Os anos 20 e os projetos de modernização do Brasil | Cadernos de Pesquisa do CDHIS | 2022

Fundadores do Partido Comunista em 1922.
Fundadores do Partido Comunista, em 1922. De pé, da esquerda à direita, estão: Manoel Cendon, Joaquim Barbosa, Astrojildo Pereira, João da Costa Pimenta, Luís Peres e José Elias da Silva. Sentados, da esquerda à direita: Hermogênio Silva, Abílio de Nequete e Cristiano Cordeiro | Imagem: Arquivo ASMOB/IAP/CEDEM/Blog da Boitempo.

É com grande satisfação que apresentamos o Dossiê “Os Anos 20 e os Projetos de Modernização do Brasil” neste v. 35, n. 1 (2022), da Revista Cadernos de Pesquisa do CDHIS, do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Uberlândia. Este Dossiê traz como tema os mais recentes debates historiográficos e pesquisas, objetos, problemas e fontes de análise sobre o período da década de 1920 no Brasil, as diferentes visões de modernidade e modernização para o país. Este número é resultado da contribuição de pesquisadoras e pesquisadores de diferentes instituições do país, e se caracterizam pelo olhar e pelo potencial transdisciplinar dos temas, objetos e abordagens apresentados, o que reforça o salutar e promissor caráter coletivo da produção científica no país.

No dia 7 de setembro de 2022 será comemorado o Bicentenário da Proclamação da Independência do Brasil. O tema e a celebração encontram-se em evidência, sobremodo, devido ao contexto político, social, econômico e cultural que o país se encontra atualmente. O cenário de ano eleitoral de 2022 imprime maior expectativa acerca da centralidade que o tema assumirá, inescapavelmente. É um momento oportuno para novas propostas de interpretação sobre os significados de 1822 na história do Brasil, como também o foi em 1922, ano do primeiro Centenário. Um ano que simboliza uma década que pode ser considerada um divisor de águas na história da modernização do país.

A década de 1920 foi fortemente marcada pela miríade de reflexões em torno do Centenário da Independência. Além de reflexões, esse período também ajuda a fixar o cenário de intensa ebulição política e social, em virtude da intensificação das disputas entre diferentes projetos e horizontes de um “Brasil moderno” que se redesenharam nos anos 1920. A realização da Semana de Arte Moderna de 1922, a fundação do PCB (Partido Comunista Brasileiro) e do núcleo conservador do Centro Dom Vital, o início do movimento tenentista e a forte militarização da política, dentre outros eventos, marcaram essa década decisiva no processo de modernização nacional vivido nas décadas seguintes. No campo da cultura, a identidade nacional ganhou seus contornos mais sólidos que a sustenta substancialmente até hoje. No campo político, a década de 1920 também foi definidora de alguns dos principais temas, imaginários, representações e conceitos presentes nos ideários, vocabulários e culturas políticas que duram até nossos dias. No campo social, as lutas dos movimentos operários e camponeses construíam algumas das maiores conquistas de direitos que a classe trabalhadora brasileira alcançou na história de sua formação.

Apresenta-se, portanto, especialmente para os campos da História Política e Social, História Cultural e História Intelectual, Patrimônio e Memória, uma oportunidade para visões e abordagens originais e inovadoras que nos levem a refletir tanto sobre a imaginação, no passado, do Brasil do futuro, quanto sobre o presente, no contexto do Bicentenário da Independência do Brasil.

As contribuições trazidas neste volume começam com o artigo “Reflexões sobre Raízes do Brasil: um ensaio histórico da obra e de sua perspectiva weberiana”, que traz reflexões sobre o contexto histórico em que foi produzido esse livro clássico de Sérgio Buarque de Holanda. A autora Tatiana Vasconcelos Fleming Machado aborda algumas das principais influências no pensamento do autor nesse período, como o movimento modernista brasileiro e a sociologia weberiana, com enfoques sobre o processo de construção das identidades do povo brasileiro e sobre a formação da burocracia estatal no Brasil, avaliando suas implicações históricas no passado e no presente.

O segundo artigo, “Fascismo e modernismo: a atuação de Plínio Salgado na década de 1920” apresenta um tema de pesquisa ainda pouco explorado pela historiografia brasileira: as relações e permeabilidades entre modernismo e fascismo no Brasil dos anos 1920. Os autores Leandro Pereira Gonçalves e Gabriela Santi Pacheco tomaram como fonte o papel de Plínio Salgado, fundador e chefe nacional da Ação Integralista Brasileira (AIB), que foi o maior movimento fascista fora da Europa nos anos 1930. O artigo traz em suas análises contribuições para a compreensão da inserção de Salgado no modernismo como um estágio fundamental para a elaboração de seu pensamento político fascista, cuja influência se faz sentir no campo das direitas radicais brasileiras até os dias de hoje.

Na sequência, o tema central do terceiro artigo deste dossiê também é a vida política brasileira. O artigo “Olga, a agente secreta”, de Thiago Pacheco, trata uma personagem histórica muito conhecida, a agente comunista alemã Olga Benário, através de um olhar pouco explorado sobre a sua trajetória política, ressaltando sua atuação no campo das chamadas “Operações Encobertas”, missões secretas com objetivos políticos. Através dessa chave de leitura, o artigo buscou contribuir para a compreensão tanto da atuação de Olga ao lado do comunista brasileiro Luiz Carlos Prestes, no contexto histórico marcado pelo Levante Comunista de 1935. Esse tipo de atuação de agentes comunistas no país é trazido como parte de um esforço de entendimento dos diferentes caminhos que as visões e projetos de um Brasil moderno envolveram no período entre as duas Guerras Mundiais.

No quarto artigo do dossiê, “O Centenário da Independência chegou: o estado do Piauí na Exposição Internacional de 1922”, Laila Pedrosa da Silva aborda o cenário interno do estado do Piauí na Exposição Internacional de 1922, evento realizado no âmbito das celebrações do Centenário da Independência do Brasil, e que tinha como objetivo promover o ideário de um Brasil moderno. O artigo apresenta o posicionamento dissonante do estado e da elite piauiense em face do chamado da capital federal, Rio de Janeiro, e sua insatisfação com a alegada marginalização do Piauí no projeto de modernização nacional então em curso, o que se refletiu na participação pouco engajada do estado na Exposição Internacional de 1922 e marca os estudos sobre memória e patrimônio do Piauí.

Por fim, seguindo a temática da memória e patrimônio, o quinto e último artigo, “O patrimônio à luz da Primeira República: o discurso de Jair Lins” analisou as noções de patrimônio em formação no Brasil dos anos 1920. A pesquisa de Alexandre Alves de Sousa Moreira abordou o discurso e a ação legislativa de Jair Lins sobre a questão patrimonial no país, como parte importante dos amplos debates em torno dos temas relacionados ao progresso, à civilização, à propriedade e à modernidade no Brasil. A pesquisa parte da perspectiva metodológica da história dos conceitos alemã, apoiando sua abordagem do conceito de “patrimônio” nas categorias meta-históricas de espaço de experiência e horizonte de expectativa, buscando elucidar seu caráter eminentemente moderno no contexto histórico da Primeira República brasileira.

Boa leitura.


Organizadores

Pedro I. D. Tanagino –  Pós-Doutorando em História na PUC-SP.

Claudia Ribeiro Viscardi – Professora Titular do Departamento de História na UFJF.


Referências desta apresentação

TANAGINO, Pedro I. D. ;  VISCARDI, Claudia Ribeiro. Apresentação. Cadernos de Pesquisa do CDHIS. Uberlândia,  v. 35, n.1, p. 15-18,  jan./jun. 2022. Acessar publicação original [DR]

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