História da Urbanização no Brasil: novas propostas em Arqueologia da Paisagem | Anais do Museu Paulista | 2021

O dossiê que o leitor tem em mãos visa divulgar uma uma nova safra de estudos sobre história da urbanização, nove anos depois da publicação do dossiê “Caminhos da história da urbanização no Brasil-colônia” no volume 20, número 1, dos Anais do Museu Paulista, 2012, realizado sob minha coordenação. O desafio de explorar um Brasil de dimensões continentais impõe, antes de tudo, um trabalho coletivo para descontruir as narrativas e os lugares-comuns que acabaram adquirindo estatuto historiográfico. Nossos olhos viciados por certos estereótipos são embaçados por pesquisas recentes, que fazem saltar à vista novas territorialidades com ramificações bastante alargadas. Desconectados entre si e sem necessariamente terem consciência disso, esses estudos lançam luz sobre evidências empíricas que merecem debate por seu ineditismo e por convergirem para uma necessária releitura do Brasil em seu conjunto, inclusive nas suas interfaces com a América Espanhola e com outros continentes. Essas pesquisas recentes desmontam a tese da colonização “arquipelágica”, rompendo com as ideias de fragmentação e descontinuidade entre as partes do Brasil ao revelar territorialidades macrorregionais e zonas de intersecção de perfil cultural híbrido, que compartilhavam hábitos, dialetos e costumes que subvertiam as fronteiras políticas que lhes foram impostas. Além disso, elas permitem refutar narrativas e ideologias emanadas dos Institutos Histórico e Geográficos regionais que, ao construírem as identidades dos estados da República Federativa então em gestação, isolaram-nos do conjunto, contaminando gerações de pesquisas e pesquisadores igualmente regionalizados. Também desmontam axiomas históricos, como a estanqueidade na divisão técnica e social do trabalho, reforçando a ideia de interdependência entre as zonas vinculadas ao comércio atlântico e as zonas de abastecimento, fugindo da dicotomia clássica litoral-sertão. Demonstram, desse modo, a interdependência de fluxos que entreteciam o mercado interno ao comércio platino e andino e às outras três partes do mundo. Esses estudos revelam materialmente formas e tipologias de articulação, inclusive intermodais. Revelam uma diversidade de pontos de enraizamento e mobilidade de uma rede urbana mais plural e interiorizada do que nos parecia. Esses estudos nos incitam a “varrer a pé” e a pensar com os olhos, despojando-nos da comodidade do gabinete e das bibliotecas cada vez mais agigantadas que nos impõem um sedentarismo nefasto. Leia Mais