Patrimônio Musical Brasileiro | LaborHistórico | 2022

Brasao da Orquestra Lira Sanjoanense

Brasão da Orquestra Lira Sanjoanense 

O dossiê temático “Patrimônio Musical Brasileiro” reúne artigos relacionados tanto ao patrimônio musical histórico acumulado em fontes musicográficas e gravações, quanto ao patrimônio musical transmitido pela memória e pelas tradições comunitárias, além das intersecções entre esses dois campos. A proposta visa estabelecer conexões entre esses campos de estudo e contribuir para a integração do conhecimento de todas as formas de patrimônio musical relacionadas ao Brasil, evitando assim sua separação estanque, ainda que se reconheça a especificidade de transmissão e da pesquisa de cada uma delas.

Com este dossiê, desejamos fortalecer o conceito de patrimônio musical e estimular o desenvolvimento de linhas pesquisas a partir dessa ideia nuclear, porém considerando sua diversidade intrínseca, nas representações, celebrações, expressões, construção e uso de instrumentos musicais, manifestações, grupos e lugares associados à memória musical, bem como ao estudo dos conjuntos documentais, organológicos, fonográficos, iconográficos, hemerográficos, bibliográficos e afins, ainda que, do ponto de vista metodológico, predominem na atualidade os trabalhos referentes a estas duas abordagens:

(a) Identificação, reconhecimento, mapeamento, estudo, registro, continuidade, acompanhamento, divulgação e apoio do patrimônio musical imaterial ou de tradição oral, bem como de todo o patrimônio cultural relacionado à atividade musical, na forma de práticas, saberes, representações, celebrações, expressões e lugares culturais;

(b) Levantamento, salvaguarda, tratamento, difusão do conteúdo e pesquisas relacionadas aos acervos musicais do país, bem como o levantamento do estado atual das pesquisas e da realidade brasileira referente ao patrimônio arquivísticomusical e histórico-musical brasileiro.

Por outro lado, existe uma diversidade de perspectivas, como as abaixo relacionadas (várias delas associáveis entre si), que permitem a contínua expansão metodológica da pesquisa, com uma consequente ampliação do conhecimento e do impacto acadêmico e social produzido:

(1) estrutura política relacionada ao patrimônio musical (legislação nos âmbitos federal, estaduais e municipais, regulamentos e normativas institucionais, acordos de cooperação etc.);

(2) conhecimento disponível sobre a existência, conteúdo e abertura à pesquisa dos acervos musicais brasileiros;

(3) projetos específicos de estudo, registro, apoio, conservação de documentos, catalogação, digitalização, edição, gravação e difusão online já realizados, planejados ou em andamento;

(4) conhecimento nacional e internacional (teórico e prático) sobre patrimônio musical;

(5) interfaces do patrimônio histórico-musical brasileiro com a história oral, o memorialismo histórico e outras narratividades, bem como o desenvolvimento teórico e metodológico para essas tarefas;

(6) estudos relacionados ao registro sonoro e audiovisual de manifestações musicais tradicionais;

(7) métodos de inventariação de referências culturais;

(8) práticas comunitárias em vista da preservação de registros, memórias e práticas musicais;

(9) atuação de pesquisadores, das comunidades e demais interessados junto aos órgãos patrimoniais nas esferas municipal, estadual e federal;

(10) inclusão do patrimônio musical brasileiro nos sistemas de ensino e suas consequências culturais e políticas.

Como amostra significativa das propostas acima apresentadas, o presente dossiê publica quinze artigos, divididos em cinco blocos, cada um deles com as seguintes abordagens predominantes: 1) Aspectos teóricos do patrimônio musical; 2) grupos e corporações musicais; 3) acervos musicográficos e documentais relacionados à música; 4) significados de repertórios musicais históricos e tradicionais; 5) difusão musicográfica de repertórios brasileiros.

No primeiro bloco, o artigo de Paulo Castagna considera a amplitude teórica do conceito de patrimônio musical e a artificialidade de sua separação em material e imaterial, propondo a abordagem de suas três dimensões para sua compreensão e utilização mais eficiente, ao passo que o artigo de Lúcia Campos, Pedro Aragão e Rafael Velloso descreve o processo de instrução para registro do choro como patrimônio cultural pelo IPHAN, refletindo sobre as ressonâncias e desafios do processo, que envolveram as articulações entre as normativas e o acolhimento das demandas das próprias comunidades do choro.

No segundo bloco, o artigo de Marcos Botelho analisa um acervo de entrevistas e depoimentos de integrantes de bandas de quatro cidades históricas de Goiás, o de Manuela Areias Costa estuda as memórias e os acervos físicos da Sociedade Musical União XV de Novembro, de Mariana (MG), e o de Josineia Godinho aborda a vida musical do Seminário de Mariana até a década de 60 do século XX e sua relação com a formação de líderes religiosos.

No terceiro bloco, Modesto Flávio Chagas Fonseca estuda o arquivo musical remanescente da “Companhia de Muzica” (primeira metade do século XIX) de São João del-Rei (MG), incorporado ao arquivo da atual Orquestra Lira Sanjoanense, enquanto Matheus Theodorovitz Prust dois acervos musicais de Santa Catarina à Schola Cantorum “Santa Caecilia” (Canoinhas – SC), Vinícius Eufrásio estuda os documentos musicográficos do compositor Francisco Fonseca (1884-1970) na cidade de Formiga (MG), e Luciana Requião aborda o processo de tratamento do fundo documental do Sindicato dos Músicos do Estado do Rio de Janeiro.

No quarto bloco, Thais Fernanda Vicente Rabelo Maciel estuda a prática e a transmissão musicográfica dos Motetos de Passos da Quaresma no século XIX, na cidade de São Cristóvão, primeira capital de Sergipe, enquanto Sérgio Dias realiza uma abordagem crítica das fontes (libretos e manuscritos musicais) das aberturas, elogios dramáticos e peças de circunstância do compositor carioca José Maurício Nunes Garcia (1767-1830), Glauber Paiva da Silva e Ana Lúcia do Nascimento Oliveira estudam os usos do passado para enaltecimento da paraibanidade na música Paraíba joia rara, Daniel Issa Gonçalves constata a permanência de uma melodia italiana do século XVII, o Romance da Bela Infanta, em várias melodias brasileiras de transmissão oral, e Pedro Razzante Vaccari realiza uma análise etnomusicológica de duas canções populares tradicionais brasileiras: o canto de Maracatu “Loanda” e a canção indígena “Natiô”, dos Paresis.

Finalmente, no quinto bloco, Rosana Saldanha da Gama Lanzelotte e Nivia Gasparini Zumpano abordam os desafios da construção de plataformas para a disponibilização on-line de partituras eletrônicas, como estratégia de difusão do legado musical brasileiro.

Conclui este dossiê uma resenha, por Suzel Ana Reily, do recente livro Gold, Festivals, and Music in Southeast Brazil: Sounding Portugueseness, de Barbara Alge (2022), importante contribuição ao estudo do patrimônio musical brasileiro, tanto do ponto de vista metodológico, quanto dos resultados obtidos.

Com isso, está lançada a proposta de integração das diferentes abordagens relativas ao patrimônio musical brasileiro, esperando-se que o presente volume seja apenas um dentre muitos outros, cada vez mais numerosos e diversificados, mas principalmente gerando um impacto cada vez maior, tanto no meio acadêmico, quanto no âmbito específico de cada assunto abordado.


Organizadores

Paulo Castagna – UNESP.

Carlos Sandroni – UFPE.


Referências desta apresentação

DORES, Marcus; LOPES, Célia. Apresentação. LaborHistórico. Rio de Janeiro, v. 8, n.1, p. 10-12, jan./abr. 2022. Acessar publicação original [DR]

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