História dos Rios no Brasil / Revista Mosaico / 2008

O presente número da revista Mosaico traz como temática a História dos Rios no Brasil. Essa temática é fruto da aproximação e cooperação acadêmica entre universidades brasileiras e francesas (Universidade Federal de Goiás, Universidade Católica de Goiás, Universidade Federal do Piauí, Universidade de Brasília, Universidade Federal de Viçosa, Universidade Federal do Para, Universidades de Paris III – Sorbonne, Universidade de La Rochelle, entre outras). Essa cooperação inclui o intercâmbio de pesquisadores e a realização de eventos tanto no Brasil como na França, assim como, publicações conjuntas. Como parte dessa cooperação realizamos o segundo1 seminário franco-brasileiro que teve como temática “a cidade e os rios na história do Brasil”. O objetivo do mesmo foi entender de modo mais agudo o papel dos rios e das vias de comunicação naturais na estruturação de uma rede urbana regional e nacional (sobretudo a partir da segunda metade do século XVIII) e de entender a dupla formação das cidades ribeirinhas, umas nascidas do porto, e outras virando as costas para o rio. Procurou, ainda, entender a configuração das identidades nestas cidades entre a atração do rio e a atração do interior. O IIº Seminário Itinerante Franco-brasileiro “A cidade e os rios na história do Brasil” teve como referencia o estudo de casos tendo como ênfase o rio Parnaíba no Piauí. Três cidades foram visitadas e sediaram os encontros acadêmicos: Teresina-PI, Parnarama- MA e Parnaíba -PI. Elegemos as cidades beira-rio Parnaíba por oferecerem um panorama que bem representam o papel histórico dos rios e das vias de comunicação naturais na estruturação de rede urbana regional e nacional. A realização do II Seminário Franco-Brasileiro aproximou, ampliou e consolidou a cooperação acadêmica de uma rede de pesquisadores que animará a organização dos próximos seminários itinerantes franco-brasileiros. O próximo está previsto para ser sediado em Belém do Pará tendo as cidades e os rios da Amazônia brasileira como temática.

A revista Mosaico se compõe de duas sessões. A primeira apresenta um Dossiê “História dos Rios no Brasil” reunindo artigos produzidos por pesquisadores, de diferentes Universidades brasileiras, que participaram do referido evento, trazendo contribuições significativas em torno da temática escolhida para nortear esta coletânea. Nesses artigos encontram-se reflexões que abordam diferentes aspectos da história dos rios no Brasil. Em sua maioria, resultados de pesquisas do grupo e foram apresentados oralmente no II Seminário Itinerante. Quando da realização do Seminário no Piauí, uma das participantes do encontro, a professora Maria do Espírito Santo Rosa Cavalcante afirmou: “apaixonemos- nos, então, pelos nossos temas e nas águas do Parnaíba, vamos com eles navegar”. Façamos nossas as palavras da professora e convidamos nossos leitores a navegar um pouco nas águas da história dos rios e cidades ribeirinhas do Brasil. O artigo “rio Parnaíba… sua figuração humana e poética” da professora Gercinair Gandara considera além dos contornos geográficos os contornos simbólicos do rio Parnaíba. Observa que na poesia, no romance e na literatura expressou-se a realidade do rio Parnaíba. O artigo do Professor Leandro Rocha intitulado “Aruanã- GO: identidades e fronteiras étnicas no rio Araguaia” trata da história recente de uma pequena comunidade de índios Karajá localizada no vale do Rio Araguaia, que aos poucos se viu engolfada por um núcleo urbano, a cidade de Aruanã-GO. Trata-se especificamente dos Karajá da aldeia de Buridina que viram aos poucos seu território tradicional ser confinado a um pequeno conjunto de casas à beira de um barranco do rio Araguaia. O artigo da professora Vanessa Brasil “O rio São Francisco – a base física da unidade nacional do império” identifica o rio São Francisco como a base física da unidade nacional do Império em distintos períodos da história brasileira. O artigo da professora Carmem Izabel Rodrigues “O bairro do Jurunas, à beira do rio Guamá” nos apresenta o bairro do Jurunas, em Belém, situado à beira do rio Guamá e que se configura como um lugar de fronteira, isto é, ao mesmo tempo, de inclusão e exclusão, de separação e comunicação entre espaços urbanos e rurais, entre os quais circulam, em contínuos movimentos e fluxos, bens e serviços, saberes e práticas, sujeitos e identidades. A professora Maria do Espírito Cavalcante em seu artigo “Um rio que passou: o discurso do atraso em perspectiva” retoma, sob o viés da “modernidade”, as narrativas do discurso autonomista do Tocantins e mesmo das falas dos moradores da então região Norte de Goiás, a questão do isolamento e do atraso da margem direita da BR 153, por onde passa o Rio Tocantins, percebendo um outro lugar daquele rio na narrativa histórica contemporânea. A professora Maria de Fátima Oliveira no artigo “rio Tocantins: lugar de memórias e identidades” nos apresenta um estudo sobre memória e identidades nas margens do Rio Tocantins, Argumenta como, em um determinado espaço e tempo, uma identidade foi se construindo, se fragmentando e se reconstruindo devido às transformações ocorridas na região. Mostra, ainda como valores partilhados e sedimentados por ribeirinhos ao longo dos séculos foram se transformando em resposta às rupturas. Cendrine Paul-Guers no artigo “o rio Oyapoque: povos indigenas e fronteiras” analisa o papel tradicional do rio como lugar identitário e de subsistência. Evidencia como a situação de fronteira provocou uma superposição de identidades. No artigo “O São Francisco partiu minha vida em duas partes” Sebastião Rios e Carolina Santos explicam por meio da narrativa do romance Grande sertão: veredas de João Guimarães Rosa, que narrar ordena o viver em busca do sentido. Explica que nesta literatura, o movimento do rio é uma metáfora do movimento da vida que manda em todos e não manda em si, porque é cavalgado pelo “outro”. Luciana de Fátima Oliveira, em “a vila de Bragança, rios e caminhos: 1750-1753” trata da formação e do desenvolvimento da vila de Bragança localizada na capitania do Grão-Pará e Maranhão. Evidencia a importância dos rios e caminhos no crescimento e o desenvolvimento da vila inserido num período de re-ordenamento territorial da região e de projetos políticos de poder. O Professor José Luis Lopes Araújo em “O rastro da carnaúba no Piauí” levanta questões acerca das áreas produtoras de pó e cera de carnaúba no Estado do Piauí ressaltando o período em que algumas cidades situadas às margens do rio Parnaíba viveram época de intensa atividade comercial, como é o caso, entre outras, de Parnaíba que se constituiu no principal centro comercial do estado. No período analisado o rio Parnaíba era a via de transporte mais eficiente, que além de navegável em todo o curso, corria ao lado de toda a área produtora. Para ele a cidade de Parnaíba e o rio Parnaíba estavam para o Meio-Norte, assim como Amsterdã e o Reno estavam para a Europa.

A segunda sessão da revista Mosaico se compõe de artigos sobre temáticas variadas da História. O professor Ernst Pijning no artigo “Norms and Values of the Brazilian Interior A study of eighteenth-century testaments from Serro do Frio, Minas Gerais” explica a partir dos testamentos dos anos quarenta oitocentista em Serro-MG / Brasil que inicialmente eram os valores da igreja e da lei que preocupavam os testamenteiros mineiros, mas posteriormente eram comas normas e costumes das sociedades locais que se preocupavam. O do professor Alexandre Martins de Araújo “Trinidad século XIX: Estratégias culturais entre Indianos e Afro-descendentes na festa Muçulmana do Hosay” é um estudo que discute o relacionamento entre as comunidades de Indianos e Afro-descendentes em Trinidad, durante o século dezenove. A professora Teresinha Marra, em “integração latino-americana e sua inserção no mundo globalizado” analisa os obstáculos (rivalidades históricas e interesses conflitantes) para a integração da América Latina, o papel dos Estados nos processos de globalização e regionalização. Discute ainda o papel do Brasil e a integração física na América do Sul e os possíveis custos da não integração. O professor Edson Arantes Junior em “Diálogos dos Mortos sobre os Vivos: Uma crítica Luciânica à Cerimônia de Apoteose do Imperador Romano” analisa algumas possibilidades interpretativas dos Diálogos dos Mortos de Luciano de Samósata, procurando elucidar os usos da mitologia e da escrita ficcional como elemento de crítica cultural no Império Romano.

Nota

1. Em agosto de 2004, realizamos o primeiro seminário itinerante franco-brasileiro sobre a história das cidades brasileiras organizado no Estado de Goiás, com o apoio da Universidade Federal de Goiás, da Universidade Estadual de Goiás e da Universidade de La Rochelle. A temática deste simpósio (“a cidade no Brasil: nascimentos, renascimentos – Séculos XVIII – XX”) buscava refletir sobre a multiplicidade das formas de surgimento das cidades e do urbano nas regiões de fronteiras do Brasil.

Gercinair Silvério Gandara – Professora Doutora UNIP / UFG

Leandro Mendes Rocha – Professor Doutor UFG

Laurent Vidal – Professor Doutor Paris III- Sorbonne Nouvelle / Université de La Rochelle

Organizadores


GANDARA, Gercinair Silvério; ROCHA, Leandro Mendes; VIDAL, Laurent. Editorial. Revista Mosaico. Goiânia, v.1, n.2, jul. / dez., 2008. Acessar publicação original [DR]

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