Indústria Cultural e Contemporaneidade / História e Cultura / 2013

A indústria cultural é um dos elementos que identificam a contemporaneidade. Toda a vida humana está hoje permeada por imagens, símbolos, sons, textos que foram produzidos em seu âmbito. Nossas subjetividades, a maneira como vemos o mundo, os desejos que expressamos estão sempre em diálogo, mais ou menos contraditório, com bens culturais produzidos de forma massiva e mercantilizada.

O conceito de indústria cultural foi trazido ao debate sobre a natureza do capitalismo no Pós-Guerra por Theodor Adorno e Max Horkheimer. Era o ano de 1947, no qual se definia a Guerra Fria e época em que os horrores do extermínio ainda povoavam intensamente corações e mentes. Em Dialética do Esclarecimento (Dialektik der Aufklärung), os autores criticavam a razão iluminista, capaz de tornar o massacre racional, e viam na indústria cultural sua perpetuação. Em oposição ao termo “cultura de massas”, que pode significar uma produção cultural produzida por ou para as “massas”, o conceito de indústria cultural põe a nu a lógica da cultura mercantilizada. Nesta, as “massas” seriam apenas objetos e jamais sujeitos. Os bens culturais produzidos como mercadorias se destinam ao consumo e, por meio deste, a um controle social fabricado pela alienação. Ao mesmo tempo similares a quaisquer mercadorias produzidas sob o capitalismo, esses bens se distinguiam pela sua capacidade de gerar conformismo e aquiescência, capturando subjetividades para a legitimação da ordem do capital.

Muitos foram os autores que debateram essa concepção, seja para negá-la radicalmente e celebrar a “liberdade de escolha” da audiência, seja para perceber nesse sistema de dominação brechas e contradições capazes de permitir a produção de contrahegemonias. Assim, tomando como horizonte a gênese de tal conceito, o dossiê “Indústria Cultural e Contemporaneidade” reuniu diferentes textos, divididos em: 10 artigos, 01 resenha e 01 entrevista que lançam olhares diversos sobre expressões culturais e seus contextos históricos.

Os primeiros artigos focam mais diretamente nas reflexões conceituais acerca da indústria cultural e seus desdobramentos. Em seguida, passamos para análises mais específicas de produtos e / ou manifestações culturais que dialogam com o referido conceito.

Música, turismo, produção audiovisual, novas tecnologias de informação e comunicação, movimentos sociais, foram temas escolhidos para problematizar o papel da indústria cultural no mundo contemporâneo. Selecionamos ainda uma entrevista de Armand Mattelart, sociólogo belga, co-autor do livro Para ler o Pato Donald, na qual ele reflete, entre outros temas, sobre o papel da indústria cultural no golpe que derrubou o presidente chileno Salvador Allende. Realizada pelo historiador Ivan Gomes, a entrevista traz uma contribuição fundamental para o aniversário dos 40 anos do golpe civil-militar no Chile. Por fim, Lia Rocha apresenta resenha que aborda a “moda” do turismo nas favelas, parte de um processo mais amplo de ordenamento urbano e de comoditização da cidade que está em curso no Rio de Janeiro, sede de megaeventos nos próximos anos.

“O Apocalipse é uma obsessão do dissenter, a integração é a realidade concreta dos que não dissentem.” A célebre frase de Umberto Eco, em seu livro Apocalípticos e Integrados, pode ser tomada como epígrafe deste dossiê. Nossa intenção foi, a partir de abordagens diferentes, desnaturalizar o senso comum, incentivando estudos culturais críticos que compreendam a História como processo. Pode-se perceber, assim, as mediações produzidas na dinâmica da indústria cultural, arena de conflitos e disputas entre um poderoso status quo que busca se perpetuar eternamente e um campo contrahegemônico que busca construir, de modos diversos, um novo horizonte histórico.

Adriana Facina – Professora do PPGAS / Museu Nacional / UFRJ, com pós-doutorado em Antropologia Social.

Pâmella Passos – Professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ). Doutora em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisadora do Grupo de Pesquisas “Observatório da Indústria Cultural (Oicult).

Organizadoras do Dossiê Indústria Cultural e Contemporaneidade


FACINA, Adriana; PASSOS, Pâmella. Apresentação. História e Cultura. Franca, v.2, n.2, 2013. Acessar publicação original [DR]

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