O Império e as Províncias: configurações do estado nacional brasileiro no século XIX / Outros Tempos / 2019

Caro leitor, a nova edição da Revista Outros Tempos apresenta o Dossiê O Império e as Províncias: configurações do estado nacional brasileiro no século XIX. Ao convidar estudiosos dos Oitocentos para a reflexão sobre a diversidade de questões compreendidas por essa temática, apontamos para algumas possibilidades, como: a história dos mecanismos jurídicos, fiscais e militares e sua configuração nas províncias; as expressões políticas no campo doutrinário e os embates do espaço público, como a imprensa da Corte e das províncias; as expressões literárias e artísticas, e a pluralidade de identidades políticas coletivas que engendram.

Quanto aos pontos de observação dessas questões, também propusemos olhares múltiplos: do centro político em sua percepção sobre as províncias, a visão a partir de uma província em particular, ou uma determinada articulação entre elites provinciais, sem esquecer as perspectivas comparadas e / ou de história conectada que permitam pensar a problemática no plano do continente americano e dos debates europeus coevos.

O resultado foi uma grata surpresa. Sobre as províncias, representadas por Maranhão, Minas Gerais, Pernambuco e Rio Grande do Sul, recebemos contribuições que preservaram / ampliaram as abordagens propostas inicialmente pelo Dossiê.

Em relação ao Maranhão, as abordagens variaram entre a recuperação de trajetórias individuais (Luisa Moraes Silva Cutrim – “Massa de brasileiros transatlânticos”: a reinserção do negociante Antonio José Meirelles no Maranhão pós-independência (1825-1831)), a análise da atuação de órgãos provinciais, como o Conselho Presidial (Raissa Gabrielle Vieira Cirino – “Vigiar a ordem pública em conformidade das leis”: trabalhos do Conselho de Presidência do Maranhão nos primeiros anos do Brasil Império (1825-1829)) e de grupos políticos radicados na província (Yuri Costa – Escalas de poder: grupos políticos no Maranhão oitocentista e sua relação com a Corte do Império).

Sobre a província de Minas Gerais, as contribuições também gravitaram entre a recuperação de trajetórias (Luciano Mendes de Faria Filho e Dalvit Greiner de Paula – Do Conselho da Província à Assembleia Geral: os homens e as ideias em torno de Bernardo Pereira de Vasconcelos (1795-1850)) e a atuação de órgãos provinciais, desta feita, a Assembleia Legislativa (Kelly Eleutério Machado Oliveira – As províncias do Império: a Assembleia Legislativa de Minas Gerais e o regresso conservador (1835-1842)).

Outros grupos políticos também foram contemplados nesse Dossiê. Em primeiro plano, como no caso de Pernambuco (Paulo Henrique Fontes Cadena – A divisão do poder. Pedro de Araújo Lima, os irmãos Cavalcanti de Albuquerque e os Rego Barros entre Pernambuco e o Centro no Século XIX), ou em torno de temáticas que despertavam interesses e conflitos de grandes dimensões, como a questão da propriedade da terra no Rio Grande do Sul (Cristiano Luís Christillino – Mosquetes, penas e muita negociação: a aplicação da Lei de Terras na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul).

Em todos esses artigos, de modos distintos, esteve presente a articulação entre as províncias e a corte, perspectiva acrescida por uma análise dessa relação sob o ponto de vista da administração do Império (Andréa Slemian – Pelos “negócios da província”: apontamentos sobre o governo e a administração no Império do Brasil (1822-1834)).

O Dossiê conta ainda com perspectivas comparadas e conexões que contemplam outros espaços, para além do território que se conformava como o Império do Brasil. Uma “mirada transnacional” conectou interesses das províncias brasileiras e Guerra Civil nos Estados Unidos (Juliana Jardim de Oliveira e Oliveira – Interesses provinciais no Brasil nos anos da Guerra Civil norte-americana: uma mirada transnacional sobre relações entre o império e as províncias); noutra perspectiva, tomamos contato com a construção do estado nacional no México (Rodrigo Moreno Gutiérrez – Provincias, reinos, estados e imperio: El problema de la articulación territorial de la Nueva España a la República Federal Mexicana).

Além dos artigos, o Dossiê brinda o leitor com uma entrevista de Miriam Dolhnikoff a Wilma Peres Costa. Referência para as discussões que inspiraram a proposição desse Dossiê, a autora também participa dessa edição por intermédio da resenha de uma de suas recentes publicações: História do Brasil Império, Contexto, 2017, por Edyene Moraes dos Santos. Outra resenha, também articulada ao debate aqui proposto, é do livro de Marco Morel: A Revolução do Haiti e o Brasil escravista: o que não deve ser dito, Paco Editorial, 2017, por Bruno da Fonseca Miranda.

O Dossiê conta ainda com um estudo de caso, centrado na tensão entre liberdade de expressão / imprensa e as formas de controle e repressão na década de 1820 / 1830 (Roni César Andrade de Araújo – Um processo de jornalismo à época da Independência: Maranhão, 1829- 1832). Cabe lembrar que a imprensa caracterizou-se como elemento-chave nesse processo de construção de espaços públicos de representação política, que transparecem, invariavelmente, nas pesquisas que compõem esse Dossiê.

Apresentamos ainda quatro artigos livres, situados em espaços-tempos distintos do século XX, eventualmente conectados, como na proposta que articula Revolução Russa e imprensa anarquista no Brasil (Leandro Ribeiro Gomes – Revolução Russa no Brasil: o imaginário e cultura política da imprensa anarquista (1917)). Outras aproximações, agora entre campos de estudo, são apresentadas em artigo sobre relações inter-raciais e racismo em Luanda, a partir do diálogo entre história e literatura (Washington Santos Nascimento – O casamento do preto Marajá com a branca Arlete: relações amorosas e racismo em “Os discursos do Mestre Tamoda” de Uanhenga Xitu). A questão racial é também tema de outro artigo, centrado na trajetória do intelectual brasileiro Clóvis Moura (José Maria Vieira de Andrade – Os dilemas de um intelectual “transitivo”: Clóvis Moura e a constituição de uma rede de sociabilidade antirracista no Brasil). Por fim, apresentamos artigo centrado na relação entre organizações empresariais e trabalhadores da construção civil durante a ditadura civil-militar (Pedro Henrique Pedreira Campos – Ditadura e classes sociais no Brasil: as organizações empresariais e de trabalhadores da indústria da construção durante o regime civil-militar (1964-1988)).

Assim, chegamos ao 16º ano e a 27ª edição. Boa leitura a todos!

Marcelo Cheche Galves

Wilma Peres Costa

(ORGANIZADORES)


GALVES, Marcelo Cheche; COSTA, Wilma Peres. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 16, n. 27, 2019. Acessar publicação original [DR]

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