Instrumentos do trabalho didático / Cadernos de História da Educação / 2013

Esta edição dos Cadernos de História da Educação traz a público um dossiê sobre instrumentos do trabalho didático. Dois são artigos assinados por pesquisadores que compõem o HISTEDBR de Mato Grosso do Sul, como resultados da pesquisa financiada pelo CNPq: “O manual didático como instrumento de trabalho nas escolas secundária e normal (1835-1945)”. A partir da ideia de centralidade dos instrumentos didáticos na relação educativa, os trabalhos analisam manuais didáticos, compêndios e apostilas adotadas no Colégio Pedro II e na Escola Normal de São Paulo, no período em questão.

A escolha dessas instituições pauta-se no preceito de que as mesmas representaram as formas mais desenvolvidas da educação no Brasil da segunda metade do século XIX e primeira do século XX, servindo, inclusive de referência ao sistema educacional brasileiro. Compõe ainda, o dossiê, um artigo que analisa material didático publicado e divulgado pelos anarquistas no Brasil, no primeiro quartel do século XX. Trata-se de material que pretendia oferecer suporte teórico às suas ações educacionais. O ultimo artigo a integrar o dossiê versa sobre os instrumentos didáticos primordiais para o ensino da língua alemã, formulados por Wolgang Ratke, em fins do século XVI e início do XVI. Ao todo são publicados quatro artigos, cuja ordem de apresentação é a que segue:

Abre o dossiê o artigo Ensino de língua e literatura no Brasil do século XIX: o Curso Elementar de Literatura Nacional e as Postillas de Rethorica e Poetica utilizados no Colégio Dom Pedro II, de autoria de Ana Aparecida Arguelho de Souza, da Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul. O artigo analisa dois instrumentos formulados pelo cônego Joaquim Caetano Fernandes Pinheiro, professor das cadeiras de Retórica, Língua Portuguesa e Literatura, no Colégio Pedro II. Na análise das postilhas demonstra-se, face à retórica aristotélica, o caráter reducionista que esse instrumento tão caro e necessário ao mundo antigo ganhou no cenário educacional do Brasil Império; no estudo do Curso Elementar… A preocupação foi a de demonstrar que o foco dos estudos literários no século XIX recaíam na história da literatura e não, propriamente, no texto literário. O cônego Pinheiro cumpriu papel determinante no desenvolvimento dos estudos linguístico-literários, sendo que a organização do ensino de literatura no Brasil em manuais didáticos contemporâneos ainda apresenta algumas marcas do seu trabalho pioneiro.

O segundo texto é Manuais de psicologia – instrumentos de trabalho utilizados na formação dos professores paulistas (1920-1940), de Samira Saad Pulchério Lancillotti, que buscou evidenciar a simplificação do trabalho didático materializado em dois manuais didáticos de Psicologia e o papel que cumpriram as Escolas Normais na consolidação desse campo do conhecimento, no Brasil. A análise dos manuais tem por vetor os conteúdos concernentes à aprendizagem e ao desenvolvimento humanos. Em um deles, o Psychologia, escrito por Antonio Sampaio Dória, na década de 1920, o autor discute a Psicologia enquanto ciência, seu objeto e métodos de investigação. A obra não trata, especificamente, da Psicologia aplicada à educação, mas da Psicologia em geral, de uma perspectiva mais elementar. O outro manual, Introdução à Psychologia Educacional, de Noemy da Silveira Rudolfer, publicado em1938, revela o amplo movimento histórico e a complexidade que marca esse novo campo de conhecimento e, nesse sentido, cumpre relevante papel na constituição da ciência psicológica no Brasil.

No artigo seguinte, “’Leitura que recomendamos – o que todos devem ler’: impressos didáticos e ensino de história nas escolas anarquistas”, José Damiro de Moraes traça um interessante painel sobre o movimento anarquista no Brasil e discute instrumentos de caráter didático utilizados pelo movimento em sua ação pedagógica, os quais, segundo o autor “ajudaram a organizar os trabalhadores em suas lutas cotidianas por melhores condições de vida”. O compêndio de História Universal de Clemencia Jacquinet, “que discutia os acontecimentos históricos e explicava o funcionamento da sociedade a partir da ótica do proletariado”, é um desses instrumentos. Analisa também o jornal A Voz do Trabalhador, “que trazia denúncia a partir do ponto de vista do sindicalismo revolucionário” e periódicos como O Início, de responsabilidade dos alunos da Escola Moderna, instituição emblemática do movimento anarquista O artigo analisa esse material procurando perceber as diferenças, similitudes e compromissos na formação individual e coletiva desejada pelo projeto libertário da construção de uma nova sociedade. A pesquisa contou com auxílio parcial da FAPEMIG.

No quarto artigo, Instrumentos do trabalho didático na Nova Arte de Ensinar de Ratke, Sandino Hoff analisa, nessa obra traduzida por ele do alemão para o português, os instrumentos de ensino utilizados pelo autor para a disseminação dos estudos da língua alemã. Hoff busca compreender na obra, à época em que floresceram as manufaturas, a relação educativa, instituída por um professor a ensinar a lição programada de cada dia a dezenas de alunos, reunidos numa classe única, sob a mediação dos instrumentos didáticos. O artigo traz a análise de materiais didáticos – livrinho de leitura, livro de ensino, livro escolar, guia, compêndio e tabela, tal como Ratke os concebeu e utilizou, como centralidade dos ensinos. O artigo conclui que os livros escolares, elaborados e utilizados pelo pedagogo alemão, destoam do manual comeniano. Constata-se, neles, a presença maior da subjetividade do que da objetivação, característica do manual comeniano. Explica-se essa manifestação dos livros escolares de Ratke, primeiramente, pela forma de elaboração, isso é, foram feitos pelos próprios professores da matéria; e, em segundo lugar, pelo tipo de livro confeccionado em moldes de fio condutor, deixando à subjetividade docente a tarefa de organizar os ensinos.

Ana Aparecida Arguelho de Souza

Samira Saad Pulchério Lancillotti

Organizadoras


SOUZA, Ana Aparecida Arguelho de; LANCILLOTTI, Samira Saad Pulchério. Apresentação. Cadernos de História da Educação. Uberlândia, v. 12, n.1, jan. / jun., 2013. Acessar publicação original [DR]

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