Africanidades, Artes e Saberes / Tempo Amazônico / 2020

Esta edição da Revista Tempo Amazônico é composta pelo dossiê Africanidades, Artes e Saberes, organizado pelos professores Marcos Vinicius de Freitas Reis, Sérgio Junqueira e David Junior de Souza Silva.

O objetivo deste dossiê é reunir trabalhos que versem sobre as interfaces entre as religiões afro-brasileiras e a produção de saberes, considerando a arte como um campo de saberes ao lado dos saberes medicinais e científicos. O dossiê convocou trabalhos que fizessem a reflexão sobre como as religiões afro-brasileiras são retratadas no campo científico e como são representadas nas modernas e tradicionais linguagens artísticas – como o grafite e o artesanato.

Ao mesmo tempo, o dossiê convocou reflexões que tratem dos conflitos epistemológicos entre a matriz de visão de mundo africana e afro-brasileira, expressas em suas muitas expressões religiosas, e a visão de mundo eurocêntrica, conflitos que quase nunca tomam forma na dimensão epistemológica, mas na dimensão religiosa, configurando os fenômenos que chamamos racismo religioso e intolerância religiosa.

O texto de Taissa Tavernard de Luca, professora do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião (UEPA) e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (UFPA), e de Valter dos Santos Vieira, mestre em Ciência da Religião, Arte e expressão religiosa no Amapá: um olhar a partir do grafismo, investiga o uso da arte como expressão religiosa dentro de um terreiro de candomblé, em Macapá. O respectivo terreiro, templo religioso da Nação Angola, usa imagens feitas pela técnica artística do grafite como meio de representação do sagrado. As imagens representam divindades do panteão africano, santos católicos e caboclos do tambor e mina maranhense.

Quatro textos do dossiê dedicam-se a compreender o fenômeno do racismo religioso. O primeiro, Repensando os ataques às Religiões Afro: uma breve discussão sobre o conceito de racismo religioso no Candomblé, de Ozaias da Silva Rodrigues, Doutorando em Antropologia Social, reflete sobre os usos científicos dos conceitos de racismo religioso e de intolerância religiosa em relação aos religiosos candomblecistas, e tipifica diferentes sentidos com que o conceito racismo religioso aparece nas falas dos candomblecistas para se referir à discriminação que a religião sofre.

O segundo, Tipos de Racismo Religioso: Padrões Comportamentais do Racismo Religioso, de Roberto José Nery Moraes, professor do curso de Direito Unifap, visa discutir a teoria geral do racismo religioso, como forma de comportamento aprendido que enseja na intolerância religiosa. A realidade empírica em qual se baseia a discussão teórica do autor é a das comunidades tradicionais de terreiro do Amapá, expressão religiosa, conforme o autor, de grande contribuição para a formação da identidade étnico-ambiental-religiosa do povo amapaense.

O texto de Pedro Henrique de Oliveira Germano de Lima, doutorando em Antropologia pela UFPE, O campo das religiões afrobrasileiras visto pelas teorias: balanço e crítica de normatizações, tem como objetivo a compreensão de como os cientistas sociais se debruçam sobre o fenômeno religioso, examinado a troca e circulação de conceitos entre os campos colocados em interação nesta tarefa científica: o campo das ciências sociais e o campo das religiões indo-afro-brasileiras. O texto defende o postulado de que as religiões eventualmente podem ser legitimadas pelo binômio autenticidade-falsidade, a ciência social não deve adotar este binômio como recurso heurístico. A ciência social deve afastar-se desta discussão sobre autenticidade, e investigar como as tradições religiosas são criadas pelos devotos.

O texto Catalogação dos Remédios Naturais Amazônicos – Santana AP, de autoria de Rodrigo Reis Lastra Cid, Afrânio Patrocínio de Andrade, ambos professores da licenciatura em Filosofia da Unifap, e Marlon Viana de Almeida Junior, graduando em Filosofia, trata-se pesquisa realizada com curandeiros da cidade de Santana, objetivando catalogar suas práticas e receitas, e suas crenças com relação à mística de suas garrafadas.

Concluindo o dossiê, o texto A tradição ceramista como guarda do Mistério Amazônico, de autoria da mestra em Ciência da Religião Roseane Barbosa Ferreira, realiza pesquisa de campo com cinco oleiros, que renovam a tradição da confecção das peças em cerâmicas no bairro do Paracuri, no município de Icoaraci, no Pará. A pesquisa conclui que mesmo na produção artesanal contemporânea dos artefatos cerâmicos a mediação principal ser um sentido econômico para a atividade, a religiosidade se faz presente na atividade, da qual não se esquece ser herança dos mitos e encantarias da região.

A seção artigos livres começa com a compreensão histórica da dinâmica da economia capitalista no período de vigência do Welfare State, no artigo intitulado Acumulação Capitalista, Welfare State e Taxa de Mais Valor, de autoria de Ednéia Alves De Oliveira e Gustavo Giovanny Dos Reis Apóstolos. O texto examina as relações que existem entre as políticas de aumento de renda aos trabalhadores, da matriz econômica keynesiana, e a extração ampliada da mais valia possibilitada pelo modo de organização da produção taylorista.

O texto Sociologia e Modernidade: entre o mundo pré-moderno e o póstradicional, de David Junior de Souza Silva também tematiza processos de longa duração, como os que foram a passagem do sistema feudal para a sociedade moderna industrial. Este artigo investiga as relações recíprocas entre Sociologia e Modernidade.

Outra contribuição sociológica a este número é o texto A recepção de José Carlos Mariátegui no brasil: ausência e presença de Glaucia Maria Tinoco Barbosa. Este texto é uma reflexão no campo da Sociologia Latino-americana, investigando as características específicas da nacionalização da teoria social de Mariátegui no Brasil e sua aplicação a compreensão da sociedade brasileira.

O ensino de história é tema do artigo intitulado Heavy Metal em sala de aula: a Inquisição Católica nas músicas do Iron Maiden de Diogo Tomaz Pereira, Mestre em História pela Universidade Federal de Juiz de Fora. O texto, colocando-se o objetivo de elaborar inovações metodológicas para o ensino de história, trabalha a possibilidade da utilização de composições musicais do gênero heavy metal como ferramentas nas aulas de história.

Concluindo este número, o texto de Eliane Vasquez, intitulado Movimento de reforma das prisões e ciência penitenciária no século XIX, reflete sobre o processo institucionalização da ciência penitenciária na segunda metade do século XIX compreendido a partir da perspectiva da história da ciência e em suas relações com o movimento de reforma penitenciaria, que emergia como questão social no período.

David Junior de Souza Silva (Unifap)

Marcos Vinicius de Freitas Reis (Unifap)

Sérgio Junqueira (IPFER)


SILVA, David Junior de Souza; REIS, Marcos Vinicius de Freitas; JUNQUEIRA, Sérgio. Apresentação. Tempo Amazônico, Macapá, v.8, n.1, 2020. Acessar publicação original [DR]

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