A formação dos profissionais de arquivo | Marilena Leite Paes

Marilena Leite Paes, em seu texto intitulado “A formação dos profissionais de arquivo”, publicado em 1981, no Boletim Histórico e informativo do Arquivo do Estado de São Paulo, já apresentava seu olhar crítico e visionário da área da Arquivologia.

No referido texto, ela começa por apresentar o aumento, à época, do uso do conceito de memória nacional e outras derivações como memória da música, do teatro etc., por parte dos meios de comunicação e periódicos científicos, bem como sua aceitação por parte de pesquisadores e da sociedade como um todo. A partir daí, Marilena Leite Paes avança suas reflexões em torno dos arquivos e dos Profissionais de Arquivos.

Ela aponta que, sem dúvidas, os arquivos requerem atenção especial, quanto à especificidade de seus acervos, por serem constituídos por fontes primárias de informações, e que tais arquivos requerem, além de recursos materiais, investimentos em recursos humanos, tanto em quantidade quanto em qualidade. A partir dessa constatação, a autora começa a desenvolver suas críticas quanto à formação dos profissionais de arquivo. O texto se mostra bem atual quanto a algumas questões apontadas naquela época.

A autora critica a formação dos cursos técnicos e/ou profissionalizantes de arquivos (o antigo 2º grau Técnico ou o atual Ensino Médio Profissionalizante). Em 1980, apesar de a legislação vigente prever o cargo de técnico de arquivo, não existia nenhum curso que capacitasse o profissional para tal cargo, culminando na falta desse profissional e no desvio de função do Arquivista, que muitas vezes desenvolvia as atividades do técnico de arquivos. Essa realidade só foi alterada em 2018, quando foi inaugurado o pioneiro curso de Técnico em Arquivos na Escola Técnica Estadual, do Centro Paula Souza de São Paulo, em parceria com o Arquivo Público do Estado de São Paulo.1

Ao tratar dos cursos superiores de Arquivologia, Marilena Leite Paes afirma, ainda, que em 1980, eram três cursos existentes, concentrando-se dois no Rio de Janeiro (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e Universidade Federal Fluminense) e um no Rio Grande do Sul (Universidade Federal de Santa Maria). Atualmente, existem 16 cursos de Arquivologia no país, sendo todos ministrados em Universidades públicas. A saber: Universidade Federal de Santa Maria – UFSM, Universidade Federal Fluminense – UFF,  Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, Universidade de Brasília – UNB, Universidade Federal da Bahia – UFBA, Universidade Estadual de Londrina – UEL, Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Universidade Estadual Paulista – Unesp/Marília, Universidade Estadual da Paraíba – UEPB, Universidade Federal do Rio Grande – FURG, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Universidade Federal da Paraíba – UFPB, Universidade Federal do Amazonas – UFAM, Universidade Federal do Pará – UFPA. Em relação ao quantitativo de cursos superiores de Arquivologia, percebe-se que este melhorou nos últimos 39 anos.

Porém, Paes também apresenta questões quanto à qualidade da formação do Arquivista ao apontar a inadequação do conteúdo programático dos cursos superiores às reais necessidades profissionais, assim como a falta de interesse das universidades quanto à melhoria do nível cultural dos Arquivistas. Nesse aspecto, poucas coisas mudaram. Observa-se ainda hoje uma discrepância entre o conteúdo ministrado nos cursos e as necessidades profissionais. Por mais que tenha diminuído tal discrepância, a morosidade e burocracia na atualização das ementas e das grades dos cursos superiores no Brasil dificultam a aproximação do curso e das necessidades profissionais de forma mais rápida, fazendo com que, muitas vezes, o aluno – e o futuro profissional – busque por conta própria essas informações, revelando uma lacuna em algumas questões profissionais da sua formação acadêmica.

Em relação à melhoria do nível cultural do Arquivista, o cenário pouco mudou comparativamente ao apresentado em 1980. As Universidades ainda desenvolvem poucas iniciativas voltadas ao nível cultural dos Arquivistas, sejam nas questões relacionadas ao próprio curso, sejam em incentivos para que essa busca ocorra em ambientes externos. Não obstante, observam-se algumas iniciativas em projetos de extensão, mas ainda incipientes no tocante ao profissional de arquivo.

Paes criticou igualmente em seu texto a duração dos cursos, que era de 3 anos. Isso mudou em sua maioria. Os cursos hoje exigem 4 anos para a formação do Bacharel em Arquivologia.

No que se refere à pesquisa na área da Arquivologia, a autora apontou a inexistência de cursos de Pós-graduação, sejam Lato sensu ou Stricto sensu. Ela afirma que deveriam ser desenvolvidos cursos de especialização para preparar o profissional para as necessidades especificas. Hoje, diretamente relacionado à Arquivologia, existe apenas um curso de Pós-graduação Stricto sensu: o Mestrado em Gestão de Documentos e Arquivos, que é oferecido pela UNIRIO.

Ao ler este intrigante texto de Marilena Leite Paes é inegável notar o quão crítico e atemporal ele é. Além de tratar das questões da formação dos profissionais de Arquivo, ele nos leva à reflexão de como é, e como deve ser essa importante formação acadêmica.

Passados 39 anos, devemos olhar criticamente para este cenário, assim como o fez Paes, e atuarmos juntos em busca de melhorias, para sermos capazes de executar com eficiência e maestria o que cabe ao profissional de arquivo executar.

Para também ressaltar a relevância do profissional de arquivo e da Gestão e Preservação de Documentos, gostaria, então, de finalizar essa resenha com uma citação retirada do próprio texto de Paes, em que ela afirma:

“Entendemos que, somente usando as armas da educação e do ensino para formar profissionais competentes, poderemos realmente salvar a memória nacional como um todo, ordenando a documentação do passado, preparando a do presente e planejando a do futuro” (PAES, 1981, p. 11).

Nota

1Sobre esse curso: https://www.vestibulinhoetec.com.br/unidades-cursos/curso.asp?c=1525


Resenhista

Brenda Rocco – Professora do curso de Arquivologia da Unirio (RJ).


Referências desta Resenha

PAES, Marilena Leite. A formação dos profissionais de arquivo. Boletim Histórico e informativo do Arquivo do Estado de São Paulo, 1981. Resenha de: ROCCO, Brenda. Comentários sobre o artigo a formação dos profissionais de arquivo, de Marilena Leite Paes. Revista do Arquivo. São Paulo, Ano VI, N. 10, p. 115-116, junho de 2020.

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