A aliança não escrita: o Barão do Rio Branco e as relações Brasil-Estados Unidos | Bradford Burns
Organizada em nove capítulos, a obra de Bradford Burns utiliza-se dos mais variados assuntos para explicar as relações Brasil-Estados Unidos, percorrendo desde o perfil pessoal da formação do Barão a sua aceitação da Doutrina Monroe e do Pan-Americanismo. O autor perfaz a história desse relacionamento desde a suspeição, que emoldurou o início da amizade, às futuras recompensas que de fato ele trouxe para o Brasil.
Fortalecer a amizade entre as duas nações era um dos objetivos fundamentais da política externa do Barão do Rio Branco. Construindo os alicerces dessa relação fundamental, o chanceler conseguiu alinhar diplomaticamente os dois países, e sua gestão no Itamaraty marcou o apogeu desse relacionamento amistoso. Além disso, o Barão conseguiu, com o apoio norte-americano, executar grande parte dos seus objetivos no cenário internacional, quais sejam, a política territorial, a elevação da legação brasileira em Washington ao nível de embaixada e a adoção de um prestígio regional de grande valia para a inserção internacional do país. Some-se a isso o fato do chanceler estar cercado de homens, como Joaquim Nabuco e Rui Barbosa, que possuíam afinidade com a conduta norte-americana e também percebiam, por meio de uma visão realista, a ascensão de um novo eixo de poder que se moldava no continente americano, deslocando-se o pólo de poder mundial da Europa para os Estados Unidos.
Delimitar o perfil territorial de um país e o mapa em cujo interior se há de exercer a soberania é, para qualquer nação, uma espécie de precondição da possibilidade de desenvolver sua política externa. Sendo assim, a definição territorial de um país se torna uma condição sine qua non para o modo de se atuar no cenário regional e mundial. Ressalte-se, ainda, que nenhuma das questões territoriais solucionadas por Rio Branco levou o uso da força como pressuposto basilar. O relacionamento para solucionar questões lindeiras se dava preferencialmente pela via bilateral, utilizando-se do arbitramento como medida jurídica sanável. Tal política desenvolvida entre 1902 e 1912 foi uma das principais responsáveis pela delimitação do território brasileiro o qual nos encontramos atualmente, com pequenas modificações, ao passo que os demais países da América do Sul continuaram ao longo do século XX delimitando sua arena territorial
A elevação das legações em Washington e no Rio de Janeiro ao nível de embaixada também serviu para intensificar as relações entre as nações. Na virada do século, a embaixada ainda era uma raridade diplomática, característica exclusiva das capitais das grandes potências mundiais. A título ilustrativo, Washington, em 1904, só contava com sete embaixadas, quais sejam, Alemanha, Áustria-Hungria, França, Grã-Bretanha, Itália, México e Rússia. O Brasil, em 1905, seria, portanto, o primeiro país da América do Sul a possuir essa elevação diplomática, o que ocasionaria certa tensão para com seus vizinhos mais próximos, principalmente a Argentina. Além do mais, a presença dessa amizade especial serviu como meio para que o país pudesse afirmar sua liderança diplomática na América do Sul e projetar-se em um cenário diplomático mundial em constante mudança.
A política externa brasileira ao tempo de Rio Branco e Joaquim Nabuco, caracterizada pelo Pan-Americanismo e pelo Monroísmo, contribuiu para a consolidação do bloco de poder internacional liderado pelos Estado Unidos, procurando também tirar proveito da nova situação que se delineava. O comércio era, segundo Burns, o pano de fundo para a atuação diplomática do Brasil, principalmente no que se refere à exportação de café, principal produto da pauta da balança comercial brasileira.
A amizade votada aos norte-americanos, além de se assentar na tradição, em razões de natureza econômica e no prestígio que essa relação desencadeava, serviria para afastar eventuais dificuldades que poderiam surgir em Washington, capital que era o principal centro de intrigas contra o Brasil, de acordo com as palavras do próprio chanceler. Assim, segundo o próprio autor, Rio Branco decidiu dar maior ênfase ao crescimento da amizade entre os dois países a fim de utilizá-la como instrumento para alcançar mais facilmente suas metas de política externa.
Desse modo, o estudo de Bradford Burns, utilizando-se de ricos arquivos diplomáticos tanto nos Estados Unidos como no Brasil, como por exemplo, o National Archives, em Washington (NA) e o Arquivo Histórico do Itamaraty (AHI), bem como de jornais da época, como O Jornal do Comércio, O Paiz, The New York Times e The New York Herald, busca oferecer ao leitor um modo claro e transparente da maneira como o relacionamento bilateral entre os países foi de grande importância para ambos. Além dessas fontes, destacam-se os arquivos pessoais de Rio Branco, Joaquim Nabuco e Rui Barbosa, personalidades diretamente ligadas à intensificação da aliança não escrita.
Assim, trazendo à tona a história da relação entre os países e sugerindo algumas reflexões de maior grau, conclui-se que a presente obra se constitui em fonte valiosa para o estudo das relações Brasil-Estados Unidos, propiciando aos leitores e estudiosos uma excelente base para a formação de uma opinião crítica acerca do modo de inserção internacional do país no início do século XX.
Resenhista
Marcos Felipe Pinheiro Limam – Mestrando em Relações Internacionais na Universidade de Brasília (UnB).
Referências desta Resenha
BURNS, Bradford. A aliança não escrita: o Barão do Rio Branco e as relações Brasil-Estados Unidos. Rio de Janeiro: EMC, 2003. Resenha de: LIMAM, Marcos Felipe Pinheiro. Revista Brasileira de Política Internacional, v.47, n.2, 2004. Acessar publicação original [DR]