História Intelectual / Tempos históricos / 2015

O campo da História Intelectual e da História dos Intelectuais, surgia, há alguns anos, envolto em muitas dúvidas e incertezas, objeto de pesadas críticas por parte da comunidade acadêmica. Nos últimos anos, contudo, assistimos a partir do esforço de pesquisadores e / ou professores do Brasil e fora dele, ao fortalecimento do referido campo de estudo. Cada vez mais suas balizas históricas estão definidas, bem como sua natureza e seu campo de ação. O dossiê “História Intelectual” é um exemplo deste esforço empreendido por diversos pesquisadores da grande área das ciências humanas, demonstrando a pluralidade de abordagens possíveis para a História Intelectual. Passamos a apresentar, de forma breve, pois a leitura aprofundará a discussão, os artigos que compõem o dossiê da Revista Tempos Históricos.

Deste modo, os quatro primeiros artigos do dossiê centram-se em questões de ordem teórica e metodológica no que se refere à História Intelectual. O texto de José D’Assunção Barros oferece uma original e instigante proposta, com vistas à superação das dificuldades comuns aos conceitos e modelos tradicionalmente empregados pelos pesquisadores dedicados ao mencionado campo historiográfico. Assim sendo, o estudioso parte da teoria musical a fim de construir uma metáfora – o “acorde historiográfico” – como possibilidade para se lidar com os complexos temas vinculados à História Intelectual.

Em seguida, Eugênio Rezende de Carvalho salienta de que maneira o filósofo e historiador argentino Arturo Andrés Roig contribuiu decisivamente no sentido de uma renovação teórica do movimento latino-americano da História das Ideias durante os anos 1970, abrindo uma via rumo à História Intelectual. Todavia, como bem demonstra o autor, muitos trabalhos que não abandonaram as tradicionais práticas ligadas à História das Ideias mantiveram intenso diálogo com as perspectivas inovadoras formuladas por Roig.

O artigo da professora e pesquisadora Claudia Wassermann discute os principais conceitos para a História Intelectual, a natureza dos intelectuais e suas funções. O artigo traz, como um estudo de caso, a ação de alguns intelectuais latino-americanos.

Por sua vez, Carlos Henrique Armani aborda um dos temas mais caros da História Intelectual: o conceito de contexto. Ao revisitar o tema, estabelece-se um diálogo com os principais autores da área em questão, propondo outras perspectivas de abordagem para o conceito de contexto na e para a História Intelectual.

Na sequência, Raphael Guilherme de Carvalho investiga determinados aspectos da escrita de si observáveis em alguns textos que o historiador Sérgio Buarque de Holanda produziu no decorrer da década de 1970. O estudioso indica a forma pela qual Sérgio Buarque elaborou discursos tendo por objetivo legitimar a sua produção ensaística – como, por exemplo, Raízes do Brasil – em um contexto marcado, entre outros, pelo aprofundamento da especialização da pesquisa histórica em nosso país.

Walkiria Oliveira Silva nos apresenta suas reflexões sobre as funções do conhecimento histórico e da historiografia para a Alemanha de meados do século XX, tomando como ponto de partida o chamado Círculo de Stefan. Discute ainda as relações estabelecidas entre o Círculo e o conceito alemão de Bildung.

O texto seguinte, de Raimundo Lima dos Santos, aborda a presença dos viajantes no Maranhão ao final do século XIX. O autor aponta, ao discutir as impressões dos viajantes sobre a fauna, a flora, a cultura e a economia, a presença do Romantismo e da Ilustração, ainda que tal se observe por vezes de forma indireta. As impressões construídas pelos viajantes sobre o Brasil, e mais especificamente sobre o Maranhão, ainda sobrevivem nos dias atuais.

Por sua vez, Andrea Ciacchi delineia em seu artigo a trajetória intelectual da antropóloga Gioconda Mussolini e a relevância de seu trabalho na Universidade de São Paulo ao longo dos anos 1940-1960. A abordagem biográfica ora empregada pelo autor visa, ao mesmo tempo, esclarecer a importância da referida intelectual em um momento crucial no que se refere à institucionalização da antropologia no Brasil.

O professor André Fabiano Voigt a partir do diálogo com diversos importantes autores do século XIX e XX delimita o principal foco de sua análise: a discussão sobre a presença da mimesis que em Jacques Rancière que deve ser entendida dentro de sua historicidade, em contraposição às reflexões de Hans-Georg Gadamer e Luiz Lima, para os quais a mimesis mantém sua atualidade para a compreensão da experiência artística.

Jocelito Zalla analisa a obra Terra Gaúcha, vista no artigo como espécie de “ensaio histórico” composto pelo escritor João Simões Lopes Neto na segunda metade da década de 1910. O livro reiterava o modelo do gaúcho da região do Pampa como figura representativa do povo do Rio Grande do Sul. No entanto, o estudioso busca desvelar o fato de que, naquele ensejo, o modelo de identidade social rio-grandense ainda se encontrava em aberto, forjado em meio a disputas pela configuração de uma memória local que, por seu turno, se articulavam a questões nacionais mais amplas.

O artigo de Patrícia Helena Baialuna de Andrade reflete, tendo como pano de fundo o contexto dos anos 1930, mais especificamente a partir do estabelecimento do chamado nacional-socialismo, a publicação de dois periódicos. A autora analisa os referidos periódicos (Freies Deutschland e Internationale Literatur), que tinham como objetivo criar focos de resistência e apoiar os artistas, políticos e intelectuais, em grande parte, judeus, forçosamente exilados pelo regime nazista.

Por fim, Regina Weber se volta para a presença étnica polonesa no Brasil, particularmente aos conflitos derivados das iniciativas propostas por intelectuais laicos e religiosos no seio de associações construídas por emigrados na primeira metade do século XX, em especial no estado do Paraná. A autora destaca, por outro lado, que na década de 1960 nota-se um processo de convergência entre tais intelectuais no interior dessas comunidades, então compostas por muitos descendentes, pautado na noção de pertencimento étnico e na constituição de uma memória comum para os imigrantes de origem polonesa.

Boa leitura a todos.

Marcos Luís Ehrhardt – Doutor em História Social (UFPR). Professor do curso de História e do PPGH – UNIOESTE.

Moisés Antiqueira – Doutor em História Social (USP). Professor do curso de História e do PPGH – UNIOESTE.


EHRHARDT, Marcos Luís; ANTIQUEIRA, Moisés. Introdução. Tempos Históricos, Paraná, v.19, n.1, 2015. Acessar publicação original [DR]

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