Normatividades medievais: discussões teóricas e estudos de caso | Signum – Revista da ABREM | 2020

Ao longo dos séculos XIX e boa parte do XX, o campo científico dos chamados “estudos jurídicos” ou do “direito”, esteve fortemente baseado em uma ruptura epistemológica quase total entre o direito e as ciências humanas como a história, a sociologia e a antropologia. Com isso, a história do direito se desenvolveu como uma disciplina de domínio exclusivo da área do direito, disciplina essa que parecia caminhar “fora do tempo” (como se o Direito não fizesse parte da construção social).2 Nos últimos vinte e cinco anos, a ascensão da antropologia jurídica e da sociologia do direito assim como o crescente interesse de historiadores pelo direito como elemento de compreensão de práticas sociais, políticas e culturais têm trazido novas abordagens que recolocaram o direito na sociedade.3

Para os estudos medievais, o efeito dessas novas abordagens traduziu-se em inúmeros trabalhos de historiadores utilizando documentos legais e jurídicos com novas propostas metodológicas. Assim, procurou-se cada vez mais incorporar uma abordagem que ia além do interesse pelo contexto normativo e institucional no interior do qual as relações sociais se estabelecem, para incluir também uma atenção às formas jurídicas sob as quais os objetos de estudo podem se tornar acessíveis, como procedimentos de litígios, formas de contratos, interpretação de leis e costumes, etc.4 Abriu-se caminho para o trabalho com conceitos diferentes como o de “norma” e de multiplicidade de estruturas normativas, como propõem Gauvard, Boureau, Jacob e Miramon.5 Também surgiram novas abordagens como análises semânticas, propostas por Isabelle Rosé,6 análises comparativas e combinadas entre teologia, escolástica e direito, por Elsa Marmursztejn e Alain Boureau,7 estudos focados nos atos da prática e seu lugar na construção do direito, como propõe Florent Mazel,8 e a compreensão dos conflitos e suas resoluções como alguns trabalhos de Patrick Geary e Bruno Lemesle.9 Leia Mais