Auguste Comte. La science, la societé – MARIETTI (RA)

MARIETTI, Angele Kremer (Dir). Auguste Comte. La science, la societé. Paris, França: L’Harmattan, 2009. Resenha de: BENOIT, Lelita Oliveira. Revista Archai, Brasília, n.3, p. 165-166, jul., 2009.

Auguste Comte é ainda – e talvez hoje, mais do que no século XIX  – motivo de discussões intensas e polêmicas, como esta que é apresentada no livro que estamos resenhando, ocorrida por ocasião do aniversário de cento e cinqüenta anos da morte do filósofo. Em outubro de 2007, na Salle des Actes, que se situa na Université Paris 4, a célebre Sorbonne, sob a presidência da professora  Angèle  Kremer  Marietti,  reuniu-se o Groupe d’Études et des Recherches Épistémologiques para refletir e analisar asp ectos essenciais da obra de Auguste Comte. Lembremos que este colóquio foi promovido pela Association Internationale “La Maison d’Auguste Comte”, cuja sede se encontra em Par is. Sintetizando o conteúdo deste encontro, o livro em questão apresenta artigos de diversos pesquisadores ali presentes.

Comecemos por aquela temática que, de certo modo, parece nortear a coletânea. Angèle Kremer Marietti (Université de d”Amiens, França), em seu “La lecture des textes de Comte soumise aux méthodes du télescope et du kaléidoscope”, relê Comte a partir do próprio Comte, ou mais exatamente, da perspectiva de certas “Lições”do Curso de Filosofia Positiva e do Sistema de Política Positiva. A filósofa resgata significados sedimentares, enraizados nos textos comteanos, de conceitos que constroem relações entre Ordem e Progresso, aprofundando-os. Este seria, se assim podemos dizer, o significado dessas investigações voltadas para o estudo daquele s que o próprio Comte chamou de método do telescópio (télescope) e do calidoscópio (kaléidoscope). Colocando-se nessas perspectivas, aparentemente enigmáticas, a autora mostra que a metáfora do telescópio “é perfeitamente adequada para explicitar a classificação das ciências”(p. 18), sobretudo no Curso de Filosofia Positiva. Quanto à perspectiva do calidoscópio, seria, segundo a autora, “um modelo de pensamento utilizado para descrever como múltiplos elementos, em um finito compreendido em uma tópica finita, podem se combinar em um número indefinido de vezes, seguindo um simples re-agencemento do dado”(p. 20). A autora analisa elementos do calidoscópio comteano, elementos estes que coincidem com os conceitos da estática comteana (entre estes últimos: a biologia, a ciência do homem, o meio interior, dependência e variação, vida e organização, sociocracia). O ineditismo desta análise reabre discussões essenciais sobre alguns dos desgastados e incompreendidos temas comteanos, que envolvem Ordem e Progresso.

Outro ensaio de igual interesse por seu conteúdo inovador é o de autoria da filósofa Grange (Université de Nancy, França), intitulado “Le rôle social des sciences: l’astronomie”. Também aqui estamos em presença de uma análise que, paradoxalmen te, restitui os significados esquecidos da astronomia comteana quando esta se inscreve na hierarquia das ciências. Articulam-se, neste ensaio, teses provindas da leitura comteana do idealismo do século XIX e do empirismo clássico, para prover de significa do a astronomia, que nem seria ciência positiva pura, nem idealidade desprovida de base empírica. Sobretudo, na “astronomia moderna”– parece nos dizer a autora – revela-se uma vocação maior, a de, coletivamente e definitivamente, ultrapassar “atitudes mentais herdadas das religiões”(p. 88). Duas vertentes aí se entrecruzam: esta de romper com a base teológica do passado e outra, de mostrar que existe um “determinismo exterior”para a existência da astronomia. Ciência empírica e saber filosófico, a astronomia está neste limite que sinaliza a passagem para a “modernidade positivista”, leitura esta, lembremos, de rara profundidade para os estudos contemporâneos do positivismo comteano.

O  espaço  parece  pequeno  para  listar  o  conteúdo  de  outros  ensaios,  igual mente importantes (como os de Saïde Chebili, Cláudio de Boni, Gilles Charest, entre outros),  que compõe esse livro, como já dissemos, de significativa contribuição para os estudos do positivismo comteano, na França, no Brasil e em toda parte.

Lelita Oliveira Benoit.

Acessar publicação original