O Populismo no século XXI: a emergência de novas formas/Intellèctus/2022

O presente dossiê organizado por Isabel Valente (Un.Coimbra) Maria Emilia Prado ( Un. do Estado do Rio de Janeiro) e Manuel Loff ( Un. do Porto e UNL) tem por objetivo apresentar artigos que discutem o significado histórico do populismo no Ocidente. Especial atenção será dada as experiências da Ibero-América, mas, também será importante discutir conceitualmente populismo. O tema adquire relevância ímpar uma vez que neste alvorecer do século XXI se assiste ao surgimento e o ressurgimento de governos autoritários de cunho populista. Que impacto pode ter este fenómeno na qualidade da democracia e na sua simples vigência? Até que ponto a crise pandêmica do Covid-19 terá facilitado e facilita ainda as ações autoritárias de governos populistas? Através dos artigos aqui reunidos pretende-se levantar considerações sobre as implicações e os possíveis desdobramentos sociais desse cenário político.

O primeiro dos artigos a compor este dossiê é o de Carlos Eduardo Martins, “O ressurgimento do fascismo no mundo contemporâneo: história, conceito e prospectiva”, Nele o autor propõe refletir sobre o fascismo enquanto ideologia e força política, tomando por parâmetro a América Latina e em especial o Brasil. Ao longo do texto procurou tratar as condições históricas da emergência do fascismo “seus vínculos com o liberalismo, com as tradições antimodernistas e anti-iluministas, sua especificidade e contradições como forma política, suas dimensões centrais que nos permitem remeter suas variações históricas e contingenciais a um mesmo conceito, tal como se faz com o liberalismo e o socialismo”. Ainda que apresente uma enorme diversidade o autor destaca o fato do fascismo eleger “o socialismo, o internacionalismo proletário, a organização emancipatória ou reformista dos trabalhadores e a ascensão social dos pobres como seu principal inimigo”. Em seguida, o autor procura refletir sobre os significados da emergência do fascismo no século XXI, apontando para o fato dos Estados Unidos tenderem a se constituírem no epicentro do fascismo mundial, com o Partido Republicano sendo apreendido por uma extrema direita que se “organiza na sociedade civil, estabelece lideranças, penetrando em extensos segmentos de trabalhadores brancos, desorganizados e vinculados a espaços economicamente decadentes”.

A partir de então o autor busca compreender esse fenômeno no Brasil atentando, especialmente, para a eleição de 2022 com a derrota de Bolsonaro e os impasses a serem enfrentados pela direita liberal assim como pelas forças de esquerda.

O texto de Sérgio Schargel apresenta uma proposta de análise teórica acerca de fascismo e populismo para centrar na discussão a respeito de “qual rótulo usar para nomear o movimento antidemocrático que se alastra não somente pelo Brasil, mas por todo o mundo”. A partir da utilização de bibliografia acerca do que o autor denomina “dois rótulos” busca então compreender suas aplicabilidades contemporâneas, percebendo-os como dois “significantes para o mesmo significado”. Percebe-os como “metodologias de poder e ferramentas políticas” não sendo de forma alguma sistemas políticos herméticos e isto permite entender e explicar a “elasticidade de suas compreensões”. Centrando a análise nas condições do Brasil e da América do Sul busca ainda analisar as dificuldades para que se estabeleça a democracia em países onde o grau de desigualdade é muito alto. E no caso brasileiro uma democracia saudável seria difícil de existir enquanto houver “tamanha desigualdade, fragilidade econômica, hegemonias e oligarquias tão poderosas, e, importante lembrar um exército centralizado que só aceita os ideais democráticos quando lhe convém”.

O artigo de Nuno dos Santos Lopes “Pós-funcionalismo e populismo no quadro da integração europeia: uma relação teórico-prática” busca estabelecer uma relação entre pós funcionalismo e populismo na Europa. O autor apoia-se no pós funcionalismo, para compreender como se deu a ascensão de partidos populistas e como ocorre a busca por se distanciar da Europa elitista, assumindo o populista um caráter eminentemente prático. Dessa forma, o autor procurar perceber como o pós-funcionalismo possibilita perceber teóricamente o atual fenômeno populista na Europa. Nas palavras do autor o “pós-funcionalismo pressupõe que 1) existem ligações diretas entre grupos nacionais e atores europeus, que contradizem a afirmação de que os Estados monopolizam a representação dos seus cidadãos no plano internacional; 2) as políticas internas e europeias associam-se de forma cada vez mais estreita, à medida que os governos se tornaram mais sensíveis às pressões públicas sobre a integração europeia; e 3) a identidade é um fator decisivo para a governação em geral e para a integração regional em particular, devido à sua natureza”.

O artigo apresentado por Amarildo Mendes Lima objetiva analisar o “populismo” como uma categoria aplicada por economistas vinculados ao novo-desenvolvimentismo em suas análises da denominada “Nova Matriz Econômica” implementada no governo Dilma Roussef. Para isto, utiliza as reflexões de Bresser Pereira acerca do governo Dilma bem como as de Luís Oreiro e Nelson Marconi, quando propõe diferenciar o novo-desenvolvimentismo do que denominaram como social-desenvolvimentismo, segundo os autores este último seria uma interpretação equivocada do Keynesianismo.

Para isto, o autor apresenta o que seriam os aspectos principais da ideologia novo-desenvolvimentistas bem como o conceito de populismo na interpretação de Bresser-Pereira. Em seguida, procura então analisar os conflitos na execução da Nova Matriz econômica e a avaliação dos “esforços feitos por Luis Oreiro e Nelson Marconi para diferenciar novo-desenvolvimentismo de social-desenvolvimentismo. Dessa forma, demonstramos como o novo-desenvolvimentismo mobiliza o conceito de populismo e sua crítica ao governo Dilma”.

O artigo a seguir, de Fabio Bacila Sadh, objetiva tratar das disputas em torno de figuras como Trump, Bolsonaro e Le Pen, na tentativa de compreender o significado atual dessa extrema direita. Para isto, o autor buscou apresentar as reflexões de diversos autores que procuram analisar e discutir os significados atuais de fascismo e populismo. Após a análise das reflexões dos diferentes autores, buscou então sintetizar as questões centrais sobre as quais se pauta a extrema direita. Nesse sentido, aponta para a “dimensão xenofóbica do pertencimento nacional, um retorno mítico a um passado soberanista idealizado, a antiglobalização e um modelo de “securitização” ou “política simbólica pós-democrática”.

No texto denominado “Da Coalizão ao Movimento: metamorfoses no presidencialismo brasileiro e a crise da democracia” Julio Cesar Guimarães de Paula, objetiva analisar as mudanças por que passou, a partir de 2018, o presidencialismo multipartidário brasileiro, ao mesmo tempo em que tenta compreender até que ponto elas se relacionam com a atual crise da democracia. Ao longo do artigo, o autor procura mostrar como o presidencialismo de coalizão que vigorou no Brasil por mais de 30 anos foi substituído pela “lógica do Movimento, onde a execução da agenda governamental não é o objetivo. O foco está no fortalecimento de uma rede de apoiadores que seriam responsáveis por fortalecer um projeto específico de poder”, caracterizado por ser antipolítico, intolerante, polarizador e caracterizado ainda pela constante mobilização da rede de apoiadores.

Patrício Dugnani e Roberto Gondo Macedo buscam em “Meios de comunicação e modernidade tardia: reflexões sobre o populismo e o uso dos meios digitais” compreender de que modo seria possível conceituar o populismo no tempo histórico que os autores denominam “modernidade tardia” ou mais conhecido como o tempo da pós-modernidade, para em seguida discutirem como as práticas populistas interagem com os meios digitais. Ao longo do texto, os autores buscam perceber como os meios digitais possibilitaram novas formas de ação política de tal modo que o “senso comum substitui o conhecimento objetivo e científico” e isto afeta substancialmente o “pensamento político de uma sociedade” o populismo por sua vez tende a crescer na exata proporção em que ocorre cada vez mais a “a personalização do poder político”. Nos meios digitais então ganha mais “destaque os discursos ligados a emoção, do que aqueles fundados em visões mais objetivas ou racionais”. Ao longo do texto, os autores buscar tornar mais claro e inteligível o argumento.

O artigo “povo brasileiro” nos tuítes de Lula e Bolsonaro. Aproximações e antagonismos nas eleições presidenciais de 2022, de Denise Paiero e Vinicius Prates procura analisar a comunicação digital utilizada nas campanhas de Jair Bolsonaro (PL) e de Luís Inacio Lula da Silva (PT) com o objetivo de identificar os sentidos dados por cada uma das campanhas ao “povo brasileiro”. A partir das conceituações de Laclau, Paiero e Prates, os autores buscam compreender as diferenças significativas de cada campanha a respeito do que se entende como sendo o “povo brasileiro”.


Organizadores

Isabel Valente – Universidade Coimbra.

Maria Emilia Prado – Doutora em História Social – USP Professora Titular de História do Brasil da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).E-mail: [email protected] orcid: https://orcid.org/0000-0002-0520-442X

Manuel Loff – Universidade do Porto e UNL.


Referências desta apresentação

PRADO, Maria Emilia. Apresentação. Intellèctus. Rio de Janeiro, v.21, n. 2, p.1-4, 2022. Acessar publicação original [DR/JF]

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