Gênero, Interseccionalidade e Subjetividade | Outras Fronteiras | 2020

A proposta do presente dossiê surgiu a partir da evidenciação do impacto nacional e global da pandemia de Covid 19. Com a crise sanitária e as subsequentes instabilidades nos âmbitos econômico, político, médico, social e humano, nunca esteve tão proeminente a biopolítica e a necropolítica. Nos meses de março e abril de 2020, nos países europeus, e agora em 2021 também no Brasil, diante de hospitais precarizados e abarrotados vimos @s profissionais da saúde confrontad@s com a “Escolha de Thanatus ou Tânato”, isto é, com a necessidade de estabelecer critérios para determinar quem viveria e quem morreria, entre o “fazer viver e o deixar morrer”. Com o aval e um – grande – empurrãozinho, claro, dos Estados e sua política neoliberal. Essa situação extrema demonstra a rejeição e o abandono que isola determinados segmentos da sociedade, notadamente os velhos e os moribundos, escolhidos entre aquel@s deixad@s para morrer e, assim, mais uma vez, separad@s da comunidade dos vivos. Segundo Nobert Elias (2001), “a morte é um problema dos vivos”. O sociólogo alemão demarca assim a desimportância ocidental do velho e dos doentes crônicos, do moribundo, em uma sociedade que valoriza a juventude consumista e superficial. Podemos chamar de “velhofobia” ou simplesmente compreender que “a humanidade não deu certo”, conforme carta de suicídio do ator octogenário Flavio Migliacco, que tirou a própria vida em 4 de maio de 2020. Em território nacional, vivenciamos um colapso, um estado de crise, quase, um Estado de Exceção. O abandono e a desorganização deliberada por parte dos poderes públicos ao lidar com a pandemia implica no testemunho, atônito e às vezes passivo, de centenas de milhares de pessoas morrendo sem cuidados adequados, com a falta de recursos básicos, como oxigênio ou leitos em UTI. Familiares e profissionais da saúde acompanham cotidianamente a morte de milhares de brasileir@s afogad@s em terra firme, buscando inutilmente um suspiro, o último fôlego para viver. Angustiante. Leia Mais