A Revolução Americana – WOOD (RH-USP)

WOOD, Gordon S. A Revolução Americana. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013. Resenha de: PANDOLFI, Fernanda Cláudia. Revista de História (São Paulo) n.172 São Paulo Jan./June 2015.

O livro A Revolução Americana de Gordon Wood é um exemplo da importância dos livros de divulgação científica para difusão do conhecimento histórico. Publicado originalmente em inglês em 2002, o livro refina e aplica interpretações desenvolvidas pelo autor em trabalhos anteriores, por exemplo, Wood (1991), que lhe deu o prêmio Pulitzer de 1991, e Wood (1969). Com linguagem acessível ao público não especializado e capítulos dispostos cronologicamente, o autor analisa os efeitos que a Revolução Americana produziu na vida cotidiana daquela sociedade. Sua principal contribuição neste e em outros trabalhos tem sido a de criticar ou, em alguns casos, qualificar tanto análises que tendem a criar uma aura de divindade sobre a geração dos líderes revolucionários como os estudos produzidos principalmente na primeira metade do século XX, que tendem a privilegiar os aspectos de conflitos de classes na revolução. Autor de reconhecida produção acadêmica, Gordon Wood concluiu o doutorado em Harvard e leciona atualmente na Universidade Brown.

Organizado em sete capítulos, o livro aqui resenhado inicia-se com a abordagem das origens da revolução e finaliza com a sua institucionalização. O crescimento populacional e a expansão da riqueza no período prévio são considerados os principais fatores para a eclosão da revolução por propiciarem o surgimento de poderes políticos locais independentes nas regiões mais distantes da colônia, o que dificultou significativamente sua governabilidade pelos ingleses. A implantação de regulamentações e leis como a Lei do Selo e a Lei do Chá nesse contexto catalisaram as insatisfações, mobilizando e unificando a resistência contra os ingleses. Uma inovação teórica importante introduzida pelo autor, já no início do livro, é a adoção de uma perspectiva relacional, em que as mudanças nas formas pelas quais as pessoas se conectavam socialmente redefiniram progressivamente as relações de poder. Particularmente interessante a esse respeito é a sugestão de que a intensa mobilidade populacional no período teria favorecido a formação de vínculos mais fluídos entre as pessoas, dificultando a permanência das relações de dependência que caracterizavam a sociedade colonial.

Líderes revolucionários importantes como George Washington e Thomas Jefferson são brevemente citados, provavelmente devido a limitações editoriais. Aos pesquisadores interessados em uma descrição mais detalhada do papel desses líderes na revolução, sugere-se outro texto do autor (Wood, 2007), que explica que eles, apesar de não serem democratas no sentido moderno do termo, criaram uma aristocracia diferente da nobreza hereditária que governou até o século XVIII.

Nos capítulos seguintes, o autor reconstitui a gradativa mudança na forma de fazer política no período, analisando, por exemplo, o surgimento das associações locais, dos governos informais e de um novo tipo de política popular, em que os chamados “incendiários” competiam pela liderança política trazendo escândalos morais para o centro do debate político. O mais influente desses incendiários, segundo o livro, foi Thomas Paine, que se notabilizou por substituir em seus panfletos políticos o latim e as referências eruditas pelas citações bíblicas, alcançando, com isso, um público muito mais amplo.

Sobre a guerra de independência propriamente dita, o autor discorre a respeito dos diversos fatores que levaram à derrota da Grã-Bretanha como, por exemplo, os obstáculos decorrentes da grande extensão territorial e da natureza selvagem das colônias, o apoio dos franceses e a liderança militar de George Washington. A parte mais esclarecedora dessa discussão, entretanto, é a conclusão de que a Declaração de Independência, por representar um compromisso entre as treze colônias, significava que o termo Estados Unidos tinha um sentido literal naquele momento em que o conceito de nação estava relacionado às identidades regionais.

O republicanismo que se institucionalizou com a revolução é analisado pelo autor não somente como uma forma de governo, mas como uma forma de vida, de ideais e de valores, que se baseavam em uma moral mais rígida, se comparada a da monarquia que tolerava altos graus de interesses privados e corrupção entre seus membros. Ao afirmar que o republicanismo era uma ideologia “tão radical para o século XVIII quanto o marxismo seria para o século XIX” (p. 119), o autor enfatiza exatamente esse ponto, argumentando que a revolução desafiou princípios fundamentais da monarquia como a hierarquia, a devoção aos laços de sangue, o patriarcalismo e as relações de dependência. O republicanismo americano, entretanto, não era logicamente inconsistente com a monarquia, tendo sido seus princípios adotados por intelectuais que procuravam reformar e revitalizar as sociedades monárquicas em outros países.

As mudanças na vida cotidiana trazidas com a revolução são analisadas a seguir. No âmbito religioso, por exemplo, proliferaram igrejas mais atraentes aos homens sem raízes de uma sociedade em que as antigas relações paternalistas declinavam. Uma conclusão instigante do autor é que, embora não tenham produzido uma distribuição da riqueza mais equânime, essas mudanças na vida cotidiana fizeram os americanos se sentirem mais iguais. O homem comum passou a exigir o direito de envergar títulos – o sr. e sra. – e muitos homens ricos referiam-se orgulhosamente à sua origem humilde, tendo a publicação da autobiografia de Benjamin Franklin iniciado a tradição de celebração do homem que “fez a si próprio”.

A ênfase do autor na análise das transformações advindas da revolução, contudo, não implica a adoção de uma abordagem dicotômica entre ruptura e continuidade; ao contrário, o autor prefere explicar essas mudanças sem dispensar totalmente as antigas estruturas políticas e de pensamento. A igualdade republicana, por exemplo, apesar de não ter por objetivo eliminar todas as diferenças entre os cidadãos, embutia, mesmo que em geral de forma implícita, a “ideia explosiva” de que somente a educação e o refinamento diferenciavam os homens. Da mesma maneira, argumenta o autor, embora não tenha produzido muitos efeitos imediatos, a ideia de igualdade republicana levou ao início do questionamento do ambiente intelectual que apoiava a escravidão.

Os capítulos finais analisam o período mais crítico da revolução, caracterizado pelo quase caótico ato de legislar em nível estadual com o crescimento dos interesses localistas. A dificuldade de arrecadar impostos e a ameaça da integridade territorial, além disso, constituíam uma ameaça real à viabilidade da revolução. Nesse contexto, não é surpreendente que tenha havido uma guinada para a moderação, com a reorganização da estrutura político-administrativa para conter o que chamavam de “despotismo democrático”, levada a cabo sobretudo pelos federalistas, que se viam salvando a revolução de seus excessos. Essa “desradicalização”, contudo, não impediu que inovações políticas abrissem espaço para a emergência da “política popular” adotada pela geração seguinte, principalmente no norte do país, em que homens com pouca instrução e riqueza adentraram na política como representantes de grupos étnicos e religiosos, enfraquecendo o ideal republicano anterior que imaginava (utopicamente) que os legisladores deveriam ser árbitros imparciais das disputas entre os indivíduos.

O grande mérito deste livro, em nossa opinião, é o de retratar o debate de questões intelectuais e políticas em um processo que teve, e ainda tem, amplas repercussões no debate político contemporâneo. Para o público acadêmico, especificamente, é particularmente valiosa a seção de “notas bibliográficas”, em que o autor resenha extensivamente a literatura sobre a Revolução Americana em sete páginas, ressaltando temáticas e enfoques teóricos dos autores. Trata-se, portanto, de leitura introdutória importante para compreensão não apenas da sociedade americana da época da independência, mas também da emergência das estruturas políticas, administrativas e mentais contemporâneas.

Referências

WOOD, Gordon S. Revolutionary characters: what made the founders different. Londres: Penguin Books, 2007. E-book: Kindle edition. [ Links ]

WOOD, Gordon S. The creation of the American Republic, 1776-1787. Chapel Hill: University of North Caroline Press, 1969. [ Links ]

WOOD, Gordon S. The radicalism of the American Revolution. Nova York: Vintage eBooks, 1991, Kindle Edition. [ Links ]

Fernanda Cláudia Pandolfi – Doutora em História pela Universidade Estadual Paulista. Pós-doutoranda em História pela Universidade Federal de Minas Gerais. E-mail: [email protected].

Mystery Train | Luiz Bernardo Pericás

Há quem imagine que Mystery Train, de Luiz Bernardo Pericás, é um roteiro de viagens ou aventuras, mas é muito mais que isso. O autor vai além e inova ao apresentar uma obra que mescla experiência pessoal e ficção com cultura e história dos Estados Unidos. O livro de Pericás é fortemente inspirado em três destacados autores: Jack London e seu The Road, livro memorialístico, autobiográfico, no qual narra suas aventuras e desventuras de trem pelos Estados Unidos; Woody Guthrie, autor de Bound for Glory, um dos nomes mais importantes da cultura popular norte-americana, da primeira metade do século XX e criador da música folk moderna, cujas letras dão voz aos marginalizados de sua época (como os negros, os red necks e os operários); e Jack Kerouac e seu On The Road, considerada a bíblia da “geração beat“, que mostra o lado sombrio do “sonho americano” a partir da viagem de dois jovens, que atravessaram a “América” de costa a costa.

A chamada “geração beat”, formada por Jack Kerouac, William Borroughs, Gregory Corso, Allan Ginsberg e Lawrence Ferlinghetti, entre outros, exerceu enorme influência nos movimentos contraculturais dos Estados Unidos. Os beatniks ouviam muito jazz, usavam drogas, praticavam o sexo livre e mantinham-se com o pé-na-estrada. Queriam fazer sua própria revolução cultural por meio da literatura. Leia Mais

Constructing a Powerful Approach to Teaching and Learning in Elementary Social Studies – GRANT; VanSLEDRIGHT (CSS)

GRANT, S. G.; VanSLEDRIGHT, Bruce. Constructing a Powerful Approach to Teaching and Learning in Elementary Social Studies. Boston, MA: Houghton Mifflin, 2001. 304p. Resenha de: Canadian Social Studies, v.38, n.3, p., 2004.

It is always problematic when an American social studies text, specifically one designed to be used by pre-service teachers, is reviewed through Canadian eyes. For the most part, my own professional past experience has demonstrated that the typical historical examples cited (Mayflower landing, American Revolution, Civil War, Civil Rights Movement, etc.) along with picturesque geographic features such as the Grand Canyon, the Everglades, and the Mississippi River Delta have little relevance for a would-be elementary teacher anywhere in Canada. Additionally, detailed chapters dealing with the American Constitution, government and legal systems as well as issues related to state rights, are foreign to the practical educational realities of anyone north of the forty-ninth parallel. If nothing else, the narrow and specific foci of many of the diverse provincial and territorial elementary social studies programs in Canada are themselves out of synch and offer no commonality, level playing field, or any sort of pan-Canadian national program upon which major pedagogical and curriculum notions can be examined. Therefore, it was with some reluctance that I agreed to tackle a review of Constructing a Powerful Approach to Teaching and Learning in Elementary Social Studies [abbreviated hereafter as CPA]. This hesitation is further heightened by the fact that I am, deep down, a closet Canadian nationalist; use Kirman (2002) as a required text in my own social studies methodology course with second year education students; and periodically refer to Wright (2001) for additional collaboration.

Unfortunately, as if I did not already have enough reticence, CPA is accompanied by a sixty-seven page Instructor’s Resource Manual (ISBN: 0-395-88788-7 supplement). This raises a whole new concern as I am always a tad insulted by those who feel that I am incapable of knowing, deciding, and discovering how to teach my own classes. The notion that I need an instructor’s manual is, in my mind’s eye, offensive. My memory harkens back to my beginning elementary teaching days when teacher’s manuals were all the rage; especially in the mathematics and science domains where the obvious assumption was made that I (as an elementary school teacher) was incapable of solving grade 4 to 6 problems and needed an answer key disguised as a teacher’s edition.

The following review, then, will treat the core text separately from the accompanying manual and will be divided into three sections: text, instructor’s resource manual and summary.

Text: CPA is specifically targeted at budding pre-service elementary teachers-in-training as well as newly minted elementary classroom practitioners. The authors clearly note in the opening sentence that they wrote this book because we were dissatisfied with the elementary social studies textbooks we reviewed for our courses (p. xi). They go on to state that the other books that they did review (unfortunately not listed) failed to capture the vibrancy and power we see in school classrooms where the subject of social studies is well taught (p. xi).

With tongue in cheek and based on my thirty-five years of dealing with elementary schools, I also would certainly like to see social studies well taught. My own professional experience suggests that social studies/sciences is not a discipline that most elementary teachers (and pupils) rank as important. Let us not forget that in the majority of provincial and territory educational jurisdictions in Canada, the social studies domain is not even a part of the prescribed elementary curriculum! Additionally, based on field reports from my third and fourth year teacher candidates, most of their classrooms eschew the teaching of social studies. Even though it can be argued that Quebec is the only province that includes social studies in some meaningful and integrated manner at every grade level from one through to six, curriculum space is always decided in favour of ‘the big three’, namely, English language arts, mathematics and French as a second language.

CPA is a tightly written volume! The book is focused, visually sparse (thank God!), and stays away from unnecessary tangents. In some ways, the text is a solid classroom pedagogical voyage as many of the more practical and concrete planning and organizational notions can easily be applied to other academic areas within the elementary curriculum. Centering Joseph Schwab’s common place concept, grounded in reliable research, and realistically placed within a total elementary curriculum environment, CPA provides a classroom blueprint for the neophyte teacher at the beginning of the twenty-first century.

The strength of the volume is its philosophical grounding. This is not a low-level ‘idiot-proof’ kind of how-to workbook. There is no collection of ready to use on a Monday morning generic social studies lesson plans. There are no easily duplicated worksheets for a dreary Friday afternoon. Rather, this book forces the teacher to think of the place of his/her own educational philosophy and to ground social studies instruction within a much wider philosophical landscape. There is no question that this book was written for the professional educator, and is specifically designed to augment many separate orientations.

Instructor’s Resource Manual: Oh God, a t-shirt handout for a class slogan! While I would strongly recommend the text, I must express many misgivings related to this so-called instructor’s manual. Flimsily produced, its very structure screams ‘cheap’ and ‘of no importance’. I am unsure why publishers feel that course instructors are to be treated in such a manner, but if the manual is so important, make the product of paper that does not rip at a glance, use a cover that will endure more than a couple of openings, and try not to make the manual appear to be something that was produced in the 1970’s by a basement Gestetner and run-off as an after school program.

Instead of taking some of the exciting notions that are introduced in the text, the authors of the manual appear to have fallen back on the same old tired and misguided concepts that drove previous manual designers. The assumption is that the reader of the manual is slightly slow (in intelligence) and old (with dwindling eyesight); hence, large black print, lots of margin space, simple sentences, nothing controversial, and trite statements as guiding principles. For everything that is positive about the text, the reverse is true for the manual. While great care and energy was clearly put into the design and organization of the main volume this is evident in dealing with concepts such as the Treads Approach and Creating a Genuine Classroom Community the manual shows none of this enthusiasm and offers no additional insights. This reader can only assume that it was thrown together somewhat belatedly by an in-house staff that did not understand the concepts and originality of the textbook.

On the whole, Constructing a Powerful Approach to Teaching and Learning in Elementary Social Studies is a valuable volume. It is worth reading as its underlying philosophy is so appealing. Clearly, Grant and VanSledright have some understanding of the realities of the elementary practitioner and have grounded their particular social studies interests in a framework that would fit with many emerging trends. Further, the authors are to be congratulated for providing an overall structure that meets the student centered and individual accountable orientations that are being exhibited in many emerging curriculums. This book will appeal to classroom practitioners as well as those who instruct soon to be elementary teachers. The volume is grounded in time-tested research and not based on the limited experiences of a special group of teachers in a specific school with an abundance of resources. This is a professional book whose ideas and teaching strategies can be implemented by creative classroom practitioners.

References

Kirman, J. M. (2002). Elementary social studies: Creative classroom ideas, 3rd Ed.. Toronto, ON: Prentice Hall.

Wright, I. (2001). Elementary social studies: A practical approach to teaching and learning, 5th Ed. Toronto, ON: Prentice Hall.

Jon G. Bradley – Faculty of Education. McGill University. Montreal, Quebec.

Acessar publicação original

[IF]