Política Exterior Brasileña: oportunidades y obstáculos para el Paraguay | D. A. Brun

O Brasil e o Paraguai possuem grandes assimetrias. Em termos demográficos, toda a população paraguaia, estimada em torno de 7 milhões de habitantes, equivale à metade da população do estado do Paraná, com o qual o país faz fronteira. Em termos econômicos, os números do comércio praticado em Cidade do Leste (produtos de reexportação, que ingressam majoritariamente na forma de descaminho no Brasil), representaram 12% do PIB do Paraguai e a 0,2% do PIB do Brasil em 2016 (OBEI, 2018).

A Usina Hidrelétrica de Itaipu foi um divisor de águas nas relações bilaterais e, para a história política recente do Paraguai, se pode falar em antes e depois da Binacional (ROLON, 2011). Para o Brasil, Itaipu é uma das empresas estatais importantes, mas que não tem poder para influenciar o resultado da política nacional, por exemplo. Neste sentido, o tema não foi pauta das campanhas presidenciais no Brasil em 2018, algo impensável no contexto paraguaio.

Desde o final da década de 1960, Brasil e Paraguai levaram a termo diversas ações que os integraram física e politicamente (CHESTERTON, 2018). Na virada para a terceira década do século XXI, quais obstáculos e oportunidades o Paraguai pode vislumbrar da relação com o Brasil? O livro de Diego Abente Brun, Fernando Masi e Carlos Gómez Florentín parte desta problemática.

“Política Exterior Brasileña: oportunidades y obstáculos para el Paraguay” está dividido em quatro capítulos. No primeiro, o experiente professor Diego Brun analisa os aspectos centrais da Política Externa Brasileira. No capítulo seguinte, o igualmente experiente, professor Fernando Masi faz uma análise brilhante sobre as relações comerciais entre Brasil e Paraguai, com foco no Mercosul e com insights sobre o comércio de reexportação.

No capítulo terceiro, Carlos Florentín explora as três dimensões centrais das relações bilaterais: Itaipu, imigração brasileira no Paraguai e a fronteira entre ambos. O último capítulo é também de Diego Brun, e o foco recai sobre os pontos chaves da política paraguaia que incide na relação com o Brasil. Para concluir, os autores escrevem a conclusão com dez recomendações a serem consideradas pelo Paraguai nas relações com o Brasil.

O livro é de fundamental importância para o estudo das relações bilaterais. Há dois motivos principais pelos quais recomendo a leitura aos diplomatas e aos acadêmicos brasileiros que trabalham com o país vizinho. Em primeiro lugar, é possível conhecer a perspectiva paraguaia. Em segundo, os problemas contemporâneos compartilhados exigem respostas à sociedade paraguaia como um todo e à sociedade brasileira, especialmente aquela que reside na fronteira.

Sobre a perspectiva paraguaia, o livro é uma síntese do pensamento político e social paraguaio, construído a partir de uma sólida e internacional formação de intelectuais em universidades nos Estados Unidos e Europa (ROLON, 2011). Diferentemente do Brasil onde a pesquisa é concentrada em universidades, a pesquisa acadêmica especializada no Paraguai é fortemente ligada a think tanks, como o Centro de Análise e Difusão da Economia Paraguaia ao qual os autores são vinculados (GALEANO, GARCÍA, et al., 2014).

No país onde havia apenas 145 doutores em 2012, a criação do Consejo Nacional de Ciencia y Tecnología (CONACYT) representa também o avanço para o fortalecimento da pesquisa acadêmica. O livro em análise recebeu recursos do programa Programa Paraguayo para el Desarrollo de la Ciencia y Tecnología (PROCIENCIA).

A atuação dos intelectuais e o avanço da produção de conhecimento paraguaio é particularmente importante para a formação de opinião qualificada sobre temas importantes. “Política Exterior Brasileña” é resultado deste processo e certamente haverá um pensamento paraguaio próprio e estruturado, a fim de se obter maiores vantagens nas relações internacionais, em geral, e com o Brasil, em particular.

A questão da renovação do Anexo C do Tratado de Itaipu é o primeiro e mais importante dos três temas prioritários que, na visão dos paraguaios, dizem respeito às relações com o Brasil. Em geral, os autores partem da premissa de que o Paraguai não recebe todos os benefícios que lhe corresponde. Por este motivo, os autores recomendaram que os representantes do governo paraguaio que renegociarão o Tratado, deverão ser firmes para cobrar algumas reivindicações antigas. As principais são: liberdade para comercializar energia excedente; que o Brasil pague um preço justo pelo que adquire do Paraguai; administração paritária da Usina; e revisão da dívida.

Sobre o mercado para energia elétrica, Carlos Florentín assinala que, em 2011, o Paraguai produziu 59 milhões e usou apenas 8,5 milhões de KW/H. Se pudesse comercializar o excedente com outros países, haveria um mercado a ser explorado em toda a América do Sul. Após 2023, somente se o Brasil comprar o excedente paraguaio a um preço mais justo, haverá a injeção de US$ 1,7 bilhões por ano na economia paraguaia (algo em torno de 6% do PIB de 2017). Sobre a dívida, em 2008, ainda restava pendente US$ 19 milhões.

Além de Itaipu, os outros dois problemas comuns ainda são: a imigração e o espaço fronteiriço. Quando se trata de imigração, trata-se dos “brasiguaios” que formam a segunda maior comunidade de brasileiros no exterior (ALBUQUERQUE, 2010). Carlos Florentín faz uma importante revisão de como o tema é tratado desde a perspectiva paraguaia. E, assim como para as questões fronteiriças, sugere que haja entendimento entre Brasil e Paraguai. Ao governo paraguaio, ainda recomenda que haja integração cultural sem prejuízos à população paraguaia e ao meio ambiente.

Especificamente sobre a problemática fronteiriça, há uma relativização da tendência brasileira de atribuir o contrabando e o tráfico à conta dos paraguaios. Baseado em outros autores, especialmente em publicações anteriores de Fernando Masi (MASI, 2006), a informação de que o contrabando não existiria sem o mercado brasileiro e certa “tolerância interessada” que caracterizou, por exemplo, o período de Stroessner. Recomenda-se ao Paraguai colaborar com o Brasil no limite de manter sua soberania e interesse nacional.

Por fim, “Política Exterior Brasileña” deve ser lido por todos aqueles que tratam das relações bilaterais entre Brasil e Paraguai. Especialmente por aqueles que trabalharão nos termos do novo acordo de Itaipu que se avizinha. Um tema esquecido durante a campanha eleitoral de 2018, mas que ocupará uma parte da agenda do próximo presidente do Brasil.

Referências

ALBUQUERQUE, J. L. A Dinâmica das Fronteiras: Os Brasiguaios na fronteira entre o Brasil e o Paraguai. São Paulo: Annablume, 2010.

CHESTERTON, B. M. From Porteño to Pontero: the Shifiting of Paraguayan Geography and Identity in Asunción in the Early Years of the Stroessner Regime. In: BLANC, J.; FREITAS, F. Big Water: The Making of Borderlands Between Brazil, Argentina and Paraguay. Chicago: University of Arizona Press, 2018. p. 242-266.

GALEANO, L. A. et al. Estudio país: Paraguay. In: RIED, J. J. B.; CADEÑO, O.; ALBUJA, A. Más Saber América Latina: potenciando el vínculo entre think tanks y universidades. Quito: Universidad Diego Portales y Grupo FARO, 2014.

MASI, F. Paraguai-Brasil e o projeto Mercosul. Política Externa, São Paulo, 14, n. 3, 2006. 23-32.

OBEI. Informe Especial de Comercio Exterior 2017. Observatorio de Economía Internacional. Centro de Análisis y Difusión para la Economía Paraguaya. Assunción. 2018.

ROLON, J. A. Paraguai: Transição Democrática e Política Externa. São Paulo: Annablume, 2011.


Resenhista

Micael Alvino da Silva – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Professor Adjunto na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA). E-mail: [email protected]


Referências desta Resenha

BRUN, D. A. (Org.). Política Exterior Brasileña: oportunidades y obstáculos para el Paraguay. Asunción: Editorial Servilibro, 2017. Resenha de: SILVA, Micael Alvino da. Monções: Revista de Relações Internacionais da UFGD. Dourados, v.8, n.16, p.526-529, jul./dez. 2019. Acessar publicação original [DR]

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