Ensino de História / História Revista / 2009

Neste número apresentamos ao público o dossiê temático: Ensino de História organizado pelas professoras Maria da Conceição Silva, da UFG, e Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt, da UFPR. A proposta de um dossiê com este tema surgiu de preocupações debatidas nas últimas décadas entre professores da área de Ensino de História no interior de suas Instituições de Ensino e Pesquisa. O objetivo dos textos que compõem este dossiê é o de somarem-se as discussões sobre o Ensino de História e às temáticas já publicadas neste periódico desde o ano de 1996. Diante disso, pretende-se mostrar o significado das questões ensinadas e pesquisadas e, ao mesmo tempo, incentivar investigações nos cursos de licenciaturas, pois várias são as abordagens – pluralidades – possíveis de análises. E ainda propiciar o diálogo entre Universidade e Escola, entre professores-pesquisadores e professores de educação básica. Nesse sentido, vale ressaltar que a área – Ensino de História – já foi tema de vários periódicos de História, além do intenso debate no GT: Ensino de História e Educação-ANPUH e no Encontro Nacional Perspectivas do Ensino de História. Em 2008, criaram a Associação de Pesquisadores do Ensino de História, quando especialistas se reuniram na UFRN, em Natal. Nesses eventos, pesquisadores preocupados com a trajetória do Ensino de História no Brasil destacaram as pesquisas e os debates em encontros realizados em várias cidades; o debate avançou pelo mérito dos que se debruçam sobre problemáticas pertinentes as teorias, as metodologias e aos materiais didáticos, às temáticas ligadas à Educação e a Formação de professores de História. Assim os congressos e simpósios em Instituições brasileiras e internacionais constituem-se lugar de profícuo diálogo e embates que, muitas vezes, resultam em projetos e publicações valorosas.

Daí observa-se pesquisas como história da África, que a partir da lei 10.639, passou a ser disciplina obrigatória no currículo escolar. É possível notar que os estudos deixaram de abordar apenas enfoques da escravidão para constituir-se num campo mais amplo e específico com fontes de diversas naturezas sobre o afro-descendente –a fronteira como espaço da alteridade–. Além dos estudos desta temática há também as pesquisas sobre a formação de professores, bem como a política de estágio da licenciatura em História, da educação patrimonial, das teorias e metodologias e de uso das fontes históricas em sala de aula, considerando a relevância dos recortes espaciais-temporais para a compreensão do processo histórico. Diante disso, pode-se afirmar que os grupos de estudos existentes em Secretarias Estaduais e Municipais propiciam a revisão das concepções de aprendizagens e das propostas curriculares aos PCNs de História e de temas transversais de 1998.

Dessa maneira, o ensino e o aprender a história centram-se no uso de fontes de pesquisas, da especificidade da disciplina História no currículo da Escola e das diretrizes curriculares, que se constituem num veio de políticas públicas inseridas em contextos matizados no interior da história do Brasil. É mister dizer que as pesquisas sobre (e nos) manuais didáticos de História tornaram-se fundamentais, pois o livro didático de ensino fundamental a partir da década de 1990 passou a ser objeto de políticas do governo federal por meio de avaliações realizadas pelo MEC, pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).

Diante do exposto, os estudos e as pesquisas que integram o dossiê deste número representam variadas temáticas, abordagens, linguagens e materiais do Ensino de História, que, nas últimas décadas, conquistaram espaço na historiografia, compondo, assim, as análises dos textos (artigos) como se podem acompanhar a forma em que os autores percorreram tal campo.

O artigo “Olhares sobre a África: abordagens da história contemporânea da África nos livros didáticos brasileiros”, de Anderson Ribeiro Oliva, tem como fio condutor o tratamento outorgado à história da África Contemporânea em livros didáticos das 6ª a 8ª séries (7º ao 9º). Para tanto, investiga-se a existência de análises superficiais a respeito das trajetórias recentes dos países e sociedades africanas, destaca as representações, os estereótipos sobre a África no ocidente.

O artigo “Oficina de ensino, formação e estágio no fazer do estudante de história”, de Carlos Augusto Lima Ferreira, constitui-se em um relato do estágio de estudantes de História em três escolas públicas da cidade de Salvador/ BA e também no Arquivo Público da Bahia.

O artigo “Educação patrimonial e as interfaces com o ensino de história: os museus de rua em São Paulo”, de Cláudia Engler Cury, é uma abordagem das experiências com os Museus de Rua/Museus de Bairro do final dos anos de 1970 e no final dos anos de 1990, mostra a construção dos processos simbólicos como constituição de memórias e identidades entre os  gestores públicos e as comunidades. A autora considerou-se, ainda, os projetos escolares de ensino da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo.

O artigo “Formações “humanistas” e percursos estudantis: o caso das Universidades de Paris I, Cambridge, Amsterdam, 1988-1998”, de Cendrine Paul-Guers, é uma investigação que traz à luz a análise da natureza de um saber disciplinar e as ferramentas deste saber para a inserção no mundo do trabalho. O objetivo é compreender a utilidade social da história, o modo como as representações influenciam as aprendizagens, e os acessos ao mercado de trabalho. O eixo principal da pesquisa são alguns estudantes da Sorbonne, de Cambridge e da Universiteit van Amsterdam.

O artigo “Aspectos teórico-metodológicos, fontes e historiografia da história do ensino de História no Brasil (1990-2008)”, de Décio Gatti Júnior, trata-se de algumas reflexões elaboradas da análise da produção histórico-educacional vinculada à temática da História das Disciplinas Escolares no Brasil entre os anos de 90 e 2008 do século XXI. O autor investiga o conteúdo de algumas fontes para concluir que, na história das disciplinas escolares, existe fertilidade na utilização de evidências a respeito de bibliografia variada, documentos impressos e manuscritos, depoimentos orais e iconografia.

O artigo “O espaço e o tempo no processo de ensinar e aprender história na sala de aula”, de Ernesta Zamboni e Sandra Regina Ferreira de Oliveira, apresenta reflexões sobre a organização do espaço e a utilização do tempo por professoras e alunos, considerando as relações, implicações e possibilidades que podem ser estabelecidas com o ensino de História; utilizaram dados empíricos coletados em duas salas de 3ª. série do ensino fundamental.

O artigo “A educação dos sentidos na leitura do Almanach-Album de São Carlos de 1916-1917”, de José Evaldo de Mello Doin, Arrovani Luiz Fonceca, Humberto Perinelli Neto e Rafael Cardoso de Melo, explora o universo da leitura fotográfica no Almanach-Album de 1916-1917, de São Carlos, mostrando à luz da “educação dos sentidos” como o leitor interage com os ditames da belle epoque cafeeira.

O artigo “Autonomia do docente de história em grupos de estudo”, de Luis Fernando Cerri e Maria Antônia Marçal, investiga a atuação de professores de História em seus movimentos de autonomia e heteronomia em grupos de estudos de professores. O primeiro grupo como proposta de “capacitação” da Secretaria de Educação do Paraná, o segundo como laboratório vinculado ao projeto de pesquisa dos autores. A metodologia abordada envolveu pesquisa-ação, observação etnográfica e pesquisa documental.

O artigo “A formação do professor universitário de História”, de Luiz Fernando Silva Prado, é uma reflexão sobre a problemática da formação do professor universitário de História, no Brasil, centrada na bipolaridade ensino e pesquisa como “ethos acadêmico”, que sustenta a idéia de Universidade.

O artigo “A construção de referenciais para o ensino de história: limites e avanços, de Margarida Maria Dias de Oliveira, mostra que existe no mínimo cinqüenta profissionais brasileiros discutindo os referenciais que devem nortear o ensino de História. Utiliza-se no artigo textos de Emília Viotti da Costa escritos entre 1957 e 1963 sobre os elementos de um debate pautado em algumas ocasiões pelos profissionais de História, todavia, a autora ressalta que, ainda, não se enfrentou e não dialogou a respeito dos referenciais que devem nortear a seleção de conteúdos e objetivos do ensino no currículo.

O artigo “Concepções de aprendizagem histórica presentes em propostas curriculares brasileiras”, de Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt, é resultado de uma pesquisa mais ampla que traz à luz à análise de documentos curriculares referentes aos Parâmetros Curriculares Nacionais de História para o ensino fundamental e médio (1997; 1998). A metodologia adotada é a de investigação qualitativa de estudo de caso e a perspectiva da investigação bibliográfica e documental.

Para fechar o dossiê, o artigo “Ensinar e aprender a ensinar história”, de Thiago Fernando Sant’Anna, apresenta a descrição de experiências docente em Didática e Prática de Ensino em História e Estágio Supervisionado em História na UFG (Goiânia) e UCG. O autor discorre sobre as propostas da historiografia do ensino de história nos últimos anos, como a distância entre Universidade e Escola, a produção de conhecimento, o livro didático, o eixo temático e o uso de diferentes linguagens no ensino de história. É importante ater-se à pesquisa apresentada pelo autor, uma vez que se aborda o campo “Ensinar e aprender história” na licenciatura da UFG-Goiânia e da UCG, das experiências de trabalhos de campo (estágios) realizadas no curso de História. Nos últimos anos a área –Ensino de História– investe em trabalhos interdisciplinares, considerando o diálogo Universidade-escola (campo de estágio), o que contribui para enriquecer a formação dos alunos (professores). Estes apontam suas experiências em salas de aulas, nas escolas como propício do debate e ressaltam a relevância da pesquisa, sobretudo, ao se efetivar a proposta de criação do Laboratório de Ensino de História (LEHIS). O objetivo deste laboratório é desenvolver pesquisas e solidificar o diálogo com a Escola –Educação Básica- publicando e divulgando o resultado desses estudos em oficinas, eventos e, por fim, elaborado materiais didáticos.

Neste número da História Revista ainda há três artigos entre os quais “Festividades mestiças na Amazônia”, de Carmem Izabel Rodrigues, que é uma análise de duas festividades em Belém, no século XIX. A autora mostra 13 motivos da proibição e o desaparecimento dessas festividades, sobretudo pelos fluxos culturais, hierarquias e poderes da Amazônia urbana.

Outro artigo “Impactos da romanização em Alexandria: alguns debates bibliográficos”, de Joana Campos Clímaco, apresenta uma discussão bibliográfica sobre Alexandria quando foi sujeita ao poder romano em 31 a.C. que deixou de ser a sede do reino ptolomaico.

Por último o artigo “A presença francesa no Piauí do Século XIX”, de Leandro Mendes Rocha e Gercinair Silvério Gandara, é uma investigação do Piauí e Maranhão, onde os portugueses encontraram-se firmas britânicas e francesas que repetiram métodos e processos empregados em suas colônias, inclusive estimulando o transporte marítimo e fluvial de mercadorias. Há, ainda, a resenha escrita por Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd do livro de OLIVEIRA, Margarida Maria Dias de; CAINELLI, Marlene Rosa; OLIVEIRA, Almir, Félix Batista de. (Orgs.). Ensino de História: múltiplos ensinos em múltiplos espaços. Natal/ RN: Editora da UFRN, 2008. Integra também neste número o artigo traduzido por Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt “Arquivos Simulados e Didática da pesquisa histórica: para um sistema educacional integrado entre arquivos e escolas”, autorizado pelo autor Ivo Mattozzi. O texto remete o leitor à reflexão de arquivos escolares a partir de experiências didáticas que se baseiam na relação entre professores e fontes de arquivologia, que podem distinguir-se esquematicamente em importantes eixos como –experiência de utilização de fontes não estruturadas; – pesquisas histórico-didáticas com materiais estruturados;– pesquisas de arquivos organizadas pelos professores, permitindo, assim, observar as possibilidades de pesquisas histórico didáticas. Pode-se, portanto, observar que a Didática, a escola são fontes de pesquisas.

Os artigos que integram o dossiê e os demais são de autoria de professores-pesquisadores, que trazem importantes contribuições para novas reflexões no campo das temáticas do Ensino de História. Boa leitura.

Maria da Conceição Silva

Maria Auxiliadora Moreira dos Santos Schmidt

Organizadoras do Dossiê

Comissão Editorial

 Maria da Conceição Silva

 Anderson Ribeiro Oliva

Armênia Maria de Souza

 David Maciel

Luciane Munhoz de Omena


SILVA, Maria da Conceição; SCHMIDT, Maria Auxiliadora Moreira dos Santos; et al. Apresentação. História Revista, Goiânia- GO, v. 14, n. 1, jan/jun, 2009. Acessar publicação original [DR]

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