Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano | Grada Kilomba

Em 2008, a intelectual negra, filósofa e psicanalista portuguesa Grada Kilomba, cuja família tem origem nas ilhas de São Tomé e Principe e em Angola, teve sua tese de doutorado laureada com a “mais alta (e rara) distinção acadêmica” (KILOMBA, 2019, p. 12), no doutoramento em Filosofia pela Universidade Livre de Berlim, Alemanha. Nesse mesmo ano, a tese foi publicada na Alemanha com o título Plantation Memories: Episodes of Everyday Racism. No Brasil, o livro foi traduzido e publicado, em 2019, pela editora Cobogó.

Antes do doutorado na Alemanha, Grada Kilomba realizou o curso de Psicologia Clínica e Psicanálise no Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA) e trabalhou no Hospital Júlio de Matos, em Lisboa, com pacientes sobreviventes de guerra. Neste período, se aproximou de uma perspectiva psicanalítica pós-colonial e de uma abordagem subjetiva e fenomenológica da pesquisa científica. Essas são marcas substanciais da obra da autora.

Em “Memórias da plantação”, Grada Kilomba explora o “racismo cotidiano”, conceito desenvolvido pela cientista social Philomena Essed, como uma realidade psicológica. A obra subdividese em 14 capítulos, que parecem se desenvolver como um processo terapêutico, desde o reconhecimento de si e do trauma, no primeiro capítulo, até a cura, transformação e descolonização do sujeito, nos dois últimos.

Para a edição brasileira, Kilomba fez uma carta, na qual conta sua trajetória pessoal enquanto intelectual negra e afirma que “este livro é muito pessoal; escrevi-o para entender quem eu sou” (p. 13). A autora demarca sua subjetividade e questiona uma suposta neutralidade da pesquisa científica.

A psicanalista também questiona as estruturas da linguagem: “a língua tem, também, uma dimensão política de criar, fixar e perpetuar relações de poder e de violência, pois cada palavra que usamos define o lugar de uma identidade” (p. 14). Ela conduz um exercício que envolve a “desmontagem da língua colonial’. Nesta carta, a autora revela sua influência fanoniana. No livro Pele negra, máscaras brancas, Frantz Fanon faz uma reflexão sobre a linguagem, suas construções e usos nas estruturas de dominação racial.

A autora explica a semântica e as tensões em torno de vocábulos presentes em seu texto e indica como os utilizou: algumas palavras são escritas em itálico, para apontar as relações de poder; outras, de caráter considerado mais traumático, são abreviadas ou escritas em letras minúsculas; e aquelas resultantes de processos de autodefinição e identidade política são escritas com a primeira letra maiúscula.

Na introdução, “Tornando-se sujeito”, a subjetividade das pessoas negras é o tema central. Para Kilomba, escrever é uma prática política, que envolve um tornar-se “a autora e a autoridade na minha própria história” (p. 28). A psicanalista debate os conceitos de sujeito e objeto através da perspectiva da feminista negra estadunidense bell hooks. Para hooks, o sujeito é aquele que pode definir a sua própria realidade, suas história e identidade, enquanto o objeto é aquele que é definido pelo outro, que tem seus aspectos definidos a partir da sua relação com o sujeito. A “passagem de objeto a sujeito é o que marca a escrita como ato político”, diz Grada Kilomba.

O livro Memórias da Plantação, diz a autora, examina a atemporalidade do racismo por meio de narrativas subjetivas e biográficas de mulheres negras, com o intuito de descortinar a sua realidade psicológica. A junção das palavras “memória” e “plantação” remetem a um processo mimético de um traumático passado colonial, algo que tem sido, por muitas vezes, negligenciado. O sujeito negro é colocado, de forma violenta, numa “reencenação” do trauma racial. Ele é cativo do “outro”. É o ser objetificado, inferiorizado, subordinado e exótico.

Grada Kilomba compromete-se com uma abordagem fenomenológica das estratégias raciais outrora empregadas na plantation, retificadas na época contemporânea. Para tanto, a pesquisadora analisa, de forma episódica, os relatos autobiográficos de uma mulher afro-alemã, Alicia, e de uma mulher afroestadunidense, Kathleen. As duas residem na Alemanha.

“A máscara do silenciamento” é o tema do primeiro capítulo, intitulado “A Máscara: colonialismo, memória, trauma e descolonização”. Essa máscara foi uma peça concreta. A autora traz o retrato da “escrava Anastácia” e as histórias em seu entorno. O retrato foi feito pelo desenhista francês Jacques Arago, durante uma “expedição científica” pelo Brasil, entre dezembro de 1817 e janeiro de 1818. Na imagem, a escravizada tem uma máscara que lhe cobre a boca, um grilhão no pescoço e tem os olhos voltados para o seu leitor.

Segundo Kilomba, a máscara

[…]era composta por um pedaço de metal colocado no interior da boca do sujeito negro, instalado entre a língua e o maxilar e fixado por detrás da cabeça por duas cordas, uma em torno do queixo e a outra em torno do nariz e da testa. Oficialmente, a máscara era usada pelos senhores brancos para evitar que africanas/os escravizadas/os comessem cana-de-açucar ou cacau enquanto trabalhavam nas plantações, mas sua principal função era implementar um senso de mudez e de medo, visto que a boca era um lugar de silenciamento e de tortura (p. 33).

É uma máscara que faz parte de um sistema de silenciamento. Esse instrumento de tortura, utilizado na época colonial, faz parte de uma realidade traumática e produtora de feridas. Estabelece um senso de mudez e protege o sujeito branco do reconhecimento da humanidade do “outro”. Nesse momento, Grada Kilomba dialoga com o pensamento do psiquiatra e filósofo Frantz Fanon. A máscara se transforma em metáfora para o processo de dominação e colonização do sujeito negro.

O sujeito branco projeta sobre o sujeito negro tudo o que teme identificar em si mesmo. Isto é, características reprimidas, como sexualidade e agressividade. Kilomba apresenta uma discussão sobre humanidade, semelhança e desemelhança e como o sujeito negro é construído através de uma visão de “outridade”, onde lhe é destinado o lugar de “não sujeito”. O direito de forjar ideias de si e para si é negado. A autora descreve e caracteriza, em conformidade com o historiador Paul Gilroy, os cinco mecanismos de defesa do ego do sujeito branco. É um processo de conscientização coletiva, que envolve negação, culpa, vergonha, reconhecimento e reparação, que pode criar maneiras de desmantelar o racismo e reorganizar as configurações de poder.

Em diálogo com a teórica e crítica indiana Gayatri Spivak, no segundo capítulo, “Quem pode falar? falando do centro, descolonizando o conhecimento”, Grada Kilomba continua as discussões sobre os processos de silenciamento e de opressão que negam a possibilidade do sujeito oprimido de ser escutado. A autora explora a dificuldade das subalternas em terem suas vozes ouvidas num sistema repressivo e racista.

Nas reflexões que envolvem as tensões e os processos de negociação entre fala e escuta, Kilomba traz para o debate a intelectual negra Patricia Hill Collins. A escritora demarca como os processos de construção do conhecimento são permeados por violências e conservação de estruturas hierarquizadas que privilegiam o sujeito branco. Ela questiona um conhecimento que se quer universal e o mito da objetividade: “A ciência não é um simples estudo apolítico da verdade, mas a reprodução de relações raciais de poder que ditam o que deve ser considerado verdadeiro e em quem acredita.”(p. 53-54). E clama por uma reflexão que rompa as estruturas hegemônicas de produção do conhecimento e da linguagem.

As definições de racismo estrutural, institucional e cotidiano, com destaque para este último, são apresentadas no capítulo três, “Dizendo o indizível. Definindo o racismo”. Segundo a escritora, o racismo manifesta três aspectos simultâneos. Primeiro, a construção de/da diferença por meio de um processo discriminatório. A construção dessa diferença tem ligação com o segundo aspecto: os valores hierárquicos. Ambos os aspectos são ladeados pelo terceiro: as estruturas de poder sócio-históricas, políticas e econômicas. Neste sentido, diz a autora, “o racismo é a supremacia branca. Outros grupos raciais não podem ser racistas nem performar o racismo, pois não possuem esse poder”. (p. 76). Grada Kilomba não se aprofunda, porém, nas nuances e imbricações entre poder e racismo nas relações raciais.

O racismo estrutural é exposto nas estruturas sociais e políticas que privilegiam o sujeito branco. O racismo institucional aponta que o racismo não opera apenas em nível ideológico, mas também por dentro das instituições, como no mercado de trabalho, na justiça criminal e em agendas educativas.

O racismo cotidiano, por sua vez, é discutido com detalhe por Kilomba. A categoria consiste no cerne de sua análise. O sujeito negro é apreendido como “o outro”, sob aspectos de infantilização, primitivização, incivilização, animalização e erotização, experiências habituais, como destaca a autora, que se repetem “incessantemente ao longo da biografia de alguém” (p. 80).

A teoria psicanalítica e anticolonial de Frantz Fanon é utilizada como referencial de um estudo que propõe centrar-se nos sujeitos. A pesquisa surge a partir das subjetividades das mulheres entrevistadas e do study up, metodologia na qual os pesquisadores investigam componentes de seu próprio grupo social.

A proposta de pesquisa é conciliada com uma “subjetividade consciente”, como argumenta o cientista educacional alemão Paul Mecheril. Mesmo que a investigadora não aceite sem críticas as narrativas das pessoas entrevistadas, ela respeita as declarações e demonstra interesse nos eventos, por muitas vezes considerados banais. Assim, a pesquisadora objetiva diluir as relações hierárquicas produzidas entre investigadores e informantes.

Ao todo, seis mulheres são entrevistadas pela pesquisadora, mas apenas Alicia, uma mulher afroalemã, e Kathleen, uma mulher afro-estadunidense, são escolhidas para terem suas entrevistas analisadas. Segundo Kilomba, isso ocorreu por causa da diversidade e riqueza dos relatos apresentados por elas. O intuito da análise foi apontar políticas espaciais, políticas do cabelo, políticas sexuais, políticas da pele, cicatrizes psicológicas impostas pelo racismo cotidiano, estratégias psicológicas para curar-se do e/ou superar o racismo cotidiano e estratégias de resistência.

No capítulo quatro, “Racismo genderificado”, é exposta a necessidade de interpretações entrecruzadas sobre o racismo cotidiano que marca as experiências das mulheres negras, que são racializadas e generificadas. A autora inicia o capítulo com uma experiência pessoal. Quando tinha 12 ou 13 anos, a menina Grada foi levada em uma consulta com um médico branco. No fim da consulta, o médico chamou a criança, disse que ia sair de férias com a família e propôs que a menina os acompanhasse para realizar serviços domésticos. A relação médico/paciente foi transformada em uma relação senhor/servente. A partir desse momento, até o capítulo 13, a autora se aprofunda nas narrativas das mulheres negras entrevistadas e na sua própria experiência pessoal com o racismo cotidiano.

Para analisar as correlações e facetas do racismo e sexismo, Grada Kilomba traz as perspectivas de teóricos como Fanon, Essed, bell hooks e Heidi Sofia Mirza. “Pode-se argumentar que, como processos, o racismo e o sexismo são semelhantes, pois ambos constroem ideologicamente o senso comum através da referência às diferenças ‘naturais’ e ‘biológicas’” (p. 100) A autora não utiliza propriamente a categoria de interseccionalidade e não aprofunda nas questões envolvendo as classes econômicas.

A ideia de uma sororidade universal – de “irmandade” entre todas as mulheres, de auxílio mútuo diante de um mundo que privilegia aos homens – é questionada. Segundo Kilomba, sem uma devida contextualização, essa ideia, que pode ser poderosa, se torna apenas “uma presunção falsa e simplista que negligência a história da escravidão, do colonialismo e do racismo nos quais mulheres brancas têm recebido sua parcela de poder branco masculino em relação tanto a mulheres negras quanto a homens negros” (p. 101).

Os escritos de Fanon também são analisados e há uma crítica sobre como o termo “homem” é colocado pelo autor para designar sujeitos, invisibilizando as experiências das mulheres negras. Com essa crítica, a autora visa demonstrar que o movimento negro não está livre do sexismo e existe uma complexa relação entre homens negros e mulheres negras no patriarcado racial.

As “políticas espaciais” são tema do capítulo 5. As narrativas das mulheres negras alemãs percorrem questões de nacionalidade, estrangeirismo e estranhamento. Marcam o reforço cotidiano de uma ilusão histórica racista, onde o negro não pode pertencer a determinada nacionalidade ou territorialidade por ser negro. É a “relutância do sujeito branco em aceitar que não é que nós temos nosso próprio país para viver, mas sim que nós estamos vivendo em nosso país”, diz Grada Kilomba (p. 113). A pessoa negra não é reconhecida, não é escutada e é empurrada para um espaço de “não pertencimento”.

As experiências de violência e opressão sobre aspectos estéticos são tema do capítulo 6, “Políticas do cabelo”. A autora afirma que a diferença é colocada como uma “justificação” para a invasão e controle. Quando questionado, para evitar a culpa e a vergonha, o sujeito branco faz um processo de regressão, conceito caro à psicanálise clássica, agindo de forma imatura, tornando-se a personagem central e colocando o sujeito negro como secundário. A dinâmica entre os dois é invertida.

Na tentativa de aliviar as violências sofridas, mulheres negras acabam por adotar procedimentos de “desracialização”, como o alisamento dos cabelos. Assumir os cabelos crespos é, então, para a autora, a afirmação de uma consciência política identitária da mulher negra, de descolonização do corpo negro.

O capítulo 7, “As políticas sexuais”, trata da objetificação e desapropriação do corpo negro. A autora explica como as imagens e discursos difundidos sobre o negro atingem, de forma violenta e sádica, seus corpos. A noção de “constelação triangular”, desenvolvida a partir do diálogo entre Freud e as análises de Frantz Fanon, é apresentada por Kilomba. Nas situações cotidianas, o racismo se “naturaliza” com o isolamento da pessoa negra e a ação coletiva das pessoas brancas, que anuem para que o racismo seja cometido. Outra questão discutida é de um “complexo de Édipo racial”: “dentro do triangulo do racismo, o sujeito branco ataca ou mata o sujeito negro para abir espaço para si, pois não pode atacar ou matar o progenitor – pelo menos não sem que seja penalizado” (p. 140).

Em “Políticas da pele”, capítulo 8, são analisados os processos de negação da negritude e o desenvolvimento de uma hierarquia de nomenclaturas como M. (mischling)1 e N.(neger), que são utilizados num entrecruzar de fobia racial e recompensa. Ser chamado de M. coloca o sujeito em uma categoria média, o afasta do N., mas não o coloca entre os brancos. Hierarquiza os negros entre os de pele mais escura e os de pela mais clara. É a discussão sobre colorismo e intensidades do impacto do racismo.

Dos capítulos 9 ao 12, Grada Kilomba trata das “cicatrizes psicológicas impostas pelo racismo cotidiano”. “A palavra N. e o trauma” são temas do primeiro deles. A violência e a dor empregadas por meio de discursos racistas, nos quais ocorre um processo de afirmação da dominação do sujeito branco, reinserem o sujeito negro numa cena ancestral colonial. A violência do trauma colonial causa dor psicológica e física. Numa busca pela defesa do ego, o sujeito atingido exterioriza seu trauma somatizandoo em seu corpo.

O capítulo 10, “Segregação e contágio racial”, e o capítulo 11, “Performando a negritude”, ligam-se diretamente. A metáfora da luva branca, utilizada por pessoas negras quando tinham que entrar em contato com o mundo branco, é apresentada para discutir o medo branco de ser “infectado” pela pele negra. Outra questão, discutida ainda no capítulo 10, é a solidão do negro em espaços segregados, nos quais é constantemente vigado e avaliado.

No capítulo 11, existe uma discussão sobre o “status de ter que representar a negritude” (p. 173). Num círculo de exclusão e inclusão, as pessoas negras são chamadas a representar aquelas cujo acesso às estruturas foi negado. Outro tema discutido pela autora, neste mesmo capítulo, é que o sujeito, posto como exceção, é cobrado e exposto.

O sujeito branco utiliza como instrumento um mecanismo de defesa do ego, a dissociação, para realizar compensações, preservando o caráter racista de seu discurso. Diz Kilomba, referindo-se a Kahleen:

Ela é inteligente desde que seja comparada à branquitude. Consequentemente, a negritude é sempre algo à parte. […] Uma pessoa é negra quando vem a ser a representação do que é corpóreo, mas não se é negra/o quando se trata do intelecto (p. 177).

O capítulo 12 é, sem dúvida, o mais delicado. Intitulado “Suícidio”, nele é analisado o último estágio do trauma racial cotidiano. Para discutir o tema, recorrente nas narrativas de livre associação das mulheres entrevistadas, a autora contextualiza o suicídio no período colonial. Resultado do processo de isolamento perverso, violento e cruel, da desqualificação do sujeito negro, o ato pode ser considerado como uma performance final da subversão da ordem estabelecida. Uma afirmação da autonomia do indivíduo diante de um sistema que o desumaniza.

Os dois últimos capítulos se referem à categoria “estratégias de resistência” e são dedicados ao tratamento do trauma advindo do racismo cotidiano.

Em “Cura e transformação”, capítulo 13, a autora aborda os processos de reconhecimento dos eventos traumáticos e do reencontro do sujeito negro com o seu grupo de identificação. As narrativas de Alice e Kathleen se colocam no sentido de escancarar as feridas abertas pelo colonialismo e pelo trauma cotidiano, afirmando que o racismo é um problema branco que se apresenta nas estruturas das relações raciais vivenciadas pelas pessoas negras. O afeto e a recriação dos laços familiares, perdidos no processo de escravização, são maneiras de trabalhar os traumas.

No capítulo último, “Descolonizando o eu”, Grada Kilomba recupera a noção de trauma colonial e expõe que a memória histórica coletiva da Plantation é ainda vivenciada pelo sujeito negro, que carrega consigo as feridas das violências vívidas, reencenadas na contemporaneidade. O abuso racial tem, então, um padrão histórico.

Segundo Kilomba, o racismo cotidiano pode ser definido enquanto uma experiência traumática por carregar o choque violento, a separação e a atemporalidade, três dimensões que fazem parte do conceito de trauma na Psicanálise. Este é o ponto crucial de “Memórias da plantação”: como o passado colonial pode ser revisitado e atualizado no presente.

Urge, então, que o sujeito negro imponha barreiras, recusas, limites, que negue o lugar de “outridade” que lhe foi imposto, se afirmando subjetivamente independente de sua relação com o sujeito branco.

A raiva pode ser um instrumento para a mudança de perspectiva da pessoa negra, num processo que também envolve diversos recursos de proteção do ego – negação, frustração, ambivalência, identificação e, por fim, descolonização – e por meio dos quais o negro nega a representação que lhe foi atribuída e torna-se sujeito. Assim, a autora retoma o tema de sua introdução, fechando o ciclo de identificação, tratamento e cura do trauma provocado pelo racismo cotidiano.

Memórias da Plantação é um livro essencial nas discussões sobre relações sociais. Grada Kilomba, através de uma perspectiva psicanalítica pós-colonial, mostra como, especialmente, as mulheres negras são sistematicamente silenciadas por estruturas que as oprime e invisibilizam. Convoca, assim, o leitor a questionar o seu lugar e ações, enquanto sujeito histórico, nas relações raciais. É uma obra que se quer transgressora e questionadora e, sem dúvidas, o é. Ler Memórias da Plantação é ser convidado a refletir sobre todo um sistema que oprime e mata negras/os por não as/os enxergar enquanto indivíduos, enquanto sujeitos, enquanto seres humanos.

Nota

1 mestiço.


Resenhista

Kamilla Dantas Matias – Mestre em História da Idade Média pela Universidade de Coimbra, Portugal. E-mail: [email protected]


Referências desta Resenha

KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Trad. Jess Oliveira. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. Resenha de: MATIAS, Kamilla Dantas. Politeia: História e Sociedade. Vitória da Conquista, v. 19, n. 2, p. 342-348, jul./dez. 2020. Acessar publicação original [DR]

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