Direitos e Cidadania / Estudos Históricos / 2006

Este número da revista Estudos Históricos é dedicado ao tema “Direitos e cidadania”. Trata-se de um número especial, pois reúne textos produzidos no bojo de um Projeto Pronex de mesmo nome, financiado pelo CNPq e pela Faperj desde 2004. Tal projeto, sediado no CPDOC / FGV, conta com a participação de pesquisadores do próprio CPDOC e também de outras instituições, como a Universidade Federal Fluminense, a Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Fundação Casa de Rui Barbosa. Exatamente por essa razão, todos esses textos foram discutidos no I Seminário Pronex Direitos e Cidadania, realizado na Fundação Getúlio Vargas, entre 4 e 6 de agosto de 2005, com o objetivo de apresentar e debater os primeiros resultados das pesquisas em curso.

O projeto “Direitos e cidadania” tem como foco a investigação do processo histórico de construção da cidadania no Brasil, na chave do acesso a direitos (civis, políticos, sociais, culturais, de gênero etc.) e da efetivação de controles democráticos capazes de garantir e expandir esses direitos. O tema da construção da cidadania, nesse sentido, está sendo compreendido como um longo e permanente processo de interação político-cultural, que envolve tanto as instituições formais do Estado como as entidades da sociedade civil, e inclui uma grande diversidade de atores sociais, mesmo não organizados. Com tal tema de fundo, ele se volta para um amplo recorte cronológico, utilizando fontes de caráter variado e trabalhando-as com metodologias diversas, a partir de uma perspectiva interdisciplinar. Sua natureza multifacetada guarda relação com a formação diversificada de seus pesquisadores, cujos olhares são conformados a partir das disciplinas da história, da sociologia, da antropologia e da ciência política. O projeto se estrutura em quatro grandes linhas de investigação, todas elas contempladas com artigos neste número de Estudos Históricos: I – Políticas de inclusão e movimentos pela expansão dos direitos de cidadania; II – Controles democráticos e instâncias de efetivação de direitos de cidadania; III – Cidadania, participação, representação e cultura política; IV – Cidadania cultural: memória, patrimônio e espaço urbano.

Dessa forma, o texto que abre a revista, de Daniel Aarão Reis, intitulado “Os intelectuais russos e a formulação de modernidades alternativas: um caso paradigmático?”, revisita uma questão clássica do pensamento social brasileiro- o debate entre projetos de modernização em sociedades “atrasadas” -, trabalhando em perspectiva comparada e utilizando o exemplo dos intelectuais russos, pouco contemplados na literatura de ciências sociais. A seguir, dois artigos, o de Regina Moraes Morei e Elina da Fonte Pessanha, intitulado “Magistrados do trabalho no Brasil: entre a tradição e a mudança”, e o de Angela de Castro Gomes, “Retrato falado: a Justiça do Trabalho na visão de seus magistrados”, concentram-se no estudo da história e da memória de uma das instituições mais importantes no mundo do trabalho a partir dos anos 1940. A Justiça do Trabalho, que recentemente teve sua competência ampliada pela Reforma do Judiciário, é o foco para se pensar em uma das dimensões mais visíveis e consistentes da cidadania no Brasil: os direitos do trabalho. Seguem-se então três textos que discutem a questão da cultura na história recente do país, fazendo cada um deles uma abordagem tão particular quanto original. Lia Calabre analisa a atuação do Conselho Federal de Cultura nos tempos do regime militar; Fernando Weltman acompanha a construção do que vem sendo chamado de jornalismo comunitário, tomando como exemplo a experiência da Rede Globo e do RJTV; e Mônica Almeida Kornis, ainda no universo televisivo, analisa as “aventuras urbanas” da série Cidade dos Homens, pontuando a questão da construção de estratégias de inclusão social.

Esse é o gancho para o tratamento de uma das dimensões mais significativas dos direitos e da cidadania no Brasil republicano, qual seja, a questão da “raça”. Verena Alberti e Amilcar Araujo Pereira privilegiam, entre os temas does) movimento(s) negro(s), a discussão polêmica e atual sobre as cotas nas universidades; e Hebe Mattos destaca a trajetória de um jovem líder de uma comunidade de quilombo: Antônio Nascimento Fernandes, morador da Fazenda São José, no estado do Rio de Janeiro. Seguindo a linha das trajetórias e estudos de textos memorialísticos, finalizam o número os artigos de Denise Rollemberg, “Uma vida, duas autobiografias”, e de Célia Costa e Juliana Gagliardi, “Lysâneas, um autêntico do MDB”.

Como se pode verificar, são muitas as possibilidades de leitura e de articulação entre esses textos, ressaltando-se a existência de exemplos de trabalhos com a história do tempo presente, com fontes-objetos, como programas de televisão, e com trajetórias de indivíduos, movimentos sociais e instituições. Finalmente, todos os artigos procuram apresentar contribuições sobre aspectos ainda pouco contemplados de temas e questões muito tratadas nas áreas da história e das ciências sociais. Embora sendo textos preliminares, acreditamos que o leitor poderá construir, com eles, seu próprio mosaico de achados, chegando satisfeito ao final deste número “especial”.


GOMES, Angela de Castro. Apresentação. Estudos Históricos. Rio de Janeiro, v.1, n.37, jan. / jun. 2006. Acessar publicação original [DR]

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