sécurité. Le destin de Louise est aussi la mort d’une certaine idée de la République.

Un album à lire et à faire lire

Si l’intérêt de cette bande dessinée est naturellement d’ordre mémoriel, il nous semble que l’album joue un rôle tout aussi déterminant dans la pédagogie de la Shoah. Expliquer à des élèves aujourd’hui ce qu’est cet assassinant industriel de masse, n’est pas simple. Cela ne peut se réduire à une collection de mesures et de chiffres. Il est nécessaire d’incarner la « Solution finale », par des exemples précis. Comme le cinéma ou les séries télévisées, la bande dessinée dispose du pouvoir de l’image. À ce titre, en raison de sa richesse, cet album doit s’inviter dans nos pratiques.

Il y a d’abord l’empathie pour une jeune fille de leur âge. Il y a ensuite l’explication sobre et efficace de la mécanique implacable de la Shoah, de l’exclusion à l’arrestation puis à la déportation. La bande dessinée souligne également l’héroïsme au quotidien d’une enseignante, qui fait retirer à Louise pour la photo de classe, sa veste avec l’étoile jaune, car elle est « une élève comme les autres » (p. 45). On imagine la tranquille résolution de notre collègue qui, elle, n’a pas démérité de la haute idée que l’immense majorité du corps enseignant, hier comme aujourd’hui, se fait de la République.

Les larmes de notre collègue s’expliquent ainsi sans doute, pour ne pas avoir pu sauver une jeune vie si prometteuse et par là tout un monde. Qu’elle soit toutefois assurée et rassurée, grâce à elle, et grâce au travail des auteurs de cet album, au soutien de la Fondation pour la Mémoire de la Shoah, Louise ne sera plus oubliée.

Site web de l’éditeur

Yohann Chanoir – Agrégé d’histoire, professeur en classe européenne allemand au Lycée Jean Jaurès de Reims, rédacteur en chef adjoint d’Historiens & Géographes.

Consultar publicação original

[IF]

 

España en mapas: Una sínteses geográfica – SANCHO COMÍNS (I-DCSGH)

SANCHO COMÍNS, J. (dir). España en mapas: Una sínteses geográfica. Madrid: Centro Nacional de Información Geográfica, 2018. Resenha de: LÓPEZ, Maria Sebastián. Íber – Didáctica de las Ciencias Sociales, Geografía e Historia, v.99, p.85-86, abr./jun., 2020.

En el contexto actual de cambio metodológico y revolución digital en el que está sumida nuestra educación, resulta interesante, y a la vez necesario, recuperar la esencia de los métodos y las técnicas que se vienen aplicando para la enseñanza y el aprendizaje de la geografía. En este sentido, la obra que nos ocupa –publicada por el Instituto Geográfico Nacional (IGN) y perteneciente a la serie Compendios del Atlas Nacional de España– es un magnífico recurso para enseñar la geografía de España, pues no solo reúne en sus páginas todos los métodos y técnicas de esta disciplina, sino que además proporciona un discurso coherente, sistémico y actualizado de nuestra realidad.

El nuevo Atlas Nacional de España del siglo xxi muestra a través de la cartografía temática, la estadística y otro tipo de documentación gráfica la realidad cambiante y compleja de España. La obra ha sido llevada a cabo por un amplio equipo interdisciplinar compuesto por geógrafos, cartógrafos, historiadores, sociólogos y economistas que han dado forma y conexión a sus más de seiscientas páginas, poniendo énfasis sobre problemáticas territoriales actuales, pero sin olvidar los hechos y las consecuencias históricas. El recorrido por sus veinticuatro capítulos ayuda a la adquisición de la competencia espacial a través de la localización de los fenómenos territoriales, el análisis de las fuentes geográficas, la interconexión de factores múltiples y la identificación de procesos ambientales, culturales y sociales.

Su cantidad de recursos geográficos (alrededor de 1250 recursos gráficos, de los cuales más de 800 son mapas) hace que este atlas pueda ser utilizado para el desarrollo del pensamiento crítico y el compromiso cívico en todos los niveles educativos.

La secuencia expositiva de los contenidos puede calificarse de clásica: después de algunos ejemplos de cartografía histórica y una breve alusión a las funciones del IGN, se presenta el medio natural con los tres clásicos apartados dedicados a la estructura terrestre (geofísica, geología y geomorfología), el clima y las aguas y la biogeografía; las referencias históricas ofrecen seguidamente las claves fundamentales para entender la evolución y el desarrollo de la sociedad en ese territorio; continúa con la población, el poblamiento y los rasgos esenciales de la sociedad; las cuatro secciones siguientes están dedicadas a las actividades humanas (agrarias, industriales, turísticas y comerciales) y los servicios, equipamientos e infraestructuras asociadas; prosigue con el análisis de características más globales, como el paisaje, el medio ambiente, las estructuras socioeconómicas y territoriales…; y termina con una novedosa aportación que contextualiza la personalidad geográfica de España en el marco planetario y la presencia de nuestro país en el contexto geopolítico actual.

España en mapas: Una síntesis geográfica (en su versión impresa o digital) aporta, pues, grandes recursos para abordar el paradigma actual de cambio global y desarrollo sostenible, siendo una excelente herramienta de conocimiento sobre la sociedad y el territorio en todos los niveles educativos; profesorado y alumnado sabrán encon trar los modos de interlocución y aprehender su rico contenido.

La obra completa en formato PDF se puede descargar gratuitamente en el apartado «Libros digitales»: www.ign.es/web/publicaciones-boletines- y-libros-digitales Los capítulos completos y los contenidos gráficos se pueden visualizar y descargar en formato PDF a través del portal web España en mapas: www.ign.es/web/ign/portal/ espana-en-mapas Cada mapa, con sus datos, metadatos y ficheros gráficos georreferenciados asociados, se puede descargar en el producto Mapas temáticos del ANE del Centro de Descargas del CNIG: https://bit.ly/2RKw8cx

María Sebastián López – E-mail: [email protected] Acessar publicação original

[IF]

 

The death of nature: women, ecology, and the Scientific Revolution | Carolyn Merchant

Lançado em 1980, The death of nature completa, em 2020, 40 anos de publicação e ainda carecia de uma resenha em português. Apesar do tempo passado desde o lançamento, o livro de Carolyn Merchant apresenta algumas reflexões e contribuições ainda atuais.

Merchant é professora emérita da University of California, Berkeley, e possui publicações nas áreas de epistemologia feminista, história ambiental e história das ciências. É uma das referências do ecofeminismo, movimento que associa ecologismo e feminismo, identificando relações entre a exploração da natureza e das mulheres. Contudo, ainda hoje a autora tem pouca inserção nos cursos e programas de história ambiental e das ciências no Brasil, sobretudo quando a comparamos com outras autoras feministas, como Evelyn Fox Keller e Donna Haraway. Entretanto, isso não é exclusividade brasileira. Apesar do interesse do campo ambiental e feminista, o livro foi marginalizado por historiadores anglófonos e filósofos da ciência moderna, além de ter encontrado um “clima frio” para sua recepção dentro da historiografia da ciência ( Park, 2006 ). Leia Mais

 Le baptême de Clovis (24 décembre 505 ?) – DUMÉZIL (APHG)

DUMÉZIL, Bruno. Le baptême de Clovis (24 décembre 505 ?). Paris: Gallimard, coll. « Les journées qui ont fait la France », 2019. 320p. Resenha de: PROUVOST, Yveline. Association des Professeurs d’Histoire et de Géographie (APHG). 20 fev. 2020. Disponível em: <https://www.aphg.fr/Le-bapteme-de-Clovis-24-decembre-505>Consultado em 11 jan. 2021.

Le pari du livre de Bruno Dumézil, comme celui de la collection dans lequel il est publié, est d’inscrire le baptême de Clovis parmi ces journées particulières qui ont pu participer, d’une façon ou d’une autre, à la construction de la France.

L’auteur, qui part des commémorations de 1996, nous projette ensuite au tournant du VIe siècle. Il se place dans la continuité et l’utilisation des travaux précédemment rédigés autour de cet événement, ceux de Georges Tessier, Michel Rouche, Laurent Theis ou encore Stéphane Lebecq par exemple.

Bruno Dumézil commence par présenter tout ce que l’on peut savoir de ce baptême en le comparant à ceux de cette époque, analysant pour cela la source principale de cette information, tant dans sa forme que dans son contenu : la lettre d’Avit de Vienne dont il montre aussi les limites.

Afin de tenter de comprendre ce baptême, ce sont les sociétés de l’Antiquité tardive que l’auteur fait revivre : l’ethnogenèse franque, les Francs, et leur rapport à l’Empire romain, l’apparition de la « dynastie » mérovingienne : tout est évoqué, analysé, mis en question.

Cette approche montrant ses limites, dans un second temps, Bruno Dumézil replace le baptême dans le contexte religieux des Ve– VIe s. : il nous présente le christianisme de la fin de l’Empire romain, son expansion progressive, mais aussi ses divisions et querelles nombreuses. Il distingue ainsi classiquement les tendances religieuses ariennes et nicéennes, mais aussi la croyance homéenne qui domine un temps largement l’Occident européen, jusqu’à la bataille d’Andrinople en août 378. La question des schismes est fondamentale. Le schisme d’Acace d’abord qui divise profondément la communauté chrétienne entre Orient et Occident de 484 à 519 et contraint chaque chrétien à prendre position. Mais aussi le schisme de 498 au sein de l’Eglise de Rome, issu de la double élection pontificale de Symmaque et Laurent. Dans ces querelles : quelles positions Clovis a-t-il tenu ? L’enquête va jusqu’à scruter les cadeaux envoyés par Clovis au Saint Siège pour tenter de cerner ses fidélités. Bruno Dumézil replace ainsi la religion chrétienne, son expansion et son imprégnation dans toute l’épaisseur de la société gallo-romaine de ce tournant du VIe siècle. Cependant, et malgré certaines hypothèses convaincantes, la question du choix religieux de Clovis demeure irrésolue.

Face à cette nouvelle impasse, Bruno Dumézil tente alors de reconsidérer la place de ce baptême dans le règne du Franc. Il montre alors ce que les sources nous permettent de comprendre du règne de Clovis, ainsi que sa portée pour les générations suivantes. Il met à jour la quasi amnésie mérovingienne concernant Clovis… et, a fortiori, son baptême. Là encore les sources, comme l’œuvre de Grégoire de Tours, sont finement analysées et critiquées, montrant bien leur peu de fiabilité quant à l’évènement considéré, ce qui n’enlève rien à leur intérêt.

On découvre rapidement comment jusqu’au début du règne des Carolingiens, Clovis ne resurgit que de façon très opportune dans la mémoire : comme modèle ou anti-modèle, afin de montrer les défauts des rois régnants sans s’en attirer les foudres. La figure de Clovis est utilisée, modifiée, transformée selon les besoins politiques du temps.

S’ensuit alors une tentative de datation du baptême elle-même conçue tel un jeu : l’auteur scrute chaque possibilité de date, la critique, avant de se risquer à en proposer une, dont il ne manque pas non plus de montrer les limites. C’est au travail de fond de l’historien, à sa démarche réflexive, qu’on est alors confronté, même si, avec une grande honnêteté intellectuelle, aucune réponse nette et définitive n’est apportée.

Enfin, il remonte le cours du temps jusqu’à nos jours pour mesurer la portée et surtout l’utilisation (ou non) de cet événement au fil du temps : s’attardant autant sur les périodes de construction et d’utilisation du mythe que sur celles de sa disparition tout aussi édifiantes. Il nous montre les querelles suscitées autour de Clovis et de son baptême, contribuant au passage à la réhabilitation de certains historiens tels Aimoin de Fleury ou l’abbé Dubos.

Bruno Dumézil, face à cet exercice particulièrement périlleux d’évocation d’un sujet largement traité et dont la sensibilité resurgit périodiquement, s’en tire donc avec brio et humour, redonnant de l’épaisseur à la période traitée, envisagée sous tous ses aspects, mettant au jour l’essentiel de la démarche historique et ses éventuelles limites. Il fait véritablement œuvre ici d’historien mesurant la place d’un évènement (on pourrait presque dire d’un « non-événement » au VIe s.) dans la construction de la France, à partir d’une analyse précise et même impitoyable de notre maître absolu : les sources.

Il nous livre ainsi tout au long de cet ouvrage la riche histoire d’un « détournement de fonts » (sic).

Yveline Prouvost

Consultar publicação original

[IF]

A fotografia em instituições de memória: experiências no Brasil e em Portugal / Revista de História da UEG / 2020

No dossiê “A fotografia em instituições de memória: experiências no Brasil e em Portugal”, reunimos entrevistas e artigos que trazem uma série de informações, reflexões e problematizações em torno da pesquisa sobre fotografia, tendo em vista sua presença em instituições de memória. O dossiê insere-se num contexto de incorporação da fotografia nos campos de estudo da História, da Antropologia, da Comunicação e das Artes, dando continuidade a um processo iniciado há algumas décadas. De acordo com o balanço historiográfico realizado por Ana Mauad (2016), os estudos, ao tomarem a fotografia como objeto e fonte de investigação, têm possibilitado significativos avanços nas reflexões sobre diversos temas: as formas de linguagem, as maneiras de representação do mundo social, o modo como as imagens amparam vivências individuais e coletivas, bem como a influência da imagem nas formas de percepção do espaço e do tempo e nas políticas de memória. As pesquisas, em suas diferentes vertentes teóricas, têm refletido tanto sobre os modos de produção das imagens, como sobre suas formas de circulação e de apropriação social.

Nesse processo, foi e tem sido vital a organização e a disponibilização de acervos fotográficos [1] públicos e privados, pessoais ou institucionais, que amparam pesquisas em diferentes domínios e sem os quais não teria sido possível trilhar grande parte dos caminhos percorridos. Ao serem abrigados por instituições que são concebidas como lugares de memória (NORA, 1993), – tais como os arquivos, museus, bibliotecas, centros de documentação – estes acervos adensam o patrimônio histórico e cultural de seus respectivos países. Tanto no Brasil quanto em Portugal, verifica-se certa sensibilidade para a necessidade de guarda, tratamento e disponibilização dos acervos fotográficos. Há, nestes dois países, instituições públicas e privadas que são referências importantes para o trabalho com a história da cultura visual fotográfica e que se tornaram verdadeiros repositórios, capazes de viabilizar o trabalho com as memórias dos sujeitos, das famílias, dos governos, dos movimentos sociais e, também, dos próprios fotógrafos, com suas histórias pessoais, seus aparelhos, técnicas e métodos de trabalho. Nos limites desta apresentação, não será possível traçar um panorama da situação dos acervos fotográficos nos dois países, mas podemos indicar alguns aspectos para reflexão.

No caso do Brasil é possível afirmar que três instituições podem ser vistas como referência para o trato dos acervos fotográficos, pois contribuíram e ainda contribuem para pensar as políticas de guarda, preservação e difusão: a Funarte, a Biblioteca Nacional e o Instituto Moreira Salles. A Funarte começou a atuar no final da década de 1970 por meio do seu Núcleo de Fotografia, renomeado INFoto (Instituto Nacional de Fotografia) em 1984, e colaborou na implantação de uma política pública para os acervos fotográficos do país (VASQUEZ, s / d). Graças especialmente ao Programa Nacional de Preservação e Pesquisa da Fotografia, o INFoto contribuiu para disseminar a importância da valorização dos acervos fotográficos em arquivos públicos e particulares, universitários e sindicais, nos âmbitos federal, estadual e municipal (VASQUEZ, s / d). Foi nesse âmbito de atuação que surgiu a colaboração com a Biblioteca Nacional por meio do Projeto de Preservação do Acervo Fotográfico da Biblioteca Nacional (PROFOTO), iniciado em 1990, e que se revelou um dos mais importantes trabalhos com acervos fotográficos do país. A Biblioteca Nacional se tornou, com essa iniciativa, uma referência “(…) na afirmação e na definição de uma política de tratamento das coleções fotográficas representada por meio de publicações técnicas, orientação, processo de identificação e indexação, bem como da guarda desse material” (ZAHER, 2004). Já o Instituto Moreira Salles afirmou-se nas duas últimas décadas como uma referência na constituição de acervos fotográficos de caráter autoral, com ênfase especial em fotógrafos do século XIX e XX, contendo cerca de 800 mil fotografias. Muitas outrasinstituições no país guardam acervos fotográficos de relevância, tais como Arquivo Nacional, o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, o Museu Paulista da USP, a Fundação Joaquim Nabuco, o Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa e o Arquivo Público Mineiro. Para oferecer uma visão mais ampla do assunto, teríamos que levar em consideração as instituições públicas e privadas do âmbito estadual e municipal, as bibliotecas, centros de documentação de universidades, etc. Além disso, teríamos que acrescentar a presença da fotografia nas coleções dos museus de arte. Enfim, fazer um balanço da situação dos acervos fotográficos no país é muito delicado, mas é possível afirmar, seguindo Aline Lacerda (2012, p. 284), que a fotografia se apresenta de maneira sistemática nos arquivos, sejam eles públicos ou privados, institucionais ou pessoais.

Uma questão importante diz respeito à digitalização de acervos, que é um desafio enfrentado pelas instituições de memória a partir da década de 1990. Desde então, vários projetos têm sido implantados. De acordo com Rubens Silva (2006), a digitalização permite a preservação da memória visual, traz a possibilidade de fortalecer as identidades e de ampliar os conhecimentos no que tange à formação educacional e cultural, principalmente quando ocorre a disponibilização de acervos online. Assim, o acesso remoto, ao mesmo tempo em que maximiza a utilização, satisfaz parcialmente as necessidades e as demandas da sociedade e, embora não permita o acesso à materialidade dos objetos fotográficos, apresenta-se como um caminho possível para democratizar a informação. Alguns exemplos de sucesso nesse campo podem ser citados: a Biblioteca Nacional Digital, o Instituto Moreira Salles e o Arquivo Público Mineiro. Cabe destacar, pela sua excelência, o projeto da Brasiliana Fotográfica, que é um dos desdobramentos da expertise alcançada pela Biblioteca Nacional no tratamento dos acervos fotográficos. A iniciativa surgiu da parceria com o Instituto Moreira Salles (IMS), obtendo posterior adesão de outras instituições [2]. O acesso remoto de acervos fotográficos abre a possibilidade de fruição, ampliação da consciência, facilita o acesso de pesquisadores, constitui uma forma de preservar o documento original, abrindo oportunidades para a produção de conhecimento crítico. Um dos grandes desafios atuais diz respeito à entrada dos arquivos nato-digitais nos acervos fotográficos das instituições de memória.

Em Portugal, existem instituições de referência para o estudo e para a conservação da fotografia, tal como o Centro Português de Fotografia, o Arquivo Municipal Fotográfico de Lisboa e o Arquivo de Documentação Fotográfica da Direcção Geral do Património Cultural, cuja coordenadora, Alexandra Encarnação, é entrevistada neste dossiê. O projeto de investigação Fotografia no Arquivo e no Museu Colonial Português 1850 – 1950, desenvolvido em 2013 e coordenado pela historiadora Filipa Lowndes Vicente, explorou a existência de fotografias em diversas instituições de memória em Portugal e analisou-as à luz dos debates internacionais historiográficos sobre o colonialismo e a condição colonial. Graças a esse trabalho, podemos construir uma visão ampla sobre a presença da fotografia nos acervos de diversas instituições [3]. Mais precisamente, nesse contexto, a existência de fotografias em instituições de memória em Portugal foi exaustiva e até então, a nosso conhecimento, ineditamente mapeada – ainda que sob a perspectiva da sua inscrição ou afetação a um contexto colonial. Desde então, alguns desses arquivos e fundos vêm passando por reconfigurações institucionais, como, por exemplo, o Instituto de Investigação Científica Tropical, hoje sob a tutela da Universidade de Lisboa. Além disso, foram surgindo outros projetos de pesquisa na área da fotografia, – como, por exemplo, a OPSIS – Base Iconográfica de Teatro em Portugal, Mobilizando Arquivos, Photo Impulse, Perphoto –, assim como conferências, publicações, colóquios e investigações acadêmicas dedicadas ao estudo da fotografia no contexto histórico português, bem como à relação entre fotografia e (sua representatividade no e do) arquivo.

O arquivo surge então aqui como um conceito sinônimo de instituição de memória, embora possamos considerar a existência de arquivos não institucionais, tais como os fundos pessoais e as fotografias “soltas”, ou seja, não consideradas enquanto corpus arquivável. Desde há cerca de uma década, assistimos igualmente a uma gradual afirmação no panorama cultural português de instituições de memória dedicadas, direta ou indiretamente, à fotografia, tais como: o Museu da Imagem em Movimento, em Leiria; a Casa-Estúdio Carlos Relvas, na Golegã; ou, mais recentemente renovado, o Museu de Fotografia da Madeira – Atelier Vicente’s, no Funchal. À semelhança do caso brasileiro, outro movimento importante no contexto português tem sido o da dinamização de projetos de constituição de fundos fotográficos digitais disponibilizados (exclusivamente ou não) online, que promovem a difusão de seus acervos e facilitam o trabalho dos pesquisadores [4].

Ainda à semelhança do caso brasileiro, para termos uma visão mais ampla da representatividade dos acervos fotográficos em instituições de memória em Portugal, deveríamos considerar a sua presença em nível distrital, municipal, das bibliotecas e de centros de documentação diversos; e, sobretudo, considerar a sua presença nas coleções dos museus de arte, onde se privilegia uma prática fotográfica autoral. Consideramos que o balanço da situação dos acervos fotográficos no caso português é ainda mais incerto do que no caso do Brasil, tendo sido pouco pesquisado de forma sistemática. Mas, em suma, na última década, assistimos em Portugal a um processo de consideração da fotografia, quer enquanto imagem / janela quer enquanto objeto / material, e mais particularmente como fonte de interesse da disciplina da História (e das ciências sociais em geral). Assistimos ainda ao aumento dos estudos e cuidados (de restauro, conservação, inventariação, digitalização…) com as coleções fotográficas, ou ao seu devir institucional: a sua integração em arquivos e acervos, bem como a uma crescente visibilidade da fotografia em museus e exposições de natureza diversa.

O presente dossiê reúne duas entrevistas e oito artigos. No que tange às entrevistas, temos duas conversas bem interessantes com representantes de instituições de alta relevância para a memória cultural e histórica de seus respectivos países. Pela Biblioteca Nacional do Brasil, temos Joaquim Marçal Ferreira de Andrade, servidor da instituição há trinta e nove anos, que fez um amplo balanço do trabalho com os acervos fotográficos que esta vem realizando há algumas décadas, o que a tornou referência na área. Pelo Arquivo de Documentação Fotográfica, temos Alexandra Encarnação, que faz um balanço dessa mesma instituição de grande relevância no que diz respeito ao panorama dos arquivos fotográficos em Portugal, assim como do trabalho desenvolvido pela mesma na guarda de outros acervos. Na entrevista, destaca-se ainda alguns exemplos de coleções e imagens no arquivo, fundamentais quer para a história da fotografia em Portugal quer na Europa.

No que diz respeito aos artigos, talvez devido ao fato de ser esta publicação uma iniciativa “brasileira”, houve uma resposta mais expressiva em relação às pesquisas que incidem em coleções fotográficas no Brasil. Na apresentação dos artigos, optamos por trazê-los em conjuntos. Temos dois artigos nos quais os autores, cada qual partindo de uma fotografia específica, problematizam a participação das referidas imagens nas práticas sociais. O artigo de Marcus Vinicius de Oliveira discute as formas de apropriação da fotografia de uma criança guineense de nome Augusto na época de sua produção, no contexto da Exposição Colonial de 1934, na cidade do Porto. Estuda-se a trajetória da imagem com o objetivo de problematizar o colonialismo contemporâneo, por meio das reflexões em torno dos usos e funções desempenhados pela imagem. Já o artigo de Aline Montenegro Magalhães e Maria do Carmo Teixeira Rainho problematiza a trajetória histórica da fotografia de uma mulher de turbante, realizada provavelmente no Rio de Janeiro na segunda metade do século XIX, pelo fotógrafo alemão Albert Henschel. Em ambos, podemos acompanhar a potência dos estudos de biografia das imagens e o quanto uma única fotografia pode constituir-se como instância de sentido, a partir da qual várias problemáticas podem ser levantas, na medida em que ela é tomada enquanto fonte histórica polissêmica. Os autores nos mostram que as imagens devem ser interpeladas em relação às suas características formais, à sua autoria, ao contexto de produção, bem como analisadas em virtude da produção, circulação, consumo e apropriações diversas ao longo da história.

Um segundo conjunto de artigos nos leva para dentro de instituições de memória que lidam com acervos fotográficos, sendo que um deles tematiza a experiência de um museu e o outro aborda uma escola. O artigo de Guilherme Marcondes Tosetto apresenta um histórico da atuação do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP) na incorporação da fotografia em seu acervo. A partir do levantamento das exposições realizadas pelo museu e da atuação do Clube de Colecionadores de Fotografia, o autor constrói uma descrição detalhada do conjunto fotográfico sob guarda da instituição, indicando os questionamentos artísticos que orientaram o trabalho de curadoria na constituição da coleção. Já o artigo de Hugo Rodrigues Cunha traz o relato do encontro fortuito e inesperado com um material fotográfico guardado em uma área da escola onde é docente da disciplina de Química: o Liceu Camões, em Lisboa. A partir de um pequeno conjunto formado por objetos, negativos e fotografias, ele realiza algumas reflexões sobre a relação entre memória e história e os silêncios e invisibilidades, intencionais ou involuntários, que marcam as ações humanas na escola e em outros espaços.

Outro conjunto formado por três artigos se dedica ao estudo, cada um a seu modo, dos acervos dos fotógrafos Mario Baldi, Pierre Verger e Paulino de Araújo Ferreira Lopes. Mario Baldi, fotógrafo austríaco, realizou um amplo trabalho de fotografia, escrita de artigos e reunião de objetos da cultura indígena no Brasil, entre as décadas de 1930 e 1950. Marcos de Brum Lopes analisa a coleção do fotógrafo, que é compartilhada por duas instituições de memória: o Serviço de Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural de Teresópolis (SPHAC), no Brasil; e o Weltmuseum Wien (WMW), na Áustria. O texto de Marcos Lopes discute como o “Projeto Baldi” vem sendo desenvolvido pelas duas instituições e reflete sobre os motivos e intenções do colecionismo. O artigo de Marilécia Oliveira Santos e Thiago Machado de Lima clarifica o trabalho minucioso sobre a constituição da Fundação Pierre Verger, enfatizando o papel da instituição na guarda do legado fotográfico do fotógrafo e antropólogo francês, que viajou por muitos lugares do mundo e se radicou na Bahia em 1946. Os autores detalham o trabalho desenvolvido pela Fundação com o propósito de constituir uma organização interna que garanta a conservação do acervo fotográfico e permita a memorialização e valorização do legado fotográfico de Verger. Por fim, o artigo de Marcos Ferreira de Andrade traz um relato do trabalho de organização do Centro de Memória Cultural do Sul de Minas (CEME), desenvolvido entre 1996 e 2000, na cidade de Campanha (MG), quando era professor na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras Nossa Senhora de Sion, hoje pertencente à Universidade Estadual de Minas Gerais (UEMG). Em seu trabalho, ele discute a importância dos centros de memória dirigidos por instituições de ensino em localidades com carência de arquivos públicos. Ele apresenta o escopo de todo o projeto, mas enfatiza o trabalho realizado junto ao acervo fotográfico de Paulino de Araújo Ferreira Lopes, fotógrafo que atuou na região entre o final do século XIX e meados do século XX.

Finalizando o dossiê, o artigo de Laila Zilber Kontic não se concentra numa instituição de memória específica, mas problematiza as representações sobre os indígenas brasileiros na fotografia, a partir da visita a acervos fotográficos do Museu do Índio, da Biblioteca Nacional Digital, do Instituto Moreira Salles, do Museu do Quai Branly, e da Galeria Vermelho. Em um primeiro tempo, a autora analisa fotografias do século XIX de fotógrafos como E. Thiesson, Albert Frisch e Marc Ferrez; em um segundo tempo, ela discute o trabalho de documentação realizado pela Comissão Rondon, e por reportagens da revista O Cruzeiro; em um terceiro tempo, a autora discute o trabalho da fotógrafa suíça Claudia Andujar, que mora no Brasil desde 1955 e construiu uma convivência próxima com os Yanomami, desde a década de 1970. O objetivo principal de Laila Zilber Kontic repousa em mostrar como o trabalho artístico de Andujar elabora novas formas de utilizar a fotografia para abordar os costumes e valores do povo Yanomami, diferentemente do que fizeram outros fotógrafos com suas representações de indígenas.

Esperamos que este dossiê contribua para o aprofundamento da análise da fotografia em instituições específicas e que, deste modo, se alcance uma visibilidade quer sinóptica quer precisa da existência e da representatividade da fotografia nos arquivos e demais instituições de memória, em Portugal e no Brasil. Esperamos ainda que o dossiê constitua uma pequena contribuição para a valorização (institucional ou não) de fundos fotográficos até então invisibilizados. Finalmente, esperamos lançar o mote para pesquisas futuras e outras ações, como exposições ou mostras online, que estabeleçam análises, relações e sinergias entre coleções, fundos e acervos fotográficos nos dois países: Portugal e Brasil.

Desejamos uma ótima leitura!

Notas

1. Segundo Aline Lacerda (2013, p. 240) acervos fotográficos são “grupos de documentos tão distintos quanto arquivos estritamente fotográficos, arquivos mais tradicionais que abarcam, além de documentos de gênero textual, também o material fotográfico, parcelas de arquivos que foram desmembrados e dos quais restam apenas seu componente fotográfico, coleções mais orgânicas de fotografias (pois que produzidas com alguma sistemática), coleções menos orgânicas de fotografias (pois que mais fragmentadas), pequenos conjuntos de fotografias avulsas reunidas sob critérios vários etc.”

2. Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, Arquivo Nacional, Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz, Dir. Pat. Hist. Documentação da Marinha, Fundação Bibliioteca Nacional, Fundação Joaquim Nabuco, Instituto Moreira Salles, Leibniz-Institut fuer Laenderkunde, Museu Aerospacial, Museu da República e Museu Histórico Nacional.

3. Arquivo Histórico da Marinha, Arquivo Histórico Diplomático do Ministério dos Negócios Estrangeiros, Arquivo Histórico do Patriarcado de Lisboa, Arquivo Histórico do Ex-Banco Nacional Ultramarino, Arquivo Histórico Militar, Arquivo Histórico Ultramarino, Arquivo Municipal de Lisboa – Fotográfico, Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Biblioteca Nacional da Ajuda, Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa, Centro Português de Fotografia, Fundação Mário Soares, Divisão de Documentação Fotográfica / Direcção-Geral do Património Cultural, Palácio Nacional da Ajuda, Sociedade de Geografia de Lisboa.

4. Como exemplo podemos citar a base iconográfica do teatro em Portugal, OPSIS; o site em desenvolvimento dedicado a fotografia vernacular portuguesa Foto-Sintese; coleções digitais fotográficas da Fundação Calouste Gulbenkian; registos fotográficos do Arquivo Fotográfico da Câmara Municipal de Lisboa disponibilizados online; imagens fotográficas da secção Cinemateca Digital da Cinemateca portuguesa; a coleção online do Centro Português de Fotografia; o repositório digital do Arquivo Científico Tropical.

Referências

DIAS, Inês Sapeta; FAZENDA, Maria do Mar Fazenda; NASCIMENTO, Susana. O que é o arquivo? / What is the Archive? Lisboa: Sistema Solar / Documenta, 2018.

LACERDA, Aline Lopes de. Quatro variações em torno do tema acervos fotográficos. Revista do Arquivo Geral da Cidade do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, n.7, p. 239-248, 2013, Disponível em: http: / / wpro.rio.rj.gov.br / revistaagcrj / wpcontent / uploads / 2016 / 11 / e07_a11.pdf. Acesso em: 28 jun. 2020.

MAUAD, Ana Maria. Sobre as imagens na História, um balanço de conceitos e perspectivas. Revista Maracanan, Rio de Janeiro, v. 12, n. 14, p. 33-48, jan. / jun. 2016. Disponível em: http: / / www.e-publicacoes.uerj.br / index.php / maracanan / issue / view / 1194 / showToc. Acesso em 28 out. 2017.

NORA, Pierre. Entre Memória e História – A problemática dos lugares. Projeto História, São Paulo, n. 10, p. 7–28, dez. 1993. Disponível em: http: / / revistas.pucsp.br / index.php / revph / article / view / 12101 / . Acesso em: 10 jul. 2010.

SILVA, Rubens. Acervos fotográficos públicos: uma introdução sobre digitalização no contexto político da disseminação de conteúdos. Ciência da Informação, Brasília, v. 35, n. 3, p. 194-200, set. / dez. 2006. Disponível em: https: / / www.scielo.br / scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100- 19652006000300018&lng=pt&nrm=isso Acesso em: 29 jun. 2020.

VASQUEZ, Pedro. As ações do INFoto. Brasil Memória das artes. s / d. Disponível em: http: / / portais.funarte.gov.br / brasilmemoriadasartes / acervo / infoto / as-acoes-do-infoto / . Acesso em: 10 jul. 2020.

VICENTE, Filipa (Coord.). O império da visão: a fotografia no contexto colonial português (1860–1960). Lisboa: Edições 70, 2014.

ZAHER, Celia Ribeiro. Comentário IV. Anais do Museu Paulista, São Paulo, v.12, p. 35-37, jan. / dez. 2004, Disponível em: https: / / www.scielo.br / scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=0101 – 471420040001&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 08 jul. 2020.

Rogério Pereira de Arruda – Doutor em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); professor Adjunto III na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – Campus JK-Diamantina. E-mail: [email protected]

Ana Gandum – Doutora em Estudos Artísticos – Artes e Mediações pela Universidade Nova de Lisboa (UNL); pesquisadora da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, Universidade Nova de Lisboa, Portugal. E-mail: [email protected]


ARRUDA, Rogério Pereira de; GANDUM, Ana. Editorial. Revista de História da UEG, Morrinhos – GO, v.9, n.2, jul / dez, 2020. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Os investimentos estrangeiros em serviços públicos: América Latina e Espanha (século XIX e XX) / História Unisinos / 2020

O Dossiê que apresentamos para a apreciação dos leitores reuniu um conjunto de textos que contempla, a partir de diferentes perspectivas de análise, a historicidade dos investimentos estrangeiros na América Latina e na Espanha, dentro do marco cronológico dos séculos XIX e XX.

As pesquisas que originaram os artigos, apesar de procedentes de tradições historiográficas distintas – a europeia e a latino-americana – buscam explorar duas questões relevantes para a História Econômica. São elas: (1) Quais as relações existentes entre conjunturas nacionais / regionais e o fluxo de capitais estrangeiros para um determinado país? (2) Como as instituições políticas nacionais / regionais conduziram as tensões geradas entre os adeptos da captação de investimentos estrangeiros e os adeptos da valorização de capitais internos?

As questões supracitadas advertem para a necessidade de refutarmos uma leitura homogênea sobre os fatores que determinam o fluxo de capitais externos na direção da América Latina ou da Espanha. Neste sentido, para além da intencionalidade do lucro sempre presente na transferência de capitais de um país para outro, fatores como cooperação tecnológica, avaliação de riscos, previsão de demanda e os atrativos oferecidos pelo poder público são aspectos importantes para a compreensão da dinâmica dos investimentos externos. Igualmente importante é a percepção de que determinados setores da economia receberam maior afluxo de capitais externos em determinadas conjunturas históricas. E, no caso específico deste Dossiê, os setores contemplados foram o transporte ferroviário; o serviço de abastecimento de água; a indústria de gás e a geração / transmissão de energia elétrica.

No primeiro texto, Miguel Muñoz Rubio e Pedro Pablo Ortúñez revisam a discussão historiográfica sobre o impacto que a importação das primeiras locomotivas provocou na economia espanhola. Concentrando a abordagem no período entre 1848-1855, os autores constataram que a importação de locomotivas possibilitou uma transferência de tecnologias que foi fundamental para impulsionar a organização do sistema de transporte ferroviário da Espanha.

A gradual expansão do sistema de transporte ferroviário, primeiro da Inglaterra para a Europa continental e, posteriormente, da Europa para os outros continentes, pode ser considerada um dos capítulos mais interessantes na História Econômica mundial. Financiado na sua maior parte com capitais europeus, o novo sistema de transporte alcançou a América Latina, onde se tornou símbolo de modernização econômica, e, ao mesmo tempo, provocou tensões entre os investidores externos e as autoridades políticas locais. O artigo de Gunter Axt aborda este tipo de tensão. O autor pesquisou o embate entre o poder público e as empresas estrangeiras que atuavam no transporte ferroviário no Rio Grande do Sul da Primeira República. O desfecho do embate foi a encampação das empresas e a ampliação da intervenção do poder público na economia sul-rio-grandense.

Na mesma época em que as ferrovias facilitavam a circulação de passageiros e mercadorias e participavam da consolidação do chamado “sistema-mundo”, o fenômeno da urbanização se intensificava. Inseridas nas rotas de um comércio internacional que estava em expansão no final do século XIX e nas primeiras décadas do século XX, algumas cidades portuárias atraíram grandes contingentes populacionais e se defrontaram com a urgente necessidade de ampliar a oferta de água potável. Este foi o caso da cidade chilena de Iquique – objeto de estudo do artigo escrito por Inmaculada Simón Ruiz e Luis Castro Castro. Localizada no extremo norte do Chile, numa região de clima árido, no final do século XIX, durante o ciclo de extração / exportação do salitre, a cidade portuária de Iquique se expandiu convivendo com o problema da disparidade entre a demanda por água potável e a escassez de recursos hídricos. A pesquisa de Ruiz e Castro constatou que a redução parcial da disparidade foi financiada com capitais externos que priorizaram o lucro dos investimentos e prolongaram a situação precária do abastecimento de água em Iquique – situação que só foi revertida a partir de intervenção do poder público no serviço.

A relação entre aumento na demanda por água e o desenvolvimento de um serviço de abastecimento controlado pelo capital privado e externo também está presente no texto de Alberte Martínez López, que escreveu sobre os investimentos da empresa britânica Algeciras Water Works Company Limited na cidade de Algeciras, Espanha. O estudo realizado pelo autor abrange o período entre 1912, ano de fundação da empresa, e 1952, ano da sua dissolução. Dentro deste recorte cronológico a atuação da Algeciras Water Works foi afetada pela Primeira Guerra Mundial, pela crise econômica dos anos 30 e por mudanças na política cambial praticada pela Espanha. Diante destas adversidades e de uma crescente demanda por ampliação na oferta de água, a empresa se endividou e não foi capaz de atender de forma satisfatória os compromissos assumidos no contrato de concessão.

O fracasso de empresas estrangeiras é uma parte da história do fluxo de capitais internacionais. Outra parte desta história diz respeito aos padrões de investimentos estrangeiros observados em determinados locais e conjunturas históricas. Identificar estes padrões a partir da realidade da Espanha na segunda metade do século XIX e nos primeiros decênios do século XX é o propósito do artigo de Juan Manuel Matés Barco e Mariano Castro Valdivia. Os autores analisaram os investimentos estrangeiros nos setores de abastecimento de gás e água – ambos organizados a partir de indústrias de rede –, e concederam uma especial atenção para o fenômeno de retração dos investimentos estrangeiros na Espanha a partir de 1914 – um fenômeno ligado ao contexto da Primeira Guerra Mundial e às estratégias adotadas pelo governo para fortalecer a economia espanhola.

No sexto artigo do Dossiê, Alexandre Machione Saes aborda as mudanças ocorridas na política norte-americana de financiamento para o setor de energia elétrica no Brasil no período entre 1945-1954. O estudo de Saes ressalta a importância da pesquisa em fontes documentais diplomáticas no âmbito da História Econômica e oferece elementos para a compreensão das estratégias adotadas pelo Brasil e pelos Estados Unidos no fomento de um setor que ambos consideravam relevante.

Dentro do habitus da escrita acadêmica, a função do texto de Apresentação de um Dossiê é oferecer ao leitor pistas sobre um conjunto de artigos que pode ser lido em partes ou na sua totalidade. Acreditamos que nossa Apresentação, apesar de sucinta, atende esta função. No entanto, na condição de organizadores, consideramos pertinente registrar a constatação de que os seis textos reunidos tratam de investimentos estrangeiros diretos (IED), e, consequentemente, os investimentos estrangeiros em carteira (IEC) não foram contemplados. Apontando a ausência de estudos sobre a história dos investimentos estrangeiros em carteira neste Dossiê, sinalizamos para os leitores uma tendência no âmbito da História Econômica – a tendência de conceder maior atenção para pesquisas que abordam os investimentos estrangeiros diretos.

Diante do que foi exposto, finalizamos a nossa Apresentação agradecendo aos pesquisadores que participaram deste Dossiê como autores ou como avaliadores. E, da mesma forma, estendemos nosso sincero agradecimento para a Equipe Editorial da revista História Unisinos.

Fabiano Quadros Rückert

Guillermo Banzato

Os Organizadores

Corumbá / Buenos Aires, maio de 2020.


RÜCKERT, Fabiano Quadros; BANZATO, Guillermo. Apresentação. História Unisinos, São Leopoldo, v.24, n.2., maio / agosto, 2020. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Verités et Légendes | J.-L. Brunaux

Os gauleses aparecem em diversos livros sobre Arqueologia e História Europeia Ocidental. Eles fazem parte da História da França e também nos referimos a eles quando falamos sobre celtas. Foram populações recorrentemente selecionadas para a construção do nacionalismo francês, como fez Napoleão III, em 1865, ao projetar seu rosto em uma estátua de bronze em Alésia. Ele também justificou as ações coloniais francesas (como na Indochina e no norte da África), afirmando que a dominação romana aos gauleses teria levado a civilização e a paz a essas populações. Além disso, podemos citar durante a Segunda Guerra Mundial, o caso de Marechal Pétain, que também se associou à figura de Vercingetórix, argumentando que se sacrificou pelo país, dentre diversos outros casos.

No geral, os pesquisadores dividem-se entre os que são a favor do uso das nomenclaturas Gália e gauleses, e os que são contra. Christian Goudineau é um nome de destaque dentro de uma visão mais cética. O autor apresenta esta visão em sua obra Par Toutatis: que reste-t-il de la Gaule? (2002a), argumentando que as populações locais da França não chamavam a si próprias de gaulesas. Além disso, o que chamamos de Gália seria apenas uma concepção geográfica criada por César durante as Guerras da Gália, até mesmo pela consideração de divisões territoriais tão rígidas. E também porque o que César retrata é apenas o território que ele conquistou (cf. GOUDINEAU, 2002b, p. 37).

Enquanto isso, Jean-Louis Brunaux pertence ao grupo que adota essa nomenclatura, junto a diversos outros pesquisadores de pré e proto-história europeia da França. Podemos citar a obra de Py (1993); Les gaulois du Midi: de la fin de l’Âge de Bronze à la conquête romaine; Dedet (2018), Coutumes Funéraires en Gaule du Sud Durant la Protohistoire (IXe-IIe siècle av. J.-C.); Férnandez-Götz (2014), Identity and Power: The Transformation of Iron Age Societies in Northeast Gaul; Dessenne (2011), Celtes et Gaulois: deux chemins vers l’au-delà; dentre diversas outras obras. Esta se trata da abordagem mais tradicional e recorrente até hoje.

Podemos observar reflexos da Arqueologia Social francesa nesse livro, tendo em vista que o foco da obra é decifrar quem são as populações chamadas de gaulesas. Apesar disso, o autor propõe teorizações próprias, como veremos, e não uma descrição da cultura material, como encontramos muitas vezes na produção arqueológica do país.

Brunaux já publicou diversos livros sobre os gauleses voltados para acadêmicos, como Les religions gauloises (2016), Guerre et religion en Gaule: essai d’anthropologie celtique (2004), Les Gaulois (2005), Les Druides (2006). A grande diferença deste livro é a proposta de responder quem são os gauleses a partir da colocação de perguntas, que muitas vezes aparecem correntemente no imaginário popular sobre as populações da Idade do Ferro da França (VIII-I a.C.). Assim, o autor busca desmitificar lendas, mal-entendidos e apontar que evidências concretas existem. Dentre elas, encontram-se: se os gauleses são os ancestrais dos franceses (“Les Gaulois sont-ils les ancêtres des Français?”), se os chamados gauleses possuíam bigodes e cabelos grandes (“Les Gaulois étaint-ils moustachus et chevelus?”) e se eles se embebedavam em banquetes gigantescos (“S’enivraient-ils dans des banquets gargantuesques?”). Estas questões também se tratam de assuntos que aparecem de forma corrente na documentação textual feita por gregos e romanos.

“Les Gaulois: Vérités et legendes” possui, além de uma introdução, vinte e nove capítulos. A quantidade deles deve-se justamente ao fato de que cada capítulo propõe a resposta de uma questão, cuja resolução é feita, na grande maioria vezes, a partir do cruzamento da documentação arqueológica e textual. Consideramos este um livro introdutório, tendo em vista que responde a questões relativamente básicas sobre as populações da Idade do Ferro da França, que seria também compreendido por pessoas que não possuem informações anteriores sobre o assunto.

Dentre as perguntas colocadas, destacaremos as que consideramos mais essenciais. Logo na introdução, Brunaux defende o uso do termo gauleses para todas as populações da Idade do Ferro da França (BRUNAUX, 2018, p. 11). Essa ideia também é reforçada no segundo capítulo, “Sont-ils gaulois ou celtes?”.

No primeiro capítulo, “Marseille-la-Grecque a-t-elle adouci la civilisation gauloise?”, Brunaux fala sobre a fundação da colônia grega de Massália no sul da França, e discorre sobre as consequências da interação entre gregos e as populações locais. Já no segundo capítulo, “Sont-ils gaulois ou celtes?”, apresenta sua interpretação sobre quem são os celtas e os gauleses. Ele assinala que a concepção de que, nos séculos XIX e XX, os celtas compunham uma mesma raça já foi totalmente superada (BRUNAUX, 2018, p. 29). Segundo seu ponto de vista, a única coisa em comum entre os celtas seria uma:

[…] estreita relação que eles possuíam com os gregos, os foceus de Marselha particularmente. Todos tinham ligações diretas ou indiretas com esses comerciantes. Ou organizavam o tráfego na Gália para eles: cuidavam do transporte, da descoberta de novos mercados. Ou produziam para atender a sua demanda: extraíam minérios, refinavam metais, fabricavam produtos semiacabados e exportavam parte de sua produção agrícola” (BRUNAUX, 2018, p. 30).

Brunaux considera também que os celtas eram populações confederadas vinculadas a interesses econômicos (BRUNAUX, 2018, p. 31). De maneira que “era então provavelmente o nome genérico que esses aliados se davam” (BRUNAUX, 2018, p. 31). Segundo o autor, as alianças que eles fizeram indicariam duas fases: uma diplomática com os foceus (para fluxo de mercadoria e proteção) que se converteu também em política (criação de grandes vias por esses territórios), e outra econômica (estando o poder dessas populações conectado aos seus contatos). Ademais, Brunaux defende que os celtas seriam uma parte dos gauleses, que ele acredita que formem um grupo mais amplo, ou seja, todas as populações que residiam no território chamado de Gália (BRUNAUX, 2018, p. 34). Menciona-se que os celtas se helenizaram “superficialmente” (BRUNAUX, 2018, p. 30). Ele não considera este termo como uma perda total do que ele chama de “personalidade” das populações locais.

O capítulo três intitula-se “Les invasions gauloises étaint-elles barbares?”. Nele, o autor se propõe a desconstruir a ideia de que essas populações seriam invasores bárbaros. Ele apresenta episódios de incursões violentas relatadas pela documentação textual, mas também a ideia de uma imigração e da criação de colônias, vinculada a uma movimentação de longo prazo, nos quais os já residentes abririam o caminho para que mais pessoas chegassem (cf. BRUNAUX, 2018, p. 38-39 e 45). Igualmente, defende que a ideia de invasões célticas, como uma movimentação populacional em massa, nunca aconteceu. Como o autor aborda, sabemos que a maior parte da população local da França era composta por agricultores, ligados à terra, e que o grupo que mais se movimentaria nessa região eram os guerreiros que atuavam como mercenários (BRUNAUX, 2018, p. 43).

Dentre esses capítulos, acreditamos igualmente que o nono merece destaque. Tendo em vista que, ao lançar a questão de se a Gália seria uma invenção de César, Brunaux defende sua ideia de que as populações locais do sul da França teriam consciência dos limites do território chamado de Gália (BRUNAUX, 2018, pp. 104- 105).

Do mesmo modo, consideramos relevante a problematização da ideia de que os chamados gauleses seriam os ancestrais dos franceses (capítulo 10), tendo em vista que essa se trata de uma seleção parcial da História da França para fins nacionalistas, sendo uma construção.

O capítulo vinte e quatro contribui, desmitificando a ideia de que a França na Idade do Ferro seria coberta de florestas, e que eles seriam bons selvagens, vivendo harmonicamente na natureza. Como Brunaux (2018, p. 248) aponta, o norte da França possui mais florestas atualmente do que na Idade do Ferro, e era bastante habitada, demandando grande quantidade de terras para agricultura.

Podemos dividir o restante da obra por temas. Da forma como os capítulos 7 e 12 abordam a aparência dos chamados gauleses, que como mostra o autor, não seriam gigantes e louros, como perdura no imaginário popular (BRUNAUX, 2018, p. 87-88).

Outra temática levantada sobre essas populações são suas inovações e tecnologias. Isso aparece nos capítulos 14, 15, 16 e 17. Assim, ele menciona como essas populações criaram a colheitadeira, arado, a cota de malha (coletes de pequenos anéis para proteção dos cavaleiros), o esmalte vermelho (para substituir o coral), a colocação de uma camada de estanho para recobrir vasos e também inovações na botânica. Também reproduziram novas espécies de animais a partir do cruzamento com animais importados (BRUNAUX, 2018, p. 171). Do mesmo modo, são mencionados como ótimos artesãos com metal e madeira. Essas informações são essenciais para a desconstrução da ideia dessas populações do sul da França como bárbaros.

Alguns aspectos importantes dessas sociedades também são mencionados nos capítulos dezoito e vinte e cinco, como o fato de que algumas mulheres possuíam um lugar privilegiado e de destaque nessas sociedades. Brunaux também retoma assuntos bastante recorrentes sobre os chamados gauleses, como os serviços mercenários (capítulo 6), banquetes (capítulo 13), os druidas (capítulos 19 e 20), Vercingetórix (capítulo 11), a conquista da Gália (capítulo 26), organização social (capítulo 25), “arte” (capítulo 29), dentre tantos outros.

A obra contribui para o assunto, pois recorrentemente contesta a documentação clássica (textos gregos e romanos), até mesmo pelo cruzamento com a Arqueologia, apesar de nem sempre uma problematização ser totalmente alçada. Um exemplo disso é que o autor concorda com a ideia de Pompeu Trogo, de que “os foceus suavizaram a barbárie dos Gauleses, e lhes ensinaram uma vida mais doce” (BRUNAUX, 2018, p. 22-23), e diz que Massália era a “principal inspiradora da civilização gaulesa” (BRUNAUX, 2018, p. 24). Dessa forma, podemos observar que apesar dos avanços apontados na obra para que a visão de barbárie dessas populações seja desmitificada, o autor não questiona completamente o discurso colonial de que os gregos levariam a civilização para a barbárie. Podemos dizer o mesmo quanto à consideração de um papel ativo das populações locais nas relações com os gregos, tendo em vista a insistência em chamar as relações interculturais locais de helenização, escolhendo uma palavra que continua a enfatizar apenas um lado desse contato, ao invés de buscar alguma mais precisa e representativa, denotando claramente uma troca entre ambas as partes.

Além disso, apesar do perigo de generalização apresentado pela obra, tendo em conta seu grande escopo, que não leva em consideração até mesmo as diversidades regionais, esta é uma boa obra introdutória e atualizada sobre o tema. Inclusive porque poderia ser lida e compreendida por pessoas sem conhecimento prévio sobre o tópico, e também pela revisão de pontos clássicos.

Por fim, consideramos interessante a forma como o autor constrói a sua narrativa sobre quem eram os chamados gauleses, a partir de questões apresentadas em capítulos curtos, facilitando a leitura, enquanto nesse trajeto o pesquisador introduz o leitor a questões mais amplas, como religiosidade, contexto funerário, organização social, guerra, dentre outros. E assim, juntando as respostas dessas diversas questões, o autor nos permite a reunião da sua imagem e interpretação acerca de quem eram essas populações da Idade do Ferro da França.

Referências

BRUNAUX, Jean-Louis. (2016) Les religions gauloises. Paris: Biblis.

BRUNAUX, Jean-Louis. (2006) Les druides. Des philosophes chez les Barbares. Lonrai: Éditions du Seuil.

BRUNAUX, Jean-Louis. (2004) Guerre et religion en Gaule: essai d’anthropologie celtique. Paris: Errance.

BRUNAUX, Jean-Louis. (2005) Les Gaulois. Paris: Société d’édition Les Belles Lettres.

DESSENE, Sophie (coord.). (2011) Celtes et Gaulois: deux chemins vers l’au-delà. Soissons: Musée de Soissons.

FERNÁNDEZ-GÖTZ, Manuel. (2014) Identity and Power: The Transformation of Iron Age Societies in Northeast Gaul. Amsterdam: Amsterdam University Press.

GOUDINEAU, Christian. (2002a) Par Toutatis: que reste-t-il de la Gaule? Paris: Éditions Seul.

GOUDINEAU, Christian. (2002b) “Les Gaulois: récit d’une redécouverte.” Raison présente, n. 142, p. 31-38.

Thaís dos Santos – Mestre em História Social (PPGH/UFF/NEREIDA) ORCID: https://orcid.org/0000-0002-3575-8300 E-mail: [email protected]


BRUNAUX, J.-L. Les Gaulois. Verités et Légendes. Paris: Perrin, 2018. Resenha de: SANTOS, Thaís dos. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.20, n.1, p. 342- 348, 2020. Acessar publicação original [DR]

El dibujo entre América y Europa en época moderna y contemporánea. Historia, modelos, aplicaciones | Cuadernos de Historia del Arte | 2020

Dibujo técnico, artístico, académico, anatómico, animado, arquitectónico, geodésico, vectorial, a mano alzada, lineal, del natural, geométrico, científico, industrial, fotogénico. Estas son solo algunas de las modalidades, y por ende de las posibilidades, ofrecidas por el dibujo, disciplina tanto antigua como continuamente in fieri gracias a los nuevos materiales y tecnologías, cuyo desarrollo e historia han sido y son objeto de numerosos estudios y reflexiones.

Sus remotísimos origines hay que localizarlos en las cuevas prehistóricas habitadas por hombres y mujeres que no consideraron prescindible la comunicación por medios gráficos, que emplearon para dar forma a lo que la comunicación sonora difícilmente podía expresar. Los testimonios que nos han llegado, por ejemplo, de escena de animales y figuras estilizadas, se pueden considerar el antecedente por antonomasia de la ilustración científica. Leia Mais

Brasil-Polônia: Diálogos Histórico-Culturais / História – Debates e Tendências / 2020

A exuberante paisagem da Baia de Guanabara se desvela ao olhar sensível e atento dos poetas. A poesia, aliás, assim como a música, nos servem de linguagem para descrever o indescritível. Temos aqui um paradoxo. A linguagem escrita e falada que comumente utilizamos para nos expressar, igualmente nos impõe limitações para descrever com clareza nossos sentimentos, percepções e emoções.

Talvez por isso Tomasz Łychowski utilizou a poesia como forma de registrar suas impressões ao aportar no Rio de Janeiro em 1949. O caminho feito pelo poeta imigrante foi o mesmo de grande parte dos poloneses que desembarcaram na costa brasileira em grandes contingentes a partir do século XIX. Para muitos, a etapa marítima da viagem iniciava-se nos portos de Bremen ou Hamburgo, a partir daí singravam o Atlântico em direção ao Brasil. Apesar de não constituir o destino final da maioria dos imigrantes, a chegada ao Rio de Janeiro certamente ocupava um lugar de destaque no imaginário das famílias, pois representava um marco nessa jornada rumo ao desconhecido. Era o início de uma nova etapa em suas vidas. A maioria deles jamais retornaria à sua terra natal ou veria seus familiares novamente. A tęsknota za domem [1] se tornou uma constante. Leia Mais

Viagens e relatos: representações e materialidade nos périplos de latino-americanos pela Europa e Estados Unidos no século XIX | Stella Maris Scatena Franco

Por uma série de motivos, os livros de viagem têm despertado, ao longo do tempo, considerável interesse e conquistado gerações de ávidos leitores, estando como que inscritos na cultura ocidental. É extensa a lista de autores que marcaram época com seus relatos e ainda hoje são objeto da atenção de leitores e estudiosos, tais como Heródoto (séc. V a.C.), Marco Polo (1254-1324), Américo Vespúcio (1454-1512) ou Alexander von Humboldt (1769-1859). De formatos variados e natureza essencialmente híbrida, as obras que contêm relatos dos sucessos e desventuras dos viajantes por povos e culturas estranhos despertaram tamanho interesse basicamente por duas razões – especialmente nos últimos 500 anos: a) primeiramente, tendiam a satisfazer a curiosidade do público leitor europeu a respeito dos outros – fossem eles asiáticos, árabes, africanos ou nativos americanos – em meio à expansão comercial/colonial dos tempos modernos, por vezes afigurando-se como únicas formas de informação em um mundo sem cinema, rádio, televisão ou internet; b) segundo, tendem a abrir – em menor ou maior grau – uma porta para a intimidade do autor/viajante, revelando aspectos da sua subjetividade difíceis de se captar em obras diversas, de cunho ensaístico – e por isso ainda fazem sucesso nos dias atuais, ao lado dos diários pessoais e das autobiografias, propriamente ditas. Leia Mais

Los rastros del imperio. El ideario del régimen en las películas de ficción del primer franquismo (1939-1951) – PÉREZ NÚÑEZ (PL)

Jesús Pérez Núñez. Foto: Noticias de Álava /

NUNNEZ J P Los restros del ImperioDe una manera bastante generalizada, las producciones cinematográficas y del ámbito de la cultura visual suelen ser calificadas de simples (en lo técnico) y estandarizadas (bajo el prisma de la innovación y la originalidad) en España durante los primeros años de la dictadura. En relación a las temáticas y los mensajes de dichas producciones, se suele hablar de instrumentalización política, manipulación de los hechos históricos e ideologización de los referentes culturales.Esa corriente de opinión suele contar con gran aceptación en la mayoría de los casos, pero no profundiza en la efectividad que tuvo el sistema de propaganda sobre las nuevas generaciones y los sectores conservadores adheridos a la causa del Movimiento Nacional. El impacto psicológico fue mayúsculo, en un contexto de euforia inicial (por la victoria en la Guerra Civil) y de desconcierto pesimista (por la situación de aislamiento tras la II Guerra Mundial). Leia Mais

Uma editora italiana na América Latina – SCARZANELLA (Topoi)

SCARZANELLA, Eugenia. Uma editora italiana na América Latina: o Grupo Abril (décadas de 1940 a 1970). Campinas: Editora da Unicamp, 2016. Resenha de: NASCIMENTO, Aline de Jesus. A família Civita e a imprensa na América Latina. Topoi v.21 n.43 Rio de Janeiro Jan./Apr. 2020.

Escrever acerca da trajetória dos fundadores até a consolidação da Abril é tarefa que exige fôlego. Em meados do século XX, os seus criadores remodelaram os nichos editoriais na América Latina, principalmente no que tange ao caso brasileiro. Além do tradicional almanaque e das mais diversas coleções de fascículos, os produtos foram diversificados em vários suportes impressos não se limitando apenas às revistas, destinadas aos mais diversos públicos. A Abril segmentou o mercado de impressos e levou às bancas o mais variado tipo de revistas, que iam do esporte à moda, do gerenciamento e decoração da casa à informação semanal, enfim, uma diversidade de conteúdos que acabavam por agradar diferentes leitores e interesses, o que permitiu à empresa construir um verdadeiro império no campo editorial e tornar as bancas de jornais locais de informação e entretenimento. Uma empresa com tal renome não passaria impune aos historiadores, há uma gama de trabalhos acadêmicos acerca das principais revistas produzidas pela empresa, cada qual com sua metodologia.

O livro da professora de História da Universidade de Bolonha, Eugenia ­Scarzanella, seguiu uma linha interessante ao se basear na trajetória dos italianos pertencentes à família Civita na segunda metade do século XX. Especialista em América Latina, o livro representa sua primeira investida na empresa Abril. Sem deixar de entrelaçar as publicações da editora com o contexto político vigente, Scarzanella esmiuçou, com maestria, uma análise que levou em conta a experiência da Abril na Argentina, no ­Brasil e no México. Portanto, apesar da editora Abril constituir-se objeto comumente pesquisado, a autora contribui para as relações internacionais de um empreendimento que não afetou apenas o campo econômico, mas também o cultural. Dessa maneira, o título da obra por si já fornece indícios do que o leitor irá encontrar ao se debruçar no texto: a experiência de uma editora italiana na América Latina.

Cabe destacar dois pontos: a data de lançamento da tradução em português foi oportuna, visto que o atual cenário da editora não é mais promissor como o das décadas anteriores; a edição brasileira foi publicada pela Editora Unicamp, renomada por disseminar grandes títulos na área acadêmica.

Além do obstáculo da escassez de estudos que contemplem a trajetória da editora nos três países, outro desafio da pesquisa concerne às fontes. A fragmentação de documentos da editora Abril, que se encontram espalhados em diferentes bibliotecas e arquivos históricos, elencados na apresentação do livro, exigiu o empenho da pesquisadora não apenas na recolha, mas também no estabelecimento de uma linha de raciocínio diante de tantas frações. Também, a ausência de indícios fez com que Scarzanella levantasse diversas fontes para cobrir possíveis brechas na história. As fontes orais foram contribuições relevantes para o trabalho da historiadora. Além de compartilharem lembranças dos membros da família Civita, os testemunhos dos funcionários da empresa forneceram informações que não puderam ser acessadas nos escassos documentos oficiais.

A obra privilegia os primeiros anos da editora na Argentina, ao evidenciar como ocorreu a investida da empresa e quais foram as obras de mais destaque naquele país. A questão das relações étnicas e de como os italianos ocuparam espaço desse empreendimento na Argentina foi delineado pela autora e representa um novo olhar acerca da empresa. O livro, desse modo, contribui para novas perspectivas acerca dessa grande empresa que não se limitou apenas a um espaço geográfico.

O Brasil aparece como pano de fundo, quando a Abril constituiu-se numa empresa autônoma, mas que soube se apropriar de determinadas publicações de sua vizinha. Ao México foram destinadas poucas páginas no final do livro. A partir da atuação da família Civita na América Latina, o livro está dividido em seis capítulos com títulos claros acerca do que cada componente irá abordar. Acrescenta-se dois recursos interessantes: o índice onomástico e o caderno de imagens, elementos pós-textuais de grande relevância para quem quer realizar uma rápida consulta de revistas citadas no decorrer dos capítulos.

Scarzanella abordou os passos iniciais dos fundadores das empresas, a família ­Civita, desde o momento que fizeram parte da estatística dos exilados que se espalharam nos territórios da América por causa dos regimes totalitários entre 1920 e da Segunda Guerra Mundial que eclodiram na Europa. Cabe lembrar que uma parcela desses exilados era pertencente à classe social média alta, com elevados recursos econômicos e culturais. A atividade editorial da família Civita dentro do território latino-americano iniciou-se na Argentina com Cesare, empenhado em publicações de revistas em quadrinhos. Uma rede de relações e parcerias, firmadas por Cesare, na qual estavam envolvidos contatos com a comunidade judaica e italiana na Argentina, possibilitou um leque de novos financiadores e leitores. Em 1944, a Abril argentina publicou uma revista em pequeno formato da Disney: El Pato ­Donald. Trabalhar nesse local não significou apenas um privilégio econômico comparado a outros empregos no setor, simbolizava a possibilidade de compartilhar um ambiente dinâmico, jovem, culto e divertido.

Vittorio seguiu o caminho do irmão e, com os direitos autorais da Disney, publicou no Brasil, em junho de 1950, o Pato Donald, marcando o momento inicial da empresa que dominaria as bancas em poucos anos. A sede da editora sempre foi São Paulo, estado que se destacava do ponto de vista econômico e que então contava pouco mais de dois milhões de habitantes. O mundo do jornalismo, assim como o da cultura e dos intelectuais, era largamente dominado pelo eixo Rio de Janeiro/São Paulo e a cidade foi uma aposta do fundador que acabou por se revelar bastante acertada.

Scarzanella estabeleceu os traços comuns entre os dois países, que não se limitaram apenas pela escolha do mesmo nome para a editora. O desenvolvimento paralelo da Abril no Brasil e na Argentina prosseguiu por todos os anos de 1950. O caso da revista de fotonovelas Capricho merece destaque nessa relação devido ao seu grande sucesso. Lançada em 1952, a revista foi dirigida por uma colaboradora da Abril argentina, a fim de contribuir para o lançamento de novas publicações nesse gênero. Após uma mudança de formato e o início da publicação de histórias completas em cada número, o periódico chegou a uma tiragem de 500 mil cópias e uma versão em espanhol passou a ser distribuída na Argentina.

O segredo da Abril consistia em colocar no mercado novos produtos com publicações diferenciadas e destinadas a determinadas faixas de consumidores, em uma velocidade imposta pelas nuances do mercado editorial. Assim, em 1959, foi lançada em São Paulo a primeira revista de moda, Manequim, que utilizava material fotográfico proveniente de Buenos Aires.

Ainda na década de 1960, Parabrisas na Argentina foi grande sucesso relacionada ao desenvolvimento da indústria automobilística no país. O êxito acarretou no aumento de sua periodicidade – de mensal para semanal – a fim de estar mais presente nas bancas. Foi rebatizada como Corrida (1966) e Raúl Horacio Burzaco foi convidado para dirigi-la. Em agosto de 1960, a Abril de São Paulo lançou a revista Quatro Rodas, sob direção do jornalista Mino Carta, nos moldes da publicação argentina, igualmente especializada em turismo e automóveis.

Em 1961 surgiu nas bancas Claudia, publicação homônima à argentina lançada em 1957. Seguindo os moldes de Marie Claire, Grazia e Ladies’ Home Journal, esse semanal feminino foi de imediato grande sucesso. Destinado a donas de casa, explorou o uso de fotografia e publicidade nas suas páginas. No caso brasileiro, foi a primeira revista feminina que trouxe no título o nome de uma mulher. Os periódicos renovaram o gênero e sempre estiveram em sintonia com o crescimento da urbanização e das camadas médias. Porém, progressivamente ambas as revistas, brasileira e argentina, se distanciaram, ao adequar-se aos poucos cada qual a sua realidade nacional. Com grande sucesso até os dias atuais, no Brasil, Cláudia, destinada à mulher casada, deu origem a subprodutos como Casa Cláudia.

A Abril firmou-se no mercado brasileiro em função de projetos grandiosos e inovadores. Para garantir maior eficiência na vendagem, a editora criou uma rede de distribuição própria, comprou bancas e financiou jornaleiros para os quais organizou também cursos de formação. A editora brasileira antecipou-se à argentina no mercado de enciclopédias e fascículos com A Bíblia mais bela do mundo (1965), Os pensadores (1974), Os economistas (1982).

Pode-se levantar hipóteses de que a Abril brasileira pôde usufruir da vantagem de melhores relações com o poder público, mesmo com as dificuldades ligadas à limitação da liberdade da imprensa, fator que não se repetiu com a ditadura na Argentina. O regime militar brasileiro foi provavelmente para os empresários um interlocutor mais estável e mais hábil na gestão da economia em relação ao regime militar argentino, que fez as empresas naquele país “navegar[em] em águas difíceis, adaptando-se à mudança brusca de governos, à pretensão recorrente dos militares de impor à censura (e com ela a moral católica e conservadora) e à hostilidade dos seguidores de Perón (de direita e de esquerda), em guerra permanente entre si” (p.113).

A irmã brasileira lançou Realidade, em 1966, e Veja, em setembro de 1968. A censura impediu a circulação da primeira durante dois anos devido aos conteúdos considerados ofensivos (sexo, aborto, divórcio). O momento de lançamento da última não foi feliz porque, em dezembro do mesmo ano, foi decretado o Ato Institucional nº 5, com o qual o regime militar suspendia as garantias constitucionais. Entre 1975 e 1976, Veja teve que se submeter à aprovação prévia da censura e evitar tratar de uma lista de temas proibidos. Inclusive, de acordo com a historiadora, a demissão do diretor da revista, Mino Carta, teria sido uma exigência da ditadura, informação contestada de acordo com a versão do Roberto Civita (ALMEIDA, 2009, p. 151). Veja conseguiu sobreviver à ditadura e quando a editora brasileira comemorou 50 anos foi a revista com mais exemplares vendidos no país.

A Abril argentina não teve a mesma sorte, seus semanários de atualidade foram alvos de forte censura, houve intimidação e violência contra jornalistas, proprietários e tipógrafos. Em 1975, a organização de direita Aliança Anticomunista Argentina (Triple A) explodiu, diante do prédio da editora, uma bomba lança-panfletos contendo ameaças aos funcionários e à família Civita. Uma contribuição interessante do livro, mas que é pincelada pela autora foi que o empresário Cesare decidiu deixar o país e tentar se instalar em São Paulo, mas Vittorio teria dito que não havia modos de utilizá-lo dentro da sociedade. Esse tema pouco explorado representa uma nova perspectiva sobre a relação dos dois irmãos e questionamentos acerca dos conflitos de interesse das empresas.

A partir dos anos de 1960, Cesare tentou se inserir no México, com a Mex-Abril. enviando o genro Giorgio de Angeli para gerir esse novo empreendimento. Claudia também recebeu uma versão nesse país, com ingredientes locais, com divulgação de material de escritores e comerciantes, assuntos sobre homens e roupas que podiam ser compradas em boutiques nacionais, além de belas mulheres da televisão e sobre o cinema do país. A Mex-Abril não se revelou tão próspera quanto as irmãs e, no livro de Scarzanella, não houve muitas páginas dedicadas a essa investida de Cesare.

O destino da Abril argentina não se mostrou feliz desde os anos de 1970, explorado no encerramento do livro. Scarzanella enfatizou que o “capital social” de Cesare não foi o suficiente para transformar a editora argentina, empresa essencialmente familiar, em um empreendimento internacional. Os políticos, militares e lobistas teriam conquistados a Abril, como a própria autora afirmou no título do último capítulo.

O caso brasileiro foi mais frutífero. No ano de 2000, em seu cinquentenário, a empresa contava com 219 títulos nas bancas. Destarte, uma obra que demonstra as relações sociais e os empreendimentos na imprensa latino-americano dentro da família Civita, se caracteriza como uma leitura imprescindível. Principalmente, ao se considerar o entrelaçamento da Abril argentina com o contexto político do país que influenciou a sorte da empresa. Para um leitor que busca conhecimento acerca da Abril no Brasil e no México, o livro não contempla um estudo detalhado, o título original justifica o motivo: Abril – De Perón a Videla: um editore italiano a Buenos Aires. O assunto está longe de se esgotar dentro da obra, sendo, dessa maneira, um instrumento interessante para multiplicar as pesquisas sobre o assunto na área de História.

O estilo de escrita e a divisão dos capítulos permitem uma leitura fluída, inclusive para aqueles que não são especialistas na área. A obra se destaca por ser o resultado de uma pesquisa intensa com grande diversidade de fontes, motivo que contribui para os debates em torno da editora Abril e também abre espaço para se pensar acerca das redes étnicas criadas pela família Civita.

Referências

ALMEIDA, Maria Fernanda Lopes. Veja sob censura: 1968-1976. São Paulo: Jaboticaba, 2009. [ Links ]

SCARZANELLA, Eugenia. Uma editora italiana na América Latina: o Grupo Abril (décadas de 1940 a 1970). Campinas. Editora da Unicamp, 2016. [ Links ]

Aline de Jesus Nascimento – Mestranda da Universidade Estadual de São Paulo / Departamento de História, campus Assis, Assis/SP – Brasil. Bolsista Fapesp, processo nº 2017/15451-9. E-mail: [email protected].

Os Indígenas e as justiças no mundo Ibero-Americano (Sécs. XVI – XIX) – DOMINGUES et al (FH)

DOMINGUES, Ângela; RESENDE, Maria Leônia Chaves de; CARDIM, Pedro (orgs). Os Indígenas e as justiças no mundo Ibero-Americano (Sécs. XVI – XIX). Lisboa: Atlantica Lisbon Historical Studies. Centro de História da Universidade de Lisboa, CHAM – Centro de Humanidades (NOVA FCSH-UAc) e Programa de Pós-Graduação em História/Universidade Federal de São Joao del-Rei (PPGH-UFSJ), 2019. 364 p. Resenha de: ARAÚJO, Lana Gomes de. Protagonismos indígenas e as justiças no mundo Ibero-Americano. Faces da História, Assis, v.7, n.1, p.486-492, jan./jun., 2020.

Em 2019, sob a organização de Ângela Domingues, Maria Leônia Resende e Pedro Cardim, foi publicado o livro Os Indígenas e as justiças no mundo Ibero-Americano (Sécs. XVI – XIX) composto por vários artigos de pesquisadores que entendem a sociedade colonial não só como um espaço dinâmico, mas complexo, diverso e criativo, onde o tratamento dado aos indígenas gerava uma pluralidade de respostas e das suas justiças frente à cultura jurídica da sociedade colonial da América espanhola e portuguesa.

Abrindo as discussões, Ailton Krenak denuncia as violências reais e simbólicas sofridas pelo povo Krenak ao longo dos séculos. Foram perseguidos, tiveram suas famílias escorraçadas, massacradas, despejadas, expulsas de suas próprias terras e perambularam por diversas regiões do Brasil. Situação agravada durante o regime militar, quando juntamente com outras etnias foram jogados em um Reformatório, sob a desculpa governamental de que precisavam ser reeducados, enquanto tomavam-lhes as suas terras. Terras que as famílias indígenas nunca desistiram.

Em Os Povos Indígenas, a dominação colonial e as instâncias de Justiça na América portuguesa e espanhola, Pedro Cardim discute os esforços dos próprios indígenas ao longo da história em se afirmarem enquanto grupo étnico. Apontando que o movimento indígena, a produção acadêmica mais recente desenvolvida pelos próprios pesquisadores indígenas, a aproximação da história com outras disciplinas, métodos, conceitos, assim como as técnicas de manuseio de fontes documentais e as influências do conceito de subaltern studies1, têm sido importantes ferramentas para “superação dos silêncios nada inocentes e mostrar a voz e o rosto dos ameríndios”2. (FISCHER, 2009 apud CARDIM, 2019, p.31)  Apesar dos avanços, Pedro Cardim destaca que é preciso estar atento ao “vocabulário da conquista” (CARDIM, 2019, p. 41), referindo-se aos termos comumente encontrados nos documentos coloniais como “índio”, “gentio”, “bárbaro” e outros. Uma vez que estes possuíam efeitos jurídicos diferentes dentro do cenário da América portuguesa e podiam significar manutenção ou perda de direitos, por exemplo.

Em Da ignorância e rusticidade: os indígenas e a inquisição na América portuguesa (séculos XVI-XIX), Maria Leônia Resende traz uma importante abordagem sobre a atuação do Tribunal da Inquisição e como a produção historiográfica sobre tratou o tema, apresentando uma luta ideológica entre as diversas facções religiosas da Europa na Idade Moderna: ora uma visão detratora por sua crueldade, ora pelo certo grau de misericórdia diante aos considerados ataques ao catolicismo.

Todavia a história institucional do dito Tribunal se deu no plural na Europa e nos domínios ultramar, ao ponto de podermos afirmar que houve Inquisições. E, os estudos das denúncias e processos têm mostrado as maneiras que a Inquisição lidou com as expressões das práticas religiosas, costumes e culturas indígenas tendendo, muitas vezes, em uma interpretação jurídica-canônica mais benevolente para as “populações desprotegidas”, fundamentada no uso do conceito “persona miserabilis” e da “ignorância (in)vencível”.

O conceito de persona miserabilis permeia o debate de outros pesquisadores, como o de Jaime Goveia, Maria Regina Celestino de Almeida, Hal Lagfur e de Pedro Cardim. Este último, inclusive, compreende que a classificação de miserabile garantia certa proteção aos indígenas, situando-os numa condição especial frente à Inquisição, aos tribunais ordinários, ou ainda, aos colonos, sustentadas por uma posição evangelizadora mais benevolente. Esse entendimento, de pessoas “miseráveis, ignorantes, pessoas rústicas”, fazia com que acreditasse que os indígenas eram incapazes de dar conta dos seus próprios erros, por não terem consciência plena do “pecado”.

As principais denúncias contra os indígenas fundamentavam-se em questões de feitiçaria, adivinhações, bigamia, blasfêmias, por comerem carne em dias proibidos e até por pequenos roubos, como foi o caso de Anselmo da Costa. Este, um jovem índio de 14 anos, confessou ter roubado pequenos adereços e pedaços de fita do berço do Menino Jesus para confeccionar uma bolsa de mandigas, a fim de se livrar dos perigos de mordidas de cobras e onças. O jovem passou 4 anos no cárcere, mas teve seu processo encerrado quando o Tribunal alegou sua capacidade de discernimento (RESENDE, 2019, p.113).

Em Sem medo de Deus ou das justiças (…), a professora Ângela Domingues analisou os “poderosos do sertão” através dos discursos do capitão-mor e governador Francisco Xavier de Mendonça Furtado na Capitania do Grão-Pará e como eles estavam alinhados com a política pombalina. De acordo com ela, através da análise desse período administrativo é possível perceber as estratégias, alianças e negociações interétnicas, revelando situações em que os indígenas passaram a ser considerados infratores por não se enquadrarem nos projetos do Estado para a Amazônia e desafiarem a vontade dos poderosos da região.

Em Índios, territorialização e justiça improvisada nas florestas do sudeste do Brasil, Hal Langfur levanta uma interessante questão acerca da implementação da justiça no Brasil colonial imposta em prejuízo aos indígenas. Segundo ele, a legislação colonial mascarou uma realidade jurídica, retirou os índios das suas terras, legitimou o trabalho forçado etc., mas “os indígenas não aceitaram esta perseguição jurídica sem resistência” (HANGFUR, 2019, p.157).

Jaime Gouveia, em Os indígenas nos auditórios eclesiásticos do espaço luso-americano, debate sobre as relações envolvendo os povos indígenas e a justiça episcopal no período colonial, tema que gerou algumas generalizações equivocadas, sobretudo, por não ter existido no caso português um “direito canônico” como existiu na América hispânica.

No Brasil, os auditórios tinham alçada sobre todo o clero secular – excetuando alguns crimes (como os de lesa-majestade e disputas relativas aos bens da Coroa) – e leigos (membros da Capela Real e das ordens militares). E poderes quanto a matéria, ou seja, sobre a natureza dos delitos, abrangendo os pecados públicos, independente dos autores serem leigos ou eclesiásticos. Mas, não tinha competência para julgar as consideradas heresias indígenas.

Porém, com os índices populacionais nos territórios indígenas, as necessidades de evangelização esbarravam na escassez de estruturas necessárias a esse exercício, passando a exigir responsabilidades mais amplas. De todo modo, os processos judiciais contra os réus indígenas decorriam na mesma formalidade de praxe dos não-indígenas, com exceção do privilégio jurisdicional de miserabilidade, que era visto como concessão de uma graça do direito canônico aos indígenas.

No sétimo artigo, Maria Regina Celestino de Almeida apresenta uma nova versão de dois capítulos de seus livros publicados em 2005 e 20093, desenvolvendo uma relevante análise sobre a cultura política indígena e política indigenista no Rio de Janeiro colonial através das disputas jurídicas sobre as terras e a identidade étnica dos índios aldeados entre os séculos XVIII e XIX. Evidenciando o fato de que, para evitarem a perda total de suas terras, os indígenas passaram a assumir nitidamente a identidade de índios aldeados e súditos cristãos, assumindo uma posição de privilégios em relação aos negros e índios escravos (ALMEIDA, 2019, p. 221).

Isso porque, assumindo essa condição, podiam solicitar mercês, ter direito à terra, embora uma terra reduzida. Tinham direito ainda a não se tornarem escravos, embora obrigados ao trabalho compulsório. Por fim, o direito a se tornarem súditos cristãos, embora tivessem de se batizar e abdicarem de suas crenças e costumes. Sendo que as lideranças ainda tinham direito a títulos, cargos, salários e prestígio social, o que dentro de condições limitadas, restritas e opressivas, eram possibilidades de agir para valer o mínimo de direito assegurado por lei.

Como parte das investigações mais recentes, escrito em espanhol, o artigo de Pablo Ibáñez-Bonillo, Procesos de Guerra Justa en la Amazonía portuguesa (siglo XVII), aponta a influência indígena na construção das fronteiras coloniais, partindo da premissa de que a guerra justa é uma ferramenta para se explorar as relações de fronteira. Com isso, a construção de alteridades e a influência das dinâmicas indígenas na história colonial não podem ser vistas como um mecanismo de dominação, mas sim um processo mais amplo de negociação e resistência.

O texto do professor Juan Marchena e da Nayibe Montoya (2019) traz um valioso estudo sobre as justiças indígenas andinas e sua relação com a aprendizagem da cultura escrita. Os autores destacam que as sociedades originárias lutaram e lutam permanentemente pela independência, justiça, dignidade e necessidade de combater a pobreza, não se renderam, não se deixaram comprar, mesmo enquanto eram abatidos e destruídos. Sendo que, com a luta mantida durante os séculos até o presente, por suas terras, cultura e identidade, representam uma luta que deveria ser de todas e todos nós.

Por fim, o artigo de Camilla Macedo alude sobre a propriedade moderna e a alteridade indígena no Brasil entre meados de 1755-1862, partindo da análise da implementação do Diretório dos Índios e suas implicações para as questões de terra e propriedade privada, observando as rupturas e continuidades através das políticas indigenistas na transição da jurisdição eclesiástica para a secular, envolvendo os indígenas, administradores coloniais, religiosos etc.

Com esta obra, os autores dão continuidade ao relevante trabalho que o movimento indígena juntamente com os historiadores e antropólogos vêm desenvolvendo ao longo das últimas décadas. As reflexões contribuem para a percepção de que os homens e mulheres indígenas foram e continuam sendo protagonistas das suas próprias histórias através das suas ações, ressignificações e agenciamentos4 frente aos ditames da Coroa portuguesa.

As pesquisas apresentadas nos permitem refletir acerca dos regimes de memória5, trabalhados e discutidos por João Pacheco de Oliveira (2011), que construíram no Brasil imagens preconcebidas sobre os índios, definindo-os e limitando-os negativamente, condicionando o indígena exclusivamente ao passado colonial e estereótipos como de nomadismo, bravura ou de exuberante beleza extraído da literatura romântica.

Além de ressaltar as questões de estratégias e que interações proporcionadas pelos contatos interétnicos na realidade política colonial eram plurais, como fez a professora Maria Cristina Pompa (2001). E problematizar sobre a circularidade cultural entre os indígenas e os outros agentes coloniais, como fez Gláucia de Souza Freire (2013), ao apontar que os missionários religiosos se prevaleciam de práticas ritualísticas dos indígenas que eram consideradas “feitiçarias”, como o uso da jurema sagrada.

Os diálogos contrariam ainda a historiografia dita oficial que reservava aos indígenas um papel secundário e descarta antigas concepções sobre “índio puro”, “índio aculturado”, “resistência”, “aculturação”, embasados nas tentativas de reduzir a participação dos indígenas a um processo inevitável de extinção e desaparecimento. Sendo que os indígenas estão cada vez mais presentes nas questões políticas, se apropriando e ressignificando sua cultura e lutando pelo reconhecimento de seus direitos constitucionalmente garantidos após muita persistência do próprio movimento indígena.

Notas

1 O conceito de Subaltern Studies trabalhado por Florencia Mallon (1994) foi utilizado para tratar da análise de “baixo para cima” realizada por um grupo de estudiosos sobre a Índia e o colonialismo, mas que forneceu inspiração para historiadores americanicistas. MALLON, Florencia. The Promise and Dilemma of Subaltern Studies: Perspectives from Latin American. History. The American Historical Review: 1491-1515. DOI:10.1086. 1994.

2 FISHER; O’HARA. Introduction Racial Identities and their Interpreters in Colonial Latin America. In: FISCHER, Andrew; O’HARA, Matthew Imperial Subjects. Race and Identity in Colonial Latin America. Durham: Duke University Press. 2009. p. 1-37.

3 ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Índios, Missionários e Políticos: Discursos e Atuações Político-Culturais no Rio de Janeiro Oitocentista.” In: SOIHET, Racehel el al (org). Culturas Políticas. Ensaios de História Cultural, História Política e Ensino de História. Rio de Janeiro: Mauad, 2005, p. 235-255; ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Cultura Política Indígena e Política Indigenista: Reflexões sobre Etnicidade e Classificações Étnicas de Índios e Mestiços no Rio de Janeiro – Séculos XVIII e XIX. In.: AZEVEDO, Cecilia et al (org.) Cultura, Política, Memória e Historiografia. Rio de Janeiro: FGV, 2009, p. 211-228

Referências

ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Índios, Missionários e Políticos: Discursos e Atuações Político-Culturais no Rio de Janeiro Oitocentista. In: SOIHET, Racehel el al (org). Culturas Políticas. Ensaios de História Cultural, História Política e Ensino de História. Rio de Janeiro: Mauad, 2005, p. 235-255.

ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Cultura Política Indígena e Política Indigenista: Reflexões sobre Etnicidade e Classificações Étnicas de Índios e Mestiços no Rio de Janeiro – Séculos XVIII e XIX. In.: AZEVEDO, Cecilia et al (org.) Cultura, Política, Memória e Historiografia. Rio de Janeiro: FGV, 2009, p. 211-228

DOMINGUES, Ângela; RESENDE, Maria Leônia Chaves de; CARDIM, Pedro (orgs). Os Indígenas e as justiças no mundo Ibero-Americano (Sécs. XVI – XIX). Lisboa: Atlantica Lisbon Historical Studies. Centro de História da Universidade de Lisboa, CHAM – Centro de Humanidades (NOVA FCSH-UAc) e Programa de Pós-Graduação em História/Universidade Federal de São Joao del-Rei (PPGH-UFSJ), 2019. 364 p.

FISHER; O’HARA. Introduction Racial Identities and their Interpreters in Colonial Latin America. In: FISCHER, Andrew; O’HARA, Matthew Imperial Subjects. Race and Identity in Colonial Latin America. Durham: Duke University Press. 2009. p. 1-37.

MALLON, Florencia. The Promise and Dilemma of Subaltern Studies: Perspectives from Latin American. History. The American Historical Review: 1491-1515. DOI:10.1086. 1994.

MONTEIRO, John. Negros da Terra: índios e bandeirantes nas origens de São Paulo. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.

OLIVEIRA, João Pacheco de (org). A presença indígena no Nordeste: processos de territorialização, modos de reconhecimento e regimes de memória. Rio de Janeiro: Contra Capa. 2011.

POMPA, Maria Cristina. Religião como tradução: missionários, Tupi e “Tapuia” no Brasil Colonial. 2001. 455 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Filosofia e Ciências Humanas, Campinas, SP, 2001.

SOUZA, Glaucia Freire. Das “feitiçarias” que os padres se valem: circularidade cultural entre indígenas Tarairiú e missionários na Paraíba setecentista. 2013. 159 f. Dissertação (Mestrado em História) – Universidade Federal de Campina Grande, PB, 2013.

Lana Gomes Assis Araújo – Bacharela em Direito pelo Centro Universitário Unifacisa, Campina Grande – PB, licenciada em História pela Universidade Federal de Campina Grande – PB, mestre em História pela Universidade Federal de Campina Grande, Campina Grande – PB, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em História pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife – PE. Bolsista CAPES. E-mail: [email protected].

Acessar publicação original

[IF]

O jovem Hegel e os problemas da sociedade capitalista – LUKÁCS (FH)

LUKÁCS, György. O jovem Hegel e os problemas da sociedade capitalista. Tradução de Nélio Schneider. 1 ed. São Paulo Boitempo, 2018. 733p. Resenha de: SILVA, Edson Roberto de Oliveira. O jovem Hegel de Lukács: por uma redenção da dialética. Faces da História, Assis, v.7, n.1, p.51-507, jan./jun., 2020.

György Lukács é considerado o maior filósofo marxista do século XX. Nasceu em Budapeste no dia 13 de abril de 1885, em uma Hungria que, no período, fazia parte do território integrado ao Império Habsburgo. Graduou-se na Universidade da mesma cidade, doutorou-se em Direito e Filosofia em 1906 e 1909, respectivamente. A produção e desenvolvimento filosófico do jovem Lukács — de 1910 a 1923 influenciou nomes conhecidos como Walter Benjamin, Siegfried Kracauer, Ernest Bloch e pensadores da famosa Escola de Frankfurt, como Theodor W. Adorno.

O livro O Jovem Hegel e os Problemas da sociedade capitalista (2018), de Lukács faz parte da coleção A Biblioteca Lukács, coordenada por José Paulo Netto, e se tornou o sétimo título do filósofo húngaro publicado pela editora Boitempo. A obra foi traduzida diretamente do alemão por Nélio Schneider e teve revisão técnica de Netto e Ronaldo Vielmi Fortes.

A coleção Biblioteca Lukács tem como missão fazer a divulgação do pensamento do filósofo húngaro. Entretanto, não é de hoje que o pensamento lukacsiano é divulgado no Brasil, tanto por traduções como por elaborações críticas. Sua filosofia foi intensamente divulgada na década de 1960 por três intelectuais de grosso calibre — Leandro Konder, Carlos Nelson Coutinho e J. Chasin — efetuando traduções e em elaborações críticas. Entre as obras de Lukács traduzidas e divulgadas por Konder e Coutinho estão: Ensaios Sobre Literatura (1964); Introdução a uma Estética marxista (1978), títulos esses publicados pela Editora Civilização Brasileira.

O desenvolvimento filosófico de Lukács tem como proposta, desde seus primeiros escritos marxistas, fazer um debate renovado com a filosofia clássica, principalmente a alemã, na qual ele buscava fazer “ao nível da crítica” a “análise histórica e sistemática das modalidades de conhecimento e interpretação do mundo constituídas pela cultura burguesa” e “determinar o estatuto histórico-filosófico do marxismo” instaurando uma “crítica macroscópica da totalidade da cultura burguesa” (NETTO, 1978, p.14). Netto (1978) dará destaque para duas obras do filósofo húngaro onde se encontram as críticas sistemáticas à cultura filosófica burguesa: O jovem Hegel, a qual nos propomos apresentar a partir dessa resenha, e Destruição da Razão: de Schelling a Hitler (NETTO 1978, p.15). O intérprete nos alerta que a crítica à filosofia burguesa do pensador húngaro não somente se propõe a apontar suas limitações, mas, também, resgatar Hegel da instrumentalização mistificadora elaborada pelos ideólogos fascistas — se empenhando em “resgatar os conteúdos humanistas e democráticos do pensamento burguês anterior 1848” (NETTO, 2011, p.8). Desta forma Lukács, desde História e Consciência de Classe, é considerado um renovador do pensamento marxista.

O livro, O jovem Hegel, é dividido em quatro partes que são compostas por momentos do desenvolvimento filosófico de Hegel partindo das diferentes localidades em que o filósofo alemão viveu: Berna (1793-1796), denominado como o período republicano de Hegel; Frankfurt (1797-1800), no qual o filósofo deu início ao desenvolvimento do método dialético; e Iena, que se divide em mais dois períodos: o primeiro (1801-1803), no qual há a vinculação e a defesa ao idealismo objetivo; e o segundo (1803-1807), momento que mostra os últimos percalços que Hegel trilhou para culminar em sua primeira produção amadurecida, original e de peso, A Fenomenologia do Espírito.

O plano de fundo d’O jovem Hegel é a Revolução Francesa e os ecos no pensamento germânico. O interesse do filósofo alemão, como nos alerta Lukács, estava voltado para entender a sociedade civil burguesa [bürgerlicheGesellschaft]. O húngaro mostrará que a influência da revolução burguesa na sua totalidade — isto é, Revolução Industrial e a revolução política para a instauração de um Estado-nação —, interessava à Hegel e foi determinante para a formação de seu posicionamento filosófico e político.

No curto espaço de tempo que Hegel esteve em Berna, Lukács analisa o início do seu desenvolvimento filosófico, desmistificando as interpretações feitas de sua filosofia nesse período, que tendem a culminar, muitas vezes, na redução e vinculação de suas elaborações a um “reacionarismo” tratando-o como absolutista e vinculando-as unilateralmente com a “teologia”. O húngaro nos mostra que, em primeiro lugar, as vinculações políticas de Hegel nesse período sempre estiveram voltadas para a ala da esquerda democrática do Iluminismo e que teciam críticas ao Iluminismo alemão, pois os “absolutistas feudais e seus ideólogos tentaram muitas vezes se aproveitar de determinados aspectos deste movimento para seus próprios fins” (LUKÁCS, 2018, p. 68). Hegel via a “antiga república citadina (polis) não como um fenômeno social do passado”, mas como a constituição de “um modelo eterno, ideal não alcançado para uma mudança atual da sociedade e do Estado” (LUKÁCS, 2018, p. 69, grifos nossos). Em segundo, aponta que a filosofia de Hegel não teve vinculação teológica, pelo contrário, Lukács argumenta que o alemão é um crítico do sectarismo do cristianismo primitivo (LUKÁCS, 2018, p. 71), e se interessava por seitas posteriores. Hegel, segundo seu estudioso, trata o cristianismo como uma religião “positiva” a qual “constitui um esteio do despotismo e da opressão” (LUKÁCS, 2018, p. 85).

A ligação de Hegel à filosofia kantiana, principalmente de Crítica da razão Prática, é, segundo Lukács, de extrema importância para a vinculação de sua filosofia à realidade. O filósofo alemão vê que tanto os problemas sociais como os morais vinculam-se aos problemas da práxis, mostrando que a base de sua filosofia é a “reconfiguração da realidade social pelo ser humano”. Lukács escreve que Hegel vai além de Kant, posto que este último investiga os problemas morais do ponto de vista do indivíduo. Para Kant o fundamental é a consciência como um fato moral, em contraponto a isso “o subjetivismo do jovem Hegel, direcionado para a prática, é coletivo e social desde o início. Para Hegel, é sempre a atividade, a práxis da sociedade que constitui o ponto de partida e também o objeto central da investigação” (LUKÁCS, 2018, p. 73).

Já nos três anos de Frankfurt, Hegel, segundo Lukács, irá reestabelecer criticamente algumas das suas concepções filosóficas, entre elas a sua elaboração de positividade. Nesse momento, a “positividade” será vista como “um sinal de que o desenvolvimento histórico já ultrapassou uma religião, e que ela merece ser destruída e inclusive tem de ser destruída pela história” (LUKÁCS, 2018, p. 329). Essas novas formulações também servirão de base para os “primeiros embriões do método de Fenomenologia do espírito” (LUKÁCS, 2018, p. 177). Lukács nos expõe que todo esse desenvolvimento do período de Frankfurt é atrelado com as constantes variações na história da Revolução Francesa, porém suas concepções republicanas revolucionárias permanecem as mesmas do período de Berna. O húngaro realça que é nesse momento que se revela a diferença da produção filosófica hegeliana, pois, enquanto em Berna Hegel elaborava suas concepções histórico-filosóficas partindo de um único fato relevante para a história universal, a Revolução Francesa, após Frankfurt, o alemão passa a dar igual importância para o desenvolvimento econômico da Inglaterra. Assim, ambos os eventos passam a ser elementos fundantes para a sua concepção de história e noção de sociedade. “O problema”, diz Lukács, “referente ao modo como a estrutura absolutista feudal da Alemanha deve ser modificada pela Revolução Francesa aflora para Hegel dali em diante não como questão geral da filosofia da história, mas como problema político concreto”. (LUKÁCS, 2018, p. 171).

Lukács diz que a filosofia de Hegel incorpora as “problemáticas sociais e políticas” e que estas “se convertem em filosóficas de modo sempre imediato” (LUKÁCS, 2018, p. 172). Como consequência disso, passou a tomar “consciência, portanto, do antagonismo entre dialética e pensamento metafísico primeiro como antagonismo entre pensamento, representação, conceito etc. de um lado, e vida, de outro” (LUKÁCS, 2018, p. 173). Esse processo teria feito parte de um projeto de reconciliação filosófica de Hegel entre os “ideais humanistas do desenvolvimento da personalidade e os fatos objetivos e imutáveis da sociedade burguesa” que, segundo o filósofo húngaro, irão conduzir Hegel “a uma compreensão mais e mais profunda primeiro dos problemas da propriedade privada e depois do trabalho como inter-relação fundamental entre indivíduo e sociedade” (LUKÁCS, 2018, p. 175). Esse desenvolvimento das concepções de Hegel culminará em uma tentativa de sistematização no fim do período de Frankfurt, o que também prepara Hegel para uma crítica profunda ao idealismo subjetivo e para a separação da filosofia de Schelling frente a de Fichte.

Em Iena, onde Hegel passa um pouco mais de seis anos, de 1801 a 1807, é que surgirão as suas elaborações de juventude mais profundas. É o período em que o jovem filósofo acertará as contas com a filosofia clássica de seu tempo, Kant, Schiller, Fichte e, somente em Fenomenologia do espírito, com Schelling — obra que sela definitivamente o rompimento com as colaborações filosóficas entre ambos, e faz com que este último se coloque como um combatente frente a dialética hegeliana. Em Iena temos dois períodos, o primeiro, de 1801 a 1803, é marcado fortemente pela defesa de Hegel ao idealismo objetivo. Para tanto, o filósofo inicia sua parceria com Schelling demonstrando a diferença da filosofia deste com a de Fichte onde, o último, é colocado como um agnóstico (LUKÁCS, 2018, p. 342), motivo que colocou Hegel como defensor da filosofia schellinguiana e revelou a ambos que ali nascia uma nova formulação filosófica por parte de Schelling. Nesse processo, Lukács aponta que Hegel combateu o individualismo abstrato da ética elaborando uma crítica mais concreta, dessa forma o filósofo alemão “não se limita mais a examinar problemas isolados da ética kantiana que tem uma problemática coincidente com a sua, mas submete toda a ‘filosofia prática’ do idealismo subjetivo a uma análise crítica abrangente” (LUKÁCS, 2018, p. 391).

A filosofia hegeliana, segundo o húngaro, é histórica desde as primeiras elaborações de Berna, porém essa concepção só entra em cena após as “renúncias às ilusões jacobinas de renovação da Antiguidade”. É nesse momento que Hegel se depara com os “problemas da dialética da sociedade burguesa moderna”, isso faz com que se constitua, no seu pensamento filosófico, um problema central e latente de “conexão dialética entre o desenvolvimento histórico e a sistemática filosófica”. Dessa maneira Hegel tem a possibilidade de levantar contra Fichte uma crítica a suas concepções de “liberdade independentemente das leis objetivas da natureza e da história” (LUKÁCS, 2018, p. 410. Lukács mostra que o historicismo de Hegel segue uma concepção que não significa uma glorificação do passado, pois esse seria a visão do historiador romântico que apareceu na Alemanha “sob a influência publicística da contrarrevolução”, disseminando a “concepção de que a ‘organicidade’ das formações históricas e do desenvolvimento histórico exclui a vontade consciente dos homens de mudar seu destino social” e, além disso, também defendem que “a ‘continuidade’ do desenvolvimento histórico é francamente contrária à interrupção da linha de desenvolvimento já iniciada” (LUKÁCS, 2018, p. 411. As concepções de Hegel nesse momento já se apresentam como um prelúdio para a sua primeira síntese filosófica de peso sistematizada em Fenomenologia do espírito  A Fenomenologia do espírito de Hegel é colocada por Lukács como uma obra seminal do pensamento filosófico alemão e marca uma virada nas coordenadas do desenvolvimento não só da filosofia hegeliana, mas de todo pensamento moderno. É no segundo momento de Iena, 1803 a 1807, que Hegel iria amadurecer suas diferenças filosóficas com Schelling, as quais foram reduzidas pelo primeiro apenas à questão do método, mas que o húngaro enfatiza que a diferença se apresenta “também em todas as questões da filosofia da sociedade e da história” (LUKÁCS, 2018, p. 559). A concepção filosófica-histórica de Hegel, a partir de Lukács, vai na contramão da visão moderna, pois na filosofia hegeliana não existe “estado de espírito”, assim há uma diferença em relação a “posição histórica do tempo presente” (LUKÁCS, 2018, p. 594). Em Iena, o filósofo húngaro diz que “a Revolução Francesa e sua superação (no triplo sentido hegeliano) por Napoleão constitui o ponto de inflexão decisivo da história mais recente” e que entra em contraposição com a visão posterior do velho Hegel que a “Reforma assume a posição central na história da era moderna que em Iena Hegel havia atribuído à Revolução Francesa e a Napoleão” (LUKÁCS, 2018, p. 595).

O filósofo húngaro atribui à Fenomenologia a sistematização entre as categorias de mediação, reflexão etc. mas considera as categorias de alienação (Entäusserung) e estranhamento (Entfrendung) como pontos centrais do desenvolvimento dessa obra, ambos os termos derivados da tradução do termo inglês “alienation” para o alemão – termo esse que foi utilizado na economia-política inglesa, quando se tratava da venda de mercadoria e, também, pela “teoria do contrato social para denominar a perda da liberdade original, a transmissão, a exteriorização da liberdade original à sociedade originada pelo contrato”(LUKÁCS, 2018, p. 689). A categoria de alienação não foi usada exclusivamente por Hegel na filosofia clássica alemã. Lukács exibe que Fichte já a tinha utilizado para mostrar que um “objeto posto” constitui uma alienação do sujeito e o próprio objeto é concebido como uma “razão alienada”. O estudioso do filósofo alemão aponta que, na Fenomenologia, há três níveis de apresentações da categoria de alienaçãoo primeiro faz menção à relação entre sujeito-objeto, e vincula toda produção humana, o trabalho, à “atividade social e econômica do homem”; o segundo nível a alienação é o que se apresenta na sua forma capitalista, e que, mais tarde, será desenvolvido por Marx como categoria fetichismo (LUKÁCS, 2018, p. 691); no terceiro nível é um momento que passa pela alienação, ou seja, como “coisidade (Dingheit) ou objetividade (Gegenständlichkeit)” que é a “forma em que, na história da gênese da objetividade, esta é apresentada filosoficamente como momento dialético na trajetória do sujeito-objeto idêntico de volta a si mesmo, passando pela ‘alienação’” (LUKÁCS, 2018, p. 692).

Lukács se esforça em sistematizar historicamente o envolvimento de Hegel com o seu tempo histórico e demonstrar o reflexo desse tempo em sua filosofia. Dessa forma o húngaro não faz uma biografia de Hegel, mas um tratamento histórico-sistemático olhando a “filosofia como parte importante do movimento total da história” (LUKÁCS, 2018, p. 21). Graças ao trabalho de tradução de Nélio Schneider, a divulgação do pensamento de Lukács — que se iniciou na década de 1960 com Konder, Coutinho e Chasin — ganha ainda mais volume e temos a oportunidade de ter em mãos um trabalho histórico-filosófico que contribui para o desenvolvimento do marxismo no Brasil de forma fecunda e dialética pois essa obra tem a capacidade de desmistificar a filosofia de Hegel e, com uma leitura atenta, absorver o método dialético que ali se explicita.

Referências

LUKÁCS, György. O jovem Hegel e os problemas da sociedade capitalista. Tradução de Nélio Schneider.1º ed. São Paulo Boitempo, 2018.

NETTO, José Paulo. Lukács e a Crítica da Filosofia Burguesa. Lisboa: Seara Nova, 1978.

NETTO, J. Paulo. Introdução: Sobre Lukács e a Política. In. LUKÁCS, György Socialismo e democratização – Escritos políticos 1956-1971. 2º ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2011.

Edson Roberto Silva – Graduado em História pela Universidade Estadual Paulista – UNESP, Assis, estado de São Paulo (SP), mestrando na Pós-Graduação em História da UNESP de Assis, estado de São Paulo (SP), Brasil. Atualmente é bolsista CAPES. e-mail: [email protected].

Acessar publicação original

[IF]

A chegada das trevas: como os cristãos destruíram o mundo clássico – NIXEY (AN)

NIXEY, Catherine. A chegada das trevas: como os cristãos destruíram o mundo clássico. Porto Salvo: Desassossego, 2018. Resenha de: SILVA, Paulo Duarte. Ecos de Gibbon: a s trevas cristãs revisitadas?  Anos 90, Porto Alegre, v. 27, 2020.

“A encantadora estátua de Atena [em Atenas, aproximadamente entre 529 e 532 e.C.], a deusa da sabedoria […] [n]ão foi só decapitada, como […] usada como degrau. […]. O ‘triunfo’ do Cristianismo estava completo” (NIXEY, 2018, p. 279). Assim Catherine Nixey encerra A chegada das trevas (The Darkening Age, Pan Macmillian, 2017).

Composta por 329 páginas, uma introdução e 16 capítulos, 1 mapa, 33 ilustrações referen­ciadas, 25 páginas de bibliografia e 6 de índice onomástico, a versão portuguesa possui poucos contratempos.1 Uma breve busca online mostra que o texto alcançou grande repercussão. Em linguagem acessível e amparada em novas — e tradicionais — referências, a jornalista recorre à sua formação em Estudos Clássicos em Cambridge e à sua experiência docente pregressa para discutir o papel do Cristianismo na “derrocada” do mundo clássico.

Segundo Nixey, tal ruína iniciou-se com a ascensão de Constantino, que teria inaugurado o “século I do domínio cristão” (p. 197, 201), desvirtuando um mundo em que religião e política não se misturavam (p. 243), já que eram civilizadamente regidos pelas leis (p. 255). Assim, embora reconheça a relevância de questões climáticas e demográficas (p. 157), das invasões “bárbaras” (p. 30-31, 264) e de suposta decadência moral romana (p. 37), a autora responsabiliza o Cristianismo.2

Ao considerar que muitos usa(ra)m “o monoteísmo e suas armas para fins terríveis” (p. 34, 129), a autora relaciona a temática ao debate público contemporâneo, pela alusão expressa à Palmira (p. 17-18, 29): sem citar a obra de Veyne (2015) dedicada à cidade síria, denuncia seu drama, arrui­nada pelos cristãos e, hoje, pelos muçulmanos.

Nixey argumenta que, após intensa contenda intelectual e a destruição de espaços e monu­mentos considerados “pagãos”, a pregação cristã voltou-se à moralização dos costumes sociais e sexuais (p. 28-29, 189-252).3 É difícil não tomar tal juízo como advertência às recentes discussões sobre televangelismo, movimentos antivacina e terraplanistas, “ideologia de gênero” e afins: pro­vavelmente esta é a principal contribuição da obra e, a um só tempo, seu grande risco.

Deste modo, o primeiro eixo da obra remete ao embate entre os escritos de “pagãos” e cris­tãos, com o amplo escopo de interesses e a complexidade investigativa dos primeiros contrastados à relativa simplicidade dos últimos: por exemplo, ao apresentar os tratados de medicina de Galeno (p. 61-65), para quem “[e]ra preciso provar […]. Fazer outra coisa era, para Galeno, o método de um idiota. Era o método de um cristão” (p. 64).4

Além das contribuições “científicas”, outro âmbito elogiado é o da poesia e do teatro, pelas obras de Calímaco e de tragediógrafos como Ésquilo, Sófocles e Eurípedes (p. 160-172). A estes se somam textos satíricos e/ou sexuais, como os de Ovídio, Marcial e, sobretudo, Catulo (p. 171-179).5 No plano religioso, a autora exalta a interpretação cética de Celso em relação aos dogmas cristãos (p. 64-73), e o relativismo politeísta de Luciano, Plínio o Velho, Plutarco, dentre outros (p. 70-81, 110-111, 121, 173-181, 305).

São aclamados ainda pensadores como Cícero, Sêneca, Plínio o Novo (p. 99-113), Libânio (p. 141-152, 189-228, 254-255), Damáscio (p. 23-26, 259-272) e Símaco, líder da chamada “reação pagã” de fins do século IV (153-154). Em termos científicos, literários e religiosos, seus nomes e obras são reunidos sob o epítome da “cultura clássica” e os cuidados do imperador-filósofo Marco Aurélio (m. 180) (p. 61).

À intelligentsia antiga opuseram-se os “grandes gigantes da Igreja” (p. 47). Neste grupo, figuram Tertuliano (p. 91-105, 174-183, 219-228), Orígenes (65-69), Cipriano, Jerônimo (227-241), Martinho de Tours (p. 143-151), Shenoute (p. 243-256) e Agostinho; além de Atanásio (p. 37-49), Teófilo (p. 141-144, 164) e Cirilo (p. 154-167), bispos de Alexandria (p. 157-167), e Crisóstomo, importante pregador cristão (p. 189-252).

Na disputa com os “pagãos”, estes contariam não somente com o apoio de imperadores,6 mas de hostes violentas e temerárias: além de monges que, segundo detratores, eram “vulgares, malcheirosos, mal-educados, violentos” e “falsos” (p. 141, 231-239), as fileiras eram compostas por maqueiros, coveiros, parabolanos alexandrinos (p. 167), além dos circunceliões africanos (p. 252-256).

Subentende-se que o Cristianismo só teria superado o “gênio” cultural clássico pelos favores imperiais e, sobretudo, por meio da violência. Como “todo um modo de vida […] desaparecia” (p. 201), Nixey enfatiza a destruição promovida pelos cristãos, dividindo-a em três ramos: das estátuas, dos monumentos e espaços urbanos e do citado patrimônio literário.

Quanto às estátuas, a autora destaca, dentre outras (p. 127-130, 138-139), as dedicadas à Atena em Palmira (p. 17-18, 280) e Atenas (p. 273), e a ateniense dedicada à Afrodite (p. 137), que ilustra a capa da versão portuguesa. Considera ainda tanto a reutilização dos materiais quanto associa suas castrações ao recrudescimento da pregação cristã (p. 143-153, 252). Centrando-se em Atenas (p. 27, 117, 267-273), e, principalmente, Alexandria, Nixey denuncia a devastação promovida pelos cristãos. Assim, lamenta a destruição da “maior biblioteca do mundo antigo” (p. 27, 157-167), bem como do Farol, do Serapeu e do Museu (p. 117-122). As referências dispersas pelo texto dão a entender que, em âmbito local, outros espaços sociais relevantes foram sendo destruídos ou abandonados, como os teatros, jogos, circos e banhos (p. 221-228).7

Daí resultaria a perda colossal de textos (p. 28, 30-31, 71), “combinação de ignorância, medo e idiotice” (p. 198) e, no campo artístico, correlata à “maior destruição […] que a história humana alguma vez assistiu” (p. 33, 71, nota 97). Tal estrago associou-se a dois processos: por um lado, e não sem problemas, as letras clássicas seriam adequadas ao filtro cristão, que lhes concedia pouca ou nenhuma brecha (p. 171-186); por outro, a censura e a queima de livros cresceriam, com a referida moralização dos costumes testemunhada nos sermões cristãos (p. 189-228).

A nosso ver, Nixey tem dois méritos: criticar contundentemente a interpretação histórica demasiado otimista sobre o “triunfo cristão” (p. 18, 25-26, 33, 273), ao recorrer parcialmente às recentes discussões historiográficas. Assim, ainda que concorde com a premissa dos pesquisadores tardo-antiquistas, pela qual a expansão cristã deva ser considerada um fenômeno histórico rele­vante e multifacetado, a autora critica o viés positivo que algumas interpretações assumiram (p. 130-134, 148-149), como a de Brown (1997, p. 212-213 apud NIXEY, 2018, p. 149, nota 322), que minimizaria a destruição de templos, ou mesmo a alegação de que o Cristianismo seria “prote­tor da tradição clássica” (p. 171).8 Para tal, recorre aos recentes argumentos de Drake (p. 129, nota 260) e Garnsey (p. 150, nota 327), e do próprio Brown (p. 158, nota 346) a respeito da “tolerância cristã”, além de Shaw e Gaddis sobre a “violência sagrada” cristã (p. 243-256).9

Contudo, em que pese reconhecer seus méritos, a leitura do texto promove diversos incômo­dos. Formalmente, a falta de um plano de capítulos e o fato de que os títulos de cada sessão nem sempre são esclarecedores criam uma sensação de repetição. Porém, mais embaraçoso é perceber que, mesmo ao incorporar importantes contribuições historiográficas, um juízo gibboniano per­meia o texto, pelas citações diretas ao historiador britânico (p. 65-66, 95, 121, 132, 192, 201, 264) e pelo tom pejorativo com que interpreta, ironicamente, o “triunfo cristão”.

A responsabilização do Cristianismo conduz a um indisfarçado senso de superioridade estética e cultural dos antigos frente aos seus rivais. Comparados a crianças (p. 126), os cristãos teriam erguido, sobre as ruínas dos templos antigos, edifícios de pior qualidade (p. 117-121, 261), e possivelmente só equiparariam o volume documental da biblioteca alexandrina em meados do século XIV (p. 161).

No texto, a ênfase da autora em um contraste caricato entre a ignorância destrutiva dos cris­tãos e a liberdade “iluminista” antiga é ressalvada de modo muito pontual (p. 31, 117, 137-138, 173-174, 225, 272). Pior: esbarra em frases categóricas como “quer o politeísmo greco-romano fosse verdadeiramente ‘tolerante’ ou não, não restam dúvidas de que os velhos hábitos eram, na sua base, liberais e generosos” (p. 153), ou, ao comentar sobre Plínio o Novo, indicar que este era “o romano perfeito: demasiado educado para se dedicar a uma fervorosa crença nos deuses” (p. 104).

Nixey subestimou a capacidade intelectual dos cristãos no embate com os “pagãos”, mas não apenas. Em um dos raros comentários sobre as contendas intelectuais entre cristãos, afirma que

[o]s heréticos eram intelectuais, portanto os intelectuais eram, se não heréticos, sem dúvida suspeitos. Assim era o silogismo. A simplicidade intelectual ou, para usar um nome menos elogioso, a ignorância, era largamente celebrada […]. A ignorância era poder. (p. 180).

Talvez por isso, também tropece em questões metodológicas e conceituais. Quanto aos docu­mentos, frisa-se o relativo cuidado em relação às fontes selecionadas (p. 31-33, 50, 55, 65, 86, 130-134, 139-143, 238): este, contudo, se ofusca por uma reflexão tardia sobre contingências materiais que então envolviam a produção textual (p. 196, cf. p. 64, 68, 80, 171-186) e pela discrepância com 4 de 5  que examina, minuciosamente, a variada documentação cristã10 em busca da “lente distorcida” (p. 107) e de sua “visão deturpada” (p. 185), e que não encontra equivalência no caso dos “pagãos” (cf. p. 85-90, 99-113).

Quanto aos conceitos, ainda que atente sobre o uso de termos como “nação”, “religião” e “pagão” (p. 33, 133-134), o mesmo não ocorre com outros termos decisivos, como “cristão” e correlatos, como “bíblia” (p. 57, 129, 197), “heresia” (p. 70), “herético” (p. 80, cf. p. 134, 180) e mesmo “judeus” (p. 164-165), indispensáveis em qualquer estudo sobre o assunto. Em verdade, à exceção da menção a bispos e à “elite cristã” (p. 203), não se oferece uma reflexão sobre igreja(s) e Cristianismo(s).

Nota-se que, embora recuse parte do otimismo de diversos estudos tardo-antiquistas, Nixey desconsiderou aspectos que, em conjunto, resultam em uma obra que não atenta devidamente às nuances que envolvem o estudo das relações entre cristãos e “pagãos”. É significativa a ausência de menções aos trabalhos seminais de Jaeger (2014, original de 1961) e Cameron (1991), que mostraram que as fronteiras entre os discursos de cristãos e pagãos eram muito mais porosas do que se supunha.

Assim, embora saudemos a iniciativa em trazer à tona assuntos delicados, com os quais a historiografia vem demonstrando certo embaraço e dificuldade no debate público, frisamos que a dispensa de importantes ressalvas pode apenas reforçar o clichê gibboniano sobre as “trevas” cristãs: corre-se o risco de os muitos lados se entrincheirarem ainda mais. Resta saber como o público lusófono vai tomá-la.11

Referências

CAMERON, Averil. Christianity and the Rhetoric of Empire: the development of Christian discourse. Berkeley: University of California, 1991.

JAEGGER, Werner. Cristianismo primitivo e paideia grega. Santo André: Academia Cristã, 2014.

NIXEY, Catherine. A chegada das trevas: como os cristãos destruíram o mundo clássico. Porto Salvo: Desas­sossego, 2018.

VEYNE, Paul. Palmyre: l’irremplaçable trésor. Paris: Albin Michel, 2015.

Notas  

1 Para além de erros de datação (p. 117), ortográficos (p. 185, 221, 234, nota 584), de concordância (p. 246, 254) e de tra­dução (p. 47, 72, 149), frisa-se a ausência dos títulos dos capítulos no sumário (p. 9).

2 Não à toa, ao defender que o citado “triunfo cristão” teria precipitado gradualmente a “Idade das Trevas” (p. 264), recorre a conhecidos episódios em que os cristãos teriam sobrepujado a “filosofia”, como no assassinato de Hipácia em 415 (p. 158-167) e na destruição da Academia ateniense (p. 30-32, 259-273). Ademais, ressaltam outros em que o “paga­nismo” teria sido suplantado, caso dos monumentos alexandrinos em fins do século IV, e da promulgação do Código de Justiniano, em 529 (p. 262-264).

3 Reconhecendo, timidamente, que tais reclames estivessem de acordo com ditames prévios de parte da aristocracia (p. 215-216).

4 Da mesma forma, é saudada a teoria atomista de Demócrito, além de físicos, matemáticos e astrônomos como Arqui­medes, Erastóstenes, Aristarco, Hiparco (p. 161-162, 272) e a citada Hipácia.

5 No caso deste, Nixey ressalta que o pudor editorial para com seus textos não se limitou aos oitocentos, chegando mesmo até traduções de fins do século passado (p. 176-177).5 de 5

6 Mesmo ambíguo e vacilante, Constantino teria aberto caminho ao “rugido do mundo” cristão (p. 55-57). Justiniano, por sua vez, é mencionado quando se aborda o ímpeto moralizador cristão (p. 211, 252-271).

7 Em compasso à superação das festas antigas (p. 228, 238, 261-262).

8 Além de expor o pudor com que se pode tratar, ainda hoje, a sexualidade em Catulo (p. 171-179) e Ovídio (p. 196), ou mesmo exibida em Pompeia (p. 205-212).

9 Outros temas relevantes remetem à destruição de estátuas por Kristensen (p. 138, nota 279) e à censura de livros por Chadwick e MacMullen (p. 186, nota 438) e Rohmann (p. 198-228).

10 Hagiografias (p. 143-147), epístolas (p. 152-153), histórias (p. 185-186) e, sobretudo, os relatos martiriais (p. 90-98) e de perseguição (p. 99-113), dentre outros.

11 Em 2018, Nixey concedeu uma entrevista ao semanário Expresso, de maior alcance em Portugal no mesmo ano. Disponível em: https://leitor.expresso.pt/diario/29-05-2018/html/caderno-1/cultura/catherine-nixey–o-meu-livro-mostra-como-os-cristaos-destruiram-estatuas-e-templos-e-queimaram-livros-1. Acesso em: 7 jul. 2019. Ao passo que historiadores como Cameron (2017) e Drake (2019) já produziram resenhas de amplo alcance em língua inglesa, a recep­ção do público lusófono continua ainda particularmente atrelada à blogosfera cristã, vide: https://logosapologetica.com/ critica-do-livro-a-chegada-das-trevas-de-catherine-nixey. Acesso em: 7 jul. 2019.

Paulo Duarte Silva – Professor Adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Doutor em História Comparada da mesma instituição (PPGHC-UFRJ). E-mail: [email protected].

Inhuman Traffick: The International Struggle against the Atlantic Slave Trade: A Graphic History – BLAUFAB; CLARKE (TH-JM)

CLARKE Liz
Liz Clarke Foto: NewHouseSports /

BLAUFAB e CLARKE Inhuman TraffickFueled by the success of Trevor Getz’s award-winning Abina and the Important Men, Oxford University Press has signaled its commitment to the genre of “graphic history” by publishing six works in the series bearing that name. In Inhuman Traffick, the eminent French revolutionary and Atlantic historian, Rafe Blaufarb, teamed with the talented illustrator, Liz Clarke, to produce a remarkable example of how graphic history can engage students by combining the undeniable power of images as a form of storytelling with traditional components of a valuable pedagogical tool.

Inhuman Traffick revolves around the Neirsée incident in 1828-29, a complex tale hitherto unknown before Blaufarb’s skillful archival research. A slaving vessel of indeterminate nationality, the Neirsée was captured off the African coast as part of the British Navy’s suppression of the Atlantic slave trade. After retaking the ship, slavers sailed it to the Caribbean islands where they released Europeans at British Dominica and sold African passengers into slavery at French Guadeloupe. Because the latter group included not only the 280 survivors among the 309 original slaves but also several African Krumen (Royal Navy personnel) and Sierra Leoneans (British subjects), authorities in the UK demanded from French officials the freedom of its British African subjects. In return, the French objected to both British violation of French territory on Guadeloupe and the original confiscation of the Neirsée, which (falsely) flew under the French flag and was theoretically off limits to searches by British warships. Thus, the Neirsée incident precipitated a diplomatic imbroglio in 1829. Leia Mais

Forty Autumns: A Family’s Story of Courage and Survival on Both Sides of the Berlin Wall – WILNER (TH-JM)

WILNER, Nina. Forty Autumns: A Family’s Story of Courage and Survival on Both Sides of the Berlin Wall. New York: HarperCollins, 2016. 391p. Resenha de: SHIELDS, Trevor. Teaching History – A Journal of Methods, v.45, n.2, p.55-57, 2020.

On June 26, 1963, President John F. Kennedy, on a visit to West Berlin, eloquently lamented, “The [Berlin] Wall is…an offense not only against history but an offense against humanity, separating families, dividing husbands and wives and brothers and sisters, and dividing a people who wish to join together.” All too often, the humanity of those impacted by the events of the Cold War gets lost in the background of the larger narrative of communism versus democracy—the Soviet Union versus the United States. Nina Willner’s work, Forty Autumns: A Family’s Story of Courage and Survival on Both Sides of the Berlin Wall (2016), successfully and vividly injects much needed humanity into the Cold War.

Written as primarily a family memoir, Forty Autumns tells the story of just one of the families divided by the Berlin Wall. Willner’s book chronicles the life of her mother, Hanna, and grandparents, Erna and Karl (Willner regularly only refers to Erna and Karl as Oma and Opa, or Grandma and Grandpa.) The book, which is divided into roughly four sections, begins with several maps of Europe during the Cold War. From there, one of the greatest features of the book appears, a family and historical chronology as Willner pairs the events of the Cold War physically right alongside their impact on her family. Seeing the history of the Cold War linked to the impacts of particular historical events on real people makes the vivid narrative of Forty Autumns difficult to put down. In 1946 the Soviets occupied East Germany and imposed Soviet law. That same year, Opa, who fought for the Germans during WWII, was forced to begin teaching Soviet doctrine to his many students in East Germany.

The Cold War had more physically terrifying consequences on the people of East Germany than being forced to learn and love communism. Not wanting to take any chances of people inciting dissent, many East Germans were thrown into prison with little idea why they had been arrested. The Hoheneck Castle, which was known around the world for its Gothic and Renaissance architecture, was converted to house women. In eloquent yet terrifying prose, Willner paints the picture: “There, skin to skin, in total darkness, with no room to sit, they were made to stand in knee-deep freezing water for days on end in dank, poorly ventilated chambers until they simply passed out” (72). The inhumanity of what happened at Hoheneck Castle, although known to historians, is often missing from more traditional narratives. Since Forty Autumns was written in such an accessible way, more people today will understand the realities of life behind the Iron Curtain.

Willner’s book could be used in the classroom in a variety of ways. The most obvious, though, would be to use the story of her family to both introduce and to potentially teach the entirety of the Cold War. This would be particularly doable since Willner interjected the major events of the Cold War throughout the many pages of Forty Autumns. On the family level, for example, East German authorities harassed Opa at the same time the Warsaw Pact was being formed and dissent was being silenced. Forty Autumns definitely brings to life the impact of many Cold War developments on both individuals and Germany as a whole.

While not all of Millner’s family lived to see Germany reunified in 1990, all the individuals discussed helped make true a few of President Ronald Reagan’s words: “What is right will always triumph” (324). Although much of Forty Autumns detailed the horrors of life under communism in East Germany, it ended on a positive note, with Willner’s extended family reuniting in a united Germany in 2013. Anyone interested in learning more about the Cold War or about one family’s brave attempt at enduring the unthinkable should give Forty Autumns a read. Beyond that, in a more contemporary moment where construction of a wall is regularly discussed as a way to make life better for so many, the history within Forty Autumns should be seen as a foreboding tale.

Trevor Shields – Minooka High School.

Acessar publicação original

[IF]

El continente vacío. La conquista del Nuevo Mundo y la conciencia moderna – SUBIRATS (A-EN)

SUBIRATS, Eduardo. El continente vacío. La conquista del Nuevo Mundo y la conciencia moderna. Guadalajara: Editora da Universidad de Guadalajara, 2019. Resenha de SUBIRATS, Eduardo. An intellectual journey through the Americas. Notes on El Continente Vacío. Alea, Rio de Janeiro, v.22 n.1, jan./apr. 2020.

Quiero contarles la historia sumaria de El continente vacío aprovechando su edición este año de 2019 por la Universidad de Guadalajara, México. Tratándose de un libro altamente polémico de análisis filosófico de la “conquista” española de América presentar esta cuarta edición no es un evento cualquiera. La primera, publicada en Madrid en 1993, fue destruida por la propia editorial que la publicó después de que capital ligado a la Iglesia católica española la adquiriese, destituyendo a su director Mario Muchnik. La segunda edición fue publicada, unos meses más tarde, por la editorial mexicana Siglo XXI. Su director rechazó una reedición por motivos ideológicos. La tercera edición aumentada fue publicada por la Universidad del Valle en Cali, Colombia, en 2011.

Pero también deseo aprovechar esta ocasión para explicarles lo que me indujo a escribir este libro en 1988. También deseo contarles mis andanzas por las Américas que siguieron a la primera presentación de este ensayo de interpretación del colonialismo europeo en un Madrid que celebraba el V Centenario de un Descubrimiento de América para ocultarse el continuo proceso de destrucción y decadencia de los pueblos y las civilizaciones del continente americano y de la propia metrópoli que este llamado “descubrimiento” ha traído consigo.

Yo decidí estudiar y escribir sobre el proceso de colonización de América en uno de los muchos viajes a México que entonces realizaba como joven conferenciante, profesor de estética y autor de complicados ensayos filosóficos. Llevaba tiempo vagando y morando entre New York y Cusco, Buenos Aires y Manaos, São Paulo y La Habana. A lo largo de estos viajes me iba distanciando de mis años de aprendizaje en Barcelona, París y Berlín. Yo iba ampliando el horizonte de mi conciencia. Y lo que era más importante: iba reconociendo progresivamente los límites intelectuales y las riendas mentales de una arrogante, pero decadente, conciencia europea. Y un bello día, en el Zócalo de la ciudad de México, me dije: tienes que hacer algo con esos años de aventuras y experiencias en las Américas.

Decidí comenzar por el origen y el principio del nombre y la realidad histórica de estas Américas. Es decir, decidí empezar por el largo proceso de su descubrimiento, conquista, destrucción, sometimiento y conversión, que los estructuralistas franceses habían escamoteado bajo el anodino título de una “invención de América”. El continente vacío nació de una voluntad de analizar la colonización americana a partir de sus fundamentos teológicos y teológico-políticos.

Les contaré un par de anécdotas chuscas que ponen de manifiesto el ambiente que me asediaba en el Madrid del Centenario. Un bello día, en una fiesta madrileña que ofrecía el editor de la primera edición de este libro, Mario Muchnik, la entonces ministra de educación del gobierno socialista español me espetó con una inconfundible insolencia: “¡Usted ha escrito un libro terrible, Sr. Subirats!” Meses más tarde el editor fue defenestrado y destituido. Y una de sus consecuencias fue que mi libro se liquidó por “no vender”, de acuerdo con el veredicto de los nuevos propietarios de la editorial Anaya vinculados a corporaciones nacional-católicas. Todo ese proceso estaba empañado, además, por un resentimiento antisemítico.

Este mismo año tuvo lugar la solemne presentación de la edición mexicana en la Universidad Autónoma de México bajo la presidencia de dos destacados intelectuales mexicanos: Margo Glantz y Roger Bartra. Les mencionaré uno de los temas que se debatieron en esta ocasión. Margo subrayó el punto de partida implícito en el Continente vacío: las destruidas tradiciones espirituales islámicas y hebreas de la Península ibérica. Sólo esta perspectiva histórica permite comprender el proceso colonial americano, que el intelectual judío Bartolomé Casaus o de Las Casas denominó “destruycion de las Indias”, desde sus raíces constituyentes: su principio de guerra santa cristiana y su ferocidad genocida. En otras palabras, reconstruí la eliminación sistemática de dioses, templos, ciudades y vidas, de Tenochtitlán a Cusco, a partir de las cruzadas contra las memorias, las lenguas y los pueblos hebreos e islámicos de la península ibérica.

Les contaré todavía otra anécdota que personalmente me parece curiosa. Apenas comenzando mi nueva vida estadounidense en la Universidad de Princeton, en 1994, entregué un ejemplar de El continente vacío a Princeton University Press con el objeto de su edición inglesa. Lo leyeron atentamente e hicieron elogios de su scholarship, pero dijeron que no podían publicarlo porque citaba a demasiados autores latinoamericanos, de Garcilaso y Las Casas a Bonfil Batalla, que sólo conocían aquellos lectores de habla castellana ya familiarizados con la edición mexicana del Continente vacío. Además, me señalaron explícitamente en una carta que mi punto de vista era eurocéntrico, porque partía de la lógica de las cruzadas y de la teología política del Imperio Romano y Cristiano.

No tengo que subrayarles mi opinión sobre semejante veredicto. Pero añadiré que la ignorancia y la falsificación del proceso colonial de Ibero-América sigue siendo amparado, si más no por simple omisión, limitación y pereza intelectuales, por el eje militar del Atlántico Norte en las más significativas instituciones académicas y editoriales de Berlín, Princeton o Madrid: hoy lo mismo que en el siglo dieciséis.

Con eso creo que ya puedo dar por explicado de qué trata este libro. Es la reconstrucción de la teología política de la colonización que recorre las cartas de San Pablo y los tratados de Las Casas; que recorre la destrucción sistemática de lenguas, memorias y espiritualidades a lo largo del continente americano; y que recorre la esclavitud y el genocidio de millones de seres humanos como una de sus últimas consecuencias. Pero tengo que añadir un breve comentario a esta definición minimalista del proyecto que subyace a este ensayo.

En El continente vacío seguí al pie de la letra el mantra que pronuncio el Inca Garcilaso en sus Comentarios reales: América, antes destruida que conocida y reconocida por el Occidente cristiano. Por consiguiente, decidí reconstruir la teología de la destrucción y definir la hermenéutica de restauración de las memorias y el esclarecimiento de la noche oscura de las sucesivas cruzadas de las Américas. Lo que quiere decir que es tan importante la primera parte de El continente vacío, en la que analizo desde una perspectiva netamente negativa la teología de la sujeción y subjetivación coloniales, como su segunda parte, que es afirmativa. En esta segunda parte pongo de manifiesto un vínculo ocultado entre el Inca Garcilaso y el filósofo sefardí Leone Ebreo, y señalo la alternativa hermenéutica y el nuevo humanismo que se desprende de este encuentro espiritual desde una perspectiva rigurosamente filosófica y precisamente actual; una perspectiva explícitamente crítica con la lógica del suicidio instaurado en los poderes corporativos globales.

Pero les iba a contar la historia del viaje filosófico por las Américas que siguió a la realización de este libro, y me he quedado en México. El siguiente paso, después de México, me llevó a los Estados Unidos. Y en el departamento de Literaturas Romances de Princeton University me encontré con la memoria viva de dos profesores exiliados de la dictadura española de 1939: Américo Castro y Vicente Lloréns. El título del libro que resume esta nueva aventura intelectual es Memoria y exilio, que, en su segunda edición aumentada y revisada, modifique por el de La recuperación de la memoria. En realidad, la colección de ensayos que reúnen estos libros tratan de ser ambas cosas: define la memoria exiliada como una constante del nacionalcatolicismo español hasta el día de hoy; asimismo expone una estrategia de recuperación de estas memorias impunemente negadas y clausuradas desde el siglo de la Inquisición hasta la era de Internet.

Un libro es la continuación del otro. La reconstrucción de la teología colonial en El continente vacío se abre, en Memoria y exilio, a la crítica del absolutismo monárquico, de la arrogancia nacional-católica y de los excesos doctrinarios en la historiografía moderna de la Península Ibérica e Iberoamérica. Y el análisis de la destrucción colonial de las altas civilizaciones americanas desemboca, como su última consecuencia, en una crítica de las culturas de América Latina perenemente sometidas al atraso moral, económico y político, y a la continuidad sin fisuras de las dependencias coloniales y neocoloniales. El mundo hispánico no ha tenido humanistas (los que lo fueron eran, en su mayoría, conversos, como Luis de León o los hermanos Valdés, y fueron encarcelados y exiliados, cuando no torturados y asesinados por la Inquisición). Este pequeño mundo hispánico tampoco ha tenido un pensamiento esclarecedor (los llamados “ilustrados” nunca cuestionaron el sistema autoritario que recorría la tradición escolástica ni la autoridad de la Inquisición en el Siecle des lumières); no ha conocido el liberalismo moderno (fue asesinado o exiliado con la restauración Borbónica a comienzos del siglo diecinueve); y ha cerrado sus puertas a la construcción de un pensamiento crítico en las situaciones cruciales del siglo veinte. Esos son los problemas que debatí en Memoria y exilio.

Pero quiero regresar al relato de mis viajes panamericanos. Y cerraré esta brevísima relación con un tercera y última estación. La titulé Paraíso. Esta colección de ensayos posee múltiples ediciones con títulos ligeramente diferentes, desde una optimista A penúltima visão do Paraíso, publicado en São Paulo en 2001, hasta la más sobria visión en su edición electrónica bajo el título escueto de Paraíso, en el Fondo de Cultura Económica, de 2013.

Paraíso es un cuaderno de viaje intelectual. Y, por consiguiente, es un libro más versátil que versado. Más bien me parece una rapsodia de los motivos y las motivaciones que encontraba en mi camino, guiado por la mano de andanzas y aventuras fortuitas. Y es, con todas sus torpezas, un libro de encuentros con arquitectos como Oscar Niemeyer o Lina Bo Bardi, con artistas y poetas populares, con manifiestos de la música, la pintura, la poesía y la literatura americana como los de Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade, Villa Lobos y Mário de Andrade. Y un libro que me abrió las puertas a los estudios posteriores sobre momentos cruciales de la cultura latinoamericana moderna como el Muralismo mexicano o Yo el Supremo de Augusto Roa Bastos.

Permítanme concluir con unas palabras sobre el concepto de esclarecimiento. Su importancia en la historia moderna no puede subrayarse lo suficiente. Sin esclarecimiento no habría existido la Independencia de los Estados Unidos ni la Revolución francesa. Sin esclarecimiento tampoco hubiera tenido lugar la independencia de las naciones iberoamericanas, con todas las ambigüedades que esta translatio imperii de la escolástica y la contrarreforma españolas al esclarecimiento de Francia, los Países Bajos, Inglaterra o Alemania ha llevado consigo. Sin esclarecimiento no existirían joyas arquitectónicas y artísticas como la ciudad de San Petersburgo. Sin esclarecimiento no tendríamos una Novena Sinfonía de Beethoven. Tampoco podríamos contar con la crítica del capitalismo de Marx y la crítica del cristianismo de Nietzsche. En fin, sin esclarecimiento seriamos capaces de citar la máxima por excelencia del psicoanálisis de Freud y Jung: “Donde era Ello debe devenir Yo”, o más exactamente, donde reinaba lo inconsciente debe venir el proceso luminoso de la individuación autoconsciente. Esclarecimiento es también la finalidad suprema de la meditación en sus formas védicas, tántricas, budistas y taoístas. Y sin esclarecimiento no tendríamos el canto prometeico a un desarrollo humano en el medio de una tierra fecunda que Diego Rivera plasmó en los murales de la ex-iglesia católica de Chapingo.

A lo largo de los últimos años he organizado una serie de eventos con otros intelectuales de las Américas en torno a la idea de “esclarecimiento en una edad de destrucción”. Hemos tratado de redefinir el concepto filosófico, educativo y político de esclarecimiento desde una serie de perspectivas diferenciadas, tanto filosóficas como pragmáticas, en Sofía, Ouro Preto, Bogotá y Lima, y en New York y Santiago de Chile. Y hemos hecho público este último proyecto a lo largo de una serie de ensayos y artículos. Finalmente, también cristalizamos estas discusiones en un libro colectivo: Enlightenment in an Age of Destruction (“Esclarecimiento en una edad de destrucción”)

Pero antes de definir el significante esclarecimiento o enlightenment tengo que explicar el concepto de destrucción. Hoy vivimos amenazados bajo una gama amplia de fenómenos industriales que tienen a esta destrucción o autodestrucción como denominador común: la carrera armamentista del complejo tecnológico-industrial-militar, el envenenamiento químico de ecosistemas y el calentamiento global, y no en último lugar, los desplazamientos y el encierro en campos de concentración de decenas de millones de humanos. Paralelamente nos confrontamos con una serie de fenómenos de fragmentación política, segregación social y violencia. Y nos enfrentamos con sistemas electrónicos de manipulación y control corporativos totales sobre la vida individual de centenares de millones.

En cuanto al concepto de esclarecimiento podemos definirlo, negativamente, por lo que no es. En primer lugar, esclarecimiento no significa “ilustración”, una palabra castellana que define el lustre y el brillo de la ciudad letrada hispánica como epítome del eterno anti-esclarecimiento nacional-católico español. En segundo lugar, esclarecimiento no significa información; ni tampoco la robotización de esta información por los softwares académicos. Su fundamento es la experiencia individual de conocimiento y las posibilidades de un diálogo público sobre nuestra experiencia en el mundo. Este diálogo social esclarecedor parte de una premisa: el desarrollo de nuestras capacidades intelectuales y, por consiguiente, de los sistemas, discursos y estrategias educativas.

Nuestros sistemas educativos, en México, en Brasil o en la Península ibérica se encuentran en un estado ruinoso perfectamente administrado a través de sus salarios miserables, sus deplorables medios técnicos, la escasez de becas, y unas alternativas laborales y sociales mediocres. En los Estados Unidos las humanidades se desmoronan ostensiblemente bajo el dogmatismo antihumanista, antiestético y antifilosófico de las corporaciones académicas. Por encima de todo ello el intelectual independiente capaz de criticar, esclarecer y movilizar a una masa electrónicamente embrutecida brilla por su más obscena ausencia. Las tiranías y gobiernos corruptos dan por sentado que no es necesario investigar, ni pensar, ni esclarecer, puesto que ya tenemos smartphones.

La reivindicación del esclarecimiento y la renovación de su proyecto intelectual, referido específicamente a América Latina en la constelación del colapso completo de sus organizaciones de resistencia anticolonial, es el hilo de oro que recorre mi último ensayo Crisis y crítica. Con este proyecto, que significa revertir el proceso de regresión política y decadencia cultural impuesto por nuevas formas totalitarias de gobierno en el mundo entero, deseo poner punto final a esta presentación. A semejante tarea nos debemos todos nosotros.

Eduardo Subirats. Autor de El continente vacíoMito y LiteraturaParaíso, La existencia sitiada, entre otras decenas de libros y ensayos. Ha vivido en España, México, Brasil y en los Estados Unidos, donde fue profesor de la Universidad de Princeton. Trabaja actualmente en la New York University. E-mail: [email protected].

Acessar publicação original

[IF]

 

The medieval invention of travel – LEGASSIE (Ge)

LEGASSIE Shayne Aaron timetoeatthedogs1

Shayne Aaron Legassie. https://timetoeatthedogs.com/

LEGASSIE S A The medieval invention of travelLEGASSIE Shayne Aaron (Aut), The medieval invention of travel (T), University of Chigago Press (E), SANTOS Guilherme Maximiano Ferreira (Res), PEREIRA Luiza Souza (Res), SILVA Tainara do Carmo Lopes da (Res), Geografias (Ge), Literatura medieval, Europa (L), Século 13 (P), Século 14 (P), Século 15 (P), Viagens, Comparação

LEGASSIE, Shayne Aaron. The medieval invention of travel. [Chicago]: University of Chigago Press, 2017. Resenha de: SANTOS, Guilherme Maximiano Ferreira; PEREIRA, Luiza Souza; SILVA, Tainara do Carmo Lopes da. Revista Geografias, v.28, n.1, 2020.

The Medieval Invention of Travel é o primeiro livro publicado por Shayne Aaron Legassie que não seja em parceria com outro autor e foi lançado em 2017 pela University of Chicago Press. Legassie é professor associado ao Department of English and Comparative Literature na Universidade da Carolina do Norte (UNC). Seus interesses de pesquisa incidem, predominantemente, sobre literatura medieval, a história da Europa na Idade Média, os estudos mediterrâneos e os escritos de viagem. Tal trajetória lhe garante um forte poder comparativo dos diferentes textos literários escritos sobre viagens durante o período entre 1200 e 1500.

O livro se desenrola nesses três séculos de intensa mobilidade humana, cujos deslocamentos cosmopolitas medievais, entre a Europa, a Ásia e a África, cruzam os espaços dessa economia-mundo nascente (BRAUDEL, 1987). A partir do período selecionado, poder-se falar de uma “invenção” (p.8-9) medieval da viagem como etapa provedora de uma literatura idealizadora da subjetividade do viajante a partir do penoso trabalho físico que ele empreende nessas peregrinações.

As viagens medievais desempenharam um papel fundamental nas práticas letradas europeias e na compreensão dessas como elevadoras de status social, pelo trabalho (travail) – viagem (travel). 1 Além disso, originou novos métodos de escrita de romances baseados na investigação geo-etnográfica. É por esses motivos que o título escolhido para o livro busca atribuir um novo sentido ao significado de viagem, com a escolha da palavra “invenção” e mostrando o papel da literatura na formação e racionalização dos novos modos de viagens e subjetividades emergentes.

No decorrer da escrita, o autor aborda as diferentes intenções das viagens medievais, que se caracterizam por motivos religiosos, por razões de relações comerciais e por encontros diplomáticos. Ele também apresenta os escritores de viagens do período, que moldaram os aspectos e os valores inseridos nos relatos das viagens europeias. Por fim, discute as diferentes formas de escrita da viagem utilizadas no gênero de literatura de viagens.

Em sua metodologia, o autor se apoia na literatura comparada, tratando de realizar um esforço de estilo ensaístico a respeito das diferentes obras dos viajantes. No recorte de tempo determinado por Legassie, ocorreram inúmeros processos históricos que dão contornos ao contexto: as cruzadas na Idade Média, as tentativas de expansão dos impérios medievais dominantes, os conflitos religiosos, as peregrinações e o próprio surgimento do capitalismo. Estes processos contribuíram para uma divisão do espaço e do tempo que permite construir uma evolução e diversos estágios da viagem sem que se possa dizer que um estilo supere o outro. No primeiro período da era medieval, há uma primeira aproximação do significado de viagem como sinônimo de dor e sofrimento; no segundo momento, há a construção de um olhar sobre a viagem que a enxerga como oportunidade de ser relatada e vista, como algo a ser enaltecido; por fim, em um terceiro momento, vê-se a possibilidade de transmitir informações entre o lugar de origem do viajante e o resto do mundo.

A partir desse contexto geral, Legassie vai se aprofundar nas relações específicas que estão presentes no decorrer do livro por meio dos diferentes lugares visitados. Ele organiza a estrutura do livro em três partes: viagens ao leste da Ásia (parte I – “Subjectivity, Authority, and the Exotic”), viagens à Terra Santa (parte II – “Pilgrimage as literate work”) e àquelas que estão no caminho entre Europa e Mediterrâneo (parte III – “Discovering the proximate”). Em sua narrativa, ele traz relatos de peregrinos e viajantes diplomáticos da Idade Média, sendo alguns deles Marco Polo, Felix Fabri e Francisco Petrarca2.

A primeira parte, denominada de “Subjectivity, Authority, and the Exotic”, aborda as viagens que partem da Europa ao Leste da Ásia. Legassie debate questões geoetnográficas nas experiências dos viajantes, bem como a forma que essas experiências influenciaram na produção de escritos sobre viagens, como as descrições de Marco Polo sobre Ásia e o Império Mongol. Além disso, fala sobre o papel adquirido pela autoridade clerical e pelos escritores dessas viagens como sumos sacerdotes, que, em alguns casos, após realizarem suas viagens, voltavam como “especialistas de longa distância” (p.22) devido ao conhecimento adquirido nos destinos. Grande parte das viagens na Idade Média eram motivadas por necessidades que se relacionavam às intenções religiosas pela libertação dos pecados ou, como é reconhecido na contemporaneidade, por turismo religioso.

Diferentemente da atualidade, porém, a viagem na era medieval era árdua e penosa, com extenso caminho a percorrer e que colocava em risco a própria vida do viajante. Por isso, não era vista como um momento de lazer. Eram viagens tratadas como um trabalho, ou seja, uma negação ao ócio.

No capítulo 1, intitulado “Exoticism as the appropriation of travail”, o autor aborda os relatos de William of Rubruck (1215 – 1295) e Marco Polo (1254 – 1324). O primeiro era um monge franciscano, missionário e responsável por escritos de viagens à Ásia. O segundo era um mercador e viajante italiano que deixou registros sobre sua viagem à China e às outras regiões da Ásia. Legassie demonstra que as experiências contidas nessas obras reforçam uma posição ideológica em relação ao exotismo, que ele define como “um modo de esteticismo politicamente orientado, que na Idade Média foi fundado na apropriação simbólica do trabalho do viajante.”3 (p.13). Além disso, seus estilos revelam uma “economia de prestígio do conhecimento da longa distância” (p.22) pois é relativa ao conhecimento dos lugares distantes como expressão de um maior status ao viajante. Com efeito, essa forma de economia refere-se a um conjunto de práticas materiais e experiências subjetivas que permitiram às pessoas obter vantagens sociais, políticas e econômicas através da sua relação com o estrangeiro. Mesmo que outras abordagens compreendam que esta emergente economia de prestígio esteja posta como uma repetição excessiva (KYNAN-WILSON, 2019), se o autor o faz, é para situar ou qualificar a economia de bens simbólicos do período abordado.

No capítulo 2, nomeado por “Travail and authority in the forgotten age of discovery”, são analisados os escritos de John of Plano Carpini (1180 – 1252), um franciscano e explorador italiano; Odoric of Pordenone (1286 – 1331), um frade franciscano e missionário italiano; e John Mandeville (século XIV), suposto4 autor de uma coleção de histórias de viajantes. Esses escritos recorrem às dificuldades da viagem para reforçar a credibilidade autoral sobre os textos, ou seja, o peso probatório da verdade de seus escritos e de testemunho oficial da Igreja. A leitura desses escritos por outras pessoas está sujeita ao poder persuasivo da veracidade dos relatos através da personalidade impregnada e transmitida pelo autor através do texto. Paralelamente, o autor faz uma refutação da ideia de que o período medieval tem seus contornos fixos e ditados somente por autores da antiguidade, como Aristóteles, Cícero e Agostinho. Ao contrário, o autor aponta as contribuições da Idade Média aos avanços do conhecimento territorial, sendo esse um aspecto importante que deve ser ressaltado pela historiografia e que pode retirar o período do esquecimento.

De modo geral, a segunda parte do livro de Legassie intitulada “Pilgrimage as literate work” aborda o caminho percorrido pelo teólogo e padre Felix Fabri5 (1441 – 1502), que entende a peregrinação como um exercício de memória. Esse trabalho tratou-se de um exercício da memória pois, no ato do deslocamento da viagem, os viajantes que seguiram o modelo de Fabri utilizavam-se de ferramentas6 para fins de registros, que permitiam aos demais peregrinos lembrar posteriormente de suas viagens, tendo em vista que alguns viajantes que não exercitavam isso estavam sujeitos a desaprender o que a viagem os ensinou.

A peregrinação a Jerusalém era uma forma dos devotos provarem sua fé através do deslocamento. Entretanto, não bastava exercer o ato de deslocar-se para a Terra Santa, era preciso aguçar a mente com exercícios de memória e a utilização de técnicas para o registro do que os viajantes viram e sentiram. Com isso, no capítulo 3, “Memory of work and the labor of writing”, e no capitulo 4, “The Pilgrim as a investigator”, encontramos os relatos desses processos ocorridos na peregrinação. O terceiro capítulo abrange uma discussão sobre a tradição sintética, que se baseava, na época, em produzir um escrito sintético sobre as viagens realizadas, havendo a possibilidade de não deslocar-se para vivenciar a viagem, tratando-se de uma espécie de viagem em imaginação (alguns indivíduos tinham repulsa por vivenciar todos os males do deslocamento). Os escritores da tradição sintética foram responsáveis pela produção e pela formação pictórica dos locais por onde passavam os viajantes em campo. Dessa forma, seus escritos eram admirados na terra natal.

Com isso, os peregrinos, a partir da virada do século XIII, iniciam uma escrita descritiva das memórias para fins de leitura meditativa. Já no capítulo seguinte, o autor mostra como essas produções tornavam-se escritas reformuladas, uma visão crítica e um instrumento de investigação.

A terceira parte, intitulada “Discovering the proximate”, reúne os autores encarregados em viagens pela Europa e pelo Mediterrâneo, destacando-se o poeta italiano Francisco Petrarca (1304-1374) e o cavaleiro de Castela Pero Tafur (ca. 1410-ca. 1487).

Nessa sequência, ganham forma mais contundente os argumentos apresentados no prefácio do livro nos capítulos 5 e 6, questionando a posição de Joan-Pau Rubiés que sustentou a hipótese, em obra anterior7, quanto à uma relativa estagnação dos escritos de viagem no período contido entre 1350 e 1492. Ao contrário, Legassie assegura que, após 1350, surgem muitos novos relatos que são frutos de viagens de curta distância. Assim, antecedem as posteriores conquistas do “Novo Mundo” (p.167), e, ao contrário de serem desprovidas de importância, exerceram grande influência na vida intelectual e cultural para a emergência do mundo moderno europeu em formação.

Ainda nessa parte do livro, Legassie pontua as precisas descrições de Petrarca e Tafur em que eles elevam ao público europeu a condição de seus países de origem. Os largos projetos autobibliográficos e protonacionalistas dos viajantes estreitam a aproximação de territórios europeus a partir das missões políticas empreendidas por eles. Para o autor, os questionamentos levantados por Petrarca acerca dos benefícios e das dificuldades da viagem assemelhavam-se à tradição sintética. A viagem, no caso do poeta italiano, correspondia a um trabalho de construção pessoal identitária e ética8 e a um comprometimento com a descoberta geo-etnográfica. Igualmente, o sentido da viagem para Tafur era visto como uma vantagem política que ele possuía por conhecer os costumes de reinos distantes. Para Legassie, a postura desses autores foi compreensivelmente comparada aos valores inerentes ao Grand Tour9.

Os relatos recolhidos pelo autor, permitem demonstrar a visão europeia de mundo e os mecanismos pelos quais a Europa começa a compor e apropriar-se intelectualmente de um novo mundo que nascia das entranhas do feudalismo e da Idade Média através das viagens, com a ascensão de uma nova ordem econômica – o capitalismo.

Vale lembrar que Fernand Braudel e Immanuel Wallerstein juntos situam o nascimento do capitalismo no século XIV (BRAUDEL, 1987; WALLERSTEIN, 1979).

Ainda que este seja um processo que se desenrola em seus primórdios, é também por meio da escrita que começa a se estabelecer uma relação de mercado entre as nações e entre os diversos impérios dominantes, revelando o que possivelmente seriam os bastidores dos longos deslocamentos feitos em períodos posteriores e que passaram a incluir o Atlântico (BRAUDEL, 1987). O autor é consistente em afirmar, a partir dos relatos dos viajantes, que a dor e o trabalho árduo dessas práticas estavam relacionados a processos mais amplos e, além disso, elucida as diversas outras significações que essas viagens encarnavam, como heroísmo, superação do trabalho físico ou autodisciplina intelectual.

Ainda assim, apesar de reforçar que esse período contribuiu para formação da identidade do período pós-medieval, não nos revela com clareza os pontos impactados na posterioridade. Em algumas passagens, o autor deixa a desejar no que toca à alusão a alguns acontecimentos históricos que seriam fundamentais para melhor compreensão do leitor.

Porém, pelos seus amplos benefícios percebidos em sua abordagem, a leitura da obra do estadunidense não deve restringir-se aos especialistas da literatura e da história medieval, mas também é interessante para as áreas da Geografia e, sobretudo, para o Turismo, possibilitando o estudo da evolução e das práticas denominadas de viagem.

Agradecimentos À Pró-reitoria de Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais pela oportunidade de realizar este trabalho através do Programa de Iniciação Científica Voluntária.

Referências BRAUDEL, Fernand. A dinâmica do capitalismo. Rio de Janeiro: Rocco, 1987. 94 p.

TOWNER, John. The Grand Tour: a key phase in the history of tourism. Annals Of Tourism Research, London, v. 12, n. 3, p.297-333, abr. 1985.

WALLERSTEIN, Immanuel. El Moderno Sistema Mundial I: la agricultura capitalista y los orígenes de la economía-mundo europea en el siglo XVI. Siglo Veintiuno Editores, México, 1979.

KYAN-WILSON, William. Book Review: The Medieval Invention of Travel. TRAFO Blog for Transregional Research, 14 fev. 2019. Disponível em: <https://trafo.hypotheses.org/17922>. Acesso em: 16 jul. 2020.

Notas 1 Legassie aponta que a viagem era vista como um trabalho árduo “travail” (p. 2). A palavra similar em latim é expressada como uma conotação relativa ao trabalho. O autor faz um trocadilho com a palavra “travail” e “travel” (p.2) devido às suas semelhanças ortográficas.

2 Em geral, as partes possuem proximidade em suas grandezas; a parte I contém 76 páginas, a parte II contém 70 páginas e a parte III contém 62 páginas.

3 Tradução dos autores. Original: “a politically oriented mode of aestheticism that in the Middle Ages was founded on the symbolic appropriation of the traveler’s travail.” (p. 13).

4 No prefácio de seu escrito As Viagens de Sir John Mandeville se intitulou cavaleiro e assumiu este nome, mas há uma incerteza sobre a sua verdadeira identidade devido à falta de registros comprobatórios.

5 Após umas das suas duas viagens sobre as regiões da Europa, Fabri ficou particularmente preocupado com “sua incapacidade de responder perguntas básicas sobre a disposição e as orientações relativas dos lugares que ele havia visitado” (p. 167, tradução nossa).

6 Legassie afirma que era utilizada Tábuas de Cera para o registro. As folhas de pergaminho chegam posteriormente com o intenso comércio desse produto na Itália.

7 RUBIÉS, Joan-Pau. Travel and ethnology in the Renaissance: South India through European eyes, 1250- 1625. Cambridge University Press, 2002.

8 “Petrarca coloca em primeiro plano a questão ética do tempo e do trabalho envolvidos na descoberta geográfica.” (p.178, tradução nossa). Para Petrarca e Tafur, as viagens perigosas e de longa distância devem ser deixadas para os que não as fazem por valores morais, como por exemplo, os comerciantes e armadores que as empreendem em busca duvidosa de novidade e lucro.

9 Jornada empreendida no século XVIII, “(…) that circuit of western Europe undertaken by a wealthy social elite for culture, education, and pleasure” (TOWNER, 1985, p.289).

Guilherme Maximiano Ferreira Santos – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. E-mail: [email protected].

Luiza Souza Pereira – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. E-mail: [email protected].

Tainara do Carmo Lopes da Silva – Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. E-mail: [email protected].

Acessar publicação original

[IF]

 

Educar na realidade – L’ECUYER (C)

L’ECUYER, C. Educar na realidade. São Paulo: Fons Sapientiae, 2019. Resenha de: GONZALEZ, Nancibel Webber. Conjectura, Caxias do Sul, v. 25, 2020.

Catherine L’Ecuyer é canadense e reside na Espanha. Graduada em Direito, possui especialização pelo IESE Business School e título de Mestre Europeu Oficial em Pesquisa. É doutora em Educação pela Universidad de Navarra e publicou o artigo “The Wonder Approach to Learning”, pela revista Frontiers in Human Neuroscience, em que apresenta sua teoria sobre aprendizagem. L’Ecuyer é autora de Educar en el asombro, traduzido ao português como Educar na curiosidade: a criança como protagonista de sua educação e Educar en la realidad, traduzido ao português como Educar na realidade, do qual trata a presente resenha.

L’Ecuyer assessorou o Governo do Estado de Puebla, no México, para uma reforma da Educação Infantil, formou parte de um grupo de trabalho para o Governo da Espanha sobre o uso das novas tecnologias pelas crianças e participou da elaboração de um relatório sobre leitura digital para o Centro Regional para a promoção do Livro na América Latina e Caribe (Cerlac) (Unesco). Recebeu o Prêmio Pajarita da Associação Espanhola de Fabricantes de Brinquedos. Ministra palestras sobre Educação em diversos países, mantém um blog educativo com mais de 1 milhão de visitas e escreve artigos sobre Educação para o jornal El País. Catherine L’Ecuyer também é colaboradora do grupo de pesquisa Mente-Cerebro da Universidad de Navarra, Espanha. Leia Mais

Diálogos transatlânticos: relações e dinâmicas entre Portugal, África e América (séculos XVI e XIX) / Faces de Clio / 2020

A Revista Faces de Clio, periódico discente vinculado ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), com grande satisfação, publica a sua 11ª edição com o dossiê temático “Diálogos transatlânticos: relações e dinâmicas entre Portugal, África e América (séculos XVI e XIX)”. O presente número reúne 18 trabalhos: 15 artigos vinculados ao dossiê e três artigos livres.

Com um tema há muito explorado por grandes nomes da historiografia, o dossiê reúne novas contribuições teóricas e metodológicas acerca das relações que se desenvolveram e se dinamizaram nas e entre as margens atlânticas daqueles espaços que um dia fizeram parte o Império Português. Nesse sentido, os trabalhos aqui publicados em muito contribuem para a percepção das dinâmicas dos aparelhos político-administrativos, das economias, dos cotidianos, das relações entre os homens e das manifestações culturais concebidos pelos intercâmbios entre Portugal, África e América entre séculos XVII e XIX. Visando facilitar a difusão dos nossos artigos, com grande alegria comunicamos que a Revista Faces de Clio está, agora, integrada ao novo Portal de Periódicos da Universidade Federal de Juiz de Fora. Com nosso novo site (OJS 3), passamos a administrar todo o fluxo editorial pela nova plataforma da revista, facilitando a comunicação entre autores, editores, pareceristas e leitores.

Abrimos esta edição com o artigo de Lucas Lixa Victor Neves “Um relato sobre a Restauração de 1640 no Rio de Janeiro: A importância da demonstração de lealdade à causa de d. João IV” partindo de uma discussão acerca do ambiente politicamente fragmentado no reino luso após o fim da União Ibérica (1580-1640), Lucas Neves reflete, por meio de um relato sobre a aclamação de D. João IV no Rio de Janeiro, sobre a importância de se propagandear méritos de determinados sujeitos em um momento de quebra de regime em Portugal.

Em seguida, no artigo “Entre mares e alteridades: Um mouro disfarçado nas galés portuguesas do seiscentos”, Thaís Tanure aborda a história do corsário muçulmano Amet e suas desventuras diante da Inquisição portuguesa em 1656. Tendo como fio condutor de sua pesquisa o processo inquisitorial de Amet, a autora o cruza com outras fontes documentais e conecta a história penal portuguesa à história do corso no Mediterrâneo, refletindo acerca das relações entre alteridade e Império.

Bento Machado Mota, no artigo “Ecos dissonantes no atlântico: fundamentos e limites do antiescravismo de Epifanio Moirans”, analisa as ideias antiescravistas de missionários capuchinhos em fins do século XVII a partir do livro La Justa defesa (1681), do capuchinho francês Epifanio Moirans. Trata-se de um registro incomum, no qual diversos argumentos contra a escravidão são abordados, por um lado, à luz de justificativas jurídicas relativas ao tráfico negreiro vindas de Roma e de teólogos europeus e, por outro, por meio dos relatos missionários católicos da América do sul.

Já no artigo “Cães danados, porcos vadios e formigas excomungadas: A convivência entre homens e animais à luz do direito do Antigo Regime”, Patrícia Ribeiro analisa um tema ainda pouco frequentado pela historiografia nacional, qual seja, os conflitos advindos das relações entre humanos e bichos no império português entre os séculos XVI e XIX. Trata-se de uma significativa contribuição aos estudos de Direito Animal, um trabalho original e de grande pertinência que, tendo como pano de fundo os vários dispositivos legais que se referiam a animais, preenche significativa lacuna de conhecimento neste campo.

Juntos, Diego de Cambraia Martins e Gustavo Meira Menino discutem sobre a circulação de pessoas e mercadorias nas rotas mercantis que convergiam para a Ilha da Madeira, na primeira metade do século XVIII. A partir de um estudo de caso que analisa a trajetória de um dos mais atuantes capitães de embarcação do período analisado, os autores demonstram a inserção desse espaço geográfico em relações diretas e indiretas com outras partes do mundo. A Ilha da Madeira, em uma perspectiva global, parte de “Uma Encruzilhada no Atlântico”.

O artigo de Fabricio Lamothe Vargas, que analisa e contextualiza a obra do português D. Luís da Cunha, “Instruções Políticas a Marco Antônio de Azevedo”, reflete também sobre a difícil situação de Portugal frente aos problemas enfrentados no final do século XVII e em inícios do século XVIII, tal como as tentativas do diplomata Luís da Cunha de encaminhar propostas para que tais entraves fossem superados. Nesse sentido, o autor destaca uma das principais e mais curiosas soluções inferidas português: a mudança da corte para a cidade do Rio de Janeiro e a tomada do título de imperador do Ocidente pelo rei D. João V.

Adentrando na primeira metade do século XIX, Luiz Gustavo Martins da Silva investiga aspectos da experiência política de exilados liberais na Europa e no Brasil que foram perseguidos pelo regime de D. Miguel entre os anos de 1826 e 1837, momento no qual se desencadeou também o maior exílio português do oitocentos. Busca-se, assim, abordar o exílio liberal português, o qual se direcionou para o Brasil, numa dinâmica transnacional e transatlântica.

Em “Às Margens do Império, por dentro dos sobados: Estratégias comerciais de sertanejos e centro-africanos no Planalto Central Angolano (décadas de 1840 a 1860)”, Ivan Sicca Gonçalves analisa, a partir dos relatos cotidianos de um comerciante residente em Angola, as mudanças sociais, políticas e econômicas que ocorreram no interior do continente, na chamada zona atlântica, a partir de 1836. Ao apontar as estratégias adotadas por este sertanejo, o autor demonstra a atuação de diversos agentes que estavam envolvidos nessa rede comercial, cujo centro era o reino centro-africano do Bié.

Frederico Antonio Ferreira investiga o episódio de dois grupos de luso-brasileiros que migraram, com a ajuda do governo português, da cidade de Recife para a região de Namibe e Huíla em Angola, em 1849. Dentro do novo modelo colonial implantado pelo governo português na África, estabeleceram um sistema de cultivo de cana-de-açúcar baseado na grande propriedade e na força de trabalho escrava, conforme o existente no Brasil, evidenciando as interações existentes entre Brasil, África e Portugal na metade do século XIX.

Em seguida, já na segunda metade do oitocentos, Laryssa da Silva Machado e Lucas da Silva Machado abordam, através do caso de Itapemirim, Espírito Santo, a complexa rede de tráfico de escravos que se configurou na região Sudeste após a promulgação da Lei Eusébio de Queirós. As inúmeras denúncias e correspondências relacionadas ao desembarque de africanos no litoral sul capixaba após 1850, enviados principalmente para as fazendas de café em Cachoeiro do Itapemirim, Zona da Mata mineira e região ao norte do Rio de Janeiro, demonstram que o problema que preocupava as autoridades do Império perdurou durante toda a década de 1860.

No artigo “O sagrado, o profano e o enfermo: A Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora”, Maciel Fonseca analisa o surgimento da Santa Casa de Misericórdia de Juiz de Fora na segunda metade do século XIX. Alicerçado em jornais de circulação da época, produções historiográficas locais e o uso do Estatuto e do Compromisso da recém-fundada instituição, o autor reflete sobre a dinâmica de funcionamento da associação cujo principal objetivo era socorrer os pobres e desvalidos na tentativa de aliviar a miséria humana.

A imigração portuguesa para o rio Madeira, no estado do Amazonas, entre 1840 e 1918, foi objeto de análise de Paula de Souza Rosa, doutoranda em Historia Social da Amazônia pela Universidade Federal do Pará (UFPA). No presente artigo, a partir da trajetória individual e coletiva de 91 sujeitos, a autora desvelou o perfil social dos imigrantes portugueses, as redes sociais que possibilitaram os múltiplos deslocamentos desses indivíduos, bem como os aspectos relativos ao papel desempenhado por eles em escala local e a nível global.

Tendo presente que o melhor antidoto contra a violência é a memória, e que a historiografia brasileira está recheada de silêncios, Bruno Zétola analisa a repercussão dos atos heroicos de Simão Salvador, um africano livre que na segunda metade do século XIX ganha as páginas dos principais jornais do país, e passa a ser reconhecido por associações civis e pelo próprio Imperador. O artigo, absolutamente instigante, resgata a história de um personagem pouco conhecido e estudado de nossa historiografia, e, com base em seus feitos, nos faz refletir sobre o lugar do negro no Império escravista brasileiro e as contradições de uma sociedade escravocrata que se vê obrigada a louvar um africano livre.

Ainda na segunda metade do século XIX, Cleudiza Fernandes de Souza apresenta-nos algumas reflexões acerca das possibilidades do cruzamento entre a História Atlântica e a historiografia de outros contextos, como o pós-abolição no Brasil, por exemplo. Assim, por intermédio de obras que tratam da questão das trocas atlânticas, comparações e seus desdobramentos, a autora discute sobre os desafios da contemporaneidade em unir estas duas abordagens historiográficas, os possíveis caminhos para o encontro das duas perspectivas e os ganhos advindos a partir desse cruzamento teórico.

Finalizando a sessão do dossiê temático, Leonardo Aboim Pires examina o impacto da Grande Depressão em Portugal num contexto de transição política entre a Ditadura Militar e o Estado Novo. Tendo o desemprego rural como objeto de estudo, o autor analisa este fenómeno de forma mais completa, refletindo sobre as circunstâncias em que ocorreu, suas consequências sociais, dinâmicas exógenas, mecanismos institucionais e de governação atuantes no período em análise.

Na sequência, a 11° edição da Revista Faces de Clio inicia a sessão de artigos livres com as contribuições do historiador Pablo Gatt, que, no contexto da antiguidade grecoromana, analisa a trajetória das representações acerca do corpo feminino, visto como herdeiro direto de Eva, cunhadas pelas filosofias pagãs, pelos discursos da Igreja cristã dos primeiros séculos, e dos discursos medievais, visto que o mesmo esteve dividido por uma linha bastante tênue.

Temática ainda pouco estudada na história da imprensa mineira, Michel Saldanha investiga a configuração político-doutrinária da imprensa periódica da província de Minas Gerais na década de 1860. Ao aprofundar a questão pesquisada com a utilização de fontes primárias, o autor verifica quais periódicos levantaram a bandeira dos partidos políticos de Minas Gerais, ou da Liga Progressista, e em quais ideias político-partidárias esses periódicos se apoiaram. Em síntese, compreende as principais tendências partidárias circuladas através dos periódicos na província mineira.

Encerramos esta edição com “Os bacharéis fardados: cor, meritocracia e mobilidade social na Escola Militar da Praia Vermelha (1870-1880)”, trabalho de Geisimara Soares Matos. Através de algumas trajetórias de ofício de militares, a autora analisa o discurso do mérito que foi praticado dentro da Escola Militar da Praia Vermelha. Ancorado a isso, o autor procura entender como a cor e a origem social dos alunos influenciava a prática do discurso da meritocracia na instituição.

Por fim, gostaríamos de agradecer aos membros(os) da equipe editorial, ao conselho consultivo, aos pareceristas e autores(as), que participaram ativamente da construção deste dossiê. Aos leitores, que prestigiarão o nosso trabalho, ressaltamos que a História se faz, cada vez mais, através de um exercício democrático e de cidadania, constituindo-se como palco profícuo para novos debates e aprendizado. Desta feita, esperamos que a edição da Revista Faces de Clio que por ora se apresenta possa ampliar os conhecimentos e instigar novas pesquisas históricas. Seremos resistência.

A todos, o desejo de uma excelente leitura!


BÔSCARO, Ana Paula Dutra; FERNANDES, Bárbara Ferreira. Editorial Faces de Clio, Juiz de Fora, v.6, n.11, jan / jun, 2020. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê

Coordinación docente en los títulos de máster: Una estratégia de innovación docente – ÁLVAREZ GONZÁLEZ (I-DCSGH)

ÁLVAREZ GONZÁLEZ, E. M. Coordinación docente en los títulos de máster: Una estratégia de innovación docente. Madrid: Pirámide, 2010. Resenha de: SOUTO GONZÁLEZ, Xosé M.. Íber – Didáctica de las Ciencias Sociales, Geografía e Historia,n.97, p.82-83, out./dez. 2919.

La entrada en vigor del denominado «Plan Bolonia», con la homogeneización del Espacio Europeo de Educación Superior, supuso que las antiguas licenciaturas de cinco anos pasaran a desarrollarse en dos ciclos: un grado de cuatro anos y un posgrado, que suele corresponderse con un máster de un curso escolar. Si bien la reglamentación de los grados se ha desarrollado desde las facultades que imparten sus titulaciones, no ha sido lo mismo en los másteres: por una parte, porque algunos son interuniversitarios; por otra, a causa de la especificidad de la conoferta de estudios y la escasa tradición de la universidad espanola para trabajar cooperativamente.

El libro que coordina la profesora Elsa Marina Álvarez afronta el problema de la falta de coordinación docente en los másteres de la universidad espanola, una oferta académica queÌber – se ha multiplicado en los últimos anos: de 829 másteres y 16.609 alumnos y alumnas registrados en el curso escolar 2006- 2007, pasamos a 3.661 y 139.844 respectivamente (p. 44). Una oferta que ha combinado tanto los aspectos de especialización profesional como un curso propedéutico para hacer el doctorado.

La obra se organiza en torno a la experiencia registrada en la Universidad de Málaga en el máster de Regulación Económica y Territorial, que realmente se corresponde con una especialidad en urbanismo y ordenación del territorio. Sin duda es un ámbito interdisciplinario, como sucede en otros sectores profesionales, que requiere de una programación y una coordinación concretadas después de un amplio debate acerca de los objetivos y metodologías.

De ahí que se llame la atención en la necesidad de una coordinación en tres momentos diferentes: el plan de estudios del título y la planificación del curso académico y de las materias que componen dicho título (p. 31). Desde la experiencia acumulada como director de dos másteres de educación (el de Investigación en didácticas específicas y el de Profesor/a de Secundaria), puedo verificar la inevitabilidad de dicha coordinación, pues tanto la carga docente como las metodologías utilizadas en el desarrollo de los másteres implican una planificación conjunta y un diálogo sobre sus finalidades.

La redacción del libro es precisa y nos permite valorar las afirmaciones vertidas en las páginas del mismo. A este respecto destacamos las precisiones realizadas sobre la evaluación y calificación de los estudios de máster (Nivel 3 del Marco Espanol de Cualificaciones de Educación Superior). Los siete descriptores de los resultados de aprendizaje (pp. 68-69) nos remiten al ámbito de las competencias, donde los conocimientos se combinan con el desarrollo profesional autónomo.

Junto a los criterios de evaluación, otro instrumento que se emplea para diagnosticar el funcionamiento de los másteres son los indicadores de calidad de la ensenanza universitaria.

El problema que posee este tipo de herramientas es su carácter burocrático y subjetivo: se miden deseos y expectativas en un momento dado y no se suelen contrastar con otros indicadores, pese a las declaraciones de intenciones de los organismos que gestionan estas instituciones (p. 77). Mi experiencia personal me dice que un proceso serio y riguroso de evaluación supone la celebración de sesiones presenciales, donde se puedan confrontar los pareceres y opiniones del profesorado y el alumnado, así como las inquietudes de estos en relación con otros parámetros, como pueda ser su implicación en el momento de las actividades prácticas en los centros de trabajo, o en la transferencia de la investigación al campo de la innovación.

En este sentido, las referencias que aparecen en el libro nos remiten a las instituciones políticas que gestionan la política de calidad, pero no existe un planteamiento crítico de la evaluación de los másteres en relación con los egresados. Sin duda, esta observación es fruto de mi experiencia y está relacionada con la función que debe ejercer la universidad en la formación inicial del profesorado de educación primaria o secundaria; desde mi diagnóstico personal, no es positivo que la formación inicial esté alejada de la formación permanente y de las necesidades del sistema escolar básico, un referente que debería ser primordial a la hora de evaluar la calidad de un máster. Y lo mismo podemos decir del urbanismo y ordenación del territorio; es decir, cómo se transfiere este conocimiento a los sujetos que participan en las sesiones de debate o asesoramiento de los planes estratégicos o en los planes de ordenación municipal. Si no existe transferencia de conocimiento, difícilmente podremos hablar de calidad.

Cierto es también que las prácticas externas ocupan un capítulo entero (en concreto, el 7) y se ofrece un análisis específico del caso de la Universidad de Málaga. Como se indica en estas páginas la coordinación es compleja cuando se trata de realizar actividades en los centros laborales. Para estos casos se precisan protocolos de actuación (por ejemplo, la declaración de estar exentos de delitos sexuales si van a trabajar con menores) y un estudio exhaustivo de las condiciones laborales donde los alumnos y alumnas se van a insertar como alumnado en prácticas. Si a ello le anadimos los intereses del empresariado o de las administraciones que gestionan los ámbitos de trabajo, podremos apreciar la necesidad de una coordinación grande entre los tutores externos, propios de la universidad, la Comisión de Coordinación Académica, el rectorado y las empresas e instituciones.

Estamos pues ante un libro que nos manifiesta la complejidad de la coordinación docente de los másteres, tanto desde la figura del coordinador del título como el del módulo y la propia Comisión de Coordinación Académica, tal como se refleja en la figura de la página 96. Una coordinación que implica, además, una ardua tarea de gestión administrativa, lo que supone mayores niveles de cooperación. Como se ve, una labor que precisa ser definida en los próximos anos.

Xosé M. Souto González – E-mail: [email protected]

Acessar publicação original

[IF]

Lessons for present, lessons for future: The Holocaust and The Spanisch Civil War – GARCÍA ZAMORA et al (I-DCSGH)

GARCÍA ZAMORA, M. S.; GUILBERT HERNÁNDEZ, A. R.; MARTÍNEZ MONTESINOS, D. (Eds). Lessons for present, lessons for future: The Holocaust and The Spanisch Civil War. 2007. Resenha de:. Íber – Didáctica de las Ciencias Sociales, Geografía e Historia,n.97, p., out./dez. 2919.

Alumnado y profesorado de ocho centros europeos de educación secundaria, bajo el paraguas del Programa Erasmus + (ID Project: 2014-1-ESP1- KA201-004981), han trabajado durante tres anos en torno a la memoria histórica, en particular la del Holocausto y la guerra civil espanola. En este inmenso trabajo, premiado en 2018, han estado implicados los siguientes institutos: Gymnázium Angely Merici (Eslovaquia), IES Tirant lo Blanc (Espana), Ahmon koulu Siijinjärvi (Finlandia), 28th Lyceum of Thessaloniki (Grecia), Istituto Superiore Statale Leardi (Italia), Vilniaus Šolomo Aleichemo ORT gimnazija (Lituania), Gimnazjum nr 9 w Sosnowcu im. Jana Pawła II (Polonia) y Metod Koleji (Turquía). El coordinador del proyecto es Darío Martínez Montesinos, profesor del IES Tirant lo Blanc, de Elche.

Fruto de ese trabajo es el libro Lessons for present, lessons for future: The Holocaust and The Spanish Civil War. Didactic Units, que recoge algunos de los materiales confeccionados. El proyecto parte de la idea de que la educación, más allá del objetivo de preparar al alumnado para el mercado de trabajo, debe ser una herramienta para formar una ciudadanía capaz de enfrentarse críticamente a los mensajes –nacionalismo radical excluyente y xenofobia, entre otros– de los partidos de extrema derecha que han emergido en Europa (y en otros continentes) en los últimos anos.

Lo que se ha venido a denominar «memoria histórica» ocupa un lugar fundamental en la formación de las ciudadanas y ciudadanos. Y si hay un tema clave en esa memoria histórica es el Holocausto, que es imprescindible conocer y, hasta donde sea posible, explicar. Junto al Holocausto, este Lessons for present, lessons for future… estudia también la guerra civil espanola y el franquismo, ejes centrales del movimiento de recuperación de la memoria histórica en nuestro país. No en vano el hispanista Paul Preston ha acunado la expresión «Holocausto espanol» para referirse a la represión franquista, frente a la que se levantan peligrosas posturas revisionistas y negacionistas, como ha ocurrido con el Holocausto.

Las unidades didácticas están organizadas en torno a cuatro ejes: resistencia, colaboracionismo, indiferencia –en referencia a la actitud de la población– y, en cuarto lugar, la posición de los partidos políticos actuales en relación con la memoria histórica.

Todas las unidades recogidas en el libro están estructuradas de la misma manera. Después de indicar las edades a las que están destinadas, así como el número de horas necesarias para trabajar los materiales, se presentan las fuentes y documentos –de variadísima tipología–, los objetivos y la metodología de cada unidad.

A continuación, se incluye el contexto histórico y la biografía del personaje a través del que se analiza uno de los cuatro ejes a los que nos acabamos de referir, para finalizar con la propuesta de actividades.

El primer apartado («Resistencia») nos ofrece los materiales del 28th Lyceum of Thessaloniki, un centro de secundaria de Grecia que ha trabajado la lucha de cristianos y judíos frente a la ocupación nazi.

Las actividades proponen reflexiones sobre un problema de nuestros días: el drama de los refugiados en el Mediterráneo. La resistencia al fascismo es estudiada por otro instituto, en este caso eslovaco: el Gymnázium Angely Merici. La particularidad de esta propuesta radica en el hecho de que estudia, a partir de la biografía de un obispo, la resistencia ante dos regímenes totalitarios: el nazi y el comunista.

El fenómeno de la colaboración –«La difícil decisión de los judíos finlandeses»– es abordado por el Ahmon koulu Siijinjärvi, un centro finlandés. En este caso, no se presenta una biografía particular, sino que se utiliza la experiencia de aquellos finlandeses judíos que se enrolaron en el ejército de su país, que fue aliado del nazi. También hubo ciudadanos polacos que tuvieron que tomar «Decisiones difíciles». La biografía escogida por el Gimnazjum nr 9 w Sosnowcu im. Jana Pawła II es la de Moses Merin, miembro del consejo judío (Judenrat) creado por los nazis para gobernar la localidad de Sosnowiec.

Bajo el título de «La libertad es solo participar: indiferencia frente objea responsabilidad» se estudia el desinterés de la población en dos casos: Italia y Turquía. Las reflexiones del Istituto Superiore Statale Leardi (Cassale Monferrato, de Italia) parten de las leyes raciales de 1938. Desde la Estación de Milán fueron deportadas 774 personas, de las que solamente sobrevivieron veintidós. El testimonio de Liliana Segre, presidenta de la asociación Ninos de la Shoá, dice que el apoyo tácito al fascismo fue característico de una parte de la población italiana, que no se opuso al antisemitismo.

Por su parte, el Metod Koleji (Ankara, Turquía) trabaja sobre el caso del Struma, un barco con 768 judíos procedentes de Rumanía con destino a Palestina. Tras permanecer varias semanas en el puerto de Estambul debido a las complicadas relaciones entre Turquía y Gran Bretana, el barco, que no disponía de las más mínimas condiciones para albergar a tal cantidad de personas, zarpó hacia el mar Negro, donde fue torpedeado y hundido por un submarino soviético el 24 de febrero de 1942. El testimonio de David Stoliar, uno de los pocos supervivientes, es elegido en esta unidad para poner de manifiesto la hipocresía de la diplomacia.

El cuarto bloque de contenidos («La memoria histórica en nuestros días: el lenguaje de los movimientos totalitarios en Europa») está representado por el trabajo del ilicitano IES Tirant Lo Blanch. La dictadura de Primo de Rivera, la Segunda República, la Guerra Civil y el franquismo pasan por sus páginas para analizar las dificultades del movimiento de recuperación de la memoria histórica, un problema de actualidad que se analiza desde una perspectiva múltiple: histórica, ético-moral y política.

Estos párrafos no hacen justicia al trabajo de las muchas personas implicadas. Resulta imposible resumir en unas pocas líneas la totalidad de las experiencias recogidas en el volumen, que son solo una parte de las que están disponibles en la web www.lessonsforfuture.com, a través de la que pueden descargarse. Su visita debería ser obligada; y no solo para alumnado y profesorado.

Víctor Manuel Santidrián Arias – E-mail: [email protected]

Acessar publicação original

[IF]

Ditadura e Democracia: legados da memória – RAIMUNDO (RTA)

RAIMUNDO, Filipa. Ditadura e Democracia: legados da memória. Lisboa: Fundação Francisco Manuel dos Santos, 2018. Resenha de: SILVA, Paulo Renato da. Os “cravos” da memória: democracia e passado autoritário em Portugal. Revista Tempo e Argumento, Florianópolis, v.11, n.28, p.546-552. set./dez., 2019.

Ditadura e Democracia: legados da memória, da socióloga Filipa Raimundo, foi publicado em 2018 pela Fundação Francisco Manuel dos Santos. O livro é o 87o da coleção “Ensaios da Fundação”, uma das mais importantes coleções portuguesas tendo em vista a publicação de títulos que superem o meio acadêmico.

Escrito em linguagem acessível – mas não simplista –, e bem estruturado, o livro é composto por uma introdução, quatro capítulos e uma conclusão. Na introdução, De que é que trata este livro?, a autora evidencia o propósito do livro, a análise “(…) da relação da democracia portuguesa com o seu passado autoritário e dos elementos que têm contribuído para a construção da memória deste período (…)” (p. 9). No caso de Portugal, o passado autoritário se refere ao Estado Novo (1933-1974), período marcado pelo governo de António de Oliveira Salazar (1889-1970), Presidente do Conselho de Ministros entre 1932 e 1968, quando sofreu um acidente e foi afastado de suas funções. A Revolução dos Cravos, de 25 de abril de 1974, representou o fim da ditadura do Estado Novo1. Para leitores que não sejam de Portugal, é importante acrescentar que o primeiro governo constitucional eleito depois da ditadura se estabeleceu apenas em julho de 1976, informação que ajudará a compreender alguns elementos tratados no livro e críticas feitas à condução da Revolução dos Cravos por diferentes grupos políticos portugueses.

O capítulo 1, Democracia e passado autoritário, destaca como as democracias de cada país se relacionam de modo diferente com os seus respectivos passados autoritários. “A decisão de punir ou não os responsáveis pelo regime deposto é, em larga medida, um produto das condições políticas existentes durante a mudança de regime. (…). Mais tarde, só conjunturas críticas permitem mudar a relação entre um povo e o seu passado autoritário” (p. 17). No capítulo 2, Ajustar contas com o passado, Raimundo passa a focar no caso português; analisa como alguns nomes ligados ao Estado Novo sofreram sanções institucionais e políticas depois da queda da ditadura e como outros foram processados criminalmente pelos atos cometidos. O capítulo 3, Romper com o passado, mas sem o apagar, analisa as novas narrativas sobre o passado promovidas a partir da Revolução dos Cravos, “(…) acções no plano simbólico e museológico [que] permitiram que a democracia se legitimasse tanto por oposição como por rejeição ao regime anterior, mesmo que ela nem sempre tenha sido tão profunda quanto a narrativa revolucionária faria supor” (p. 55). No capítulo 4, O antifascismo como imagem de marca, a autora investiga o tema das reparações econômicas e simbólicas aos perseguidos pela ditadura até os dias atuais. No início, as associações de perseguidos tinham o principal objetivo de libertar os presos políticos e “(…) sua existência foi relativamente efémera, tendo em conta a relativa rapidez com que os presos políticos foram libertados” (p. 77). Atualmente, poucas associações reuniriam ex-membros da oposição e da resistência e as atuais propostas de reconhecimento estariam muito concentradas nas mãos dos partidos políticos. Enquanto as associações primariam pelo reconhecimento simbólico, dos partidos políticos viriam as principais propostas de compensação financeira aos perseguidos. “(…) os beneficiários desses mecanismos parecem ser, em grande medida, os militares e simpatizantes dos partidos que lideram as propostas legislativas” (p. 78). De acordo com Raimundo, a reunião das iniciativas de sucessivos governos e dos principais partidos, sobretudo de esquerda, “(…) mais do que dar resposta a (…) certos sectores da sociedade, poderá ser encarada (…) como uma forma de cultivar uma imagem de marca através da qual podem reforçar as suas credenciais democráticas e chamar a si a herança da luta pela democracia e contra o autoritarismo” (p. 78). Na Conclusão, a autora faz um balanço do tratado em todo o livro e aponta aquilo que ficou de fora2.

Os méritos do livro começam pela própria temática, pois a memória de um passado autoritário é sempre um tema complexo e controverso. Ao abordar o tema, Raimundo sistematiza e analisa as principais ações quanto a esse passado3, destacando as contribuições, limites e contradições das medidas adotadas por governos, partidos e associações de perseguidos pela ditadura. Além disso, a autora evidencia as relações entre esse passado e a política portuguesa contemporânea, indicando como os usos dessa memória variam entre governos e partidos de diferentes vertentes políticas. Já comentamos que, segundo o livro, os usos desse passado estariam relacionados à construção de “credenciais democráticas” para os partidos e governos e a maioria das propostas de reconhecimento dos perseguidos partiria de governos e partidos de esquerda. Entretanto, ainda que não haja reivindicação do passado autoritário pelos atuais partidos portugueses, a autora demonstra que existem divergências sobre o reconhecimento aos perseguidos e a condução do processo revolucionário, o que aponta para diferentes concepções de democracia em Portugal após a Revolução dos Cravos. Para mencionar apenas um exemplo tratado no livro, além de indicar divergências existentes entre os próprios partidos de esquerda, Ditadura e Democracia mostra como o CDS, partido conservador português, procurou estender uma lei que beneficiava os perseguidos pela ditadura aos que sofreram sanções pelo processo revolucionário iniciado em abril de 1974, o qual teria cometido abusos semelhantes aos da ditadura:

Como mostram os registros da Assembleia da República, duas semanas depois da aprovação da Lei 20/97, aquele partido [CDS] apresentou uma proposta de alteração da lei que se baseava no facto de muitos portugueses terem sido “perseguidos e vítimas de repressão em virtude das suas convicções democráticas e anticomunistas [grifo meu]. Foram deste modo prejudicados no exercício das suas profissões, afastados ou saneados dos cargos e funções que desempenhavam, impedidos de ensinar, obrigados a recorrer à clandestinidade ou ao exílio, tendo em alguns casos sido presos por longos períodos. (p. 91) Se na Assembleia existem tensões sobre o tema, na sociedade portuguesa não poderia ser diferente. Raimundo destaca várias reivindicações de António de Oliveira Salazar em Santa Comba Dão, terra natal do ditador, e na imprensa, como o caso do documentário da RTP – uma das principais redes de televisão de Portugal – que apresentou Salazar como o expoente do século XX português (p. 10-14). “Tendo já superado a longevidade do regime autoritário, a democracia portuguesa dificilmente poderá continuar a ser apelidada de ‘jovem’. Ainda assim, estes temas surgem no debate com relativa frequência (…)” (p. 14). Ao apontar para as divergências existentes na Assembleia e na sociedade portuguesa – ainda que pontuais, esporádicas e minoritárias –, o livro nos leva a considerar que existem elementos que poderiam mudar a relação dos portugueses com seu passado autoritário diante de eventuais “conjunturas críticas”, conforme a autora defende no início de Ditadura e Democracia sem mencionar especificamente o caso português.

Ainda sobre a sistematização das ações e medidas tomadas em relação ao passado autoritário português, o livro se destaca pela comparação com o ocorrido em outros países europeus, africanos e latino-americanos, destacando convergências e divergências em relação a Portugal. A autora defende que “(…) o conhecimento sobre a forma como se ajustou contas com o passado noutros países poderá contribuir para mitigar a avaliação negativa que os portugueses fazem do seu próprio processo de ajuste de contas (…)” (p. 53). Raimundo apresenta dados de uma pesquisa que coordenou, na qual 95% de 131 perseguidos pela ditadura responderam que não teria ocorrido justiça no caso português (p. 51). A autora cita que nos casos de Espanha e Brasil, por exemplo, a opção punitiva não esteve nem sequer à disposição da elite política (p. 53). Além desse esforço de História Comparada, é necessário valorizar, ainda, o diálogo multi e interdisciplinar apresentado pelo livro entre áreas como História, Direito, Ciência Política e Sociologia.

Quanto às polêmicas suscitadas pelo livro, uma delas se refere ao termo “ajuste de contas” para se referir às sanções e processos sofridos por nomes ligados ao Estado Novo depois da Revolução dos Cravos. A polêmica, por exemplo, apareceu em 21 de setembro de 2018 no lançamento do livro no Museu do Aljube – Resistência e Liberdade, uma das principais referências quanto à memória do Estado Novo português. O lançamento no Museu do Aljube contou com comentários de Fernando Rosas e Riccardo Marchi. Rosas foi enfático na crítica ao termo “ajuste de contas”: “Ajuste de contas ou responsabilização cívica e criminal de responsáveis da ditadura e dos seus crimes? Ajuste de contas tem um subtexto. É o subtexto da vingança. Não se trata bem de um ajuste de contas. Trata-se de justiça.” (2018, 17m30s).

Para leitores da maioria dos países latino-americanos e em particular do Brasil, como é o caso do que aqui escreve, o livro pode soar deveras crítico quanto à forma como a Revolução dos Cravos lidou e como os governos constitucionais têm lidado com a memória do passado autoritário português. Deveras crítico, pois muitos de nós ainda esperamos ansiosamente por um “ajuste de contas”, ainda que limitado e com imperfeições. Assim, para muitos de nós latino-americanos, ler o livro é experimentar um choque entre a nossa temporalidade e a portuguesa no que se refere à relação com o passado autoritário. Só é possível criticar o “ajuste” com o passado quando o processo foi feito ou pelo menos tentaram fazê-lo.

A crítica feita por Ditadura e Democracia é necessária e muito bem-vinda. Serve de experiência e referência àqueles que ainda esperam por um “ajuste” com o passado. Entretanto, faltou ampliar a contextualização das limitações e contradições apresentadas no caso português. Ressaltamos: os excessos cometidos no pós-25 de Abril de 1974 devem ser lembrados e criticados para (des)construir e historicizar os discursos políticos em Portugal desde então. Devem ser lembrados e criticados, pois, em alguns casos, foram muito graves e resultaram em “(…) diversas prisões arbitrárias, uso de tortura e violenta agressão física” (p. 99-100), conforme apontou comissão constituída para averiguar os excessos. Contudo, esses excessos também estão profundamente relacionados a um estrangulamento do espaço público promovido por décadas pelo Estado Novo. O (re)estabelecimento de princípios legais e constitucionais depois de períodos autoritários não é um processo simples. Por sua vez, que os excessos de Abril sejam “esquecidos” ou silenciados por forças políticas que outrora os promoveram ou defenderam (p. 99-101) também deve ser analisado como um sinal de revisão do passado revolucionário por essas forças e de seu alinhamento – ou submissão – a valores presentes na sociedade portuguesa contemporânea ou em setores expressivos dela. Para além dos interesses imediatos, presentes nos usos que os partidos e governos fazem do passado autoritário, caberia apontar como a experiência democrática transformou as forças políticas portuguesas e provocou mudanças na forma de lidar com a memória da ditadura e da Revolução dos Cravos. Em outras palavras, o “esquecimento” ou o silenciamento dos excessos cometidos por Abril talvez indiquem um aprendizado maior com a democracia do que reivindicações de Salazar em sua terra natal ou em programas de televisão de grande alcance. Enfim, faltou ao livro um equilíbrio entre a crítica à memória de Abril e os legados que a Revolução dos Cravos deixou para a democracia portuguesa, o que implica conceber a democracia para além do seu aspecto institucional.

Em tempos nos quais o passado autoritário brasileiro é minimizado ou mesmo negado por expoentes e setores de nossa política e sociedade – o que se verifica com variações em outros países latino-americanos –, a leitura de Ditadura e Democracia nos conecta com experiências históricas vividas pelos portugueses desde a queda da ditadura. Ajuda-nos a pensar nas particularidades de cada processo, mas também nos problemas e dilemas em comum deixados por governos autoritários e ditatoriais. Quanto às críticas que Filipa Raimundo faz aos usos da memória do passado autoritário português e da Revolução dos Cravos, estas nos servem, sobretudo, para que a sociedade civil seja a grande promotora de nosso “ajuste” e, assim, não fiquemos à mercê das instabilidades que marcam a política partidária e institucional. 1 Entre 1968, quando Salazar se acidentou, e 1974, quando ocorreu a Revolução dos Cravos, a presidência do Conselho de Ministros foi exercida por Marcello Caetano. 2 “Este livro não teve a pretensão de apresentar uma análise exaustiva das ferramentas e mecanismos usados para lidar com o passado em Portugal. (…). Ficaram de fora desta análise muitos outros aspectos, tais como: o exílio forçado da cúpula do regime, a punição dos funcionários da Legião Portuguesa, o Tribunal Cívico Humberto Delgado, a mudança na toponímia, a proibição de constituição de partidos fascistas, a amnistia aos desertores e refractários, entre outros temas (…)” (p. 98). 3 No que se refere à sistematização, são dignas de nota as tabelas 1 “Funções abrangidas pela restrição de direitos políticos em 1975-76” (p. 31) e 2 “Temas, conteúdos e principais conclusões dos 25 relatórios publicados pelo Livro Negro” (p. 65). O Livro Negro foi uma proposta iniciada em 1977 pelo primeiro governo constitucional depois da queda da ditadura e teve o objetivo de reunir documentos sobre o autoritarismo e a repressão durante o Estado Novo.

Paulo Renato da Silva – Doutor em História pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Professor da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). Foz do Iguaçu, PR – BRASIL. E-mail: [email protected].

El pensamiento conservador y derechista en América Latina, España y Portugal, Siglos XIX y XX – KOLAR (VH)

KOLAR, Fabio; MÜCKE, Ulrich. El pensamiento conservador y derechista en América Latina, España y Portugal, Siglos XIX y XX. Madrid: Iberoamericana-Vervuert, 2019. 362 p. LVOVICH, Daniel. Conservadores y derechistas en Iberoamérica en los últimos dos siglos. Varia História. Belo Horizonte, v. 35, no. 69, Set./ Dez. 2019. 

Los textos que componen El pensamiento conservador y derechista en América Latina, España y Portugal, Siglos XIX y XX, volumen compilado por Fabio Kolar y Ulrich Mücke son resultado de las ponencias presentadas originalmente en un simposio que se realizó en Hamburgo en 2016. Se trata de un libro ambicioso en sus alcances geográficos y temporales, ya que incluye textos sobre distintos, países latinoamericanos, España y Portugal, desde comienzos del siglo XIX hasta fines del siglo XX.

En la introducción del texto, a cargo de Kolar y Mücke, se destacan las dificultades que supuso para el estudio de esta tradición el uso poco preciso y en ocasiones arbitrario de conceptos como derecha y conservador. Los compiladores asimismo señalan la necesidad de articular, en el plano temporal, los elementos heredados de las tradiciones políticas conservadoras con las novedades propias del siglo XX; y en el plano de las escalas la combinación entre las historias políticas e intelectuales nacionales con los elementos propios de una historia regional o global, para dar cuenta de la especificidad de cada caso en el marco de sus conexiones transnacionales (KOLAR; MÜCKE, 2019, p.7-36).

Los temas que los compiladores eligen presentar como ejes para el análisis de la tradición derechista y conservadora en sus continuidades y rupturas son los de la soberanía y la revolución, la Iglesia y la religión, las mujeres y el género, las masas y las élites, la circulación de lecturas y el problema del anticomunismo, el fascismo y las dictaduras.

No todos los textos que integran la compilación responden del mismo modo a las aspiraciones de renovación historiográfica expuestos en la introducción – como el empleo de las herramientas de la historia intelectual y la combinación de escalas de análisis – aunque todos ellos son sólidos y bien fundamentados. De hecho, es perceptible una distancia entre la tradición cultural en que se insertan y la biblioteca en que se respaldan los compiladores y las de los autores, de modo que su articulación no resulta siempre sencilla.

Varios trabajos abordan el temprano siglo XIX. Lucia Pereira das Neves estudia los lenguajes políticos de conservadores y lliberales en la época de la independencia del Imperio de Brasil, mostrando los modos en que más allá de la implantación de algunos principios liberales, la vida pública no se extendió más allá de la elite. Víctor Peralta Ruiz analiza el pensamiento político del realismo antiliberal en Perú en los años de las guerras de independencia, al que considera un movimiento reactivo y reacio al liberalismo español, estudiando para ello tres momentos relevantes de esa tradición conservadora.

En una mirada de largo plazo sobre el siglo XIX, Marta García Ugarte destaca la centralidad política y la heterogeneidad del catolicismo mexicano, proponiendo como clave interpretativa que la modernidad resulto connatural a la catolicidad. Por su parte, Benjamin de Losada estudia el pensamiento de Pedro Gual y Pujadas, franciscano español que expresó el pensamiento ultramontano en el Perú de la segunda mitad del siglo XIX. El análisis en el marco de una “cultura atlántica de la confrontación” permite al autor mostrar las peculiaridades del vínculo entre catolicismo y republicanismo en América del Sur. Tributario de la perspectiva de Quentin Skinner, el aporte de Erika Pani analiza las formulaciones conservadoras sobre el pueblo en el marco de la Guerra de Reforma mexicana, mostrando los modos en que el conflicto funcionó como un límite a la hora de desarrollar iniciativas que consideraran de un modo efectivo la soberanía popular.

Eduardo González Calleja expone en su trabajo la larga y heterogénea tradición conservadora española de defensa armada de un orden social al que se consideraba amenazado, desde la década de 1840 hasta la conformación del Somatén Nacional, entendido como un eslabón intermedio entre las formas tradicionales de movilización reactiva y las modalidades de radicalización de las derechas.

Ricardo Arias Trujillo discute las visiones tradicionales sobre el conservatismo colombiano entre 1880 y 1930 proponiendo una visión de esta tradición que – más allá de su relación intrínseca con el catolicismo – resultó sumamente heterogénea, de manera que su consideración como una fuerza reaccionaria ha impedido dar cuenta de la existencia en su seno de sectores que defendieron la democracia y el laicismo.

Entrando de lleno en la historia del siglo XX, dos trabajos examinan en particular la problemática de la historia de las mujeres. Para el caso portugués bajo el salazarismo, Irene Flusner Pimentel da cuenta de la situación de subordinación femenina en el Estado Novo, lo que no impidió la movilización política de las mujeres ni la tardía formación de una elite femenina en el seno del régimen. Por su parte, Margaret Power, a través del análisis del caso de la movilización de las mujeres anticomunistas contra Goulart en Brasil y contra Allende en Chile muestra – apelando al análisis transnacional y comparado – la coexistencia en su discursividad de tópicos en común, propios del anticomunismo global de la época de la guerra fría, conviviendo con otros enraizados nacionalmente, como la importancia diferencial de la apelación al catolicismo en cada caso.

Un enfoque igualmente trasnacional y comparado se encuentra en el trabajo de Ernesto Bohoslavsky, Magdalena Broquetas y Gabriela Gomes dedicado al estudio de organizaciones juveniles conservadoras en Argentina, Chile y Uruguay entre 1958 y 1973. Atentos al impacto común del discurso anticomunista trasnacional, y a las redes que lo sostenían, cuanto a los rasgos que particularizan cada experiencia nacional, el articulo sostiene que las diferencias ideológicas entre estos grupos y los propios de la derecha revolucionaria no ocluye la existencia de un repertorio de acciones violentas y de un enemigo definido de manera similar que los emparenta.

El aporte de João Fabio Bertonha se ubica en un estilo de reflexión conceptual. Partiendo de la constatación de que existieron múltiples conexiones entre las derechas latinoamericanas de entreguerras y los fascismos, el autor sostiene que existió un fascismo latinoamericano con rasgos diferenciales respecto a sus coetáneos europeos, y propone – sin llegar a una conclusión definitiva – discutir y evaluar la utilidad del concepto de fascismo ibérico. Por último, Riccardo Marchi estudia el tránsito de una elite universitaria identificada con el nacionalismo revolucionario en los años finales del Estado Novo portugués hacia el liberal-conservadurismo, en un proceso que es explicado por el anacronismo de su lenguaje original ante el fin del imperio colonial, y por la incorporación del lenguaje político predominante en Europa y Norteamérica en los años setenta y ochenta como parte de homogenización política e ideológica del período.

Más allá de la marcada heterogeneidad de las contribuciones que constituyen esta obra, Conservadores y derechistas es una valorable contribución a un campo en expansión, y un libro que instiga a los historiadores de América Latina y Europa a profundizar el diálogo, así como un instrumento que nos ayude a pensar en la génesis del fenómeno de las derechas y su radicalización en nuestros días y a pensar claves analíticas para su comprensión.

Referências

Kolar, Fabio y Mücke, Ulrich (eds.). El pensamiento conservador y derechista en América Latina, España y Portugal, Siglos XIX y XX. Madrid: Iberoamericana-Vervuert, 2019. [ Links ]

Daniel Lvovich – Instituto del Desarrollo Humano Universidad Nacional de General Sarmiento – CONICET Juan María Gutiérrez, 1150, Los Polvorines, Buenos Aires, Argentina. [email protected].

Come si diventa nazisti. Storia di una piccola città – ALLEN (CN)

ALLEN, Williams S. Come si diventa nazisti. Storia di una piccola città. Torino: Einaudi, 2005. (Ristampa a cura di L. Gallino). Resenha de: ORI, Giada. Clio’92, 7 ago. 2019.

ll titolo del libro di Allen di primo acchito ci comunica gli elementi caratterizzanti del libro:

  • salta subito all’occhio che Allen vuole spiegarci il processo attraverso il quale i tedeschi di una piccola città diventarono seguaci del nazismo;
  • il periodo storico è ben delineato, si tratta del breve sessennio dal 1930 al 1935;
  • il territorio di cui parla il libro è molto delimitato, si tratta infatti di una piccola città da lui chiamata Thalburg (in realtà Nordheim nell’Hannover)

Allen tenta col suo libro di metterci in condizione di capire come sia stato possibile che un partito quasi inesistente, in poco tempo sia divenuto il primo e successivamente l’unico di tutto il territorio. Prende in considerazione una piccola città come studio di caso per rendere più comprensibile il mutamento avvenuto in quegli anni in tutta la Germania, dall’arrivo dei nazisti sino alla loro salita al potere.

Il libro di Allen presenta sia una introduzione di Luciano Gallino, sia una prefazione dell’autore. Nella prefazione l’autore ci spiega che ha preso in considerazione una città piccola della Germania per il semplice motivo che mai nessuno si era occupato di una situazione locale per parlare del nazismo, precisando che le città piccole hanno come caratteristica la scarsa riservatezza e molti pettegolezzi.

Afferma che la città di Thalburg aveva una buona dose di documenti da poter consultare e ci mette a parte che molti cittadini si lasciarono intervistare con la promessa dell’anonimato anche della città stessa (ecco spiegato, quindi, il motivo del perché la città di Thalburg è inesistente sulle cartine).

Dunque, una molteplicità di fonti — tra cui quelle di memoria — è messa a frutto dallo storico statunitense.

L’introduzione invece ci riassume in poche pagine il ruolo della NSDAP (Partito Nazionalsocialista dei Lavoratori Tedeschi) e dell’SPD (Partito Socialisti di Germania) nella città di Thalburg: di come NSDAP si sia fatto strada tra i cittadini privando l’SPD di moltissimi voti lavorando sulla preoccupazione che i cittadini avevano del comunismo, di come il partito nazista abbia manifestato contro il trattato di Versailles colpendo nel vivo i cittadini che non si erano ancora ripresi da quella umiliazione, come l’SPD non abbia fatto nulla per cercare di fermare l’avanzata del partito hitleriano nella città.

L’autore, a questo proposito, alla fine del libro, analizza i vari dati raccolti nelle sue ricerche organizzandoli in tabelle statistiche e in grafici, rendendo possibile, attraverso la loro lettura, la comprensione immediata delle situazioni e dei processi, anche senza aver prima letto l’intero libro.

Grafici e tabelle esplicano perfettamente i dati riguardanti la disoccupazione, le elezioni e le frequenze delle riunioni dei vari partiti a Thalburg negli anni che il libro prende in considerazione.

Allen non propone una periodizzazione ragionata dei sei anni analizzati. Ma all’interno del suo libro, la si può trovare schematizzata nell’indice. Dapprima suddivide i sei anni da lui presi in considerazione in due parti: dal gennaio 1930 al gennaio 1933, poi dal gennaio 1933 a quello del 1935. All’interno delle due parti i capitoli creano un’ulteriore periodizzazione suddivisa in stagioni.

Allen articola il libro in due parti: la morte della democrazia, dal gennaio 1930 al gennaio 1933, e introduzione alla dittatura, dal gennaio 1933 al gennaio 1935.

La prima parte inizia col darci alcune informazioni sulla città: dov’era collocata, più o meno, sulla cartina, com’era “fisicamente”, quali erano le sue condizioni durante la depressione, quale il grado di disoccupazione, quali i lavori svolti dagli abitanti, quale il ruolo delle industrie. Il terzo capitolo “entrano i nazisti”,  ci spiega come nel giro di pochissimi mesi, il partito NSDAP sia riuscito a diffondersi nella città in cui il partito SPD era già ben attecchito.

Da questo terzo capitolo, sino al nono, Allen ci mostra come lentamente il partito di Hitler si sia impadronito della città, sfruttando la disoccupazione dilagante, manifestando contro il trattato di Versailles, utilizzando i giornali per la loro propaganda, e facendo presente come l’SPD, iniziò a perdere voti, smettendo di lottare contro un partito antisemita, violento e rivoluzionario.

La seconda parte del libro inizia con le ultime elezioni in Germania nel 1933, anno in cui Hitler divenne cancelliere e l’NSDAP iniziò a lavorare per istaurare una dittatura.

La città da quel momento fu totalmente soggiogata al partito, con ormai pochissime persone, totalmente emarginate, che militavano ancora per l’SPD.

Il capitolo “il regime del terrore” è incentrato sul tentativo dei nazisti di evitare qualsiasi minima reazione da parte di coloro che non erano militanti di Hitler, facendo boicottare i loro negozi, proibendo le armi al privato, mettendo fuori legge il partito socialista e sciogliendo i sindacati. In questo capitolo si inizia a parlare del campo di concentramento di Dachau, in cui venivano mandati gli avversari politici, e di cui gli abitanti di Thalburg erano a conoscenza. Le accuse per cui si poteva venire arrestati erano assai labili, ma come veniva scritto anche sui giornali, quando i nazisti mettevano gli occhi su qualcuno, in un modo o in un altro, lo prendevano.

Lentamente la società di Thalburg, fino a quel momento ben organizzata, iniziò a disgregarsi. I circoli cittadini iniziarono ad essere controllati dai nazisti che non lasciarono più nulla di intentato per evitare che ideologie diverse dalle loro attecchissero all’interno della città.

Nel quindicesimo capitolo “gli aspetti positivi” Allen, per darci una visione complessiva del periodo, ci mostra l’altra faccia della medaglia, ovvero la positività del nazismo nella città. I nazisti, infatti, trovarono la soluzione alle difficoltà economiche che imperversavano a causa della depressione. I soldi nelle casse della città, e anche quelli stanziati da Hitler, permisero di far diminuire la disoccupazione già dal luglio 1933. Nel 1935 tutti i segni della depressione erano scomparsi.

Il capitolo “disgregazione della società”, tratta in primis della questione ebraica.

Allen ci spiega che a Thalburg gli ebrei erano una minoranza e che da una generazione all’altra il numero cresceva minimamente. Essi erano ben integrati nella società: difatti, gli ebrei non abitavano in un quartiere ebraico, svolgevano piccole attività commerciali e non risentivano molto dell’antisemitismo ereditato dal medioevo, poiché era poco sviluppato nella città.

Ma con la salita al potere dei nazisti la situazione cambiò: le quasi inesistenti frasi antisemite comparse nei discorsi precedenti al 1933 divennero realtà il 29 marzo di quell’anno. L’antisemitismo dei nazisti si manifestò non solo nei discorsi, ma anche con i fatti: nell’aprile di quell’anno infatti il boicottaggio degli ebrei diede il via al processo che solo dieci anni dopo terminò con le camere a gas. Questo primo attacco diede come risultato il disgregarsi del rapporto con i non ebrei dal punto di vista sociale.

Ma era, come si sa, solo il primo passo verso qualcosa di molto più ampio. Inizialmente si voleva solo evitare che i rapporti umani ostacolassero la dittatura e le idee che erano alla base di essa. Thalburg e gli ebrei non si accorsero in tempo del problema che avrebbe creato l’ideologia antisemita all’interno della città, anzi, gli ebrei li ritenevano, inizialmente, innocui.

Ma il boicottaggio fu una catastrofe per la piccola cittadina: tutti iniziarono a capire che gli ebrei erano dei reietti nel regime nazista, che erano da evitare per salvaguardare la propria incolumità, e lentamente furono messi tutti ai margini. Molti ebrei appartenevano a dei club, soprattutto i più facoltosi, come il banchiere Braun, fiducioso e tutto intenzionato a non andarsene dalla sua città, a nessun prezzo, allontanandosi dai club solo per evitare questioni spiacevoli, ma non perché credeva che quella situazione non sarebbe durata a lungo. Era un uomo fiducioso. Molto meno lo fu Gregor Rosenthal, che all’opposto del suo compaesano, si chiuse in se stesso e ruppe tutti i contatti sociali. Venne allontanato da tutte le congregazioni e il suo modo di fare inquietò così tanto i thalburghesi che crebbe in loro l’idea che fosse poco conveniente farsi vedere anche solo parlare con un ebreo. Non fu sicuramente l’unico con un tale comportamento, anzi, era molto più facile che gli ebrei si comportassero in modo schivo e quasi da invisibili che non da uomini di mondo come il banchiere. Non solo le relazioni sociali degli ebrei si rovinarono in questo periodo: in poco tempo, attraverso il controllo dei club, con la creazione di nuovi, con la fusione o lo scioglimento di altri, a causa delle tensioni e delle paure dovute alla sfiducia che tutti avevano verso il prossimo, sentimento che cresceva giorno dopo giorno, le relazioni divennero minime. Non ci si fidava più nemmeno dei proprio amici intimi, in poco tempo nessuno desiderava più riunirsi per scambiarsi opinioni o semplicemente chiacchierare, tutti temevano di dire qualcosa di sbagliato e di finire nei guai.

È molto interessante il modo con cui Allen costruisce la conoscenza di come ci si trasforma in sostenitori di un partito antidemocratico e razzista.

Egli presenta le situazioni e svolge i processi del loro mutamento perciò nel libro sono alternati blocchi testuali descrittici con quelli narrativi.

I primi due capitoli: l’ambiente  anatomia della città hanno lo scopo di farci conoscere lo stato di cose della cittadina di Thalburg nel 1930. In essi troviamo la descrizione fisica della città, del territorio regionale, della situazione demografica, del clima religioso, delle classi sociali e dei loro club.

Il capitolo sugli ebrei leggiamo prima la descrizione di  come essi vivevano prima dell’avvento dei nazisti e negli anni successivi alla loro vittoria elettorale, poi i narrativi ci raccontano i giorni del boicottaggio, come certi facoltosi ebrei reagirono alle leggi antisemite di fronte agli amici e alla società e di come i cittadini si comportarono verso di loro: amichevolmente alcuni, andandoli a cercare nei loro negozi e per la strada proprio per parlarci, i socialisti in testa, oppure approfittandosi di loro, facendo spese folli nei loro negozi senza mai pagare un soldo.

Allen conclude il suo libro facendo una carrellata dei fatti successivi al 1935: di come i nazisti iniziarono a manifestare le loro vere intenzioni sulle questioni religiose, di come già nel 1937 il ritmo dell’espansione economica rallentò, di come nessuno si oppose ai nazisti nel 1938 nella “notte dei cristalli”.

Durante il 1944 i bombardieri americani colpirono in  parte la città, ma in tutti i casi i cambiamenti furono rilevanti: molti profughi si trasferirono in quella cittadina per fuggire agli orrori della guerra, la popolazione aumentò esponenzialmente e all’arrivo degli alleati si sottomisero senza combattere. Nel 1950 la popolazione dell’inizio degli anni trenta era raddoppiata.

Acessar publicação original

[IF]

Novecento.org – (CN)

Novecento.org. Resenha de: COCILOVO, Cristina. La nuova edizione della rivista dell’Istituto nazionale per la storia del movimento di liberazione in Italia. Clio’92, 7 ago. 2019.

Torna in veste rinnovata Novecento.org,  la rivista on line di didattica della Storia dell’Istituto nazionale per la storia del movimento di liberazione in Italia e degli altri 68 Istituti italiani ad esso associati. È un bentornato a una rivista che ha avuto un illustre passato per il livello dei contributi e la partecipazione degli utenti, per lo più insegnanti e ricercatori,  interessati ai temi della didattica della Storia del 900. Appunto per questo, nella pagina di profilo della rivista , non manca un ampio ricordo  di Antonino Criscione che aveva progettato e curato la precedente versione, chiusa ormai da un decennio.

L’intenzione degli editori/autori è di continuare la tradizione, innovandola e adeguandola ai tempi.  La mission della versione  del 1999 è stata infatti ripresa in pieno: “L’ ambizione di questa rivista on line è quella di raccogliere, condividere e redistribuire saperi, conoscenze, risorse utili per la ricerca didattica e l’innovazione su questo terreno utilizzando a questo fine  le potenzialità di Internet e stimolando la nascita e lo sviluppo della comunità virtuale degli insegnanti-ricercatori di storia.” Ma l’aggiunta di un’indicazione significativa può permettere ora di ampliare lo sguardo dei docenti, grazie alla rete di relazioni scientifiche degli Istituti: “La rivista è stata quindi pensata e progettata come uno strumento affidabile per i docenti italiani che vogliano aggiornarsi dal punto di vista storico e didattico, … un punto di riferimento[… ] su quanto avviene in Europa in questo specifico ambito di insegnamento.

Sin dal numero 0 del giugno del 2013 la rivista si è confermata come un formidabile supporto per la didattica della Storia del ‘900, sia per le riflessioni metodologiche che per i materiali offerti e immediatamente fruibili.  Ben presto ci auguriamo che diventi uno strumento indispensabile per i docenti  che desiderano aggiornarsi.

Si assiste infatti da molti anni all’assenza di un serio processo di formazione pubblica degli insegnanti. Essa viene gestita, fra mille ostacoli, da associazioni disciplinari o appunto Istituti di ricerca come l’ISMLI, consapevoli di supplire a un compito fondamentale per l’educazione dei futuri  cittadini.

Diretta da Antonio Brusa, colonna portante della didattica della Storia, assistito a sua volta da una redazione che raccoglie i nomi di maggior esperienza dell’ISMLI e del Landis, la rivista ha avuto il suo battesimo in un riuscito convegno, tenutosi a Piacenza nel marzo 2013, sul tema “La Storia nell’era digitale”. Introdotto da una stimolante relazione di Antonio Brusa, il convegno ha visto succedersi  in due mattinate docenti e ricercatori esperti nell’utilizzo delle tecnologie digitali applicate alla storia. Nel corso del pomeriggio, tre laboratori didattici rivolti ai docenti della primaria (a cura di Paola Limone), secondaria di primo e di secondo grado (gestiti da Cristina Cocilovo e Patrizia Vajola), hanno messo a fuoco le modalità innovative di una didattica centrata sulla costruzione di conoscenze e di competenze storiche attraverso l’uso del digitale.

Gli atti del convegno sono pubblicati nella sezione “Dossier”, con la riproposizione in modo pressoché integrale di molti interventi (BrusaCigognettiFerriNoiretBiondiDi Tonto, Mattozzi, Facci, Formenti), seguiti dai materiali presentati nei laboratori.

Gli atti del convegno sono pubblicati nella sezione Dossier, con la riproposizione pressoché integrale degli interventi (Antonio Brusa, Luisa Cigognetti, Paolo Ferri, Serge Noiret, Giovanni Biondi, Ivo Mattozzi, Giuseppe Di Tonto, Carlo Formenti, Michele Facci), seguiti dai materiali presentati nei laboratori.

Sarebbe opportuno  guardare la sequenza degli interventi videoregistrati, sempre accompagnati da un fedele testo scritto: si affrontano temi chiave dell’uso di Internet da parte di allievi e docenti che affrontano la Storia, senza dimenticare che (citando Brusa) ” La disciplina storia è uno statuto di regolazione dei saperi, cioè un insieme di regole e operazioni da compiere per la specificità della formazione storica: la messa in prospettiva, la contestualizzazione, i lessici e le grammatiche fondamentali del sapere storico, la costruzione di grandi codici di senso.”

Il dibattito sull’uso della rete, che può essere spaesante, rischioso, e insieme un’inesauribile risorsa, ha accompagnato tutto il percorso del convegno nella consapevolezza che l’epistemologia, la grammatica e la sintassi della Storia sono da anteporre alle tecnologie, sebbene possano trarne reciproci vantaggi se messe in sinergia.

I materiali pubblicati in Laboratori – Storia e nuove tecnologie, offrono spunti per il docente che vuole affrontare la Storia secondo un approccio costruttivista, per attivare gli studenti secondo percorsi coerenti con la propria modalità cognitiva, approfittando dei vantaggi offerti dalla rete e dalle nuove tecnologie (ma fino a che punto sono nuove? Se lo domanda maliziosamente Facci).

Infine sono state attivate le altre sezioni nel Menù del sito. In Pensare la didattica viene recensito l’avvincente romanzo In territorio nemico, sulla maturazione di due giovani attraverso l’avventura partigiana. Scritto  secondo il metodo di Scrittura Industriale Collettiva (SIC), offre spunti operativi alle classi che vogliono cimentarsi nella produzione di un testo storicoIn Didattica in classe (un chiaro riferimento all’intenzione espressa nell’introduzione di  pubblicare riflessioni teoriche e percorsi di didattica praticata) è presentato “Lettere dall’America. Una storia d’amore e di emigrazione, affinità elettive“: un epistolario di M.G. Salonna, che, oltre ad essere una lettura stimolante in sé, si accompagna ad altri materiali che lo collocano nel contesto storico del suo tempo. Il tutto infine viene impiegato in un il bellissimo laboratorio didattico che consente agli studenti di rivivere la grande Storia attraverso la storia di gente “apparentemente” comune. In Uso pubblico della storia troviamo ricche riflessioni  per la valorizzazione del calendario civile, che può diventare uno strumento per il curricolo di Storia, a cominciare dalle giornate della memoria e del ricordo.

Una citazione a parte merita l’ultima sezione del Menù, Ipermuseo, dove sono pubblicate sotto forma di presentazione o slide share mostre realizzate dagli Istituti della Resistenza  in anni recenti su temi caldi del ‘900: avvento del fascismo, resistenza, deportazione, la  difficile convivenza sul  confine orientale nell’alto Adriatico, la realizzazione dell’esperienza pedagogica innovativa nel Convitto Rinascita di Venezia. L’uso della rete rende queste mostre fruibili a distanza di tempo, ancora spunto di riflessioni e di  possibili approfondimenti nelle classi.

La nuova versione del sito si presenta con una veste grafica molto  lineare, ben leggibile  e invogliante. La navigazione è semplice e immediata. I materiali facilmente scaricabili. Comodo poi è l’indice di ogni numero della rivista, che permette di consultarla in modo sequenziale come se fosse una pubblicazione cartacea (vedi alla voce Indici del Menù).

Un particolare prezioso: la vecchia rivista resta in consultazione ed è velocemente raggiungibile dalla pagina home d’apertura del sito. Di fatto è ancora un pozzo di informazioni. Inoltre la distanza temporale fra la vecchia e la nuova versione offre poi il vantaggio  di cogliere la dimensione storico-cronologica dello sviluppo della ricerca didattica.

Acessar publicação original

[IF]

 

Marghera 1971: l’inizio di una fine. Un anno di lotta alla Sava – PUPPINI (CN)

PUPPINI, Chiara. Marghera 1971: l’inizio di una fine. Un anno di lotta alla Sava. Portogruaro (VE): Nuova dimensione editore, 2015. 191p. Resenha de: GUANCI, Enzo. Clio’92, 7 ago. 2019.

All’inizio del Novecento, cent’anni fa, il porto di Venezia era il secondo in Italia dopo quello di Genova, ma con spazi ormai insufficienti agli importanti traffici di petrolio e carbone necessari all’industria italiana da poco decollata. Di qui l’esigenza di creare un nuovo porto; si scelse l’area di Marghera. Si iniziò a scavare i canali per le navi e a costruire i collegamenti ferroviari con la vicina stazione di Mestre. Dieci anni dopo quell’area era diventata geograficamente strategica: un notevole porto industriale, con una buona rete ferroviaria e stradale alle sue spalle. Tra i protagonisti della realizzazione ci fu il conte Volpi, capitano d’industria e futuro ministro di Mussolini che nel 1926 riunì l’intero territorio nell’amministrazione comunale di Venezia. Era ormai nato quello che nel secondo dopoguerra diventerà il più grande polo industriale italiano, arrivando ad occupare, nel 1965, fino a 35 000 addetti, senza contare l’indotto.  Un polo chimico integrato, ma non solo: cantieri navali, vetrerie, fabbriche per fertilizzanti e materie plastiche, l’alluminio.

Stabilimenti enormi. Tanti.

Oggi, cinquant’anni dopo, “Marghera è un enorme spazio che pare senza confini, abbandonato (in apparenza), punteggiato da impianti lontani e spenti.” (Jacopo GilibertoPorto Marghera volta pagina. E prova a ripartire con l’industria ‘verde’, Il Sole 24ore, 8 gennaio 2015).

Qual è stato il processo che ha così trasformato questo territorio in solo mezzo secolo? Com’è successo?

Qualsiasi risposta rischia di essere semplificatoria. Chiara Puppini consegna con il suo libro l’inizio di questo processo. O meglio, uno degli inizi. E’ la crisi della Sava, un’azienda che nel 1966 produce il 36% dell’alluminio nazionale e possiede: 2 miniere di bauxite in Abruzzo e Puglia, 1 fabbrica di allumina, 2 fabbriche di alluminio, 1 centrale termoelettrica, 5 centrali idroelettriche, 3 navi da trasporto, 1 fabbrica per prodotti chimici, 50% di una fabbrica che produce polvere e pasta di alluminio, 1 istituto di ricerca.

Ebbene, nel 1971 “i dirigenti della Sava di Porto Marghera [comunicano alle organizzazioni sindacali] la decisione del Consiglio di Amministrazione della Alusuisse [proprietaria della Sava] di chiudere il 15 ottobre la fabbrica Allumina e di licenziare circa 800 lavoratori tra operai e impiegati” (p. 69) che, sommati ai 200 posti precedentemente in cassa integrazione, fanno 1000 licenziamenti!

Il libro racconta la lotta sindacale dei lavoratori per salvare l’azienda e con essa il loro posto di lavoro. La narrazione presenta gli avvenimenti attraverso le cronache giornalistiche dell’epoca, i volantini sindacali e i comunicati aziendali, le fotografie delle manifestazioni sindacali e quelle delle trattative tra sindacati e azienda, le interviste ai dirigenti aziendali e sindacali di allora. In quelle pagine si respira l’aria dell’epoca: la solidarietà operaia, la vicinanza effettiva delle istituzioni e delle forze politiche con chi lavora e produce ricchezza. Si sente – siamo agli inizi degli anni Settanta – una cultura che mette al centro il lavoro. Ciò nonostante, il 26 gennaio 1972 l’Allumina chiude. Nel 1973  l’area Sava di Marghera viene suddivisa con altre società e negli anni successivi l’intera produzione dell’alluminio a Marghera viene dismessa. Il 12 settembre 1991 ci sarà l’ultima colata di metallo.

Insomma.

La storia della Sava è paradigmatica: il primo episodio della crisi di Porto Marghera. Assistiamo in questi anni a cambiamenti rapidissimi: all’epoca si parlava di decenni, comunque un cambiamento era ineludibile. Lo stabilimento di Allumina di Marghera veniva rifornito di bauxite che proveniva dall’Istria, dalla Puglia, tutte miniere che negli anni Settanta non avevano più senso – se si pensa come veniva estratta la bauxite in Australia a cielo aperto. Era l’inizio di un certo tipo di globalizzazione.” (p.98)

Chi parla è Giorgio Berner, allora giovane dirigente della Sava.

“Allora c’era qualcuno che pensava che Porto Marghera per i successivi cinquant’anni potesse restare sempre così, invece purtroppo la realtà è in continuo movimento. Quando l’Alusuisse ha scoperto che in Australia non era più necessario andare sottoterra a ottocento metri per cercare quel minerale dal quale poi si ricavava l’allumina, ma c’erano miniere a cielo aperto, bastava andare con i bulldozer… da lì è incominciata ad andare in crisi … Porto Marghera” (p. 101)

Chi parla è Bruno Geromin, allora segretario dei metalmeccanici CISL a Marghera.

In conclusione.

La Puppini non vuole nascondersi dietro una falsa oggettività da ricercatrice ma prova a tirare delle conclusioni per il presente e per il futuro:

“Nell’ottica delle responsabilità occorre ripensare ai doveri/diritti di ciascuno; da una parte il dovere di rispettare l’ambiente e di garantire la produttività, dall’altra – cioè dalla parte operaia – il dovere di fare bene il proprio lavoro, ma il diritto di non morire sul posto di lavoro, il diritto di vivere in un ambiente sano, i cui tempi siano modulati sull’uomo e non sulla macchina, il diritto di trovare anche soluzioni migliorative, cioè di dare il proprio contributo di esperienze per un’umanizzazione dell’organizzazione del lavoro. Questo vuol dire riappropriarsi del proprio lavoro e responsabilità per le parti che competono a ciascuno; al finanziatore, al produttore, all’esecutore, al fruitore.” (p. 125)

La nostra autrice si accorge, però, che sta chiedendo tanto, forse troppo.

“Un sogno? Alle volte sognare aiuta a cambiare la realtà, poi, però, bisogna attrezzarsi per realizzare i sogni.”

Enzo Guanci

Acessar publicação original

[IF]

 

Storia di donne e di uomini, di acque e di terre – BELLAFRONTE (CN)

BELLAFRONTE, E. Russo. Storia di donne e di uomini, di acque e di terre. Barletta: Editrice Rotas, 2009. Resenha de: GUANCI, Vincenzo. Clio’92, 7 ago. 2019.

Il sale non è solo l’ingrediente per rendere “saporita” la nostra alimentazione quotidiana. Il sale è assolutamente necessario nell’industria chimica, nella concia delle pelli e, naturalmente, per la fabbricazione dei prodotti agroalimentari. Pervade la nostra vita quotidiana. Ma non da ora; fin dal Neolitico i gruppi umani scoprirono l’importanza strategica di una materia prima necessaria all’alimentazione e che, per di più, consentiva la conservazione dei cibi. La storia dell’umanità è punteggiata da alleanze e conflitti per il controllo della produzione del sale, che, fino a pochi decenni or sono, era monopolio statale, e non solo in Italia.

Al museo della salina di Margherita di Savoia si impara la storia.  La storia del sale e delle saline, la storia di Margherita di Savoia, delle sue donne, dei suoi uomini, dei suoi bambini, del loro lavoro, della loro vita.

Questo ci dicono e ci fanno capire Francesca  Bellafronte ed Enzo Russo con il loro libro-catalogo del museo, Storia di donne e di uomini, di acque e di terre, editrice Rotas, Barletta, 2009.

La felice scelta degli autori è quella di dare al libro un’impostazione di tipo didattico.

Innanzitutto, la salina di Margherita di Savoia è raccontata secondo una struttura “presente-passato-presente”, che con tutta e immediata evidenza dà conto  dei motivi per cui oggi valga la pena di studiare la storia di una realtà importante come la salina.

In secondo luogo, le difficoltà del testo storiografico sono stemperate attraverso l’uso della domanda e della  risposta. Intendiamo dire, per esempio, che un testo descrittivo-argomentativo con un intrinseco rischio di forti asperità lessicali e concettuali,  come quello sulle innovazioni tecniche nel XIX secolo, viene invece smontato, tematizzato, problematizzato e risolto con risposte relativamente brevi e piane a dieci domande:

  • perché nel primo trentennio del XIX secolo prese corpo l’ipotesi di bonifica del lago Salpi?
  • Quali conseguenze produsse la riduzione della profondità del lago?
  • Quale problema destava più preoccupazione?
  • Come si intervenne per risolvere questi problemi?
  • Quale era il progetto di Afan de Rivera?
  • Gli obiettivi di Afan de Rivera furono raggiunti?
  • Come si presentava il nostro territorio a metà Ottocento?
  • Quali erano le vie di comunicazione a metà Ottocento?
  • Qual era la produzione della salina?
  • Come si spiega l’incremento produttivo di inizio Novecento?

In terzo luogo, le tantissime riproduzioni di documenti d’archivio, carte topografiche, fotografie d’epoca, non svolgono una mera  funzione esornativa bensì costituiscono, assieme ai testi, parte integrante del materiale per la costruzione della conoscenza storica di chi legge e studia.

Infine, due testi introduttivi e un glossario forniscono gli strumenti cognitivi e concettuali per seguire senza difficoltà, sia la visita al museo sia la  sola lettura del libro.

Si inizia con la descrizione della salina oggi, all’inizio del XXI secolo: dove si trova, come funziona, con quali macchine; ci si sofferma sui procedimenti di produzione del sale, si scopre come viene impacchettato, come viene trasportato nelle varie parti d’Italia e del mondo; si arriva fino alle innovazioni più recenti, quale, per esempio,  l’arricchimento con lo iodio  introdotto da una legge del 2005.

La seconda parte del volume racconta il passato, la storia della salina. Si va  dalla prima attestazione documentaria di una salina nella Tavola Peutingeriana, che nel XII secolo segnala la presenza di saline sulla costa adriatica già in epoca romana, fino  agli anni Sessanta del Novecento. Ma alcune tracce la fanno risalire al Neolitico; si tratta delle cosiddette “vasche napoletane”. Cosa sono? Ce lo spiegano  F. Bellafronte e E. Russo: “due canalette circolari, scavate su una piattaforma di pietra nell’età del Bronzo, rinvenute nei pressi del canale Carmosino. Probabilmente erano utilizzate per lo scolo dei sali di magnesio, più amari, dai cumuli di cloruro di sodio.”

La modernità irrompe nella salina in epoca illuminista con l’intervento del Vanvitelli, ingegnere e architetto, colui che aveva progettato la reggia di Caserta, chiamato dal re di Napoli, Carlo III di Borbone, ad ammodernare e riorganizzare la salina, per aumentarne la produzione. Nel XVIII secolo, ci ricordano gli autori, le “tecniche produttive erano rudimentali e basate sull’impiego di attrezzi manuali, per lo più azionati con la forza della braccia. L’energia animale era impiegata nel trasporto del sale: i cavalli trainavano i carretti carichi di sacchi di sale fino alla spiaggia, dove prendevano la via del mare. L’energia solare ed eolica, allora, come oggi, erano le principali protagoniste del processo di salinazione, attraverso l’evaporazione dell’acqua”. Vanvitelli risistemò le vasche, “attraverso l’eliminazione degli isolotti di terra, il livellamento del fondo e il consolidamento della base degli argini d’argilla, mediante l’inserimento di una fila di tufi.” Ma, naturalmente, non si limitò a questo; rese più vivibile l’ambiente, ampliò la base produttiva della salina e, soprattutto, introdusse le “coclee di Archimede”, chiamate volgarmente “trombe”, macchine che sostituivano i tradizionali “sciorni”.

Lo sciorno, ci spiegano gli autori, “consiste[va] in una specie di parallelipedo aperto su un lato, della capacità di due secchi, fissato ad un treppiede per mezzo di una fune. Veniva azionato a braccia: ci voleva un movimento continuo e ripetuto dei salinieri, per trasferire tutta l’acqua da un vaso all’altro” (cfr. illustrazione a p. 61). Le coclee di Archimede permettevano di “sollevare più facilmente l’acqua, in tempi più veloci e con minore fatica, superando i dislivelli altimetrici tra gli scaldati ed i campi” (p. 65) comportando anche una notevole riduzione di manodopera.

E così via. Il racconto del passato della salina di Margherita di Savoia viene presentato prestando sempre molta attenzione al contesto storico del tempo, spiegando le trasformazioni locali nella salina con il quadro politico, economico, sociale e culturale italiano ed europeo. Insomma, un esempio di come si può studiare la storia locale senza scadere nel localismo sterile che non ci fa capire i veri movimenti della storia.

Il libro si conclude con una bella carrellata di fotografie sulla evoluzione delle tecniche nel XX secolo rispetto alle problematiche di sempre della salina:

  • raccolta e ammassamento del sale;
  • pesatura e confezionamento;

L’accelerazione novecentesca appare in tutta la sua evidenza dalle fotografie degli zappasale al lavoro nei primi anni del Novecento, alla prima introduzione degli elevatori meccanici negli anni Dieci, alla velocizzazione con i nastri trasportatori  negli anni Trenta,  alla foto del capannone Nervi in funzione fino agli anni Settanta.

Insomma una pubblicazione di storia locale e di storia generale, di storia della tecnica e di storia sociale; una guida per una visita al museo e un percorso di educazione al patrimonio culturale. Impreziosita, tra l’altro, dall’accuratezza della grafica che rende leggibili le riproduzioni cartografiche e godibili quelle fotografiche.

Del resto già Giorgio Nebbia nella sua ricca e impegnata presentazione iniziale ci ricorda che oggi – dati del 2007 – nel mondo si producono ancora circa 250 milioni di tonnellate di sale, a testimonianza della sua importanza economica.

“Esiste tutta una economia e fiscalità del sale, una merce così importante – scrive Nebbia – che tutti i potenti ne hanno approfittato per ricavare imposte e per instaurare monopoli sul suo commercio. Salaria, Salina, Sale, Saline… sono i nomi di località e strade associate alla produzione e al commercio del sale. Plinio ricorda le saline di Taranto, di cui oggi resta traccia soltanto in un toponimo. E al sale era associato anche il nome di Salapia, Salpi, la misteriosa città che sorgeva proprio alle spalle della più grande salina del Mediterraneo, quella di Margherita di Savoia.” (p. 6).

Appunto a questa è dedicato il Museo, a parere dello stesso Nebbia di grande interesse per almeno tre motivi:

costituisce un opportuno riconoscimento dell’importanza dell’energia solare, il cui impiego nella salina di Margherita ammonta su base annua all’equivalente energetico di tre milioni e mezzo di tonnellate di prodotti petroliferi.

Mostra la lenta formazione del sale nelle saline solari, la nascita di cristalli diversi, mano a mano che con l’evaporazione si separano i vari sali. “Uno spettacolo che meriterebbe un film, tanto più che simili fenomeni si verificano nelle pentole, quando bolle l’acqua per la minestra, sulle serpentine degli scaldabagni …”

Recupera  e valorizza la conoscenza di una peculiare industria chimico-mineraria, tipica del Mezzogiorno.

“Il recupero della storia e delle tecniche salinare di Margherita contribuirà – secondo Nebbia – a conservare e far crescere la conoscenza e l’orgoglio operaio e imprenditoriale proprio in Puglia, tanto più che le saline di Margherita sono state ricche di innovazioni sia meccaniche, sia chimico-industriali …”

Enzo Guanci – Membro della segreteria nazionale di Clio ’92, Associazione di insegnanti e ricercatori sulla didattica della storia. Ha insegnato Storia e ricoperto il ruolo di dirigente scolastico nella scuola secondaria di II grado. Recentemente ha curato, assieme a Carla Santini, il volume Capire il Novecento, FrancoAngeli editore, Milano, 2008. Svolge attività di formazione, ricerca e aggiornamento sulla didattica della storia.

Acessar publicação original

[IF]

 

Il bisogno di pátria – BARBERIS (CN)

BARBERIS, Walter. Il bisogno di pátria. [Torino]: Einaudi, 2004 e 2010. 141p.. Resenha de: GUANCI, Vicenzo. Clio’92, 7 ago. 2019.

“Come figli di una famiglia senza armonia e senza memorie, gli italiani si sono spesso cresciuti da soli, superando la solitudine con cinismo, con opportunismo, con diffidenza, talvolta con esibizionismo. Ignorando le ragioni e l’utilità di una salvaguardia dell’interesse generale. E’ così che l’idea di patria si è di volta in volta caricata di significati che invece di tendere all’unità hanno accentuato visioni faziose, volte all’esclusione.” (p.7)

Con queste parole W. Barberis  ripropone la questione della patria, o meglio della mancanza  di un’idea di patria per gli italiani, partendo dalla sua considerazione che tale mancanza non ha inizio, come è stato scritto, l’8 settembre 1943, ma ben più in là, almeno cinque, se non quindici, secoli or sono. Egli sviluppa le sua argomentazioni  annodandole intorno a tre temi, o meglio, intorno a tre “bisogni”, a ciascuno dei quali dedica quarantadue pagine: il bisogno di Stato, il bisogno di storia, il bisogno di patria.

Quale patria?

“una patria che non disegni i confini di un’identità chiusa, esclusiva; ma che prenda valore dalla consapevolezza  della pluralità storica dei suoi volti. Una patria che non dimentichi di richiedere a chi appartenga alla comunità il rispetto delle tradizionali virtù civiche: l’obbligazione fiscale, l’esercizio della giustizia, la difesa delle istituzioni dello Stato.”  (p. 10)

Il libro guarda al futuro, sia pure riflettendo sul passato. Si tratta, infatti, di un libro di storia.  Perché, ricorda  l’autore, ” è la storia ciò di cui ha bisogno un popolo: qualcosa che rimetta in ordine, oltre lo spirito di parte, la dinamica degli avvenimenti e le loro molteplici ragioni.” La memoria ha uno sguardo parziale e, pertanto, non può nutrire che sentimenti  patriottici esclusivi; memorie differenti si contendono lo  spazio della patria “una” tendendo ciascuna a farsi storia. E’ proprio questa contesa che una società sana deve evitare. E la storia ha esattamente questa funzione: “affidata a protocolli riconosciuti da una comunità scientifica”, attraverso procedure di analisi e interpretazioni, ha il compito di fornire alla comunità intera uno sguardo generale. Barberis esemplifica tutto questo nelle pagine dedicate a sviluppare il tema del bisogno di storia  indicando le linee per la costruzione di una “dotazione storiografica comunitaria – se vogliamo nazionale – … [uscendo] dalle contingenze e dalle urgenze della contemporaneità. L’Italia ha una storia  millenaria, tutta utile alla definizione dei suoi caratteri attuali e alla possibilità di emendarli.” E qui vengono ricordati i soggetti necessari a costruire una storia d’Italia: la Chiesa innanzitutto, Roma, i municipi, il Mezzogiorno, la Repubblica, la Costituzione.

La storia ci conferma che una comunità priva di un apparato statuale efficiente e condiviso non è davvero tale, poiché ciascuno in misura più o meno grande inclina infine verso il proprio interesse privato, provocando proprio ciò che tanto spesso è stato incolpato agli italiani: opportunismo, trasformismo, dissimulazione, mancanza di senso dello Stato, appunto. Barberis mostrando la necessità di uno Stato per gli italiani ripercorre la storia della sua formazione a partire dalla risposta alla domanda: perché proprio il Piemonte (e non un altro tra gli Stati d’Italia) unificò la penisola fondando lo Stato italiano?

“Il Piemonte, selvatico e periferico, non aveva conosciuto gli splendori della civiltà comunale e signorile… La certezza delle istituzioni, la loro continuità, la prospettiva di durata della dinastia, il suo radicamento territoriale, fecero ciò che non conobbe il resto d’Italia: assicurarono i sudditi che le loro iniziative erano possibili, che avevano i requisiti minimi di riuscita, primo fra tutti il tempo, garante eccellente di ogni contratto…. non furono simpatia, garbo e cultura; ma senso dello Stato, tecnica amministrativa e militare, e anche un certo patriottismo, il bagaglio eccentrico con cui poi i piemontesi si disposero all’incontro con gli altri italiani.”(p. 21)

Il bisogno di patria, la coscienza di appartenere ad un’unica comunità, furono esigenze che si rappresentarono immediatamente dopo la fondazione dello Stato italiano e sono state preoccupazioni presenti finora nella classe dirigente per tutti i centocinquant’anni dal 1861. All’inizio fu soprattutto la letteratura a svolgere il ruolo più importante, si pensi solo alle poesie di Carducci e al Cuore di De Amicis, ma poi dopo la prova tremenda della Grande Guerra, fu il fascismo a forgiare l’idea di patria sovrapponendola alla retorica della guerra, aiutato in questo dalla letteratura futurista. Così si confuse patria con nazionalismo, aggressione e morte, con la guerra appunto.

Oggi, bisogna ricostruire per gli italiani un’idea di patria che escluda non solo guerra ma anche la sopraffazione degli altri popoli , i quali, al contrario, vanno inclusi in un’idea di patria meticciata, alla quale partecipano tutti coloro che hanno la fortuna di abitare un paesaggio unico al mondo, poiché, ricorda Berberis citando Settis, “il nostro bene culturale più prezioso è il contesto, il continuum nel quale si iscrivono monumenti, opere, musei, città e paesaggi, in un tessuto connettivo ineguagliabile… questo è il tratto identitario degli italiani” (p.111).  Se questo è vero, come è vero, vuol dire che insegnare storia d’Italia significa insegnare contemporaneamente geografia d’Italia, poiché ciò che conta imparare, va ribadito, è innanzitutto il contesto, di tempo e di spazio.

Acessar publicação original

[IF]

Che storia! La storia italiana raccontata in modo semplice e chiaro – PALLOTTI (CN)

PALLOTTI, Gabriele; CAVADI, Giorgio. Che storia! La storia italiana raccontata in modo semplice e chiaro. Formello (Roma): Bonacci editore, 2012. Resenha de: GUANCI, Enzo. Clio’92, 7 ago. 2019.

A cura di Enzo Guanci.

“Mangiare non era l’unico intrattenimento. Nel Rinascimento infatti ci si divertiva in molti modi e anche questo ci fa capire come ci si sentisse più liberi. Nel Medioevo la Chiesa controllava tutta la vita delle persone e considerava i giochi come una specie di peccato: quindi non si giocava molto e chi lo faceva doveva un po’ vergognarsi. Invece nel Rinascimento il gioco diventa una parte importante della vita: tutti, ricchi e poveri, giocano in ogni luogo, in casa, nei negozi , nelle osterie, nelle strade e nelle piazze.” (p. 86)

Questa è una notizia tratta dalle ventisette pagine dedicate al Rinascimento nella “storia italiana raccontata in modo semplice e chiaro” da Gabriele Pallotti e Giorgio Cavadi.  L’informazione sui  giochi si trova nella pagina dedicata al “divertirsi ” nel paragrafo “La vita nel Rinascimento”, che costituisce la parte più corposa  del capitolo; gli altri paragrafi sono dedicati alla geopolitica (gli Stati nazionalile signorie, piccoli stati regionali) e a fornire informazioni di contesto che consentano di comprendere il Rinascimento italiano nel quadro europeo. La scelta degli autori è appunto quella di incentrare il loro manuale sulle condizioni di vita, sui costumi, sulle abitudini sociali degli italiani piuttosto che sugli avvenimenti della politica nel corso dei secoli. La selezione dei contenuti quindi affranca il manuale dalla congerie dei numerosissimi eventi del tempo breve della politica, concentrandosi sulla descrizione delle strutture delle società italiane presentate in cinque “epoche”, come programmaticamente esplicitato nell’introduzione:   Roma, il Medioevo, il Rinascimento, l’Ottocento, il Novecento.  Ciò consente di “raccontare” l’Italia dall’VIII sec. a. C.  alla fine del XX secolo in poco più di centoquaranta pagine! E per chi volesse approfondire ci sono tre pagine di riferimenti bibliografici.

In realtà, la storia non viene “raccontata”: non ci sono, per esempio, i personaggi  e gli episodi che tradizionalmente punteggiano la storia d’Italia dei nostri manuali scolastici, che generalmente fanno della storia politica e delle istituzioni un genere storiografico noioso e poco comprensibile agli studenti della scuola secondaria. Gli autori segnalano fin dal titolo lo sforzo di descrivere la carrellata dei ventotto secoli di storia italiana “in modo semplice e chiaro”. Non era facile. Loro ci sono riusciti. Sulla base di due idee-forza: costruire un linguaggio piano, controllato al punto da riuscire “semplice”; costruire un affresco del passato d’Italia sulla base delle conoscenze essenziali a comprendere le trasformazioni delle società e dei popoli italiani dall’epoca romana al Novecento. E, siccome il libro è pensato per comprendere l’Italia di oggi, l’intero testo è punteggiato frequentemente da riferimenti e riflessioni sull’attualità, anche con un apposita rubrica titolata “ieri e oggi” (Per esempio, nelle pagine in cui si parla della repubblica romana e della figura istituzionale del dictator la rubrica viene usata per sollecitare una riflessione sul mondo attuale:

“Anche in tempi più recenti qualcuno ha pensato che un dittatore solo con tutto il potere riesca a governare lo Stato meglio di un’assemblea di rappresentanti. Ad esempio in Italia, durante il fascismo, Mussolini…. Uno Stato in cui decide una persona sola si chiama assoluto o autoritario. Uno Stato in cui le decisioni sono prese dai rappresentanti eletti da tutti i cittadini si chiama democratico. Hai mai pensato cosa si guadagna e cosa si perde in ciascuno di questi sistemi?”).

Leggendo attentamente il libro a noi pare emerga chiara la difficoltà di raccontare la storia politica “in modo semplice e chiaro” senza cadere nella banalizzazione. Un esempio, a noi sembra, possa essere fornito dalle due-tre pagine dedicate al Risorgimento (L’Italia diventa un Paese unito, pp. 97-99) nelle quali Vittorio Emanuele II, Cavour, Garibaldi  si muovono come personaggi di un “racconto” dal quale sono espunte le problematizzazioni del fenomeno risorgimentale, perché i problemi non si possono “raccontare” e se lo si fa è quasi impossibile farlo con un “linguaggio semplice e chiaro”: si rischia appunto la “banalizzazione”. I nostri autori hanno intelligentemente evitato questo rischio proponendo una storia d’Italia dal punto  di vista economico e sociale, come espressamente dichiarato nell’introduzione.

Infine va anche sottolineato che il libro non dimentica la sua funzione di strumento per l’apprendimento della storia e pur non proponendo esplicitamente esercitazioni per sviluppare le abilità di base della disciplina, l’uso di linee del tempo, tabelle, cartine tematiche, illustrazioni non di carattere esornativo bensì inserite e commentate nel testo, e l’esortazione frequente a riflettere su analogie e differenze tra passato e presente (Ieri e oggiPensaci su) indica implicitamente a chi ha la responsabilità dell’insegnamento la strada migliore per interessare gli allievi a imparare la storia d’Italia.

Maggio 2012

Acessar publicação original

[IF]

Frontiers of Science: Imperialism and Natural Knowledge in the Gulf South Borderlands, 1500-1850 – STRANG (THT)

STRANG, Cameron B. Frontiers of Science: Imperialism and Natural Knowledge in the Gulf South Borderlands, 1500-1850. Williamsburg, VA: Omohundro Institute of Early American History and Culture and Chapel Hill, NC: The University of North Carolina Press, 2018. 376p. Resenha de: CLUXTON, Hadley Sinclair. The History Teacher, v.52, n.4, p.728-730, ago., 2019.

On the cusp of the nineteenth century, astronomers employed by Spain and the United States set out to survey the boundary between Spanish Florida and the United States as negotiated in the 1795 Treaty of San Lorenzo. Armed with a variety of scientific apparatus and a bevy of enslaved black men, the two imperial parties—both, ironically, headed by men of British descent—began the arduous task of making the astronomical observations that would establish the new line between nations. Each side boasted of their astronomical prowess, and each side denigrated the other’s supposed failures. However, it was not these imperially funded astronomers who ultimately decided the fate of this expedition. By their own admission, the surveyors never could have hacked their way through the dense foliage or persevered through the Mississippi River’s swamplands without the involuntary assistance of the enslaved black men rented out from nearby plantations. Furthermore, the entire expedition came to a screeching halt in 1800, when the armed resistance of Creek and Seminole peoples forced the empires to abandon their boundary survey. This is but one of many fascinating case studies that historian Cameron B. Strang presents on the production of natural knowledge in the Gulf South in Frontiers of Science: Imperialism and Natural Knowledge in the Gulf South Borderlands, 1500-1850.

Taking cues from one of his mentors, the inimitable historian Jorge Cañizares- Esguerra, Strang joyously exhumed from the archives rich and entangled narratives on the production of natural knowledge in the Gulf South borderlands and presented these histories in all their glorious complexity. The positive influence of other mentors can also be seen in Strang’s work: Jan Golinski’s constructivism, James Sidbury’s work on race, and Julia Rodriguez’s histories of science in Latin America. In Frontiers of Science, Strang presents a mosaic of case studies highlighting a diversity of Gulf South borderlands places, voices, and branches of natural knowledge. Incorporating a variety of knowledge practices—including astronomy, cartography, conchology, now-debunked phrenology, botany, and ethnography—these case studies defy the myth that only Anglo-Americans in the original thirteen colonies participated in the production of natural knowledge in America, or that scientific knowledge merely diffused outward from metropole to periphery. Rather, Strang argues that “natural knowledge and imperialism evolved together” (p. 21) and that indigenous peoples; free and enslaved blacks; Europeans from France, Spain, and Britain; Anglo-Americans; and creoles all formed part of a rich, polycentric network of intellectual exchange often characterized by loyalties as malleable as political boundaries.

The case studies in Frontiers of Science could make worthwhile readings for undergraduate or graduate classes in the history of science, intellectual history, U.S. history, Latin American history, indigenous history, or black history, just to name a few. Although Strang regularly emphasizes the interconnectedness between imperialism and the production of knowledge, he also builds a strong case demonstrating the importance of free and enslaved blacks in the history of natural knowledge that could (and should) be included in any classroom, given appropriate professorial curating. Until U.S. imperialism ossified the United States’ control over the region, blacks in the Gulf South participated at nearly every level of natural knowledge production. In addition, Anglo-American plantation owners who generously supported the advancement of science did so with wealth created through the labor of enslaved blacks—blacks who were actively oppressed intellectually as well as physically. To this end, Strang presents evidence that white supremacists in the Gulf South wielded science to actively construct the lie of black intellectual “inferiority” in order to justify slavery. As Strang stated, “the routes that supported slavery and science were often one and the same throughout the greater Caribbean” (p. 178). Students at every age deserve to learn about the historical ways in which Anglo-Americans created and perpetuated the structural inequality that persists to this day.

One challenge with incorporating this book into a pre-existing curriculum is the fact that it defies easy categorization. While the book flows well through a variety of case studies, Strang does not oversimplify his narratives. Furthermore, the histories stretch from 1500 to 1850 and include multiple imperial, indigenous, and African or African-descended groups, which poses serious issues of periodization.

This (much-needed) presentation of the entangled nature of knowledge production creates problems when trying to squash a round story into a square framework.

If a curricular rewrite is not feasible, one suggestion might be to excerpt case studies where they fit into a pre-existing outline. Another suggestion is to change the frameworks within which we study and teach history.

Strang calls for diversity in places and voices, as well as a more inclusive understanding of what constitutes “science.” Apart from a dearth of female perspectives, this book achieves that goal. Frontiers of Science is an intellectual love song to the Gulf South’s forgotten histories of natural knowledge, a quilt of intriguing case studies that relish in their inability to be readily categorized and constrained within our narrow historiographic frameworks. Strang’s book is a solid contribution to a burgeoning field—the history of natural knowledge in the Atlantic World—a field perhaps not in the process of consolidation, but rather in the process of decolonization.

Hadley Sinclair Cluxton – Odyssey School (Asheville, North Carolina).

Acessar publicação original

[IF]