História e Testemunhos / Tempo e Argumento / 2010

A revista Tempo e Argumento, do Programa de Pós-Graduação em História, da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), em seu terceiro número leva a cabo seu objetivo de promover a reflexão sobre a História do Tempo Presente, assim como de divulgar estudos de caráter nacional e internacional produzidos nesta área do conhecimento.

Este volume, além das seções Artigos, Resenhas e Fontes do Tempo Presente, apresenta o Dossiê “História e Testemunhos”. Os testemunhos, desde os primeiros interesses por investigações históricas voltadas ao chamado Tempo Presente, adquiriram grande importância por sua condição de fontes documentais, especialmente nas áreas da Política e da Cultura Política. Em função de debates provocados pelas narrativas históricas construídas a partir dessas fontes, pensadores de diferentes áreas das Ciências Humanas produziram reflexões de ordem epistemológica sobre as possibilidades de utilização dos testemunhos. Diferentes estudos como os de Paul Ricoeur1, Beatriz Sarlo2, Henry Rousso3 e Giorgio Agamben4 destacaram-se nesta perspectiva. Uma parcela significativa dos artigos que compõem o dossiê foi edificada tendo como pano de fundo reflexões epistemológicas.

Márcio Seligmann-Silva, no artigo “O local do testemunho”, lança “luzes” sobre o debate vigente no Brasil em relação aos testemunhos e à ditadura civil-militar de 1964-1985. O historiador Hernán Ramírez, por sua vez, analisa entrevistas de Ernesto Geisel e José Oscar de Mello Flôres, com vistas a desconstruir interpretações dos depoentes acerca da ditadura civil-militar brasileira do referido período. O historiador Jefferson José Queler também caminha, em seu artigo, no sentido do autor anterior, analisando testemunhos de Samuel Wainer e Carlos Lacerda sobre a chamada “Era Vargas”. A socióloga Valentina Isolda Salvi, tendo em vista a sociedade argentina, discute os problemas éticos e subjetivos enfrentados pelos pesquisadores no processo de utilização dos testemunhos dos repressores e dos torturadores nas Comissões de Verdade e Reconciliação. O historiador Roberto Mendes Ramos Pereira, através dos testemunhos, procura conhecer os sentidos que os fiéis atribuem às suas demandas diárias aos santos, na cidade de Montes Claros (MG), no período compreendido entre 1996 e 2004. Por fim, a historiadora Mariana Joffili analisa, sob a perspectiva das relações de gênero, testemunhos sobre as violações de Direitos Humanos que integraram os informes Nunca más / Nunca mais, levados a cabo na Argentina (1984), no Brasil (1985) e no Uruguai (1989).

A seção Artigos é composta por quatro textos. Os antropólogos sociais Judith McDonnell, Cileine de Lourenço e Rex Nielson, partir de narrativas de mulheres brasileiras que migraram para os Estados Unidos na década passada, discutem o conceito de saudade, a experiência de ser transnacional e o desejo de retornar ao Brasil. O historiador Reginaldo Benedito Dias apresenta uma análise das dificuldades encontradas pelos pesquisadores que utilizam a documentação relativa aos agrupamentos de esquerda que atuaram durante a ditadura civil-militar, vigente no Brasil entre 1964 e 1985. A educadora Maria Antonieta Campos Tourinho, em seu artigo “História e ficção: fronteiras e ensino de História”, apresenta uma reflexão sobre a aprendizagem na Educação Básica e questões de ordem epistemológica do campo historiográfico. As historiadoras Laurinda Rosa Maciel e Anna Beatriz de Sá, por sua vez, evidenciam as possibilidades de uso do acervo de depoimentos orais produzidos pelo projeto Memória da Poliomielite.

Pela primeira vez, a Revista Tempo e Argumento, na seção Fontes do Tempo Presente, apresenta um conjunto de fontes documentais visuais. Estas são provenientes do acervo da versão espanhola da revista Seleções do Reader’s Digest, entre 1950 e 1960. A historiadora Mônica Sol Glick, a partir de uma perspectiva transcultural, reflete sobre os impactos dessas informações na Espanha do período franquista.

A obra resenhada pelo historiador Fábio F. F. Souza, intitulada “O que resta de Auschwitz: o arquivo e o testemunho (Homo Sacer III)”, aborda questões epistemológicas, sobretudo as que se referem, nas fontes documentais, à noção de subjetividade dos testemunhos.

Notas

1 RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: UNICAMP, 2008.

2 SARLO, Beatriz. Tempo passado. Cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.

3 ROUSSO, Henry. A história do Tempo Presente, vinte anos depois. In: PORTO JR., Gilberto (Org.) História do Tempo Presente. Bauru: EDUSC, 2007. p. 277-296.

4 AGAMBEN, Giorgio. O que resta de Auschwitz: o arquivo e o testemunho (Homo Sacer III). São Paulo: Boitempo Editorial, 2008.

Os Editores


Comitê editorial. Editorial. Tempo e Argumento, Florianópolis, v.2, n.1, 2010. Acessar publicação original [DR]

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