The Story of the Marvelous City | Orde Morton

Este livro relata a história da cidade do Rio de Janeiro cobrindo 500 anos desde os acontecimentos mais antigos até o ano de 2015. Segundo o autor, existindo muitos livros escritos em francês e espanhol e poucos em inglês, ele pretende contribuir para o conhecimento dessa história. Ele espera que o livro seja de grande utilidade para aqueles que virão participar dos acontecimentos dos jogos olímpicos no ano de 2016. O autor utilizou inúmeras fontes primárias e secundárias e, principalmente, teses e monografias defendidas nas universidades. Dispõe de uma bibliografia em www.ordemorton.com

Foi ajudado por seus alunos na Universidade Federal Fluminense e inúmeros amigos brasileiros e americanos, embora o autor não informe o período em que deu aulas naquela universidade.

Morton optou por mesclar a história do Rio com a do Brasil por ser mais inteligível para a maioria dos estrangeiros e, principalmente, porque a sociedade e a história brasileiras são resistentes a esclarecer linhas de divisão. Por exemplo, o que significa, na verdade, cor de pele preta e cor branca, esquerda política e direita política, o que é urbano e o rural, o que são regras militares e democracia, o que é legal e o ilegal, o criminal e a polícia, o cristianismo e o politeísmo – os brasileiros sucessivamente não são claros nessas definições. Palavras que aparecem ao mesmo tempo em português e inglês podem significar diferentes coisas como a máxima política brasileira “para os amigos, a justiça, para os inimigos, a lei”.

A história do Rio pode ser, ao mesmo tempo, a história do Brasil, pois ele é parte do mundo ocidental. Na sua visão, Morton pretende refletir sobre a natureza internacional do Rio, do povo e de suas ideias, influenciados pelo comércio da Europa, da África e da América do Norte que, convivendo desde 1502, criaram uma cidade de muitas facetas. E assim Morton passa visões das várias cidades dentro da cidade do Rio; a dos ricos, a dos pobres, a cidade da música, a das praias e a cidade da escravatura, do racismo, da violência endêmica. E tenta mostrar a natural e extraordinária imagem que emerge delas.

Finalmente ele tenta ser sério, mas não solene. Os cariocas têm um senso de humor que lhes dá um lugar nessa história.

Chama a atenção para o fato de que o Rio teve muitos nomes: Real e mais tarde Imperial Corte, Município Neutro, Distrito Federal, A Mais Leal e Heroica cidade de São Sebastião, Estado da Guanabara. E o seu nome se confunde com o nome do Estado a que ela pertence e se expande para as regiões suburbanas ao redor dela.

Figuras públicas no Brasil são chamadas pelo seu primeiro nome, apelidos ou com as iniciais. Isso pode indicar uma intimidade e desrespeito e é mais simples do que usar sobrenomes que são longos e complicados. Felizmente os nomes brasileiros são muito variados, com enorme gama, desde Agamenon até Zaratustra. Um bom exemplo é o nome de um jogador de futebol, Sócrates Brasileiro Sampaio de Souza Vieira de Oliveira, universalmente conhecido pelo seu primeiro nome, do filósofo grego.

Usa-se no Brasil também várias formas de chamar uma pessoa, desde Dom, para os mais antigos nobres, até para prelados da Igreja e um pequeno número de nobres portugueses. Além disso, chamados de Dom são também os membros da ordem dos beneditinos.

O livro possui 365 páginas com 16 capítulos agrupados em quatro partes e três capítulos isolados chamados de interlúdio: I, II e III.

Apresenta um conhecimento geográfico da cidade, pouco comum em livro factual histórico. Percebe os problemas que surgiram numa cidade encravada entre picos e serras, lagoas e o mar.

Na primeira parte, MORTON trata da “Cidade Colonial”, desde 1502 até 1808, e é composta de quatro capítulos, terminando com a visão da cidade colonial que já era uma cidade internacional, uma das maiores do mundo, na época.

A segunda parte, com os capítulos 5, 6 e 7, compreende a Independência, o “Império e a República”, desde 1808 a 1920.

No Interlúdio I, analisa a “Alta Sociedade”, com o capítulo oito – a década tumultuosa de 1890, – e o capítulo 9, / A velha república 1898-1920.

Segue-se o Interlúdio II, chamado de “A criação de uma Cultura popular”.

A terceira parte, chamada de “Idade do Ouro 1920 – 1960” compreende os capítulos 10, 11, 12 e 13 onde analisa a “Política e a Cultura Brasileira nos 1920”, e a seguir analisa “A Primeira Presidência de Getúlio Vargas1930-1945”.

Desejando mostrar a ascensão da classe média, faz um interlúdio, o de número III, intitulado “Modos de Vida da Classe Média”.

A parte IV intitula-se “Uma Cidade por si Própria”, composta dos capítulos 14, 15 e 16, onde se estuda “O Fim da Segunda República”, a “Criação do Estado da Guanabara 1960-1975” e “Aprendendo a Viver”.

O livro retrata a vida, a obra e os objetivos políticos de cada presidente do Brasil que aqui morou, antes da mudança da capital para Brasília. E o faz, também, para cada governador do Estado da Guanabara e cada prefeito da atual cidade do Rio de Janeiro.

No entanto, não é um livro de análise política. É um livro descritivo e memorialístico, como um manual.

E, finalmente, finaliza com “Últimas Palavras: Rio em 2014”.

Embora seja um livro descritivo, como dissemos quase factual, com a sequência factual de cada presidente, governador e fato histórico, o autor tem a preocupação de abrir páginas ou encartes de opiniões e julgamentos sobre valores, pessoas, fatos ocorridos na cidade do Rio, ampliando assim os objetivos de um livro que seria apenas memorialístico.

A análise da parte colonial utiliza antigos cronistas. Na parte imperial se destaca no capítulo “Para o Mar e as Praias”, mostrando a mudança de eixo de moradia e urbanização que passa a ocorrer no século XIX e que perdura até hoje. Insere palavras de historiadores, presidentes, escritores, jornalistas, apoiando o que quis dizer.

Como exemplo, citemos as suas explicações sobre as favelas:

No governo de Carlos Lacerda

“as favelas passaram a ser vistas não como uma maldição a serem erradicadas mas um problema a ser resolvido. O provimento de água, esgoto, e ruas calçadas é fisicamente difícil. A posse e ocupação das terras estão dificultadas por uma série de leis, burocracia, com ambiguidades legais e ausência de uma registro central de títulos de propriedade.”

Uma apreciação muito perspicaz, o autor fez sobre a nova zona sul – a Barra da Tijuca –, onde se verificou a expansão da classe média e turística e onde os nomes ingleses dominam as terras circundadas de lagoas, pensando-se até estar em Miami ou Califórnia.

O livro é ilustrado com fotos de catedrais, personagem histórico como Duguay Trouin, da princesa Isabel, de vários presidentes, como a de Getúlio num carro com Roosevelt, ícones como o da cobra fumando na época da II Guerra Mundial, de comidas, de revistas antigas, como a Revista da Semana, edifícios públicos importantes, como a Academia Brasileira de Letras, ou o antigo Ministério da Educação e Cultura (cujo nome está errado, pois chama-se, atualmente, Palácio da Cultura), onde se assinala a edificação e os azulejos de Portinari. Há também fotos da cidade, como a do Aterro do Flamengo.

Assinala a mudança do estilo arquitetônico neocolonial com a influência do modernismo.

O Rio de Janeiro possui uma luxuosa e complexa história que dura cinco séculos, e Marvelous City é o primeiro livro completo acerca dessa história escrito em inglês. Desde a vida praiana de Ipanema e Copacabana até as dificuldades das favelas, essa é uma história de contraste e contradição. Oferece um relance sobre a alta sociedade carioca e sua rica cultura, assim como a violência endêmica, corrupção e disparidade social que perduram até hoje. Com sua política populista e a mistura única das culturas europeia, africana e ameríndia, o Rio de Janeiro se tornou, ao longo dos séculos, um lugar único, maior que a soma dessas influências, distintamente brasileiro e cujo símbolo é o carnaval carioca, maior festa do mundo.

O coração pulsante do Brasil, Rio de Janeiro, é a cidade sede dos jogos olímpicos de 2016. O autor Orde Morton convida o leitor a olhar além da perfeição do cartão-postal e suas belezas naturais e descobrir essa cidade única e suas maravilhas multifacetadas.


Resenhista

Miridan Falci – Professora de História da UFRJ. Doutora pela USP e Pós-doutora pela EHECS. França. Sócia do IHGB e IHGRJ.


Referências desta Resenha

MORTON, Orde. The Story of the Marvelous City. Vitoria, Canada, 2015. Resenha de: FALCI, Miridan. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, ano 22, n.22, p. 287-292, 2015. Acessar publicação original [DR]

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