Experiências coloniais na África: Instituições, Dinâmicas e Sujeitos | Canoa do Tempo | 2021

A compreensão do processo de expansão colonial e dos processos coloniais no continente africano pedem, hoje mais do que nunca, uma abordagem que tenha em conta a sua complexidade histórica, a multiplicidade dos domínios em que se desenvolveram e a dificuldade crescente de operar sob uma visão unívoca desses processos. Logo, pensar esta complexidade convida-nos ao manejo de referenciais teóricos novos ou atualizados que os leitores poderão encontrar neste dossiê intitulado “Experiências coloniais na África: Instituições, Dinâmicas e Sujeitos”.

Os artigos que compõem esta publicação propõem uma reflexão em torno do contexto de expansão colonial e do conceito de “experiências coloniais”, sendo esta última uma ferramenta conceitual que oferece um enquadramento científico que vai além dos domínios estreitos dos “processos coloniais” e, sobretudo, das dicotomias simplistas que frequentemente tolhem as análises acadêmicas.

Nesse sentido, reunimos textos que buscam enquadrar os processos e as dinâmicas institucionais, sociais e pessoais, as construções culturais, artísticas, de valores e de ideologias que se formaram e se transformaram no contexto colonial, dentro de uma ideia de “experiência colonial”. Além disso, permitem-nos transpor o cerne desses processos (mesmo quando envolvem níveis globalizantes, como o das instituições ou das dinâmicas) para os sujeitos que os constroem e vivenciam.

Mirian Cristina de Moura Garrido, no artigo Nas tramas das memórias: análise das memórias de líderes da Frelimo, entre o passado colonial e o pós-guerra civil, examina as memórias publicadas dos moçambicanos que lutaram no processo de independência do país e desempenharam um papel central na liderança da FRELIMO. No texto, a pesquisadora busca, através dos relatos publicados de Mondlane, Machel, Chissano e Guebuza, compreender como o processo de independência de Moçambique é construído nas memórias destes indivíduos, no contexto do pós-guerra civil

Em seguida, o texto de Keith Valéria de Oliveira Barbosa, intitulado Medicina, Saúde, Doença e Colonialismo em Moçambique (1930-1940), examina os esforços direcionados ao controle da malária em Moçambique, entre as décadas de 30 e 40 do século XX. No trabalho, a pesquisadora lança mão dos acervos coloniais para o estudo da doença e das práticas médico científicas, delineando novas perspectivas analíticas a fim de problematizar heranças epistemológicas coloniais no território moçambicano.

Interesses e ações de João Fernandes Vieira e André Vidal de Negreiros contra o Estado do Congo: tráfico de escravizados e outros negócios da África Centro Ocidental para Pernambuco (1658-1666), de Leandro Nascimento de Souza, traz importante contribuição ao debate sobre o Estado do Congo no contexto do século XVII, discutindo as relações de poder, as ações militares e o tráfico de escravizados nas rotas do comércio transatlântico. A partir das fontes documentais do Arquivo Histórico Ultramarino e da coleção Monumenta Missionária Africana, além de cronistas da época, nos apresenta diversos personagens envolvidos no jogo político que envolveu eclesiásticos, soberanos regionais e locais, a aristocracia lusitana, e a própria Coroa portuguesa com o Conselho Ultramarino.

O artigo de Harley Abrantes Moreira, Política do Olhar e comunidade de sentidos nas representações fotográficas de uma “África Portuguesa” (1960-1970), nos remete à linguagem fotográfica. O autor se detém no conjunto de fotografias da revista missionária brasileira da década de 1960, demonstrando como esse conjunto de imagens podem ser examinadas enquanto vetores de comunicação entre portugueses e brasileiros e como produziam, consequentemente, ligações simbólicas.

Finalmente, Patrícia Teixeira Santos, no artigo valioso intitulado “140 anos da Revolta Mahdista no Sudão: uma história de resistência e de conquista colonial” nos brinda com uma análise que trata das perspectivas de compreensão do fenômeno colonial, a partir do estudo da efeméride dos 140 anos do surgimento da Revolta Mahdista no Sudão (1881-1898). Com o exame deste processo histórico, a historiadora trava um importante debate sobre os sentidos da interpretação do colonialismo no século XX.

Deste modo entende-se que o contexto da expansão colonial e das colonizações foram, mais que um movimento maciço de igual peso e significado para os sujeitos históricos que as vivenciaram, um vasto universo de experiências desenvolvidas em contextos específicos e que fazem das colonizações processos históricos dos mais complexos; uma complexidade que convida a uma reflexão profunda e rigorosa desse passado. Nesse sentido, a presente revista Canoa do Tempo se consolida como um importante fórum de diálogo e reflexão entre pesquisadores de diversas regiões do nosso país, que investem seus interesses acadêmicos em torno dos espaços africanos. Uma boa leitura!


Organizadores

Keith Valéria de Oliveira Barbosa – UFAM

Patrícia Teixeira Santos – UNIFESP/LAUNIV.BORDEAUX/CITCEM.

Nuno de Pinho Falcão – UNILAB/CITCEM.


Referências desta apresentação

BARBOSA, Keith Valéria de Oliveira; SANTOS, Patrícia Teixeira; FALCÃO, Nuno de Pinho. Apresentação. Canoa do Tempo. Manaus, v.13, 2021. Acessar publicação original [DR]

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