2. Aprendizagem histórica (?) como prática de libertação – Paulo Freire

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Freire dispensa apresentações, no Brasil e fora dele. Autor de dezenas de ensaios publicados em livros, o recifense Paulo Reglus Neves Freire (1921/1997) é reconhecido como o criador de uma “filosofia educacional e um método de investigação e pesquisa ancorados numa antropologia e numa teoria do conhecimento” (Gadotti, 2012, 460). É o intelectual brasileiro mais citado no exterior, em frequência semelhante aos principais textos escritos por Thomas Kuhn e de Karl Marx. (Santana, 2019, p.13-15). Sua obra mais conhecida – Pedagogia do oprimido – vendeu entre 800.000 e 1.000.000 de exemplares em 200 edições e em 57 línguas, no período de 50 anos (Santana; Souza, 2019). Sua apropriação, inclusive no Brasil, é tão elástica que é frequentemente assemelhada a abordagens diferentes em termos de produção de sentido: a epistemologia construtivista de Jean Piaget, a Teoria da História de Jörn Rüsen e a epistemologia pós-colonial de Frantz Fanon, Albert Memmi e Eduard Said. (Lima, 2011, p.14-18; Becker, 2017, p.10-12).

Nesta aula, não queremos identificar as fontes da sua Filosofia da Educação e de sua Pedagogia. Não queremos apontar contradições e fragilidades das suas combinações teóricas e do emprego de categorias. Nos interessam as suas proposições sobre a educação e a aprendizagem. Como explicitamos na aula 1, o retorno a Freire é uma tentativa de apontar as possibilidades de emprego e as limitações das teses de Freire para a construção de teorias da aprendizagem disciplinar histórica. Cumpriremos a tarefa, elencando quatro significados de aprendizagem, quatro possibilidades de proveito desses significados para a construção de projetos de aprendizagem histórica e, por fim, quatro dificuldades de emprego das proposições de Freire no nosso tempo presente.

2.1. Aprendizagens freirianas

Ao pé-da-letra, a palavra “aprendizagem” e os respectivos termos lematizados (“aprender” e “aprendido”) não são categorias para Freire, nos limites do nosso corpus (Ver referências abaixo). Tais palavras, em geral, tem uso ordinário, a exemplo de: [“nossa democracia aprendeu”]. Isso podemos afirmar quando comparamos a frequência com a qual Freire emprega os termos “aprender”, frente aos termos “educação”, “educar”, “pedagogia”, “conhecer”, “ensinar” e “estudar”.

Também ao pé-da-letra, a perspectiva de análise de Freire é dominantemente a do professor. Considerando que a tarefa que apresentamos para vocês foi a extração de significados explícitos ou implícitos de aprendizagem e de aprendizagem histórica em seus livros e, ainda, considerando que lançamos mão de um conceito típico-ideal para cumprir a tarefa, destacamos quatro significados de aprendizagem constatados nos sete títulos analisados, mas sempre da perspectiva de um imaginado aluno.

Um inventário detalhado das coisas que realizam a aprendizagem freiriana vocês encontraram na própria obra do autor, a partir dos seus específicos interesses. Encarem, portanto, os quatro tópicos como uma escolha didática, de dois professores que se organizam para falar durante 50 minutos.

Aprender é internalizar conhecimentos e habilidades do convívio democrático

O primeiro significado de aprendizagem é o de processo simultâneo de responsabilização do sujeito por sua realidade local/nacional e de tomada de decisões a respeito. Aprendizagem é mudança de comportamento. Essa mudança de comportamento pode ser traduzida como o ato de internalizar a responsabilização pelo entorno e a tomada de decisão.

Esta definição pode ser explicada a partir de duas motivações: o caráter holístico do discurso de Freire sobre educação (sua Filosofia da Educação) e os resultados da análise de conjuntura da realidade política nacional dos anos finais da década de 50 do século passado.

Para o Freire de 1959 (professor e administrador do Serviço Social da Indústria e autor de Educação e atualidade brasileira), a educação é o processo de humanização do homem. É um processo de elevação de seu comportamento predominantemente “natural”, “passional” ou “acrítico” para um comportamento predominantemente histórico, racional ou crítico.

Por esses parâmetros, o povo brasileiro enfrenta um problema histórico: a assimetria entre as necessidades de participação política provocado pelo “surto” democrático proveniente da industrialização, e a “inexperiência democrática” desse mesmo povo, cultivada por quatro séculos de colonização exploratória.

Com o significado de Teoria apresentado na aula 1, podemos concluir que o aprender em Freire é sinônimo de educar. E se o seu propósito é garantir desenvolvimento econômico e participação popular na política nacional, aprender é interiorizar (individual e coletivamente) conhecimentos e habilidades típicas do convívio democrático. Aprender é transformar hábitos democráticos em valores primordiais para a vida nacional. A aprendizagem escolar, enfim, é um processo de substituição dos comportamentos típicos de sociedades autoritárias por comportamentos típicos de sociedades democráticas. (Freire, 1959, p.62).

Aprender é elevar-se da consciência acrítica à consciência crítica

Outra variante de aprendizagem está nos textos do Paulo Freire exilado de 1967 (Educação como prática de liberdade) que se ocupa com o povo brasileiro do pós-golpe de 1964 e com o homem do “terceiro mundo”. Neste contexto, educação é o instrumento que auxilia o homem brasileiro a “inserir-se no processo, criticamente”; “ajudá-lo a ajudar-se […] fazê-lo agente de sua própria recuperação […] pô-lo numa postura conscientemente crítica diante dos seus [novos] problemas”; propor “ao povo a reflexão sobre si mesmo, sobre seu tempo, sobre suas responsabilidades, sobre seu papel no novo clima cultural da época de transição” (Freire, 1967, p.56-57). Em resumo: Freire quer que o homem (e o povo) brasileiro transporte-se da consciência “intransitivada” para a consciência “transitiva”, superando o estado da consciência “transitiva ingênua”, mas evitando a disseminação da consciência alienada, típica das determinações industrialistas.

Dentro desse objetivo, o aprender pode ser definido como o ato de tomar para si a responsabilidade pela resolução dos problemas locais e nacionais de modo intelectual e experiencial. Dizendo de modo mais abstrato, aprender é realizar a “vocação da pessoa em ser sujeito” (p.57). Aprender, enfim, é tornar-se protagonista de sua vida social.

Aprender é conhecer os determinantes da opressão.

Um ano depois, Freire complementa o Educação como prática de liberdade, publicando a Pedagogia do Oprimido (1968). A ideia de homem se mantém: ser finito, incompleto, vocacionado à liberdade e topologicamente caracterizado pelas capacidades de sensibilidade, razão e ação. Educar é, então, promover o desenvolvimento simultâneo das capacidades de pensar e agir. Isso significa que a sua Pedagogia, diferentemente das que estão em curso, compreende o aprender como mobilizar, simultaneamente, um pensamento e uma ação. Sua pedagogia é assumida como simultaneamente teórica e prática.

Na Pedagogia do Oprimido, Freire também detalha a coisa a ser aprendida ou o objeto manipulado pelo professor diante dos alunos. Quem ensina comunica algo e esse algo é o conteúdo. Até aqui, nada vemos de diferente das pedagogias dominantes. Mas Freire destaca: o conteúdo, como instrumento de libertação, deve informar sobre os determinantes da opressão. Por essa razão,  conteúdo deve ser colhido no entorno da vida mesma do aluno. Assim, de tarefa solitária da Pedagogia, a seleção de conteúdo passa a preencher quase todas as etapas método freiriano de alfabetizar adultos: 1. investigar da “consciência real” dos educandos (modos de pensar, agir e sentir, na comunidade); 2. codificar o resultado da investigação em “temas geradores” (que põem os educandos em situações limites); 3. problematizar esses temas mediante a apresentação das situações-limite codificadas e o questionamento das respostas dos educandos a essas situações-limite; e 4. Produzir material didático e programa. (Freire, 1969)

Para o Paulo Freire de 1992, então secretário de Educação do município de São Paulo, a tarefa não é mais democratizar a escola como meio de cultivar o desenvolvimento econômico e de suprir a “inexperiência democrática” do povo. Sua meta, agora, é instrumentalizar a escola para manter as práticas democráticas recuperadas recentemente. A afirmação da liberdade como vocação permanece. É necessário fugir aos extremos da “tirania da autoridade” e da “tirania da liberdade”. No entanto, diante das decepções provocadas pelos políticos no novo regime democrático (supomos), outro “imperativo existencial e histórico” (ontológico) deve ser defendido: a esperança de efetivação dessa liberdade.

Aqui, em Pedagogia da Esperança, a aprendizagem como mudança de comportamento (do autoritário ou assistencialista ao democrático ou participante) é mantida, junto à ideia corrente de aprendizagem como “apropriação” ou “apreensão” de um “conteúdo” por parte do aluno. A diferença está no fado de que Freire põe os verbos “apropriar-se” e “apreender” na dependência dos fins educacionais: aprender conscientemente.

Isso não é pouco para o nosso tempo. Agindo dessa maneira, Freire reitera um dos argumentos basilares do planejamento educacional que vigora há três séculos (para ficarmos com as ideias de educação na modernidade): se educar é formar pessoas, deve o professor refletir o tempo inteiro sobre o as estratégias e conteúdo que podem viabilizar a formação da pessoa idealizada. Ensinar e selecionar coisas somente se justificam quando estão relacionados ao cumprimento de um fim (ainda que utópico).

Aprender é interpretar e generalizar

Nos anos seguintes, esse desdobramento da aprendizagem em habilidades, conhecimentos e valores é mais frequente. Em Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa (1996), Freire situa o ensinar como historicamente posterior ao aprender e detalha operações do aprender docente, entre as quais estão as habilidades de: investigar, criticar, refletir sobre sua prática, tomar decisões conscientes e agir com liberdade e autoridade. (Freire, 1996, p.12).

É, porém, no clássico Professora sim, Tia não, um manual de formação de professores menos orgânico que o Pedagogia da autonomia, onde encontramos o último detalhamento das coisas que traduzem a sua ideia freiriana de aprender. Aqui, ela está implícita na ideia de estudar, que é dever ético de todo professor em formação e em atuação. Para o autor, aprendizagem é mudança, da “experiência sensorial que caracteriza a cotidianidade à generalização que se opera na linguagem escolar e desta ao concreto tangível” (Freire, 2015, p.61).

Em passagens próximas ele se refere ao “aprender” como sinônimo de “conhecer” e o conhecer como “ler”, “observar” e “reconhecer as relações entre objetos”. Para persuadir o leitor sobre a assertividade dessa definição ele metaforiza essa passagem com algumas imagens: “leitura anterior do mundo” e “leitura da palavra”; estar dentro e estar fora da coisa a ser conhecida; estar perto e estar distante da coisa a ser conhecida; e, por fim, compreender a coisa pelos sentidos e compreender a coisa pela razão.

Todas essas metáforas são coroadas com o exemplo da nordestina que, interrogada sobre a imagem de um oleiro, que migrou da resposta sensorial – vejo o artefato com forma de sobrevivência daquele homem – para a resposta generalizadora típica da “experiência escolar” – vejo o artefato como uma expressão de cultura. (Freire, 2015, p.63)

 2.2. Aprendizagens freirianas e aprendizagem histórica

Pelos exemplos acima, é fácil perceber que Paulo Freire não pensou aprendizagens disciplinares. Isso significa que, objetivamente, não encontramos “a” teoria da aprendizagem histórica esboçada por Freire nos livros citados aqui. Consequentemente, profissionais interessados na elaboração de uma teoria da aprendizagem histórica de tons freirianos devem se aventurar a construí-la, partindo (dos) ou chegando aos insumos ele oferece. E esses insumos são as prescrições sobre conhecimentos e habilidades necessárias aos alunos, taxonomia da consciência humana, habilidades conjugadas do ensinar e do aprender,

Conhecimentos e habilidades

Em Educação e atualidade brasileira colhemos a primeira ideia de conteúdo constituinte de uma disciplina escolar história. Se a sua ideia de aprender história é a de um processo de mudança do comportamento do aluno dos anos iniciais do Ensino Fundamental, sob fins de responsabilização, engajamento e protagonismo individual e social do seu aluno, vocês podem projetar planos de ensino, nos quais os alunos possam:

  • Conhecer história social local/regional e o modo como ele mesmo aprende;
  • Desenvolver junto aos alunos as habilidades de investigar e discutir causas e soluções para os problemas locais;
  • Desenvolver junto aos alunos o hábito de trabalhar em grupo ou colaborativamente;
  • Desenvolver junto aos alunos o hábito de se engajar em projetos para a resolução de problemas locais/regionais/nacionais, empregando métodos científicos.

O que listamos acima é uma transferência contrafactual do que Freire quis dizer quando prescreveu saberes locais/regionais como conteúdo substantivo, o desenvolvimento de habilidades metacognitivas, o engajamento, o aprendizado ativo, o cultivo da solidariedade social e da autonomia.

Tipificação de consciências

Em Pedagogia como prática da liberdade Freire potencialmente disponibiliza uma ferramenta de avaliação e de planejamento: a tipologia da consciência humana. Usando este quadro, você pode, teoricamente, identificar o estágio de consciência de indivíduos ou de grupos, planejar uma proposta de intervenção, considerando etapas de progressão e, por fim, e avaliar os resultados dessa mesma proposta de intervenção.

Tipologia da consciencia progressao das aprendizagens em Paulo Freire e1659532265672

Observem a coluna de indicadores. Percebam que cada item corresponde ao que Freire entende como variável básica que explica as suas hipóteses sobre aprendizagem. Eles referem-se às ideias de ciência, comunicação, habilidades e capacidades individuais. Eles referem-se, por fim, ao lugar espaço/temporal onde viceja cada uma das consciências em análise.

Habilidades conjugadas do ensinar e do aprender

Ainda em Pedagogia como prática da liberdade, vocês podem encontrar insumos para a instituição de finalidades da disciplina escolar história, no interior de currículos prescritos, como a Base Nacional Comum Curricular ou os Planos e Programas estabelecidos pelas secretarias estaduais e municipais de Educação. Partindo da ideia de que ensinar é “dialogar com o analfabeto sobre situações concretas” (Freire, 1967, p.110), um possível plano de curso para o ensino de História na Educação de Jovens e Adultos poderia ganhar a configuração que se segue.

Metas de ensino e expectativas de aprendizagem com inspiracao freireiana e1659532330968

Habilidades e conhecimentos necessários à atuação docente

Na Pedagogia do Oprimido, também há indicações para a construção de currículos prescritos, destinados especificamente à formação de professores. A organização do trabalho pedagógico pensado por Freire para a alfabetização de adultos é fonte para a programação de um curso de formação inicial ou continuada a partir de quatro conjuntos de habilidades e conhecimentos.

Habilidades e conhecimentos para a formaao continuada com inspiracao freiriana e1659532376187

Em suma, o quadro acima sugere que um curso de formação habilite o professor de História para construir o conteúdo disciplinar (investigar, selecionar e avaliar) a partir da realidade concreta do aluno, ao mesmo tempo em que deve conhecer o estado (ou a natureza) da consciência do aluno (acrítica/ingênua/crítica) e o estado (ou a natureza) da consciência possível de ser alcançada com a disciplina história.

Um conceito metahistórico

Em Pedagogia da Esperança, uma das atitudes inspiradoras para o Ensino de história está na reflexão de Freire sobre a ideia de tempo que deve ser incutida nas mentes dos alunos. Se antes da ditadura militar ele se ocupava de definir “presente”, agora ele se preocupa com a ideia de “futuro”.

Essa ideia pode orientar a escolha de finalidades e do conteúdo para a disciplina escolar história. Para ele, três opções estavam postas: a posição reacionária do futuro como repetição do presente, a posição revolucionária, do futuro como “progresso inexorável” e a sua própria visão – o futuro como possibilidade, inclusive para fazermos do modo como “mais ou menos” o desejamos.

Um princípio ético

Outra atitude inspiradora ao ensino de história, também comunicada em Pedagogia da Esperança, está na proposição freiriana de que o educador democrático deve explicitar a sua posição política (ser honesto). Freire enfatiza a ideia de que o educador deve selecionar conteúdo pragmático (relacionado ao fim – consciência – e à realidade do aluno).

Para o ensino de história, esse princípio ético desencadeia duas atitudes polêmicas nos nossos dias. Significa que um aluno de história deve ter desenvolvida a sua atitude de tomar posição, de explicitá-la e de defendê-la. Significa, ainda, que um futuro professor de história deve aprender a selecionar conteúdo substantivo e a se apropriar desse conteúdo selecionado sob os critérios da familiaridade e do pragmatismo. Nesse sentido, verdadeiro é o conhecimento histórico que serve à conscientização sobre a opressão, a liberdade e a esperança de transformação.

3. Limitações do uso de Freire no nosso tempo presente

Buscar aprendizagens históricas nas obras de Freire, evidentemente, implica em aceitar as suas limitações. Para manter a simetria, vamos destacar quatro delas: as dificuldades de incorporação dos usos que fez das palavras “história” e “historicidade” e “tempo” e “Estado”.

Homem e educação

A ideia dominante de homem (de ser humano) em Freire é largamente devedora do esclarecimento kantiano. Viver segundo a sua razão é um projeto a ser seguido por todos. Mas, o que fazer com aqueles que entre nós discordam da ideia de que estamos fadados ao progresso e de que todos os povos fazem parte de um corpo chamado civilização ou humanidade, esses colegas podem vir a ser professores de história freirianos?

Deus e liberdade

A ideia dominante de homem (de ser humano) em Freire também é marginalmente devedora do deísmo cristão. Deus liberta. Consequentemente, a religião não é um obstáculo ao cumprimento da vocação do homem. Mas, como ficam os leitores críticos da modernidade, os professores existencialistas, os agnósticos e os ateus, os leitores de F. Nietzshe, por exemplo, que veem no Deus cristão um dos maiores impedimentos à liberdade dos sujeitos?

História e historicidade

 Freire não se refere à história ciência ou à história disciplina escolar. Mas os teóricos da aprendizagem histórica do nosso tempo levam em consideração a relação necessária entre ciência da história e história disciplina escolar. Freire aborda história como Filosofia especulativa da História, ou seja, Freire não explora as condições de possibilidade do conhecimento do passado, não discute os modos de legitimação das proposições históricas. O seu pragmatismo sobre a verdade está, de certo modo, na contramão do pensamento dominante atual.

Freire também emprega, ao modo de muitos historiadores, a palavra “historicidade”. Ocorre que a invenção do termo e a sua transformação em categoria (o caráter de estar no tempo) não foram criações de historiadores. Elas são anteriores ao estabelecimento da história como ciência. Aqui, novamente, Freire a emprega sob o ponto de vista de um filósofo (especulativo) da educação.

Estado e tempo

Não obstante a inspiração freiriana ser compatível com determinados estados de coisas da nossa conjuntura política, é necessário perceber as diferenças. Para Freire, a teoria da aprendizagem comunicada na Pedagogia do oprimido é uma das duas etapas do processo de libertação do homem. É o momento pré-revolucionário e não estatal. Nós, ao contrário, vivemos um período estatista, onde a oferta formal da educação escolar básica e pública não é seletiva e autoritária como nos anos da ditadura militar pós-1964. Que lugar atribuir ao Estado na prescrição de programas de ensino?

No uso da Pedagogia da Esperança outra dificuldade deve ser enfrentada. Quem não professa o tempo histórico como realizado pela dialética hegeliana da oposição entre contrários em uma mesma relação pode dizer-se freiriano? Freire afirma: “os momentos que vivemos ou são instantes de um processo anteriormente iniciado ou inauguram um novo processo de qualquer forma referido a algo passado.” O presente ou a síntese, guarda os germes responsáveis pela destruição do presente já passado. Essa proposição desconsidera as ideias de que o passado é para muitos historiadores uma representação móvel e uma invenção do presente e não o contrário.

Referências

BECKER, Fernando. Paulo Freire e Jean Piaget: teoria e prática. Revista Eletrônica de Psicologia e Epistemologia Genéticas. V.9, Número Especial, 2017.

FREIRE, Paulo Reglus Neves. Educação e atualidade brasileira. Tese de concurso para a cadeira de História e Filosofia da Educação na Escola de Belass Artes de Pernambuco. Recife: [Edição do autor], 1959.139 p.

FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade e outros escritos. 5ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981.

FREIRE, Paulo. Educação como prática de liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1967.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. [?]: EGA, 1996.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. [1992]. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido [1968]. 17ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1970.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 50 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2011. Resenha de: GADOTTI, Moacir. Por que continuar lendo Pedagogia do Oprimido? Revista de Políticas Públicas, São Luís, v.16, n.2, p.459-461, jul./dez. 2012.

FREIRE, Paulo. Professora, sim; Tia, não: Cartas a quem ousa ensinar [1993]. 24ed.Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.

FREITAS, Ana Lúcia Souza de. Ensinar e aprender. In: STRECK, Danilo R.; REDIN, Euclides; ZITHKOSKI, Jaime José (Orgs.). Dicionário Paulo Freire. 2ed.Belo Horizonte: Autêntica, s.d., p.246-251.

LIMA, José Gllauco Smith Avenlino de. Paulo Freire e a Pedagogia do oprimido (Afinidades pós-coloniais). Recife, 2011. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) – Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

SANTANA, Otacilio Antunes; SOUZA, Suzana Carvalho de. Pedagogia do oprimido como referência: 50 anos de dados geohistóricos (1968-2017). Revista História da Educação, v.23, 2019.


Avaliação diagnóstica

Leiam o texto de síntese e alguns trechos dos textos originais e preencham o formulário abaixo que registra as principais dificuldades de leitura e orientam a preleção do professor.

1. Sobre o texto síntese “Aprendizagem geral e aprendizagens disciplinares”:

  • Li e não entendi a seguinte passagem: _____________________________
  • Li e quero comentar a seguinte declaração com a qual concordo/discordo: ___________________________

2. Sobre o texto do autor-objeto da aula desta semana:

  • Li e não entendi a seguinte passagem: ________________________________
  • Li e quero comentar a seguinte declaração com a qual concordo/discordo: _____________________________

Acesse aqui o formulário para responder a esta avaliação diagnóstica.


Próxima aula

Na próxima aula, iniciaremos a exposição de propostas de aprendizagens reivindicadas por pesquisadores estrangeiros. Abriremos a discussão com as principais categorias formuladas por Jörn Rüsen, extraídas, principalmente, do livro Teoria da História: Uma teoria da história como ciência.


Para citar este texto

FREITAS, Itamar; OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de. Aprendizagem e aprendizagem histórica em Paulo Freire. São Cristóvão, 2020. Disponível em <https://www.resenhacritica.com.br/a-cursos/aula-1-aprendizagem-geral-e-aprendizagens-disciplinares/>

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