Rousey – my fight/your fight | Ronda Rousey e Maria Burns Ortiz

As artes marciais mistas (MMA) têm se tornado um assunto em pauta nos mais variados meios de comunicação. Dessa forma, as produções bibliográficas e cinematográficas explorando tal temática têm seguido um curso crescente, principalmente nos últimos dez anos.

O gênero mais explorado em livros relacionados ao MMA tem sido a biografia/autobiografia. Destacam-se no território norte-americano os livros do referido gênero em que protagoniza-se os lutadores estadunidenses BJ Penn, Brian Stann, Brock Lesnar, Chael Sonnen, Chuck Liddell, Forrest Griffin, Jens Pulver, Ken Shamrock, Matt Hughes, Pat Miletich, Randy Couture e Urijah Faber e o lutador canadense Georges St. Pierre, bem como demais figuras do meio do MMA, como o árbitro ‘Big’ John McCarthy, o anunciador Bruce Buffer, o cutman Jacob ‘Stitch’ Duran e, em biografia não autorizada, o presidente do Ultimate Fighting Championship (UFC) Dana White.

No Brasil, os atletas biografados de destaque são Anderson Silva, Vitor Belfort e os irmãos gêmeos Antônio Rodrigo ‘Minotauro’ Nogueira e Antônio Rogério ‘Minotouro’ Nogueira. Há ainda o filme de longa-metragem ‘Mais forte que o mundo – A história de José Aldo’, com lançamento previsto para 16 de junho de 2016, sobre a vida do lutador José Aldo.

Inobstante o aumento da popularidade do MMA nas mais variadas mídias, o dia 23 de fevereiro de 2013 representou um importante marco para o esporte, que foi a introdução das mulheres no maior evento de MMA do mundo, o UFC. Desde então, um nome vem obtendo destaque ímpar, não somente entre as mulheres, mas entre todos os lutadores da atualidade de MMA: Ronda Rousey.

Judoca medalhista de bronze nos Jogos Olímpicos de Pequim em 2008, invicta em suas, até então, dez lutas profissionais e três lutas amadoras no MMA, última campeã da categoria peso galo feminino – até 61 kg – do extinto Strikeforce, primeira e, na ocasião, única detentora do cinturão da categoria peso galo feminino do UFC, quarta colocada no ranking peso-por-peso do UFC, eleita pelo site Business Insider em maio de 2015 como – entre homens e mulheres – atleta mais dominante em atividade no mundo, Ronda Rousey é a primeira mulher de MMA a figurar em um livro biográfico/autobiográfico de destaque.

‘Rousey – my Fight/your fight’ foi escrito por Ronda Rousey e a jornalista Maria Burns Ortiz – sua irmã – e publicado no idioma inglês pela Regan Arts., Nova York, em 12 de maio de 2015. O livro foi publicado no Brasil sob o título ‘Ronda Rousey – Minha luta/sua luta’ pela Abajour Books em 21 de julho de 2015. Quatro semanas após o lançamento o livro figurou entre os best-sellers da categoria não-ficcional nos Estados Unidos da América (EUA) divulgado pelo jornal The New York Times.

Estruturado em 53 capítulos curtos – variando entre duas e dez páginas –, o livro de 320 páginas – incluindo elementos pré-textuais e pós-textuais – expõe a trajetória sinuosa à gloria da então campeã invicta da categoria peso galo feminino do UFC, Ronda Rousey.

O livro tem início com um prefácio escrito por Dana White e posteriormente uma apresentação por parte de Ronda Rousey. Na sequência é traçada a linha temporal desde o nascimento até a sua quinta defesa do cinturão da categoria peso galo feminino do UFC contra Cat Zingano em 28 de fevereiro de 2015. São realçados o impacto do suicídio do pai durante sua infância, seu ingresso e evolução na prática do judô, sua conquista da medalha de bronze nos Jogos Olímpicos de Pequim, sua transição do judô para o MMA e sua trajetória no Strikeforce e UFC. Por fim, Ronda Rousey coloca as palavras finais para o desfecho da trajetória por esta vivida até então.

Os bastidores da vida de Ronda Rousey são minuciosamente revelados. Todavia, mesmo que bem definidos e seguindo uma estrutura cronológica linear, o grande número de capítulos torna a leitura fragmentada, não instigando o leitor à prossecução.

Ainda que se tratando de uma obra biográfica, a começar pelo título, já se remete a um caráter parcial de autoajuda ao leitor. Todos os capítulos iniciam com uma lição de vida de Ronda Rousey, remetendo a mensagens subliminares no estilo “se Ronda Rousey conseguiu, você também consegue”.

Findada a leitura, ao contrário de outras obras do gênero, fica evidenciado que a publicação do livro não foi uma estratégia de marketing para a promoção da imagem de Ronda Rousey, ainda que isso pudesse ser esperado, haja vista a supremacia e o estrelato que esta conquistara no MMA feminino acrescido de sua crescente popularidade no meio cinematográfico.

Por mais que sua irmã tenha conseguido transcrever de forma bastante apropriada as falas de Ronda Rousey para a obra, esta não traz elementos que venham a surpreender e tampouco encantar, nem mesmo aos espectadores assíduos de MMA. Pode ser uma obra fantástica para os fãs de Ronda Rousey e/ou para aqueles que precisam elevar a autoestima e se motivem com histórias de superação. Contudo, é uma leitura dispensável para os demais públicos.

Não obstante a leitura do livro, é indiscutível que Ronda Rousey superou uma sucessão de dificuldades rumo à construção do seu legado. Seu nome certamente será historicizado e uma série de recordes no âmbito do MMA foram e possivelmente continuem a ser quebrados por esta. Entretanto, uma grandiosidade de mesma magnitude não é observada em seu livro.

Posteriormente à publicação do livro, dois fatos bastante antagônicos e que podem incidir diretamente na continuidade ou descontinuidade da obra em exame merecem ser relatados.

No dia 01 de agosto de 2015, na edição 190 do UFC, Ronda Rousey colocara em jogo pela sexta vez o cinturão da categoria peso galo feminino do UFC, no Rio de Janeiro, contra a brasileira Bethe Correia. Mais uma vez logrou êxito, pela primeira vez em sua carreira de MMA fora dos EUA. Ainda que confrontada por uma adversária brasileira em sua terra natal, um número considerável de brasileiros declarou abertamente estar na torcida pela vitória de Ronda Rousey.

No dia 14 de novembro de 2015, no UFC 193 em Melborne, na Austrália, na edição que teve o maior público na história do UFC e sétima ocasião em que Ronda Rousey defenderia o cinturão que detinha, sua compatriota Holly Holm chocou o mundo ao derrota-la de forma incontestável, com um nocaute aos 59 segundos do segundo round. Na coletiva de imprensa do evento, o presidente do UFC afirmou que tal resultado foi a maior “zebra” da história do evento e que já projetava um novo confronto entre ambas as lutadoras em breve.

A esperada revanche imediata entre Ronda Rousey e Holly Holm não aconteceu. No dia 05 de março de 2016, Holly Holm colocou o cinturão da categoria em jogo contra Miesha Tate, que em duas ocasiões havia sido derrotada por Ronda Rousey, mas interrompeu o (curto) reinado de Holly Holm. Dessa forma, um terceiro confronto entre Ronda Rousey e Miesha Tate parece estar próximo.

Fora divulgado que em 2016 está para ser lançado um filme homônimo baseado no livro em exame. Entretanto, a interrupção da trajetória invicta de Ronda Rousey no MMA pode fazer com que tais planos sejam postergados ou até mesmo cancelados. Estima-se que tal fato possa incidir também na redução da procura por seu livro. No entanto, surge também a possibilidade para a continuidade deste.

Inicia-se, portanto, um “folclore do se”: se Ronda Rousey recuperar o cinturão e posteriormente vencer a revanche contra Holly Holm, uma nova edição revisada e ampliada do livro certamente será publicada, abarcando os capítulos que se desenrolaram subsequentemente à publicação da primeira edição deste; se isso não acontecer, o livro pode definitivamente cair no esquecimento assim como sua carreira, um novo reinado pode estar tendo início e a obra biográfica de uma nova estrela pode estar em vias de emergir, com possibilidades reais de se tornar um best-seller.

Os testes da história muito brevemente desmistificarão tais suposições, e, independentemente de qual das alternativas supramencionadas venha a se concretizar, se o filme homônimo ao livro vier a ser lançado, oxalá um toque hollywoodiano torne sua narrativa mais atrativa, para que a legião de admiradores de MMA possa desfrutar de uma obra à altura dos feitos conquistados pela protagonista da história, algo que não acontece no livro.


Referência

ROUSEY, Ronda; ORTIZ, Maria Burns. Rousey – my fight/your fight. New York: Regan Arts., 2015.

Resenhista

Bruno Pedroso – Docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas e do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), Ponta Grossa, Paraná, Brasil. E-mail: [email protected]


Referências desta Resenha

ROUSEY, Ronda; ORTIZ, Maria Burns. Rousey – my fight/your fight. New York: Regan Arts., 2015. Resenha de: PEDROSO, Bruno. A luta nossa de cada dia: resenha do livro ‘[Ronda] Rousey – my fight/your fight’. Recorde: Revista de História do Esporte, v.9, n.1, jan./jun. 2016. Acessar publicação original [DR]

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