Feminismo e Política: uma introdução | Felipe Luis Miguel e Flávia Biroli

O objetivo dos autores em Feminismo e Política: uma introdução, como o nome sugere, é propor uma discussão introdutória referente à teoria política feminista, apontando e discutindo as diferenciadas vertentes do movimento feminista, bem como as suas contribuições no combate às desigualdades e na busca de uma sociedade mais justa. A obra, publicada em 2014, é organizada no formato de uma pequena coletânea, que é composta por onze artigos.

Luis Felipe Miguel e Flávia Biroli são os organizadores e os autores dos estudos. Luis Felipe Miguel é doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp, professor titular do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília – UNB, onde coordena o Grupo de Pesquisa sobre Democracia e Desigualdades – Demodê. O estudioso é autor de livros como: Mito e discurso político[1] ; Política e mídia no Brasil [2] ; O nascimento da política moderna [3] ; Mídia, representação e democracia [4] ; Coligações partidárias na nova democracia brasileira [5] ; Caleidoscópio convexo: mulheres, política e mídia [6] ; Teoria política e feminismo: abordagens brasileiras [7] ; Teoria política feminista: textos centrais [8] ; Desigualdades e democracia: o debate da teoria política [9] ; Coligação e disputas eleitorais na Nova República [10]; Encruzilhadas da democracia [11] , [1]2 .

Flávia Biroli, como mencionado acima, é parceira de pesquisa e publicação de Luis Felipe Miguel. É doutora em História pela Unicamp, professora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq. Coordena a área temática “Gênero, democracia e políticas públicas”, da Associação Brasileira de Ciência Política – ABCP. Além dos livros em parceria com Luis Felipe Miguel, Flávia é autora dos livros: Autonomia e desigualdades de gênero: contribuições do feminismo para a crítica democrática [13]; Família: novos conceitos [14].

Logo na introdução do livro, em um texto escrito pelos parceiros de pesquisa, eles destacam que:

A teoria política feminista é uma corrente profundamente plural e diversificada, que investiga a organização social tendo como ponto de partida as desigualdades de gênero. Com essa análise, evidencia-se alguns dos limites mais importantes das instituições vigentes, que, a despeito de suas pretensões democráticas e igualitárias, naturalizaram e reproduziram assimetrias e relações de dominação. (MIGUEL; BIROLI, 2014, p. 07)

Destacando que toda teoria feminista é política, os autores tecem uma crítica às teorias políticas tradicionais, ressaltando que estas tendem a aceitar sem questionamento a distinção entre as esferas pública e privada, mantendo-se cegas à relevância política da desigualdade de gênero. A teoria política feminista adota temas ausentes ou marginais nas correntes hegemônicas destas. “Expõe as relações de poder em dimensões da vida cotidiana que não estão no escopo nas relações de boa parte da teoria política, o que é fundamental à própria definição do político no feminismo” (MIGUEL e BIROLI, 2014, p. 13).

Referente ao feminismo, os autores apontam que “no processo de suas próprias lutas, ele foi capaz de transformar sua agenda e viu também sua reflexão sobre o mundo social” (MIGUEL e BIROLI, 2014, p. 08). Discutindo os pontos centrais dos anseios feministas do início do século XX, destaca-se que prevalecia o pensamento de que o alcance do direito das mulheres à política seria capaz de diminuir as desigualdades no campo. A conquista do direito ao voto foi a principal bandeira do movimento Sufragista. No entanto, vale salientar que “a pífia presença das femininas nos espaços de poder após a obtenção desse direito indicou a necessidade de identificar os mecanismos de exclusão mais profundos, além da restrição consignada em lei” (MIGUEL e BIROLI, 2014, p. 08). O mesmo se pôde dizer em relação à conquista da educação. “Cada vez mais, em vez de incorporação das mulheres às ordens existentes, tornava-se clara a necessidade de uma transformação profunda dessa ordem” (MIGUEL e BIROLI, 2014, p. 08).

A reflexão sobre a realidade de sub-representação feminina na política mostra-se necessária, desde fatores como a divisão desigual (sexual) do trabalho até a construção e perpetuação de estereótipos estigmatizantes. A partir da leitura da obra e, deixando para trás os estereótipos que definiam as mulheres como menos interessadas na política, é preciso considerar essas desigualdades para compreender por que elas continuam sub-representadas, como grupo, em todos os âmbitos da política brasileira (MIGUEL e BIROLI, 2014, p. 12).

Ainda na introdução, os autores tecem uma crítica ao individualismo abstrato do pensamento liberal, apontando no sentido de uma crítica da razão e do homem moderno, característica marcante do pós-estruturalismo. Por fim, destaca-se que o livro é resultado de pesquisas e publicações dos autores na área de gênero e política nos últimos anos, impulsionado pelo sentimento de carência de discussões condensadas sobre o tema, quando fora ministrado a disciplina de Gênero e Política no programa de pós-graduação em ciência política da UNB, em 2009.

O primeiro capítulo, O feminismo e a Política, texto de autoria de Luis Felipe Miguel, discute a questão da desigualdade entre homens e mulheres, enquanto um traço presente na maioria das sociedades, assumida como um reflexo da natureza diferenciada dos dois sexos. Nessa perspectiva, ele salienta que “ao recusar essa compreensão, ao denunciar a situação das mulheres como efeito de padrões de opressão, o pensamento feminista caminhou para uma crítica ampla do mundo social, que reproduz assimetrias e impede a ação autônoma de muitos de seus integrantes” (MIGUEL, 2014, p. 17).

Apontando as duas primeiras “ondas” do feminismo existentes no Brasil, Luis Felipe Miguel apresenta algumas de suas características, principais pensamentos e defensoras. E finaliza o texto ressaltando que:

O debate sobre a dominação masculina nas sociedades contemporâneas – ou o patriarcado, como preferem algumas – abriu portas para tematizar, questionar e complexificar as categorias centrais por meio das quais era pensado o universo da política, tais como as noções de indivíduo, de espaço público, de autonomia, de igualdade, de justiça ou de democracia (MIGUEL, 2014, p. 17).

No segundo capítulo, O público e o Privado, Flávia Biroli realiza uma belíssima discussão referente a esses dois espaços de socialização, afirmando que “se há algo que identifica um pensamento como feminista é a reflexão crítica sobre a dualidade entre a esfera pública e a esfera privada” (BIROLI, 2014, p. 31). Para a autora, essas esferas tem um caráter histórico e geraram implicações para homens e mulheres. Assim, questioná-las significa questionar a naturalização das posições firmadas por elas.

Apontando a dualidade estabelecida entre a universalidade versus particularidade, Flávia Biroli ressalva que “na modernidade, a esfera pública estaria baseada em princípios de universalidade, na razão e na impessoalidade, ao passo que a esfera privada abrigava as relações de caráter pessoal e íntimo” (BIROLI, 2014, p. 32). Aponta assim, a criação de estereótipos de gênero desvantajosos para as mulheres.

Papeis atribuídos a elas, como a dedicação prioritária à vida doméstica e aos familiares, colaboram para que a domesticidade feminina fosse vista como um traço natural e distintivo, mas também como um valor a partir do qual outros comportamentos seriam caracterizados como desvios. A natureza estaria na base das diferenças hierarquizadas entre os sexos (BIROLI, 2014, p. 32).

Dessa forma, a autora destaca que a crítica às desigualdades de gênero está intrinsicamente ligada à crítica das fronteiras convencionais entre o público e o privado nas abordagens teóricas, na prática política, nas normas e nas instituições. Assim, “a garantia de liberdade e autonomia para as mulheres depende da politização de aspectos relevantes da esfera privada” (BIROLI, 2014, p. 34).

Finalizado o artigo, Flávia ressalta as contribuições do feminismo no combate à dualidade público/privado, destacando que as críticas sobre essa dualidade estão longe de ser consensual entre os feminismos, mas está no interior desses. “O feminismo mostra, assim, que é impossível deslocar a esfera política da vida social, a vida pública da vida privada, quando se tem como objetivo a construção de uma sociedade democrática” (BIROLI, 2014, p. 33).

Também de autoria de Flávia Biroli, o terceiro capítulo versa sobre a Família e a Justiça, e, logo de início, a autora aponta que “a necessária interface entre o caráter de intimidade e a singularidade dos laços familiares e seu caráter político e institucionalmente talhado faz da família um tema complexo” (BIROLI, 2014, p. 47).

Em meio à essa complexidade, Flávia aponta as influências políticas e normas institucionais que expressam relações de poder na constituição da “família”. Assim, a autora destaca: “A família é foco de disputa nas teorias e na prática política, o que incide diretamente sobre sua definição. É, também, um tema incontornável quando há preocupação com as desigualdades de gênero e, por isso, um dos objetos de reflexão clássicos do feminismo” (BIROLI, 2014, p. 47). Nessa perspectiva, a autora aponta as diversas questões relacionadas à constituição de um modelo de família e suas implicações aos diferentes grupos sociais.

Em conjunto, a divisão sexual do trabalho e a invisibilização do trabalho não remunerado realizado pelas mulheres na esfera doméstica e familiar obscurecem uma dimensão importante da desigualdade de gênero e enfraquecem o poder de barganha das mulheres individualmente. As muitas transformações ocorridas nas últimas décadas, como a maior profissionalização e a entrada massiva das mulheres no mercado de trabalho em diversos ramos de atividade, não seriam de fato acompanhado pela redivisão das tarefas domésticas (BIROLI, 2014, p. 59).

Luis Felipe Miguel escreve o quarto capítulo referente A igualdade e a diferença. Nele, o autor salienta a centralidade ocupada pela “igualdade” na pauta de diversos movimentos sociais modernos, a exemplo do feminismo. As autoras feministas ou préfeministas vão enfatizar, sobretudo, “que as mulheres são iguais aos homens da capacidade intelectual, no potencial de contribuição para a sociedade e na virtude, contrapondo-se às visões que, Aristóteles e Rousseau, legitimavam a inferioridade feminina como fundada numa menor capacidade natural […] (MIGUEL, 2014, p. 63).

Discutindo as diferentes vertentes do feminismo e suas posições sobre a questão da igualdade e o reconhecimento das diferenças, Luis Felipe Miguel aponta que a tensão entre a valorização da diferença e afirmação da igualdade de gênero também se faz presente na relação do feminismo com o multiculturalismo, “corrente que questiona a importância dos valores ocidentais como se tivessem curso universal, e afirma a necessidade de garantir a vigência de modos de vida minoritários” (MIGUEL, 2014, p. 70). Nota-se, nesse ponto, uma crítica à universalização do comportamento masculino. Por fim, o autor ressalta a grande oposição entre uma ligação direta e determinista entre o sexo biológico e os comportamentos dos indivíduos.

A aposta radical das vertentes mais avançadas do feminismo é na desestabilização de qualquer relação fixa entre o sexo biológico e os comportamentos, preferencias e papéis sociais. Em suma, na desconstrução da categoria “gênero” e no sonho de ‘uma sociedade andrógena e sem gênero, na qual a anatomia sexual é irrelevante para quem a pessoa é, o que faz e com quem faz amor, como escreveu Gayle Rubin. (MIGUEL, 2014, p. 77)

O quinto capítulo, Identidade e Diferença, se apresenta como um desdobramento do anterior, colocando em evidência um novo ponto, o da identidade. O autor retoma a discussão relacionada à constituição essencialista de estereótipos relacionados à questão biológica, assim como aponta diferentes perspectivas do feminismo favoráveis e contrários à ideia de uma “identidade” feminina. Uma importante crítica à essa tentativa de se constituir uma identidade feminina diz respeito ao perigo de que a noção genérica de mulher funciona no pensamento feminista na mesma forma que a noção genérica de homem funciona na filosofia ocidental, obscurecendo a heterogeneidade. A produção de uma noção genérica de mulher, quando não considera a mulher negra, pobre e trabalhadora é apontada então como problemática. Nesse sentido, “Feministas negras questionaram os desdobramentos dessa construção da identidade da mulher a partir da experiência das brancas” (MIGUEL, 2014, p. 85).

Contra esses argumentos, as autoras que defendem um feminismo unificado, que supere as diferenças de classe ou raça, afirmam que a forma mais paradigmática de sexismo é verificada tendo por objeto as mulheres que não sofrem outras formas e opressão – tomá-las como modelo permite identificar um sexismo puro, não contaminado por outros tipos de preconceito. (MIGUEL, 2014, p. 90)

As diferentes vertentes do feminismo não tomariam uma posição homogênea no que diz respeito à questão de uma identidade feminina. Luis Felipe Miguel ressalta os dois argumentos das vertentes opostas. Uma afirmaria que o reconhecimento de muitos tipos de mulheres não se mostraria como uma ameaça à coerência do feminismo, pensamento defendido por Elizabeth Spelman. O outro argumento seria a afirmação de que tantas singularidades comprometeria a unidade na ação contra o sexismo, posição assumida por Catharine MacKinnon.

No sexto capítulo, Gênero e Representação Política, Luis Felipe Miguel faz um apanhado referente aos possíveis fatores que proporcionam o discrepante interesse e acesso das mulheres à política partidária, ressaltando que a abolição das barreiras legais não representou o acesso às condições de igualdade no ingresso das mulheres no referido campo. Dentre os fatores apontados estão: insulamento das mulheres na vida doméstica, a dupla jornada de trabalho e a acomodação à ordem política.

Os grupos dominantes dispõem de mais bens materiais, que lhes permitem agir de forma eficaz na arena política. Está incluído ai o tempo livre, primeiro recurso necessário para a atividade política. […] Como, dada a organização atual da sociedade, as mulheres são as principais responsáveis pela gestão de suas unidades domésticas, o tempo se torna uma barreira importante para o início ou o progresso de uma carreira política; com frequência, limitam sua ambição devido a questões como a necessidade de permanecer morando na mesma cidade, que são bem menos presentes nos cálculos dos políticos homens. (MIGUEL, 2014, p. 105-106)

Apontando dados que demonstram a baixa proporcionalidade de mulheres na política, o autor destaca que a temática relacionada à participação feminina do cenário foi integrada à agenda feminista nas últimas décadas do século XX. Correlacionado ao fato, ele ressalta que houve uma revalorização das instâncias do Estado. Passou-se então a repensar um agir sobre o terreno institucional, constituindo-se como uma aceitação das estruturas políticas vigentes e redução da aposta em uma forma radicalmente novas de ação coletiva. Por outro lado, essa aproximação com as esferas institucionais teria possibilitado algumas conquistas, como a criação de conselhos estaduais das mulheres, delegacias especializadas de atendimento à mulher, Conselho Nacional dos Direitos da Mulher e a Secretaria de Política Pública para as Mulheres, fundada em 2003. “Mais recentemente, o chamado feminismo de Estado passou a enfatizar a importância de fazer com que as estruturas de exercício do poder político incorporassem demandas vinculadas aos direitos das mulheres” (MIGUEL, 2014, p. 96). Ou seja, a tentativa de sensibilização dos aparelhos do Estado. O autor tece uma crítica, afirmando que esse viés do feminismo deixou para traz o trabalho de base, a conscientização e o esforço de transformação da vida cotidiana.

Outro aspecto discutido ainda nesse capítulo diz respeito à Lei de Cotas, aplicadas na política. Quanto a esse ponto, Luis Felipe Miguel ressalta que “do ponto de vista da teoria política, as cotas implicam uma ruptura com um princípio basilar da ordem liberal, ao indicar que um grupo (as mulheres) deve ter preservado seu direito de fazer ouvir nos espaços de representação. Para o liberalismo, o único sujeito de direito é o indivíduo” (MIGUEL, 2014, p. 97). Aponta ainda alguns problemas relacionados à aplicação e à efetividade práticas das cotas, e destaca a posição de Nancy Fraser, que evidencia a distinção entre estratégias afirmativas e estratégias transformadoras. Estratégias Afirmativas seriam aquelas que visariam corrigir resultados injustos sem atingir as estruturas sociais subjacentes que os geram. As Transformadoras objetivariam restaurar o quadro generativo subjacente.

O autor finaliza o capítulo destacando alguns obstáculos encontrados pelas mulheres no acesso à vida política, como a própria configuração do campo político.

A política se organiza na forma de um ‘campo’, no sentido atribuído ao termo pela sociologia de Pierre Bourdieu é um espaço social estruturado, que possui uma hierarquia interna própria e que exige, dos seus agentes que nele ingressam, a aceitação determinada lógica e de certos padrões de comportamento, sob pena de serem marginalizados. Constituído historicamente como um ambiente masculino, o campo político trabalha contra as mulheres impondo a elas maiores obstáculos para que cheguem às posições de maior prestígio e influência, mesmo depois de terem alcançado cargos por meio de votos. (MIGUEL, 2014, p. 105)

No capítulo subsequente, Autonomia, Dominação e Opressão, Flávia Biroli ressalta que a defesa da autonomia das mulheres nas abordagens feministas é acompanhada de fortes críticas e redefinições do ideal liberal no que diz respeito a universalização dos direitos. Ressaltando a errônea correlação entre autonomia, consentimento e escolhas voluntárias, a autora aponta que o liberalismo defende o respeito às escolhas voluntárias, sem levar em conta as relações de subordinação. “O acesso a recursos e o reconhecimento do valor e da capacidade dos indivíduos para definir a própria vida variam segundo suas características e sua posição nas relações de poder, entre elas o gênero” (BIROLI, 2014, p. 110).

Outro ponto de bastante destaque diz respeito à crítica à privatização das relações de cuidado, majoritariamente atribuída às mulheres, o que levaria à uma equivocada associação convencional sobre os papéis de gênero e, consequentemente, à redução da autonomia das mulheres.

A privatização das relações de cuidado e dependência oculta seu impacto diferenciado na vida de mulheres e homens – as primeiras são tipicamente prejudicadas por estar na posição de cuidar dos mais vulneráveis, em atividades não remuneradas ou mal remuneradas. Impede, ainda, a tematização adequada das conexões entre dependência e desigualdade (BIROLI, 2014, p. 121).

O capítulo oito diz respeito ao debate sobre o aborto, no qual Flávia Biroli apresenta as diferentes posições da sociedade relacionadas ao tema.

O debate sobre o aborto no feminismo poder ser visto, em primeiro lugar, como um desmembramento da visão crítica das relações entre a esfera privada e a esfera pública, com a politização do que ocorre na primeira e o entendimento de que o modo de organização de uma delas está vinculado, permanentemente, ao modo de organização da outra. (BIROLI, 2014, p. 123)

Algumas feministas vêm destacando o fato de que sem o controle sobre a reprodução, as mulheres dificilmente conseguirão atuar profissional e politicamente como maior igualdade em relação aos homens, dessa forma, essa ausência de controle seriam um dos principais obstáculos das mulheres à vida pública/política.

Finalizando, Flávia aponta as vertentes pró-vida e pró-escolha e suas justificativas, demonstrando, de fato, o conflito de ideias e opiniões relacionados ao tema presentes na sociedade.

O debate atual sobre o direito ao aborto ternou-se mais polarizado e ganhou destaque na agenda política em diversos países do Ocidente das últimas décadas. No início do século XXI, as posições “pró-vida”, vinculada principalmente à Igreja Católica, e “pró-escolha”, ligadas aos movimentos feministas, são parte das clivagens nas disputas eleitorais e político-partidária. (BIROLI, 2014, p. 125)

Os dois últimos capítulos versam sobre O debate sobre a pornografia e O debate sobre prostituição, no quais os autores apontam que a posição do movimento feminista não apresenta posturas homogêneas. Nesse sentido, questões como a objetificação feminina, o controle do corpo, a autonomia, as liberdades individuais e de expressão são postas em reflexão sob o amparo das teorias feministas.

Por fim, numa curta conclusão, os autores fazem uma contundente crítica ao feminismo, apontando que “este confronta as desigualdades, mas o faz de maneiras diversas” (MIGUEL e BIROLI, 2014, p. 147). Segundo os autores, para a maior parte do feminismo que emergiu nos anos de 1960 e 1970, o objetivo seria estabelecer hierarquias de prestígio e de repartir a riqueza, em vez de almejar um programa ambicioso que exigisse a mudança na maneira de distribuir o poder. Configuraria, então, um feminismo em que as estruturas sociais são menos questionadas.

Luis Felipe Miguel e Flávia Biroli destacam que a construção de problemas e a produção de críticas à sociedade e à política precisam levar em conta gênero, classe social e raça, além de outros elementos, como sexualidade, deficiência ou geração. Sem isso, a igualdade almejada não passaria de uma falácia. Por fim, apontam as imensas contribuições da teoria política feminista, ao ponto que ressaltam a necessidade da retomada do olhar crítico e transformador “que produziu e produz e melhor do feminismo como movimento social de também como teoria política” (MIGUEL e BIROLI, 2014, p. 151-152).

Composta por textos de leitura fluida e prazerosa, a obra alcança o objetivo proposto, de discutir a teoria política feminista à luz das perspectivas do movimento feminista e seus diferentes pontos de vista. Demonstrando imensa afinidade de pesquisa portada por seus autores, os textos carregam algumas singularidades destes, como aproximações com determinadas temáticas em detrimento de outras, a exemplo da aproximação de Luis Felipe Miguel com a questão da representatividade feminina na política e do debate sobre o aborto por Flávia Biroli.

De caráter introdutório, os escritos presentes na obra podem e devem ser utilizados nos cursos de graduação e grupos de estudos relacionados às temáticas abordadas. Dessa forma, vale destacar a grande contribuição historiográfica da obra Feminismo e Política: uma introdução, em meio a uma produção científica ainda incipiente e que possui uma visibilidade relativamente pequena, por, talvez, ser um tema considerado de menor importância, bem como demais temáticas relacionadas aos feminismos e suas contribuições político-sociais.

Notas

1. Campinas: Editora Unicamp, 2000.

2. Brasília: Plano, 2002.

3. Brasília: Editora UnB, 2007; edição revista e ampliada, Brasília: Editora UnB, 2015.

4. Organização com Flávia Biroli; São Paulo: Hucitec, 2010.

5. Organização com Silvana Krause e Rogério Schmitt; São Paulo: Editora Unesp, 2010.

6. Com Flávia Biroli; São Paulo: Editora Unesp, 2011.

7. Organização com Flávia Biroli; Vinhedo: Horizonte, 2012.

8. Organização com Flávia Biroli; Niterói: Eduff, 2013.

9. Organização; São Paulo: Editora Unesp, 2016)

10. Organização com Silvana Krause e Carlos Machado; São Paulo: Editora Unesp, 2017).

11. Organização com Flávia Biroli; Porto Alegre: Zouk, 2017, no prelo.

12. Informações sobre os autores disponibilizadas em: http://www.demode.unb.br/equipe . Acesso em 28 de abril de 2017.

13. Niterói: Eduff, 2013.

14. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2014.

Referência

MIGUEL, Luis Felipe; BIROLI, Flávia. Feminismo e Política: uma introdução. São Paulo: Boitempo, 2014.

Dayanny Rodrigues – Doutoranda em História pela Universidade federal de Goiás (UFG). Graduada e Mestre em História pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Pesquisadora dos temas mulher e política e História comparada. E-mail: [email protected]


MIGUEL, Luis Felipe; BIROLI, Flávia. Feminismo e Política: uma introdução. São Paulo: Boitempo, 2014. Resenha de: RODRIGUES, Dayanny. Os feminismos e suas perspectivas: teoria e militância. Revista de História Bilros: História(s), Sociedade(s) e Cultura(s). Fortaleza, v.5, n.9, p. 302-312, maio/ago., 2017. Acessar publicação original [DR]

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