O uso da calculadora nos anos iniciais do ensino fundamental – SELVA; BORBA (Bo)

SELVA, A.C.V. BORBA, R.E.S.R. O uso da calculadora nos anos iniciais do ensino fundamental. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. Resenha de: KISTEMANN JR., Marco Aurélio. BOLEMA, Rio Claro, v.28, n.50, p.1579-1582, dez., 2014.

Este livro das educadoras matemáticas Ana Selva e Rute Borba, já na sua introdução, revela que a discussão sobre o uso da calculadora nas salas de aula do Ensino Fundamental é atual e controverso, dividindo opiniões nos diversos segmentos educacionais, uma vez que a polêmica se dirige para a questão de como a calculadora pode auxiliar no desenvolvimento de atividades em sala de aula, influenciando positivamente o aprendizado matemático de alunos de séries iniciais.

De acordo com as autoras, algumas defesas do uso da calculadora embasam-se no amplo uso dessa ferramenta em situações matemáticas extra-escolares. Por outro lado, sujeitos que se opõem ao uso da mesma, argumentam que crianças que ainda não dominam as operações aritméticas não devem ser expostas ao uso da calculadora para a solução de problemas matemáticos. Corroboramos a opinião das autoras de que a mera introdução da calculadora, sem reflexões sobre suas reais possibilidades e seus limites, não é suficiente para que essa mídia seja propulsora de desenvolvimento de conceitos matemáticos, na correção de erros e como instrumento de autoavaliação.

Apesar das divergências, as autoras defendem que, se bem utilizada em situações didáticas planejadas com critério, a calculadora constitui-se como ferramenta que pode auxiliar o aluno, por exemplo, na constituição do sistema de numeração decimal, na operação com números naturais e racionais, entre outros conceitos matemáticos. Para guiar suas ações investigativas, Selva e Borba traçam questionamentos centrais buscando investigar se: (i) o uso de calculadora por alunos em séries iniciais inibe o raciocínio dos mesmos; (ii) o uso de calculadora impede avanços matemáticos; e (iii) a calculadora pode auxiliar o desenvolvimento do raciocínio matemático de alunos dos anos iniciais.

No capítulo II, intitulado O que pensam professores sobre o uso da calculadora, fica claro, nas falas das autoras, que o principal responsável pelo uso da calculadora em sala de aula é o(a) professor(a), cabendo a este profissional a decisão final de elaboração de atividades para que os alunos, desde cedo, possam interagir usando a calculadora. Nesse sentido, percebemos que discussões sobre o uso de computadores e calculadoras em sala de aula propiciarão aos professores conhecimentos sobre como e porque utilizarem essas ferramentas enquanto instrumentos de ensino e de aprendizagem. As autoras, neste capítulo, apresentam ainda um levantamento realizado junto a professores que atuam nos 4º e 5 º anos, buscando descobrir se estes propõem atividades e como são as propostas elaboradas para o uso de calculadora no Ensino Fundamental. Esse levantamento tem como escopo analisar, de uma forma abrangente, a concepção de professores com relação ao uso da calculadora, a importância da mesma, as (des)vantagens percebidas quando de sua utilização e quais conteúdos são mais apropriados para serem desenvolvidos com esse recurso didático. Um resultado importante desse levantamento, dentre outros, é o que revela que, embora os professores afirmem reconhecer a necessidade do uso da calculadora em sala de aula, apontando as (des)vantagens de sua utilização, os mesmos reconhecem que não têm feito uso sistemático deste recurso no seu cotidiano escolar.

O que as pesquisas mostram sobre o uso da calculadora dá nome ao terceiro capítulo desse livro, no qual Selva e Borba discutem como e o que dizem os pesquisadores em Educação Matemática sobre o uso de calculadora em sala de aula. Embora defendam que o uso de computadores e calculadoras pode promover uma reorganização da atividade matemática, ressalta-se, ao longo do capítulo, que a calculadora é um mero instrumento coadjuvante e acessório nas atividades matemáticas propostas, uma vez que as tarefas devem ser interpretadas e consumadas pelos alunos.

As autoras relatam que estudos nacionais e internacionais vêm apresentando resultados que demonstram que a calculadora pode exercer um papel importante na compreensão de conceitos matemáticos, explicitando que a calculadora pode e deve ser proposta em sala de aula a partir de situações que estimulem os alunos a refletirem, subsiando também o professor na proposição de atividades matemáticas.

O Capítulo IV, Usando a calculadora em sala de aula, apresenta uma série de seis observações realizadas pelas autoras, em 2006, em uma escola particular em Jaboatão dos Guararapes, Pernambuco, em uma turma de 5º ano do Ensino Fundamental e de quatro observações em uma turma de 4º ano do mesmo nível e na mesma escola. A escolha por essa escola e essas séries se deve ao histórico – de pelo menos quatro anos – de desenvolvimento de atividades envolvendo a calculadora em sala de aula. Nesta escola buscam-se diversas formas de se superar dificuldades no trabalho com o uso da calculadora, tais como a resistência dos pais, a dependência dos alunos com relação ao uso de calculadora e o despreparo docente para o uso de tecnologias. Em suma, este capítulo mostra exemplos de atividades que podem ser utilizadas em sala de aula com o apoio da calculadora e os momentos prazerosos de aprendizagem resultantes das discussões de conteúdos matemáticos por parte de professor e alunos do Ensino Fundamental de uma escola particular pernambucana.

O capítulo intitulado Como os livros didáticos têm tratado o uso da calculadora, concentra-se no papel desempenhado pelos responsáveis por planejar e elaborar os livros didáticos, bem como no papel daqueles que analisam livros didáticos de Matemática dos anos iniciais e suas propostas concernentes ao uso de calculadora. Para tanto, realizou-se a análise detalhada de coleções de livros didáticos em particular no que se referia às atividades nas quais se observava a necessidade do uso da calculadora, buscando também uma verificação acerca das reflexões que os compêndios didáticos, no que diz respeito ao uso de tecnologias, proporcionam aos professores em suas práticas pedagógicas.

Percebemos também neste capítulo que, embora a importância da calculadora como ferramenta de cálculo seja reconhecida, o seu uso em sala de aula com sua representação simbólica alternativa, perfazendo-se como instrumento de explorações conceituais em cenários variados de resolução de problemas, ainda apresenta-se como alvo de muitos preconceitos, pois muitos profissionais consideram que a inserção da calculadora pode inibir o raciocínio dos alunos, além de gerar a denominada preguiça mental.

O penúltimo capítulo, Outras atividades com calculadora, apresenta propostas de atividades com a calculadora organizadas de forma criteriosa, levando-se em consideração o tipo de atividade, o eixo matemático a que se refere e os conceitos trabalhados. As atividades buscam entre outras propostas: (i) explorar o valor posicional do sistema de numeração decimal; (ii) propor a resolução de problemas com grandezas e medidas; (iii) explorar a divisão como geradora de números decimais e a multiplicação de decimais; (iv) explorar diferentes representações dos conceitos matemáticos e as relações entre operações inversas; e (v) estimular atividades de estimativas e realização de cálculos confirmadores de resultados.

No capítulo que encerra o livro, as autoras enfatizam que o fato da calculadora enriquecer o processo de ensino aprendizagem não significa que se deva extinguir o ensino de algoritmos com o uso de papel e lápis na resolução de problemas matemáticos. Em oposição a essa ideia absurda, as autoras asseveram que o tradicional uso do papel e do lápis permitem também aos alunos evoluir na resolução de um problema, ampliando as possibilidades de estratégias favorecedoras da construção dos conceitos matemáticos que permeiam o algoritmo. Contudo, ressaltam a importância do uso de novas tecnologias no processo de ensino e aprendizagem matemática já nos anos iniciais do Ensino Fundamental.

Para Selva e Borba é fundamental que ocorra a elaboração de propostas pedagógicas que tragam em seu bojo o uso de tecnologias que perpassem todos os níveis e modalidades de ensino, carecendo também de uma contundente conscientização da comunidade escolar como um todo, pais, alunos, professores, e gestores, para a relevância do trabalho envolvendo tecnologias diversas na escola.

Entendemos que a riqueza do tema exposto por Selva e Borba se revela inicialmente quando se ressalta, em diversos pontos do livro, que o uso da calculadora para a exploração de conceitos matemáticos vem desmistificando o papel da calculadora na sala de aula dos anos iniciais. Entendemos que essa desmistificação é gradativa, mas pode levar os agentes educacionais a adquirir uma visão mais abrangente sobre a utilização de calculadora na escola por meio de atividades que promovam a construção de conceitos matemáticos.

Por fim, a riqueza do tema se revela também quando são apresentadas investigações realizadas pelas autoras que demonstram que a presença da calculadora pode ser motivadora para os alunos, gerando um ambiente de reflexões acerca de situações matemáticas que se tornam repetitivas, enfadonhas e dominadas por práticas mecânicas nas quais se utilizam somente lápis e papel. Ao optar por essa tecnologia, ou seja, pela calculadora, aos alunos é dada uma opção distinta da mera aprendizagem de um algoritmo, o que se torna uma ferramenta valiosa para a reflexão sobre conceitos matemáticos, constituindo-se em um recurso pedagógico complementar para as propostas do professor de Matemática.

Marco Aurélio Kistemann Júnior – Doutor em Educação Matemática pela Universidade Estadual de São Paulo (UNESP), Rio Claro, São Paulo. Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro-RJ. Professor e pesquisador do Departamento de Matemática e do Mestrado Profissional em Educação Matemática, onde lidera o GRIFE/UFJF (Grupo de Investigações Financeiro-Econômicas em Educação Matemática), na Universidade Federal de Juiz de Fora, Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil. E-mail: [email protected].

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Brincar e jogar: enlaces teóricos e metodológicos no campo da educação matemática – MUNIZ (Bo)

MUNIZ, C. A. Brincar e jogar: enlaces teóricos e metodológicos no campo da educação matemática. Belo Horizonte:  Autêntica, 2010. KISTEMANN JR, Marco Aurélio. BOLEMA, Rio Claro, v. 24, nº 38, p. 297 a 302, abril 2011.

Para o autor Cristiano A. Muniz existe uma representação social da ligação entre o jogo espontâneo e a aprendizagem matemática que se vê marcada por uma dicotomia, qual seja, a de que a aprendizagem matemática liga-se ao trabalho enquanto que o jogo não é considerado um espaço para a Matemática. Para Muniz, a atividade matemática é, na visão infantil, sobretudo, ligada a contextos didáticos e a aprendizagem matemática à situação controlada por um adulto, por um professor.

Essas concepções inauguram o primeiro capítulo do livro. Em seu estudo sobre as atividades matemáticas da criança em jogos espontâneos, o autor buscou compreender qual Matemática é produzida quando a criança não está realizando tarefas escolares sob o controle de um adulto. O autor classifica seu estudo como uma investigação etnomatemática no contexto do mundo lúdico da criança, e seu objeto de estudo são as práticas de atividades matemáticas pela criança envolvida em jogos espontâneos. Em suma, o autor busca analisar o jogo como um virtual mediador de uma cultura matemática, enfatizando que, assim, o jogo se configura como um mediador de conhecimentos, de representações presentes num contexto sociocultural no qual a criança se insere e atua.

No capítulo II, “Jogo e educação matemática: aproximações teóricas possíveis e desejáveis”, o autor faz um estudo teórico sobre as concepções de jogos matemáticos e a Matemática. Esclarece que o objetivo do estudo não é analisar aproximações entre jogo e Matemática, mas analisar distintas associações possíveis entre a Matemática e os jogos que transcendam os denominados pelo autor de “jogos matemáticos”. Muniz relata que duas relações entre jogo e Matemática têm sido bastante difundidas e fundam-se nas noções de discussão/argumentação matemática, considerando também a produção científica da Matemática como uma espécie de jogo, isto é, um jogo produzido por (e reservado aos) uma comunidade específica. Nesse caso, são jogos em que as normas se confundem com as regras formais da Matemática: jogos de reflexão pura e jogos matemáticos ou “jogos de recreação matemática” reservados aos que dominam os saberes matemáticos.

Ciente de que há uma aproximação teórica entre o jogo e a Matemática, a proposta da investigação de Muniz direciona-se no sentido oposto a esta concepção, buscando revelar e analisar a Matemática presente nos jogos realizados pelas crianças. Busca, nesse sentido, delimitar o estudo no espaço de produção matemática de jovens estudantes, em contextos de jogos espontâneos, identificando e analisando a Matemática presente nas produções cognitivas das crianças quando estão livres de regras impostas por uma autoridade adulta. Por fim, o autor enseja discutir qual a natureza da relação entre o sujeito e a atividade matemática quando a criança se insere em contextos socioculturais não escolares.

O terceiro capítulo tem como finalidade precisar o conceito de “jogo”, buscando relacionar a aprendizagem matemática com determinadas atividades denominadas de “Jogos”. O autor visa responder à questão que guia seu estudo, qual seja, o que é, em sua acepção, um jogo. Para o autor, é a partir de um paralelismo entre o mundo real e o mundo imaginário construído durante e a partir da atividade lúdica, que traduz uma representação do mundo sociocultural em que se insere a criança, que se pode interpretar e analisar a atividade matemática presente nos jogos.

Embasado teoricamente nos referenciais de Caillois (1967) e Brougère (1995), Muniz busca responder suas questões partindo de jogos do contexto infantil nos quais as regras exigem, de cada criança e do grupo como um todo, competências matemáticas.

No capítulo IV, intitulado “As atividades matemáticas nos jogos presentes na cultura infantil”, o autor discorre sobre a possibilidade de conexão entre a Matemática e o jogo que, para Muniz, são coisas diferentes, pois o jogo não se constitui como Matemática pura, uma vez que a Matemática é tão somente um dos vários elementos que constituem a atividade do jogo.

Explicita o autor, num dado trecho deste capítulo, que a potencialidade do jogo em relação à Matemática não deve ser tomada como panacéia para os problemas existentes no ensino desta disciplina, asseverando que ao educador matemático reserva-se a incumbência de ter precauções e dúvidas quanto à possibilidade de certas aprendizagens a partir do jogo.

O autor relata, no capítulo V: “O espaço pedagógico na educação matemática”, que as relações entre jogo e Matemática ligam-se a questões epistemológicas associadas, seja quanto à natureza da atividade considerada jogo, seja quanto à concepção sobre a construção do conhecimento matemático explorado. Muniz acredita que na dualidade entre a fonte interna de produção de elementos altamente abstratos da Matemática e a necessidade de uma motivação, interna e externa ao sujeito para a realização da atividade matemática, pode-se vislumbrar uma relevante perspectiva de associação entre jogo e Matemática.

Fica claro neste capítulo que ver os jogos como um dos muitos instrumentos socioculturais de difusão e validação de saberes matemáticos possibilita que a relação entre jogo e Matemática se estabeleça como teoricamente profícua quando se toma como pressuposto que o jogo, assim como a Matemática, realiza-se fora da realidade da materialidade. Em outras palavras, jogo e Matemática se constituem como atividades da mente humana, encontrando-se num mesmo plano epistemológico.

Na seção “Ferramentas de intervenção no contexto da didática da Matemática:o jogo como mediador possível”, o autor busca analisar uma possível aproximação entre jogo e educação matemática, no campo da didática, ao introduzir a noção de situação didática a partir da “Teoria de Situações”2 proposta por Guy Brousseau (1998), teoria que fornece relevantes contribuições acerca do uso de jogos na didática francesa da Matemática.

Concordamos com o autor no que se refere à possibilidade de estabelecimento de uma relação entre o jogo e Matemática. Pode-se estabelecer uma análise a partir da consideração teórica de que o sujeito é, ele mesmo, o responsável pela construção do conhecimento matemático numa dimensão ontológica do desenvolvimento humano. Segundo Muniz, esta construção deve realizar-se em situações em que a atividade matemática se faz presente.

No penúltimo capítulo do livro o autor relata que o interesse pela identificação e compreensão da atividade matemática que as crianças e os jovens desenvolvem quando jogando em grupos e longe do alcance de um educador, levou-o a realizar por quatro anos um estudo etnográfico do contexto lúdico de um grupo multicultural de crianças e jovens que frequentaram a Ludoteca Municipal d’Issy les Loulineaux, na periferia de Paris, na França. O objetivo desse estudo foi analisar a natureza da atividade matemática presente neste grupo. Identificados 1776 jogos que envolviam diretamente conhecimentos matemáticos, o autor selecionou seis que foram jogados em grupo pelas crianças. Muniz apresenta neste quinto capítulo, de forma resumida, os seis jogos, bem como as expectativas suscitadas pelas crianças quanto às atividades matemáticas, levantadas por meio de análise do que era proposto aos jogadores.

Muniz acredita que é mister considerar as atividades cognitivas desenvolvidas no contexto de um jogo como submissas aos conhecimentos socioculturais que o próprio contexto do jogo suscita, bem como daqueles inerentes ao repertório cognitivo da criança. Desse modo, a forma de manipular valores, realizar operações, elaborar e solucionar problemas é determinada não só pela estrutura lúdica, mas também pelos conhecimentos socioculturais que, incorporados pelas crianças, passam a fazer parte do sistema de regras dos jogos.

No último capítulo o autor analisa, inicialmente, o jogo quanto a natureza da atividade matemática que ocorre subjugada ao sistema de regras constituído pelas crianças, além de analisar a liberdade quanto a mudança da estrutura lúdica que elimina a possibilidade de realização de certas atividades Bolema, Rio Claro (SP), v. 24, nº 38, p. 297 a 302, abril 2011 301 matemáticas. Também é do âmbito da análise de Muniz estudar a validade da produção matemática como dependente de um conteúdo qualitativo das ações cognitivas em um jogo. Por fim, Muniz analisa as ações cognitivas que se manifestam no jogo, em muitas situações localmente validadas, não possibilitando, portanto, sua transferência para outros contextos.

De acordo com Muniz, tanto a identificação das potencialidades e dos limites de uma atividade lúdica para o desenvolvimento de uma atividade matemática quanto a interpretação de variados jogos desenvolvidos por crianças de contextos multiculturais são os objetivos principais de sua investigação. Neste contexto, cabe ao educador estar presente no desenvolvimento da atividade lúdica, promovendo observações, reflexões e validações dos procedimentos matemáticos.

O autor confirma a ideia de que se uma estrutura lúdica não é parte essencial do jogo, sua eliminação pelo jogador altera, seguramente, a natureza da atividade matemática desejada por aquele que inicialmente concebeu o jogo e o ofereceu à criança. A análise das atividades matemáticas desenvolvidas nos jogos revelou traços e características importantes da cultura lúdica presente nos jogos em análise. Para Muniz, existe, nos jogos, uma relação dialética entre cultura lúdica e atividade matemática, de modo que essas duas facetas contribuem para a constituição das ações matemáticas das crianças que jogam em um ambiente sem controle externo.

O livro de Cristiano A. Muniz é uma leitura obrigatória não só para os interessados em estudar as relações entre jogo e aprendizagem matemática, pois presenteia o leitor com um rico referencial teórico, apresentando um estudo amplo e complexo sobre como o jogo pode ser um mediador para o conhecimento matemático na medida em que se percebe o jogo a partir da capacidade do sujeito de raciocinar, de comunicar e de transitar entre as tantas dimensões do conhecimento matemático. Entendemos que no jogo a criança é o sujeito responsável pelo desenvolvimento da atividade lúdica, bem como pelas situações que suscitam e geram atividades matemáticas, apresentando subsídios para o desenvolvimento da investigação matemática rumo a uma práxis pedagógica em que o caráter lúdico presentifica-se na sala de aula de matemática. Não podemos deixar de ressalvar uma das conclusões do autor: é necessário considerar, antes de tudo, que a intervenção do adulto no jogo espontâneo da criança, a fim de favorecer aprendizagens matemáticas, pode comprometer a qualidade da experiência lúdica em favor do ensino da Matemática.

Notas

2 Das muitas contribuições da “Teoria das Situações” de Brousseau (1998) destacamos a constatação de que existem situações de construção do conhecimento matemático fora do contexto didático, as denominadas situações adidáticas. Em situações adidáticas o professor não é o mediador do conhecimento matemático, uma vez que a mediação neste contexto realiza-se por meio dos contextos e dos objetos culturais do mundo do aluno.

Referências

BROUGÉRE, G. Jeu et Education. Paris: Editions L’harmattan, 1995.

BROUSSEAU, G. Theories dês Situations Didactiques. Grenoble: La Pensée sauvage, 1998.

CAILLOIS, R. Les jeux et les hommes. Paris: Editions Gallimard, 1967.

Marco Aurélio Kistemann Jr. – Mestre em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro/UFRJ. Doutorando em Educação Matemática Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP – Rio Claro – SP – Brasil. Endereço para correspondência: Rua 12 A, n. 335, apto – 09, Vila Alemã, CEP: 13506-668, Rio Claro – SP. E-mail: [email protected].

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