História Agrária e deslocamentos/Outros Tempos/2023

Não é de hoje que a História Agrária tem-se apresentado como um tema urgente na historiografia brasileira. A emergência dos movimentos sociais e populares no campo no século XXI vem provocando novas abordagens temáticas já conhecidas. Passamos de estudos mais centrados nas questões da estrutura e da economia agrárias brasileiras para outras que, mesmo sem necessariamente abandonar o econômico e o estrutural, centram-se em problemas referentes a identidade cultural, relações e conflitos sociais, contatos entre diferentes grupos étnicos, bem como diversos processos de povoamento e colonização, formas de acesso à terra e relações de trabalho no campo, leis e direito agrário e problemas ambientais (CONGOST, 2007; GUIMARÃES e MOTTA, 2007; LINHARES e SILVA, 1981; MOTTA, 1998; NUNES, 2016). Leia Mais

Povos indígenas no Brasil oitocentista | Outros Tempos | 2022

Miguel Maria Lisboa Imagem Wikipedia
Miguel Maria Lisboa | Imagem: Wikipédia

Presumir-se pode apenas

Que é correio, a marcha afrouxa

A cavalgada; e faz alto

Logo que disso tem prova

 Chega enfim o índio pedestre

Do peito a fivela solta;

Larga a mala, e com dois dedos

A testa que lhe pinga esgota

(LISBOA, 1866, p. 126)

A imagem da capa deste dossiê sucede os versos acima dispostos, de Miguel Maria Lisboa, na obra Romances históricos por um brasileiro, de 1866. Na reconstrução da cena do grito do Ipiranga, foi um índio-correio o responsável por levar as notícias vindas de Portugal, resultando no gesto que representou o rompimento definitivo com a antiga metrópole. Diante do glorioso Dom Pedro, vemos o indígena “civilizado” boquiaberto, atônito e confuso frente às grandes transformações que se anunciavam. Semelhante ao condutor do carro de bois da famosa obra de Pedro Américo, a sua condição era apenas de um espectador bestializado.

A gravura O grito do Ypiranga, de autoria anônima (LISBOA, 1866, p. 126-127), além de representar o ato mítico de fundação na nação, aponta para, pelo menos, duas questões cruciais acerca dos lugares identitários e sociais atribuídos aos indígenas e sobre as políticas indigenistas no Brasil Império. A primeira dela diz respeito a algo que está na linha de frente do combate da historiografia sobre os indígenas em diferentes momentos: a imagem de uma passividade inerente a essas pessoas. No império, essa narrativa se consolida, ainda que membros de governos, colonos e outros agentes nunca conseguissem esconder a rebeldia e resistência indígena na documentação que produziam. No entanto, as alegações de inércia e indolência estavam sempre lá, frutos de uma suposta inferioridade cognitiva. Sob o discurso da “civilização”, construía-se a imagem dos indígenas como incapazes de compreender a importância do trabalho, de serem plenamente civilizados e de entenderem os grandes acontecimentos políticos.

Um segundo ponto, menos comum na historiografia dos Oitocentos, é a representação de um indígena diferente do estereótipo de selvagens nus, pintados, trajando adereços com penas e habitantes de matos remotos. Aqui, tratava-se de um indivíduo em avançado processo de transformação cultural, “civilizado”, que quase já não é mais classificado de índio. Era um representante dos grupos integrados à sociedade, antes colonial portuguesa e, a partir de 1822, brasileira, que já haviam passado por décadas ou séculos de experiência de aldeamento e relações de reciprocidade com os monarcas lusitanos. Exerciam trabalhos remunerados ou compulsórios à serviço de proprietários ou de governantes, na condição de lavradores, construtores, coletores, ou como era o caso da imagem da capa, como índios-correio (COSTA, 2015, p. 235-264).

Com a independência, adquiriram uma cidadania precarizada e excludente, que os limou de espaços políticos e de qualquer oportunidade de ação institucional (COSTA, 2021, p. 17-19). Com o andar dos Oitocentos, com maior ou menor velocidade a depender da província, viram os aldeamentos serem extintos, perderam as suas terras – a última e das mais importantes de suas prerrogativas – e até mesmo a possibilidade de se identificarem como índios (OLIVEIRA, 2020, p. 193-194). Produziram-se discursos acerca do ex-índio, do misturado à massa geral da população, agora identificado como caboclo (SILVA, I., 2011, p. 327-246), vivendo nas margens, como mão de obra barata, despossuída e, eventualmente, escravizada (MOREIRA, 2020).

As instituições que se formaram e se consolidaram no Estado nacional brasileiro construíram ao longo do tempo imagens cada vez mais depreciativas contra os indígenas para justificar o processo de exclusão (ALMEIDA, 2010, p. 137-141). Isso era feito, obviamente, recheado de muito esquecimento por conveniência. As diversificadas formas de ação política indígena do início do século XIX, inclusive com a sua decisiva atuação durante a independência (MACHADO, 2010), eram magicamente apagadas. O cinismo era ainda mais flagrante quando se fortaleceram as narrativas sobre a extinção indígena, veiculadas contemporaneamente às ações de muitos grupos que reivindicavam os seus direitos à terra justamente por serem indígenas (VALLE, 2009, p. 67-78).

A formação do Estado nacional brasileiro se fez na busca pelo silenciamento indígena, por meio do extermínio, escravização ilegal e precarização de sua cidadania. De tal maneira que, até hoje, a memória nacional dá pouco ou quase nenhum espaço à atuação dos índios nesse processo. Como resultado, a própria historiografia também silencia sobre o assunto. Desde os livros didáticos (SANTOS, 2020, p. 71), passando por pesquisas acadêmicas e refletidas nas melhores coletâneas sobre o século XIX (SILVA, A., 2011)1 , os indígenas são praticamente ausentes, quase que informando que já ali estavam em vias de desaparecimento. Logo, restaria pouco o que falar. Em contrapartida, podemos perceber que, especialmente na historiografia dos Oitocentos, legou-se uma visão elitista dos processos históricos de que alguns quase não eram mais índios (MONTEIRO, 2001, p. 4-5), mas todos – os das matas, sobretudo – eram entes incapazes. É como se toda a tradição da “história dos de baixo” tivesse mais dificuldade de acessar a ação indígena na história do século XIX do que a de qualquer outra população2 . Parecem ter comprado os discursos dos autores de maior parte da documentação.

Felizmente, nos últimos anos, vieram à tona muitas pesquisas questionando a ausência indígena na história do império do Brasil, bem como a suposta e infundada carência de temas e fontes a respeito do que se investigar. Aliás, o posicionamento tradicional não possibilitava que pesquisas iniciassem, já que as perguntas e os problemas sequer eram formulados. Hoje, há uma profusão promissora de trabalhos, como o presente dossiê prova de forma tão potente.

Aqui apresentamos ao público pesquisas que se debruçam sobre as multifacetadas experiências dos indígenas no século XIX. Todos os trabalhos aqui reunidos se assentam nas ações indígenas que nem a imposição de silenciamento pelas autoridades imperiais pôde calar. Mesmo com o processo empreendido de precarização da cidadania dos grupos integrados, ou a invasão genocida sobre os territórios dos povos autônomos, as heterogêneas ações indígenas se fizeram constantes ao longo dos Oitocentos.

Para abrir os debates iniciamos com o artigo de Estêvão Martins Palitot, Marcos, rumos, posses e braças quadradas: refazendo os caminhos da demarcação da Sesmaria dos Índios de Monte-Mór – Província da Parahyba do Norte (1866-67), traz-nos uma cartografia da ocupação indígena do litoral norte da Paraíba, contrastando memórias contemporâneas e demarcação das terras da Sesmaria dos Índios de Monte-Mór, na Província da Parahyba do Norte, realizada entre 1866 e 1867. Embora o autor não busque uma continuidade histórica, aponta para os processos de (des)territorialização e tentativas de apagamento da condição étnica dos povos indígenas dessas fronteiras sob distintos subterfúgios que envolviam os interesses sobre seus territórios.

No artigo Manuel Valentim: “uma guerra civil de 12 anos”: Mobilizações indígenas na Zona da Mata Sul de Pernambuco, na segunda metade do século XIX, Edson Silva faz uma rica análise sobre os processos de desterritorialização dos indígenas aldeados no sul daquela província. Silva trabalha de forma interessante a trajetória do índio Manoel Valentim dos Santos e de outros indígenas que lutavam contra a extinção da Aldeia de Escadas e as constantes invasões de suas terras diante do avanço da economia açucareira na região.

Adauto Rocha, em seu artigo intitulado Recrutamentos indígenas nas Alagoas: da Capitania independente à extinção oficial dos aldeamentos (1817-1872), analisa um tema ainda pouco estudado: o papel dos indígenas em conflitos bélicos internacionais, como na Guerra do Paraguai (1864-1870). Ao mesmo tempo, problematiza sobre a utilização dos índios aldeados como mão de obra em distintos serviços públicos.

Com destaque para a fronteira entre as províncias de Minas Gerais e Bahia, especialmente nos territórios banhados pelos rios Jequitinhonha e Mucuri, Renata Ferreira em seu artigo “Eu não quero estradas em minhas terras!”: Os indígenas entre os projetos de navegação e desenvolvimento do Jequitinhonha e Mucuri na segunda metade do século XIX se debruça sobre os projetos de exploração dessas áreas de fronteira e o impacto sobre as territorialidades indígenas que lá se encontravam. Além de demonstrar os diferentes interesses das elites locais no avanço desses projetos, Ferreira consegue dar visibilidade às resistências indígenas diante das tentativas de espoliação de seus territórios.

Descendo a fronteira temos o artigo de Karina Melo Terras indígenas e direitos territoriais no Aldeamento guarani de São Nicolau do Rio Pardo (Província de São Pedro), onde analisa as disputas envolvendo as terras dos índios do aldeamento de São Nicolau do Rio Pardo, província de São Pedro (atual Rio Grande do Sul). A autora aponta para os processos de esbulho das terras do aldeamento diante do avanço da imigração estrangeira na região, ao mesmo tempo em que os índios ali aldeados passaram a ser tratados como “nacionais”.

O tema da expropriação das terras indígenas atravessa todos os trabalhos organizados nesse dossiê e se articula de modo incontornável com a problemática dos apagamentos das identidades étnicas desses sujeitos, para incorporá-los enquanto trabalhadores subalternizados. Nessa perspectiva de pensar os discursos de apagamento das identidades indígenas no século XIX, Philipe Luiz Trindade de Azevedo traz em seu artigo Os estereótipos sobre os “índios” no Brasil Oitocentista (1845-1867): discursos em disputa um balanço desse debate e como se articulou em espaços como o IHGB. Nesse sentido, o autor recorda os principais estereótipos atribuídos aos indígenas por essa elite intelectual. No mesmo caminho seguiu a análise de Lorena Varão, ao problematizar em seu artigo O ser e o não-ser indígena no Brasil Oitocentista sobre os processos de construção da alteridade indígena no século XIX a partir do dualismo entre o índio “selvagem” X “civilizado”.

O ensino de história indígena nas escolas ainda dialoga pouco com as pesquisas desenvolvidas na academia. Esse gargalo coloca um grande desafio aos professores, que é o de saber como ensinar essa temática sem recorrer aos velhos estereótipos tão disseminados no senso comum, como o “índio genérico”. O artigo de Lígio Maia História e ensino de história indígena: a guerra ameríndia nos livros didáticos aprovados pelo PNLD 2017 é um interessante estudo sobre como o tema da guerra ameríndia é apresentado nos livros didáticos de história para os anos finais do Ensino Fundamental. Sua reflexão aporta subsídios importantes para evidenciarmos os protagonismos indígenas no ensino de história.

A seção de artigos se encerra com o trabalho da antropóloga uruguaia Francesca Repetto, com uma análise minuciosa sobre o processo de avanço sobre os territórios ocupados pelos indígenas Charrúa no contexto de formação do Estado do Uruguai e de guerra declarada a esses grupos. Em seu artigo Tierra y mano de obra: políticas de gestión sobre los pueblos indígenas en el Uruguay de los 1830, Repetto problematiza a narrativa da extinção dos Charrúa como parte de “esquemas de apagamiento” perpetrados pela elite econômica, intelectual e política uruguaia. Diferentemente desse discurso construído ao longo do século XIX, a autora reforça a luta contemporânea dos Charrúa por seus direitos e visibilidade num país que até pouco tempo se considerava “sem índios”.

O estudo de caso feito pelo historiador Francisco Cancela Os índios de vila Verde e a luta por liberdade, prerrogativas e isenções: políticas indigenistas e políticas indígenas em uma série documental (1825 e 1826) reforça o persistente protagonismo indígena tão negligenciado e apagado na historiografia brasileira. O autor explora uma rica documentação custodiada no Arquivo Público da Bahia (APEB), a qual registra a atuação dos oficiais camarários de uma vila de índios no sul da Bahia, no contexto do Brasil independente. Ou seja, são documentos produzidos pelos próprios indígenas, que, munidos de conhecimentos adquiridos em séculos de interação, davam vazão às suas demandas e expressão as suas culturas políticas.

Tendo em vista sua já consagrada pesquisa sobre a temática indígena no período colonial e imperial, sendo uma das principais referências no assunto, convidamos a professora Dra. Maria Regina Celestino de Almeida para ser a entrevistada do presente dossiê. Além de tratar dos estudos sobre a questão indígena no Brasil, com seus avanços e desafios, Almeida nos contempla com um breve panorama sobre os trabalhos que têm problematizado de forma comparativa as experiências de participação indígena nos contextos de formação dos estados nacionais na América Latina.

Por fim, temos duas resenhas de importantes obras acerca do protagonismo indígena na História do Brasil. Felipe William dos Santos Silva aborda na sua resenha Os Indígenas no Oitocentos: das margens da História ao centro das narrativas historiográficas uma análise crítica do livro “Sem Vieira nem Pombal” do historiador Márcio Couto Henrique e sua incontornável contribuição para a escrita da história indígena na Amazônia colonial. Fechando a sessão, temos a resenha feita por Guilherme Maffei Brandalise, Os Kaingang e a colonização alemã e italiana no Rio Grande do Sul (séculos XIX e XX), onde se debruça sobre o livro de Soraia Dornelles, “Os Kaingang e a Colonização Alemã e Italiana no Rio Grande do Sul (Séculos XIX e XX)”. O autor explora as principais problemáticas trazidas por Dornelles acerca das diferentes formas de agências indígenas em uma fronteira altamente marcada pela imigração europeia.

Este dossiê pretende contribuir para o alargamento das perspectivas historiográficas acerca da participação indígena no contexto de formação do estado nacional brasileiro. Os autores e autoras aqui reunidos evidenciam em suas pesquisas que, diferentemente da visão de passividade que se queria atribuir aos indígenas, eles estavam participando dos processos históricos e ocupando lugares de luta, negociação e resistência diante do avanço sobre seus territórios. O século XIX produziu discursos do apagamento da identidade indígena sob o viés da miscigenação. Em contrapartida, seja integrados, seja isolados, resistindo em territórios autônomos ou em aldeamentos, eram muitas as formas de participação política dos povos indígenas no Oitocentos. E, como já antevira John Monteiro, quando a presença indígena deixar de ser vista como apêndice da história nacional, irão se reescrever incontáveis páginas das histórias agrárias, econômicas, políticas e sociais do Brasil (MONTEIRO, 1995, p. 228).

Notas

1 Com a destacada exceção do artigo de Patrícia Sampaio (2009).

2 Quando escreveu a sua tese de livre-docência, John Monteiro observou a mesma tendência para a história da América colonial portuguesa (MONTEIRO, 2001, p. 7).

Referências

ALMEIDA, Maria Regina Celestino de. Os índios na história do Brasil. Rio de Janeiro: FGV, 2010.

COSTA, João Paulo Peixoto. Disciplina e invenção: civilização e cotidiano indígena no Ceará (1812-1820). Teresina: EDUFPI, 2015.

COSTA, João Paulo Peixoto. Independência e cidadania: povos indígenas e o advento do liberalismo no Ceará. Acervo, v. 34, n. 2, p. 1-21, 2021.

LISBOA, Miguel Maria. Romances históricos por um brasileiro. Bruxelas: Tipografia de A. Lacroix: Verboeckhoven e Cia, 1866.

MACHADO, André Roberto de Arruda. A quebra da mola real das sociedades: a crise política do Antigo Regime Português na província do Grão-Pará (1821-25). São Paulo: Hucitec: Fapesp, 2010.

MONTEIRO, John Manuel. O desafio da história indígena no Brasil. In: SILVA, Aracy Lopes da; GRUPIONI, Luís Donizete Benzi. A temática indígena na escola: novos subsídios para professores de 1º e 2º graus. Brasília, DF: MEC: MARI: UNESCO, 1995. p. 221-228.

MONTEIRO, John Manuel. Tupi, tapuias e historiadores: estudos de história indígena e do indigenismo. 2001. Tese (Doutorado em Antropologia) – Universidade de Campinas, Campinas, 2001.

MOREIRA, Vânia Maria Losada. Kruk, Kuruk, Kurucas: genocídio e tráfico de crianças no Brasil imperial. História Unisinos, v. 24, n. 3, p. 390-404, 2020.

OLIVEIRA, Tatiana Gonçalves. Terra, trabalho e relações interétnicas nas vilas e aldeamentos indígenas na província do Espírito Santo (1845-1889). 2020. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, Seropédica, 2020.

SAMPAIO, Patrícia Maria Melo. Política indigenista no Brasil imperial. In: GRINBERG, Keila; SALLES, Ricardo (org.). O Brasil imperial, volume I: 1808-1831. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009. p. 175-206.

SANTOS, Roberta Fernandes. Da construção do estereótipo de selvagem à representação do indígena brasileiro no livro didático de História. Escritas do tempo, Marabá, v. 2, n. 6, p. 58- 73, 2020.

SILVA, Alberto da Costa e (coord.). Crise colonial e independência: 1808-1830. Rio de Janeiro: Objetiva, 2011.

SILVA, Isabelle Braz Peixoto da. O Relatório provincial de 1863 e a expropriação de terras indígenas. In: OLIVEIRA, João Pacheco de (org.). A presença indígena no Nordeste: processos de territorialização, modos de reconhecimento e regimes de memória. Rio de Janeiro: Contra Capa, 2011. p. 327-388.

VALLE, Carlos Guilherme Octaviano do. Conflitos, identidades e aldeamentos indígenas no Ceará do século XIX: um exercício de Antropologia Histórica. In: VALLE, Carlos Guilherme Octaviano do; SCHWADE, Elisete (org.). Processos sociais, cultura e identidades. São Paulo: Annablume, 2009. p. 15-87.


Organizadores

João Paulo Peixoto Costa –  Doutor em História Social pela UNICAMP. Professor do IFPI e do PROFHISTÓRIA/UESPI Uruçuí/Piauí/Brasil. E-mail:  [email protected] ORCID: http://orcid.org/0000-0001-6767-4104

Tatiana Gonçalves de Oliveira – Doutora em História pela UFRRJ. Professora adjunta da UESPI Floriano/Piauí/Brasil. E-mail: [email protected] ORCID: http://orcid.org/0000-0001-9496-0077


Referências desta apresentação

COSTA, João Paulo Peixoto; OLIVEIRA, Tatiana Gonçalves de. Povos indígenas no Brasil oitocentista. Outros Tempos. São Luís, v. 19, n. 34, p. 131-138, 2022. Acessar publicação original [DR]

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HISTÓRIA DA JUSTIÇA: Das independências aos Estados americanos | Outros Tempos | 2022

Com toda a evidência do Poder Judicial na regulação da política brasileira atual, a discussão sobre justiça, judiciário e ordem social ganhou grande importância e evidência. A historiografia oferece ao assunto instrumental heurístico de grande valia. Destacam-se, especialmente, as investigações sobre a organização das justiças durante as revoluções atlânticas quando as antigas colônias na América iniciaram o processo de autonomia política. Embora o liberalismo consista ainda em uma das chaves interpretativas mais importantes dos estudos sobre o Oitocentos, a renovação ocorreu no campo de pesquisas que recusaram a inadequação das sociedades ibero-americanas ao novo ideário. A mudança conceitual preceitua, no lugar do “liberalismo na América”, “a versão americana do liberalismo em escala atlântica” (PAQUETTE, 2009).

Da nova concepção teórica, verificou-se o “tournant jurique” nos estudos sobre os espaços políticos de construção dos estados nacionais da América (LEMPÉRIÈRE, 2017). As fronteiras entre a história jurídica e a história política estreitaram-se na abordagem dos movimentos políticos de formação da administração pública, do constitucionalismo, da cidadania, entre tantos outros temas que iluminam de modo específico os liberalismos e a formação dos estados nacionais nas Américas. Leia Mais

Imprensa no Maranhão: Trajetória Bicentenária | Outros Tempos | 2021

Tipos moveis de chumbo
Tipos móveis de chumbo | Imagem: Medium.com

Não obstante casos inexpressivos e de curta duração, foi apenas com a chegada da família real à sua colônia na América que se deu a instalação e o efetivo funcionamento de atividade tipográfica no Brasil, em 1808. No rol das transformações advindas da transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, ocorreu a instalação da Imprensa Régia, sob as ordens de D. João. Ainda que não restrita à publicação de documentos oficiais, a Gazeta do Rio de Janeiro, primeiro jornal impresso na colônia, passou a circular, em 10 de setembro de 1808, com finalidade de servir aos interesses da Coroa, publicizando atos do governo. Leia Mais

História Social dos Sertões / Outros Tempos / 2021

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Gayatri Spivak / Foto: Tweetar /

Outros Tempos v 18 n 31 1Pode o subalterno falar? Essa foi a questão formulada por Gayatri Spivak em artigo publicado em 19881 . A pergunta da professora e crítica literária indiana vem há décadas inspirando esforços na direção da descolonização da produção do conhecimento. Eivada pelo olhar certeiro da autora, a incômoda indagação conectou-se a inúmeros debates intelectuais das ciências humanas nas últimas décadas, atribuindo amplitude e autoridade ao ponto de vista feminino de uma intelectual egressa de uma ex-colônia inglesa, que colocou na berlinda o pensamento social e a teoria crítica ocidental. Podemos questionar, seguindo a reflexão de Spivak, se é válido auscultar personagens e territorialidades subalternizadas utilizando somente o arcabouço teórico-analítico oriundo de pensadores europeus entronados em instituições historicamente identificadas com diversas formas de colonialismo.

A provocação levantada pela autora ajudou a fortalecer a tendência do deslocamento do olhar acadêmico do centro para as periferias, do Norte para o Sul global, das nações centrais do capitalismo para suas margens. Essa tem sido a contribuição dos estudos pós-coloniais e decoloniais, que vem validando a instrumentalização de uma utensilagem analítica calibrada para entender os silêncios e os silenciamentos dos subalternizados, de olhos fitos nas especificidades de seus espaços de criação e reprodução sociocultural. Tal debate vem igualmente influenciando pesquisas no Brasil, especialmente no campo das humanidades. Mais que inserir os “vencidos” nos estudos acadêmicos, é preciso investigar e produzir outras epistemologias, pensadas a partir das margens. A História Social dos Sertões se insere nesses esforços, posicionando o foco em processos históricos de um Brasil distante dos grandes centros urbanos, jungidos à mesma lógica global que produz riquezas e multiplica desigualdades. Cumpre notar que a temática “sertaneja” vem sendo discutida grandemente em universidades situadas em cidades pequenas e médias, que foram contempladas no processo de interiorização de instituições de ensino superior em tempos de governos democráticos populares.

O sertão, antigo e polissêmico, historicamente observado na arte, na literatura, na música e na imagética nacional como o avesso da modernidade, tem retrucado o olhar na direção de seus intérpretes. A dita réplica pode ser observada, por exemplo, na obra de Sérvulo Roberto, artista plástico amazonense residente em Codó – MA há 30 anos, que forjou uma rica galeria temática, na qual podem ser encontradas as quebradeiras de coco babaçu, cenas de festejos locais, imagens da religiosidade popular, tudo criado em seu ateliê no Bairro São Pedro, em Codó. Destacam-se em seu repertório quadros com narrativas visuais dos mundos do trabalho, como no caso da tela “Bem perto”, produzida em 2019, que serve de capa para o presente dossiê. A obra apresenta um belo panorama em três planos, com uma quebradeira de coco debaixo das folhagens de um babaçual, ladeada por diversos homens, mulheres e crianças negras com cestos de palha na cabeça, que miram conjuntamente uma grande cidade, recoberta por um imenso sol ao fundo. Na cena, o sertão dos cocais observa a urbe, dando a impressão de que as palmeiras e as fileiras de trabalhadores empurram a metrópole, que se resguarda como uma fortaleza de prédios esguios e enfileirados. Os olhares dos personagens, segundo o artista, carregam esperanças de melhoria “bem perto” da cidade, mas a metrópole não se mostra receptiva, disposta em terceiro plano encurralada pelos olhares dos camponeses.

A urbe apresenta-se sitiada pelos camponeses. As possibilidades interpretativas da arte reposicionam o cotidiano da migração sazonal de trabalhadores pobres oriundos da região dos cocais, alvos de grave espoliação, que buscam em centros urbanos e também em grandes propriedades rurais melhores possibilidades de sobrevivência. Sob os olhos de Sérvulo Roberto, o sertão espreita a cidade.

É por esse olhar investigativo dos sertanejos, atentos ao mundo circundante do sertão, que o presente dossiê traz artigos que vão ao encontro da inquietação do artista. Textos produzidos por autores e autoras que manifestam diversas nuances da polissemia dos estudos sobre os sertões, contemplados em suas composições históricas e discursivas. Abre a edição da Revista Outros Tempos a pesquisa de José Reinaldo Miranda de Sousa, intitulada Codó: uma África sertaneja, que reflete acerca das dimensões e contribuições dos africanos na cidade de Codó, experiência que desenha no cenário dessa cidade aspectos identitários de uma África em terras maranhenses.

Logo em seguida, temos a possibilidade de encontrar o sertão dos homens no texto de Jakson dos Santos Ribeiro, intitulado, Performances masculinas em cena: o homem público da Princesa do Sertão à luz da imprensa caxiense, em que o autor problematiza as formas de ser e estar, dando possiblidades para compreender as masculinidades que se encontram e desencontram em discursos que circularam na imprensa da cidade de Caxias – MA durante a Primeira República.

Entre os textos desse dossiê também podem ser observados os sertões do período colonial, em artigo de autoria de Samir Lola Roland, denominado Sesmarias, ocupação e conflitos de terra nos sertões do Maranhão e Piauí colonial (1700-1759), em que o autor reflete acerca das disputas num interior atravessado pelos interesses de fazendeiros que esbulhavam terras indígenas seguindo os caminhos dos rios. A dita espacialidade servia de palco para constituição das experiências dos interesses do Estado e do cotidiano de exploradores adventícios, que buscavam ampliar seus domínios nos sertões do Maranhão e do Piauí.

Ainda na rota dos conflitos, encontramos outras páginas de história retratadas no texto de Anderson Coelho da Rocha, com o título: Nos sertões dos Oitocentos: escravidão, liberdade e criminalidade nos sertões da Província do Ceará (1830-1888). O autor posiciona as tensões no âmbito da sobrevivência e das relações interpessoais entre populações sertanejas, classificadas à época como “gente da pior espécie”, atravessadas pelo viés racista e pelas políticas de combate à vadiagem, que acometiam grandemente populações pobres e não-brancas, livres ou escravizadas.

Populações pobres interioranas também aparecem nas reflexões de Janille Campos Maia, que devassa em sua pesquisa um sertão de muitos conflitos e dificuldades de sobrevivência, piorados pela ocorrência da grande seca de 1877-1879. A autora trata da migração de trabalhadores do interior do Ceará em demanda da capital da província. Em Exilados do sertão: migração cearense na seca de 1877, Janille revisita tema já bastante discutido na historiografia dos sertões, adensando informações sobre o cotidiano de personagens desvalidos durante os horrores da estiagem, com foco nas ações e políticas de socorros públicos na cidade de Fortaleza.

A ambiência de pobreza e rarefeitas políticas de assistência historicamente contribuíram para maximizar a ocorrência de surtos epidêmicos, presentes nas narrativas sertanejas e em suas memórias da morte. Algumas das interpretações desses sertões adoecidos aparecem nos apontamentos realizados por Maria de Fátima Morais Pinho e Jucieldo Ferreira Alexandre, autores do texto Em toda parte só se ouvia falar em morte: a gripe espanhola no Cariri (1918-1919), cujas reflexões discorrem sobre os enfrentamentos do período da grave epidemia de gripe em terras caririenses.

Na sequência do dossiê, esse sertão de muitos sentidos também nos mostra o lugar do futebol, através das reflexões realizadas pelos autores Francisco Demétrius Luciano Caldas, Álvaro Rego Millen Neto e Bruno Otávio de Lacerda Abrahão, com o texto intitulado O futebol no sertão nordestino brasileiro: o torneio BAPE em Juazeiro e Petrolina na década de 1990, em que é possível encontrar um time de futebol protagonizando momentos relevantes para as sociabilidades locais.

Momentos de encontro e descontração apontam possibilidades de investigação para além das narrativas da pobreza que marcam as paisagens sertanejas. Nesse direcionamento, também há espaço para pensar um sertão conectado com tendências globais, que projetava um cenário de crescimento econômico através da indústria. Este é o tema central no texto de Naudiney de Castro Gonçalves, que aborda as facetas de Antonio Linard: um industrial no sertão do Cariri cearense, personagem que introduziu mudanças perceptíveis na economia local a partir da inserção de novas tecnologias, capazes de criar um movimento significativo de transformações socioeconômicas.

No campo das artes, o dossiê é contemplado por um interessante estudo de caso de Jonas Rodrigues de Moraes, intitulado História, memórias, oralidades, cultura e artes na Baixada Maranhense, importante levantamento das manifestações culturais de mestres e grupos populares nas cidades de Pinheiro, São Bento, Santa Helena e Presidente Sarney. A pesquisa fez uso de técnicas etnográficas e da história oral, cujos resultados estimularam gestores públicos locais a pensarem as possibilidades de um mapeamento cultural de seus respectivos municípios.

Por fim, mas não menos importante, este dossiê segue com a entrevista de José Carlos Aragão Silva, cujas experiências docentes servem de bússola para pensarmos as problemáticas enfrentadas por profissionais de História nos sertões maranhenses. Professor do Colegiado de Ciências Humanas / História da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), campus Codó, o entrevistado vem trabalhando na formação de profissionais da educação básica atuantes em áreas rurais e em municípios do interior. Aragão nos convida a refletir sobre as agências desses docentes, que podem servir de farol para pensarmos a formação e a importantíssima atuação de professores fora dos grandes centros.

Como se vê, as páginas deste número da Revista Outros Tempos são compostas por diversas interpretações dos sertões, pluridimensionais e complexas. Por isso, esperamos que a audiência do dossiê possa apreciar e encontrar nos estudos que seguem inspirações e instrumentos para refletir sobre a temática, repleta de narrativas, experiências e sentidos. Boa leitura!

Antonio Alexandre Isidio Cardoso – Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo – USP Professor da Universidade Federal do Maranhão – UFMA, Campus Codó Codó, Maranhão, Brasil. E-mail: [email protected]

JaKson dos Santos Ribeiro – Doutor em História pela Universidade Federal do Pará – UFPA Professor da Universidade Estadual do Maranhão – UEMA, Campus Caxias Caxias, Maranhão, Brasil. E-mail: [email protected]

Jonas Rodrigues de Moraes – Doutor em História Social pela Pontifícia Universidade Católica – PUC-SP Professor da Universidade Federal do Maranhão – UFMA, Campus Codó Codó, Maranhão, Brasil. E-mail: [email protected]

Os organizadores


CARDOSO, Antonio Alexandre Isidio; RIBEIRO, Jakson dos Santos; MORAES, Jonas Rodrigues de. O Sertão à espreita (Apresentação). Outros Tempos, Maranhão, v. 18, n. 31, 2021. Acessar publicação original [DR]

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Feminilidades e Masculinidades em Foco / Outros Tempos / 2020

Caro (a) leitor(a), a Revista Outros Tempos por meio do dossiê “Feminilidades e Masculinidades em Foco”, dedica pela segunda vez um número do periódico aos estudos de gênero, oferecendo ao público um conjunto de contribuições deste campo, que agrega pesquisadoras e pesquisadores oriundos de áreas e países diversos.

O conceito de gênero, teorizado a partir de diferentes perspectivas, despertou nas últimas décadas debates, disputas e abordagens plurais, que situaram potencialidades e limites do conceito. Seu emprego permitiu o enfoque relacional no campo história das mulheres, a pluralização da categoria mulher, o estudo das masculinidades, a (des) construção dos binarismos e das normas que informam as relações entre gênero, sexo e desejo, além do reconhecimento da necessária articulação entre gênero e as categorias classe, raça / etnia, geração, sexo, desejo, infância, juventude, velhice, corpo, dentre outros marcadores de identidade.

Com efeito, o Dossiê, que reúne 14 (quatorze) artigos de estudiosas e estudiosos nacionais e internacionais, insere-se neste quadro com o objetivo de dar visibilidade a pesquisas informadas pela categoria, a partir de suas múltiplas abordagens, em vista a apontar possibilidades de estudo da (des) construção das feminilidades e das masculinidades, em diferentes tempos e espaços.

Este número da Revista Outros Tempos encontra-se dividido nas seções temática, resenha, estudo de caso, entrevista e artigos livres. Nos artigos temáticos, nas resenhas, na entrevista e no estudo de caso, que compõem o Dossiê, a categoria gênero referencia pesquisas em diálogo com as categorias mulheres, homens, feminilidades, masculinidades, feminicídio, sexo, sexualidade, infância, juventude, geração, cultura, arte, política, carne e corpo, enfatizando práticas e representações. O que sinaliza a fertilidade do campo e a importância desses estudos para a compreensão das virtualidades do nosso tempo.

Em conjunto, as autoras e os autores, oriundos de diferentes estados do Brasil e de Portugal, na seção artigos, apresentam modelos éticos femininos na Roma Antiga; a imigração de mulheres portuguesas para o Pará, em seus números, perfis e redes sociais, entre 1834 a 1930; o papel dos dispositivos biopolíticos na construção da feminilidade; histórias de vida de mulheres no sertão do São Francisco, nas Minas Gerais, na primeira metade do século XX; a presença das mulheres no ensino superior no Maranhão, nas faculdades de Direito, de Farmácia e de Odontologia, entre 1940 e 1970; a invisibilidade feminina no rock português como aspecto central da feminilidade contemporânea; o processo de construção de práticas sociais em violências sexuais, na interface infância e direitos; o feminicídio em seus aspectos conceituais; o estudo da relação entre masculinidade e sacerdócio; a relação entre masculinos, corpos e carnes sexuadas; a sedução e a sexualidade em Portugal, entre mudanças e permanências; a sexualidade, o gênero e a política no cinema de Pedro Almodóvar; a montagem corporal transformista e a construção da feminilidade; e os discursos sobre os corpos femininos e masculinos em livros didáticos.

Como estudo de caso, o Dossiê apresenta corpo e gênero no filme Esperando João, de Jomard Muniz de Britto. Na seção Resenha, a medicina, a filantropia e as políticas públicas na assistência à infância nas primeiras décadas do século XX são referidas a partir da obra Amamentação e políticas para a infância, no Brasil, organizada por Gisele Sanglard. A relação entre os corpos nas ruas e o direito de (r) existir é abordada a partir da leitura da obra Corpos em aliança, de Judith Butler.

Na seção Entrevista, o Dossiê apresenta a temática juventude e políticas do corpo nos anos 1960 e 1970, a partir do registro da Memória e da História. Na seção de artigos livres, a Revista publica estudos que tratam do curso de Licenciatura em Estudos Africanos e Afro-Brasileiros ofertado pela Universidade Federal do Maranhão; da utilização das telenovelas no ensino de história; das Ligas camponesas de Pernambuco; e da missão católica orionita no antigo extremo norte goiano.

Agradecemos aos autores(as) que contribuíram com suas pesquisas para a realização deste número da Revista e desejamos às leitoras e aos leitores uma excelente leitura!

Elizabeth Abrantes (UEMA)

Elizangela Cardoso (UFPI)

Pedro Vilarinho Castelo Branco (UFPI)

(Organizadores)


ABRANTES, Elizabeth; CARDOSO, Elizangela; Castelo Branco, Pedro Vilarinho. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 17, n. 29, 2020. Acessar publicação original [DR]

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As relações nação-região e os espaços de fronteira no processo de institucionalização das ciências e da saúde no Brasil / Outros Tempos / 2020

O dossiê em questão, dedicado às relações nação-região e aos espaços de fronteira no processo de institucionalização das ciências e da saúde no Brasil, é um dos primeiros resultados da nossa parceria, iniciada no ano passado no âmbito da ANPUH-2019, que está assentada no interesse mútuo por explorar as potencialidades analíticas do entrecruzamento das áreas de História das Ciências e trabalhos realizados no âmbito do debate sobre a existência de uma História Regional. Tal aproximação se deu também a partir dos estudos realizados pelo Núcleo de Pesquisa e Documentação em História (NUPEDOCH), da Universidade Federal do Piauí (Campus de Picos – CSHNB), e do grande fluxo de alunos egressos do Piauí que estão realizando os seus mestrados / doutorados no Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde (COC–FIOCRUZ–RJ), fruto de suas pesquisas desenvolvidas na graduação.

Percebemos, enquanto historiadores dos campos de história das ciências e da saúde, que contextos diversificados e mais particularizados, distantes dos já tradicionais Rio de Janeiro – São Paulo – Minas Gerais, passaram a ser privilegiados pelos pesquisadores. No entanto, cabe ressaltar, que muitos destes trabalhos acabam ficando desconhecidos e deslocados do diálogo com outras realidades, de modo que o local acaba não se conectando com o nacional e o global, e a reflexão se traduz a uma análise de particularismos, com pesquisas que não circulam e acabam sendo desconhecidas de um público maior.

O que propomos não é uma coleção de estudos de caso, mas sim, repensar o nacional a partir de uma diversidade de trabalhos que nos permitam amadurecer o debate sobre nação-região, centro-periferia e outras questões que perpassam o debate em História das Ciências. Nesse sentido, cabe destacar que tal perspectiva de análise já tem, nos últimos anos, gerado resultados de pesquisa relevantes no âmbito da História das Ciências e da Saúde no Brasil, como expresso, por exemplo, em trabalhos sobre a medicina tropical no Amazonas (Schweickardt, 2011) e sobre as instituições científicas do Paraná (Ardigó, 2011), além das diversas pesquisas desenvolvidas no âmbito das Pós-Graduações no Brasil, com destaque para o Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde (COC – FIOCRUZ) e o Programa de Pós- Graduação 2 em História da Universidade Federal do Pará – com concentração em História Social da Amazônia. Todos os trabalhos que compõem este dossiê, escritos por pesquisadores de diferentes instituições do Brasil e que abrangem regiões de norte a sul do país, com recortes temporais que vão de meados do século XIX a meados do século XX, dialogam, de algum modo, com essa chave de interpretação.

Por volta dos anos 1980 assistimos a um processo de renovação importante no âmbito da História das Ciências no Brasil, a partir do qual saberes médicos, epidemias, saúde e doença de escravos, indígenas e mestiços, nas mais diversas temporalidades e contextos históricos, bem como estudos sobre museus naturais, periódicos médicos, escolas médico-cirúrgicas e comissões científicas, entre outros espaços institucionais passaram a ser reconhecidos como objetos legítimos dos estudos históricos, porém isso não significou necessariamente uma ampliação dos horizontes de pesquisa no que se refere aos recortes espaciais.

De um modo geral, percebe-se que vêm aumentando nos últimos anos os trabalhos que se dedicam a uma reflexão mais acurada sobre as diversas artes e ofícios de curar no interior do Brasil, sobre a institucionalização da ciência fora das principais capitais urbanas do país ou sobre a construção de trajetórias de cientistas em diferentes regiões. Sendo assim, considerando a importância de voltar a atenção para contextos particulares, alguns historiadores vêm desvendando as especificidades locais e a necessidade de perceber processos históricos diversos dos já tradicionais debates sobre os conhecimentos científicos e práticas médicas. A possibilidade desse olhar mais direcionado e circunscrito permite que se confrontem representações já cristalizadas no âmbito do imaginário social sobre determinadas regiões, permitindo maior problematização e reflexão crítica acerca da diversidade de contextos.

O universo de pesquisas sobre o tema da história regional nos coloca frente a trabalhos de natureza muito diversa, cuja leitura às vezes mais confunde do que esclarece seus significados e objetivos. Isso se deve, em grande parte, aos múltiplos sentidos atribuídos aos conceitos de região-nação, centro-periferia, por exemplo, dos quais decorrem também abordagens diferenciadas, dependendo do entendimento que dele se faça. Registre-se, no entanto, a relevância das análises regionais para os estudos históricos na medida em que permitem desafiar a homogeneidade de teorias generalizantes. Dada a possibilidade de aproximação com realidades mais particularizadas, tais estudos fazem emergir o específico e o diferente, viabilizando uma leitura alternativa que enriquece e complexifica a compreensão histórica sobre temas 3 variados. A imagem de que uma variação de escala permite contar outras histórias pode ser analisada, por exemplo, a partir de J. Revel, em livro no qual premissas diversas da historiografia na atualidade são abordadas, como o retorno da biografia e a microhistória. Nessa perspectiva de análise, o enfoque regional nos permitiria perceber com mais clareza a diversidade de experiências históricas.

Tendo em vista o grande debate historiográfico existente em torno das relações centro-periferia no âmbito da história das ciências, esse tipo de abordagem contribui para tensionar essas interações ao mostrar que os lugares dos centros e das periferias não podem ser considerados como fixos ou sem dinamicidade, muito menos como fruto de uma ciência capaz de definir com clareza os seus protagonistas, retirando-se toda a historicidade desses processos de definição. Nesse sentido, o conceito de circulação, de Kapil Raj, nos ajuda a compreender essa polarização que coloca em campos distintos um grupo que seria produtor de conhecimento e outro que seria mero receptor de práticas científicas vindas de fora, conferindo protagonismo a diferentes atores, muitos deles pensados até então como meros expectadores.

Sua ideia de que o conhecimento circula deixa os historiadores em alerta para as múltiplas possibilidades que os estudos focados em determinada região, por exemplo, podem trazer. Além de evidenciar o caráter relativo desses contextos considerados como “periféricos”, este tipo de estudo permite também que se note a existência de comunidades e práticas médicas e científicas locais que, ao se voltarem para a resolução de problemas cotidianos, mostram-se atualizadas e produtoras de conhecimento, trazendo elementos novos que nos levam a colocar em perspectiva o protagonismo de uma ciência pensada, sobretudo, a partir das regiões sul e sudeste do Brasil ou mesmo da Europa e dos Estados Unidos. E esse, nos parece, que é mais um motivo para apostar no potencial analítico do cruzamento entre as definições do que se convencionou chamar de História das Ciências e História Regional. Ao nos permitirem observar realidades mais específicas e ajustar as lentes para o dia-a-dia das práticas científicas, esse “casamento” entre dois campos correlatos possibilitará também que, no futuro, possamos contar com uma base variada e sólida de análises para a realização de mais estudos comparativos.

Por fim, ressaltamos ainda os artigos livres enviados para o v. 17, n. 30, 2020, da Revista Outros Tempos. Mesmo que tais trabalhos não estejam no rol dos artigos do dossiê sobre “As relações nação-região e os espaços de fronteira no processo de institucionalização das ciências e da saúde no Brasil”, os leitores perceberão que 4 todos dialogam diretamente com a proposta dos organizadores, pois trata-se também de uma tentativa de trazer à tona outras experiências históricas em contextos diversos dos já tradicionalmente trabalhados por uma historiografia oficial. Tal constatação já nos deixa com a sensação de que todo o esforço de organização e reunião dos artigos, entrevista, estudo de caso, foi completamente recompensado pelo resultado final apresentado neste volume.

Boa leitura!


COE, Agostinho Júnior Holanda; VIEIRA, Tamara Rangel. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 17, n. 30, 2020. Acessar publicação original [DR]

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O Império e as Províncias: configurações do estado nacional brasileiro no século XIX / Outros Tempos / 2019

Caro leitor, a nova edição da Revista Outros Tempos apresenta o Dossiê O Império e as Províncias: configurações do estado nacional brasileiro no século XIX. Ao convidar estudiosos dos Oitocentos para a reflexão sobre a diversidade de questões compreendidas por essa temática, apontamos para algumas possibilidades, como: a história dos mecanismos jurídicos, fiscais e militares e sua configuração nas províncias; as expressões políticas no campo doutrinário e os embates do espaço público, como a imprensa da Corte e das províncias; as expressões literárias e artísticas, e a pluralidade de identidades políticas coletivas que engendram.

Quanto aos pontos de observação dessas questões, também propusemos olhares múltiplos: do centro político em sua percepção sobre as províncias, a visão a partir de uma província em particular, ou uma determinada articulação entre elites provinciais, sem esquecer as perspectivas comparadas e / ou de história conectada que permitam pensar a problemática no plano do continente americano e dos debates europeus coevos.

O resultado foi uma grata surpresa. Sobre as províncias, representadas por Maranhão, Minas Gerais, Pernambuco e Rio Grande do Sul, recebemos contribuições que preservaram / ampliaram as abordagens propostas inicialmente pelo Dossiê.

Em relação ao Maranhão, as abordagens variaram entre a recuperação de trajetórias individuais (Luisa Moraes Silva Cutrim – “Massa de brasileiros transatlânticos”: a reinserção do negociante Antonio José Meirelles no Maranhão pós-independência (1825-1831)), a análise da atuação de órgãos provinciais, como o Conselho Presidial (Raissa Gabrielle Vieira Cirino – “Vigiar a ordem pública em conformidade das leis”: trabalhos do Conselho de Presidência do Maranhão nos primeiros anos do Brasil Império (1825-1829)) e de grupos políticos radicados na província (Yuri Costa – Escalas de poder: grupos políticos no Maranhão oitocentista e sua relação com a Corte do Império).

Sobre a província de Minas Gerais, as contribuições também gravitaram entre a recuperação de trajetórias (Luciano Mendes de Faria Filho e Dalvit Greiner de Paula – Do Conselho da Província à Assembleia Geral: os homens e as ideias em torno de Bernardo Pereira de Vasconcelos (1795-1850)) e a atuação de órgãos provinciais, desta feita, a Assembleia Legislativa (Kelly Eleutério Machado Oliveira – As províncias do Império: a Assembleia Legislativa de Minas Gerais e o regresso conservador (1835-1842)).

Outros grupos políticos também foram contemplados nesse Dossiê. Em primeiro plano, como no caso de Pernambuco (Paulo Henrique Fontes Cadena – A divisão do poder. Pedro de Araújo Lima, os irmãos Cavalcanti de Albuquerque e os Rego Barros entre Pernambuco e o Centro no Século XIX), ou em torno de temáticas que despertavam interesses e conflitos de grandes dimensões, como a questão da propriedade da terra no Rio Grande do Sul (Cristiano Luís Christillino – Mosquetes, penas e muita negociação: a aplicação da Lei de Terras na Província de São Pedro do Rio Grande do Sul).

Em todos esses artigos, de modos distintos, esteve presente a articulação entre as províncias e a corte, perspectiva acrescida por uma análise dessa relação sob o ponto de vista da administração do Império (Andréa Slemian – Pelos “negócios da província”: apontamentos sobre o governo e a administração no Império do Brasil (1822-1834)).

O Dossiê conta ainda com perspectivas comparadas e conexões que contemplam outros espaços, para além do território que se conformava como o Império do Brasil. Uma “mirada transnacional” conectou interesses das províncias brasileiras e Guerra Civil nos Estados Unidos (Juliana Jardim de Oliveira e Oliveira – Interesses provinciais no Brasil nos anos da Guerra Civil norte-americana: uma mirada transnacional sobre relações entre o império e as províncias); noutra perspectiva, tomamos contato com a construção do estado nacional no México (Rodrigo Moreno Gutiérrez – Provincias, reinos, estados e imperio: El problema de la articulación territorial de la Nueva España a la República Federal Mexicana).

Além dos artigos, o Dossiê brinda o leitor com uma entrevista de Miriam Dolhnikoff a Wilma Peres Costa. Referência para as discussões que inspiraram a proposição desse Dossiê, a autora também participa dessa edição por intermédio da resenha de uma de suas recentes publicações: História do Brasil Império, Contexto, 2017, por Edyene Moraes dos Santos. Outra resenha, também articulada ao debate aqui proposto, é do livro de Marco Morel: A Revolução do Haiti e o Brasil escravista: o que não deve ser dito, Paco Editorial, 2017, por Bruno da Fonseca Miranda.

O Dossiê conta ainda com um estudo de caso, centrado na tensão entre liberdade de expressão / imprensa e as formas de controle e repressão na década de 1820 / 1830 (Roni César Andrade de Araújo – Um processo de jornalismo à época da Independência: Maranhão, 1829- 1832). Cabe lembrar que a imprensa caracterizou-se como elemento-chave nesse processo de construção de espaços públicos de representação política, que transparecem, invariavelmente, nas pesquisas que compõem esse Dossiê.

Apresentamos ainda quatro artigos livres, situados em espaços-tempos distintos do século XX, eventualmente conectados, como na proposta que articula Revolução Russa e imprensa anarquista no Brasil (Leandro Ribeiro Gomes – Revolução Russa no Brasil: o imaginário e cultura política da imprensa anarquista (1917)). Outras aproximações, agora entre campos de estudo, são apresentadas em artigo sobre relações inter-raciais e racismo em Luanda, a partir do diálogo entre história e literatura (Washington Santos Nascimento – O casamento do preto Marajá com a branca Arlete: relações amorosas e racismo em “Os discursos do Mestre Tamoda” de Uanhenga Xitu). A questão racial é também tema de outro artigo, centrado na trajetória do intelectual brasileiro Clóvis Moura (José Maria Vieira de Andrade – Os dilemas de um intelectual “transitivo”: Clóvis Moura e a constituição de uma rede de sociabilidade antirracista no Brasil). Por fim, apresentamos artigo centrado na relação entre organizações empresariais e trabalhadores da construção civil durante a ditadura civil-militar (Pedro Henrique Pedreira Campos – Ditadura e classes sociais no Brasil: as organizações empresariais e de trabalhadores da indústria da construção durante o regime civil-militar (1964-1988)).

Assim, chegamos ao 16º ano e a 27ª edição. Boa leitura a todos!

Marcelo Cheche Galves

Wilma Peres Costa

(ORGANIZADORES)


GALVES, Marcelo Cheche; COSTA, Wilma Peres. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 16, n. 27, 2019. Acessar publicação original [DR]

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“História Antiga pra quê?” Questões antigas para problemas contemporâneos / Outros Tempos / 2019

Caro leitor,

O mais recente número da Revista Outros Tempos traz, pela primeira vez, um dossiê sobre história da Antiguidade. “‘História Antiga pra quê?’ Questões antigas para problemas contemporâneos” lançou um desafio aos pesquisadores da área: refletir não somente sobre a importância dos estudos em História Antiga no Brasil mas, sobretudo, como as pesquisas em Antiguidade podem dialogar com questões e problemas considerados contemporâneos.

Herdeira do Classicismo europeu do século XIX e do “maniqueísmo positivista”, que vai tomar conta dos estudos sobre Antiguidade desenvolvidos no Brasil durante a Ditadura Militar, a área de História Antiga foi considerada nos meios acadêmicos brasileiros, por longo tempo, como absolutamente alheia às questões contemporâneas e, particularmente, aos problemas sociopolíticos do país. Contudo, as pesquisas em Antiguidade, há mais de 30 anos, vêm construindo uma trajetória de conexão com os problemas sociais, políticos e culturais baseados no hoje. A Antiguidade feita no Brasil nunca teve preocupações tão atuais. Ela se insere de forma comprometida e legítima em um processo de reflexão contemporâneo, costurando diálogos fundamentais entre as sociedades antigas e nós.

Com esse objetivo convidamos especialistas para pensar a “contemporaneidade” da Antiguidade e propomos alguns eixos de reflexão, como as relações, interações culturais e circulação de população, religiosidades e conflitos, papéis sociais de gênero, enfim, o leque foi o mais amplo possível. E o resultado surpreendeu-nos. Os artigos presentes neste dossiê contemplaram temáticas variadas e igualmente importantes.

María Cecilia Colombani, a partir da obra de Hesíodo, evidencia a atualidade das discussões acerca de gênero e como, a partir dos discursos, a sociedade grega construiu lugares simbólicos para demarcar o eu e o outro. Neste processo, a figura feminina passa a encarnar a alteridade, representada no texto da Colombani, pela personagem Pandora.

Uma preocupação destacou-se, que foi o lugar da História Antiga no ensino de história. Os artigos de Dominique Santos e Adriene Baron Tacla dialogaram entre si, apresentando as preocupações e problemas que surgiram com a divulgação da Base Nacional Comum Curricular e a exclusão, quase que total, dos conteúdos relacionados à História Antiga. Os autores chamam a atenção tanto para a permanência de uma visão equivocada acerca das pesquisas que são realizadas na área quanto para a necessidade que se apresentou aos antiquistas de promover um amplo debate sobre a importância do ensino de História Antiga.

No interior dos debates sobre ensino de História Antiga o dossiê oferece, também, três artigos que apresentam temas diversos, mas convergentes. José Petrúcio Junior analisa a tradicional periodização quadripartite, associada a uma “história Geral”, e toda a sua dimensão ideológica. A ela, propõe periodizações alternativas muito mais aproximadas dos estudos transculturais e pós-coloniais. José Maria Gomes de Souza Neto evidencia a preocupação com conteúdos sobre História Antiga presentes na chamada cultura de massa, prioritariamente o cinema, e como os alunos interagem com essas imagens como fontes sobre o passado. A partir desta reflexão, brinda-nos com a proposta de uma metodologia de análise, a partir do filme Êxodo, deuses e reis, de 2014. Da formação discente, passamos para a formação docente com o texto de Cyntia Simioni França. A pesquisadora apresenta-se um relato de uma experiência de formação docente com professores do Ensino Básico, de escolas públicas, na cidade de Londrina, Paraná. A mitologia grega foi utilizada como experiência para um redimensionamento do humano e da própria prática docente, questionando, a partir da leitura da Odisseia, as escolhas dos modos de vida de nossas sociedades capitalistas.

O trabalho de Alex Aparecido da Costa preocupa-se com as dimensões e camadas presentes nas relações de poder evidenciadas a partir de uma análise das cartas de Plínio, o Jovem, e Trajano acerca do governo da Bitínia. As relações de poder perpassam, também, as preocupações de Leonardo Costa Ferreira e Brian Kibuuka. Ferreira insere-se nas atuais discussões sobre História Militar e como uma batalha local, a Batalha de Mylae, ocorrida em 260 a.C. entre o Império Cartaginês e a cidade de Roma, por questões geopolíticas, transforma-se em uma guerra em larga escala. Da mesma forma, Brian Kibuuka apropria-se das preocupações contemporâneas sobre os deslocamentos populacionais fomentados por crises e guerras, para pensar o Imperialismo Assírio e o desterramento do Antigo Israel.

No campo das permanências simbólicas, Leonardo Bento de Andrade “viaja” ao México para observar a trajetória do gesto contido em uma das gravuras do “corrido”, onde a imagem do esqueleto, que golpeia com sua foice um outro caído de joelhos, já aparece na cultura material etrusca.

O dossiê ainda apresenta um estudo de caso que podemos inserir nos atualíssimos debates sobre papéis de gênero, com base na análise das imagens de dois vasos de cerâmica áticos, do VI século a.C. A partir destas imagens, Camila Alves Jourdan discute o lugar da mulher nos ritos funerários e a tentativa de controle de suas emoções pelo legislador Sólon.

Este número da revista ainda conta com três artigos livres e uma resenha. Elvis de Almeida Diana propõe-se a analisar a atuação político-cultural do periódico uruguaio La Revista Literaria que, a partir de críticas dirigidas à Igreja Católica uruguaia e ao passado monárquico espanhol, propôs uma identidade nacional voltada para uma ideia de “modernidade”. A narrativa memorialista de Nelson Werneck Sodré é objeto do trabalho de João Muniz Junior Wilton e Carlos Lima da Silva, que investigam como a partir deste discurso é possível reconstruir muito mais do que vivências. Antonio Nelorracion Gonçalves Ferreira escreve sobre as problemáticas envolvidas na questão do tempo no campo das ciências humanas na contemporaneidade e como, a partir das crises da noção moderna de tempo, várias possibilidades de reflexão são abertas ao pesquisador.

Podemos ainda encontrar nesta edição uma entrevista com André Leonardo Chevitarese, especialista em Paleocristianismo. Nesta conversa, Chevitarese conta-nos um pouco de sua trajetória profissional e reflete sobre a área de Antiga no Brasil, seus empasses e sua importância.

Desta forma, convidamos o leitor a navegar pelo novo número da Revista Outros Tempos. Boa leitura!

Ana Livia Bomfim Vieira – UEMA

(Organizadora)


VIEIRA, Ana Livia Bomfim. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 16, n. 28, 2019. Acessar publicação original [DR]

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Memória, Desigualdade e Políticas Culturais / Outros Tempos / 2018

A Sérgio Figueiredo Ferretti – In Memoriam

O presente número da Revista Outros Tempos inclui o dossiê temático Memória, Desigualdade e Políticas Culturais e se relaciona à XVIII Fábrica de Ideias, ocorrida em São Luís entre 18 e 31 de março de 2017, coordenada pelos organizadores deste número e por Sérgio Figueiredo Ferretti, que falecera aos 23 de maio do corrente ano e a quem dedicamos este dossiê In Memoriam.

Com o tema Patrimônio, Desigualdade e Políticas Culturais, a XVIII Fábrica de Ideias conectou uma série de iniciativas, consistindo num seminário internacional de pesquisa e pós-graduação, apresentando-se tanto como uma disciplina acadêmica planejada e ministrada de forma interinstitucional com alto potencial de internacionalização quanto como um seminário avançado com momentos de abertura ao público. A XVIII Fábrica de Ideias resultara de parceria entre a Universidade Estadual do Maranhão, através do Programa de Pós-Graduação em História, a Universidade Federal do Maranhão, por meio dos Programas de Pós-Graduação em Políticas Públicas e em Ciências Sociais, e a Universidade Federal da Bahia, através do Centro de Estudos Afro-Orientais e do Programa de Pós Graduação em Estudos Étnicos e Africanos, e ainda o Governo do Estado do Maranhão, representado pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação, e pela Secretaria de Igualdade Racial.

Assim, a maior parte dos artigos aqui reunidos foi proposta por profissionais que participaram dessa Fábrica de Ideias, que envolveu pesquisadores, docentes e discentes de programas de pós-graduação de diferentes instituições do Brasil e do exterior em torno do tema do patrimônio e das políticas culturais em conexão com a questão da diversidade e da desigualdade. Assim, a Revista Outros Tempos e a Fábrica de Ideias apresentam este número cujo dossiê é iniciado por um estudo de Dmitri Van Den Bersselar, que analisa as relações entre cristianismo, cultura igbo tradicional e transformação cultural e identitária, a partir de interpretação baseada em entrevistas realizadas na Nigéria, jornais nigerianos locais, revistas missionárias e correspondência original dos missionários da Church Missionary Society (CMS). O autor aborda o impacto do cristianismo sobre o debate nigeriano acerca da identidade igbo. Para ele, a cultura igbo tradicional e não cristã foi definida por e em resposta aos debates da missão cristã sobre a conversão e o comportamento dos cristãos igbos. Além disso, a identidade igbo veio a coincidir com o cristianismo e isso resultou em uma apreciação renovada da religião “tradicional” local como herança e não como “paganismo”.

A luta de memória em Moçambique é a questão central de Livio Sansone, segundo o qual, os conflitos e as contradições na biografia de Eduardo Chivambo Mondlane (1924-1969) antecipam e dramatizam vários temas de debate de grande atualidade naquela que poderia ser chamada de luta pela e luta de memória em Moçambique, ou seja, a releitura, a partir de vários e conflitivos pontos de vista, da história recente e dos regimes de memória que se estabeleceram. Sansone observa que, em Moçambique, como em vários países africanos, estes regimes de memórias preveem a criação e manutenção do status de imortalidade para algumas figuras centrais na narrativa da nação. O autor enfrenta uma das questões centrais da reconstrução de biografias, aquela da agência: até que ponto a vida do indivíduo determina seu contexto ou é determinada pelo contexto? A relevância e a atualidade de um estudo sobre Eduardo Mondlane se observaria, segundo Livio Sansone, em pelo menos duas direções: de um lado, em Moçambique e nos outros países da África onde estão se dando estas lutas de memória; de outro lado, nas próprias ciências sociais, onde há um renovado interesse pela interação entre formação em ciências sociais, luta anticolonial e construção de uma moderna e nova liderança política, de caráter pós-populista, na África contemporânea.

Antonio Motta discute, a partir do campo do patrimônio e dos museus, o cenário contemporâneo dos direitos e das políticas culturais no Brasil e suas implicações na esfera pública. Para o antropólogo, no período de 2003 a 2016, os usos da cultura na esfera pública brasileira estiveram associados a processos de construção democrática. Nesse período, algumas ações culturais do Estado brasileiro podem ser tomadas como exemplos das transformações ocorridas em sua relação com a sociedade civil num contexto de criação ou ampliação de espaços de participação política e de redefinição do papel do Estado. O autor destaca que no âmbito das políticas culturais, o campo do patrimônio e dos museus também pode ser visto como agente de lutas sociais e políticas dos grupos étnicos, ao favorecer a sua mediação com a sociedade nacional e o Estado, servindo de canal institucional para o agenciamento de direitos e políticas na esfera pública. Antonio Motta destaca também que diferentes tipos de mobilizações políticas deram origem a criação de museus, como museus comunitários, museus territoriais, ecomuseus, museus indígenas, museus digitais, dentre outros, de modo que os museus já não podem e não devem mais falar em nome dos “outros”, nem tampouco representar esses “outros” sem consultar previamente o que “eles” pensam e como “eles” devem se ver, agir e se representarem, “eles” próprios, nos espaços museógrafos. O autor salienta ainda que embora os avanços no campo da cultura e de suas políticas sejam inegáveis, muitas das mudanças anunciadas e desejadas ainda não foram realizadas, restando ainda confinadas no campo semântico da boa retórica sobre a “cultura como recurso” ou “a cultura com direito”, apresentando-se como desafio a ser enfrentado por antropólogos, historiadores e demais profissionais uma maior participação e intervenção na esfera pública e em suas decisões políticas.

Objetivando refletir sobre memória, samba e políticas culturais a partir dos resultados obtidos com o projeto de pesquisa “Museu Afrodigital Rio: memória entre gerações nos quintais do samba da Grande Madureira” desenvolvido pelo Museu Afrodigital Rio (http: / / www.museuafrorio.uerj.br / ), no período de 2012-2016, Maria Alice Rezende Gonçalves e Maurício Barros de Castro observam que esse projeto de pesquisa dedicou-se a investigar os rituais e tradições que permeiam os festejos realizados nos quintais das casas das “tias” do samba, das mães de santo, dos jongueiros e das cozinheiras da culinária afrorreligiosa na Grande Madureira, região da cidade do Rio de Janeiro. Trata-se de uma região, destacam os autores, que concentra um grande número de manifestações e associações de matriz africana. Os autores concluem que o quintal é espaço de sociabilidade e local privilegiado de convívio e realização de práticas que vão do profano ao religioso, e que, de algum modo, ainda trazem memórias de gerações passadas.

As lutas de memória na África contemporânea também constitui o campo de análise de Antonio Evaldo Almeida Barros. O autor observa que John Langalibalele Mafukuzela Dube (1871-1946), fundador do Congresso Nacional Africano em 1912, tornarase uma figura central da história e memória sul-africana moderna. Suas realizações são bem conhecidas por aqueles que têm se interessado por sua vida e obra. Ao mesmo tempo, os modos como ele vêm sendo apropriado e visto do final do século XIX até os dias atuais têm relação direta com os projetos de nação e sociedade sul-africana dominantes. De um lado, há aqueles que tendem a identificar Dube como colaborador da implementação da segregação sul-africana. De outro lado, há aqueles que posicionam John Dube como personagem central das lutas históricas contra a segregação racial, inscrevendo-o, como ocorre paradigmaticamente nos dias atuais, como uma espécie de herói sul-africano – esta tendência pode ser observada em diferentes décadas e situações, como nas representações sobre Dube produzidas por sua família e grupo social nos anos 1970 no âmbito dos izibongos que lhe foram dedicados, e que são objeto central deste artigo. Conclui o autor que num jogo de lutas de memória, este padrão interpretativo tornar-se-ia claramente dominante na África do Sul pós-Apartheid, particularmente no contexto de invenção da África do Sul como Rainbown Nation.

Keith Barbosa e James Roberto Silva nos levam para o campo dos processos de reinvenção da história, da memória e do patrimônio no âmbito arquivístico, destacando que o retorno aos arquivos históricos torna-se uma tarefa fundamental para os pesquisadores que pretendem tornar visível a história das populações negras. Objetivando apresentar o tema da escravidão e suas potencialidades de pesquisa no quadro dos documentos históricos do judiciário amazonense, composto por milhares de processos judiciais, os autores observam que os registros históricos mapeados e reunidos no Arquivo do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas revelam uma complexa e multifacetada realidade cotidiana, envolvendo cativos em situações às vezes insuspeitadas. Ao cotejarem os registros da justiça contendo processos contra escravos, africanos livres e outros indivíduos, observam que esse material oferece indícios valiosos sobre as especificidades da escravidão no Amazonas. Os autores enfatizam ainda que as narrativas e memórias resgatadas podem instigar a recuperar a história de homens e mulheres que vivenciaram experiências complexas entre a escravidão e a liberdade. Argumentam ainda que, para além das histórias individuais ou coletivas que foram marcadas pela experiência do cativeiro, a sistematização / organização do acervo histórico do Tribunal de Justiça apresenta um desafio ainda mais complexo: romper os silêncios sobre a temática e impulsionar o desenvolvimento de novas pesquisas.

As conexões entre memórias, narrativas e cidades constituem o foco de Sandra de Cássia Araújo Pelegrini e João Paulo P. Rodrigues, que apresentam narrativas que trazem à tona heranças culturais dos habitantes e histórias que marcaram o desenvolvimento da cidade de Ivatuba, no Paraná. Segundo os autores, a análise e a coleta de depoimentos orais, a realização de entrevistas, a seleção de fotografias e de documentos textuais de diversas tipologias possibilitara esmiuçar histórias sobre o processo de emancipação política e de crescimento da cidade, sem negligenciar a apreensão das múltiplas facetas do viver humano em novas fronteiras.

Fladney Francisco da Silva Freire, por sua vez, tem como perspectiva lançar notas sobre o complexo contexto do Terecô no Maranhão, tratando de questões como território, identidade, processos históricos de cerceamento de práticas religiosas, conflitos, pensando diversas articulações no município de Bacabal, interior do Estado do Maranhão. O Terecô, afirma o autor, é uma das religiões afro-brasileiras do Maranhão, que se difundiu na região central, mas também nos estados do Pará e Piauí. O autor chama atenção para o fato de que, se, até os dias atuais, continua a haver uma espécie de expectativa de que o Terecô e outras religiões de origem africana ou indígena, tenham como característica visível a simplicidade, a casa de palha, o chão batido, as roupas simples, este cenário vem se transformando nos últimos anos, pois é possível observar um movimento intenso de inclusão de elementos do chamado mundo “moderno”, o que impacta a construção predial dos terreiros, suas formas de celebração, incluindo o vestuário, e suas formas de difusão, com a proliferação das mídias digitais. O autor conclui que os terreiros têm acompanhado as novas realidades do mundo social, o que os leva a serem protagonistas de suas histórias, memórias e narrativas local, nacional e globalmente definidas.

Chérif Keita integra este dossiê com um excelente estudo de caso. Keita reflete sobre a relevância de seu usar filmes no processo de reconstrução nacional da África do Sul pós-Apartheid. O autor argumenta que os filmes têm o potencial de reconectar a África do Sul atual aos seus primeiros heróis, atualmente esquecidos, que lutaram pela liberação, contra a segregação e o apartheid.

O entrevistado desta edição é o Prof. Dr. Sérgio Figueiredo Ferretti (1937-2018). Em 24 de março de 2018, dois meses antes de seu falecimento, Prof. Ferretti concedera a presente entrevista a Marilande Martins Abreu e Antonielton Vieira da Silva. Ferretti era graduado em História (UB-UFRJ / 1962) e Museologia (MHN / UNIRIO / 1962), especialista em Sociologia do Desenvolvimento (UCL Bélgica, 1964 / 66), mestre em Ciências Sociais / Antropologia (UFRN / 1983) e doutor em Antropologia Social (USP / 1991). Professor Emérito da Universidade Federal do Maranhão e Bolsista de Produtividade do CNPq, Sérgio Ferretti pesquisou religiões de matriz africana e manifestações da cultura popular e negra durante mais de 40 anos no Estado do Maranhão, e formou muitas gerações de pesquisadores dedicados ao estudo de expressões da cultura e da religião, e da luta por igualdade e inclusão social e cultural, sendo vasta sua produção acadêmica. Nesta entrevista, o Professor Ferretti fala sobre o campo dos estudos das práticas religiosas de matriz africana e cultura popular no Estado do Maranhão, o que coincide com sua própria vida, especialmente a partir dos anos 1960.

“As Tramas da Patrimonialização da Cultura” é o título da resenha de Wheriston Silva Neris sobre a obra “As Faces de John Dube: Memória, História e Nação na África do Sul” (2016), de autoria de Antonio Evaldo Almeida Barros. Wheriston Neris observa que a reconstituição progressiva das diferentes estratégias, tramas de competição política e batalhas pela memória da nação sul-africana contemporânea constituídas em torno do legado e da biografia de uma de suas figuras centrais, John Langalibalele Mafukuzela Dube (1871-1946), constituem o objeto principal da obra. O livro, destaca Wheriston Neris, constitui um convite etnográfico, interdisciplinar e bem documentado para acompanhar o autor na aventura da exploração das artimanhas da nação e da memória no contexto sul-africano, explorando o contínuo, complexo e multifacetado processo de reconstrução biográfica d’As Faces de John Dube. Conclui o resenhista que sem prender-se a uma visão puramente celebratória a respeito da construção da Rainbow Nation e mobilizando uma pluralidade de fontes com aportes teóricas, o livro consegue, antes de qualquer coisa, demonstrar as múltiplas tensões, simbólicas e sociais, por meio das quais a nação é fabricada e representada na contemporaneidade.

Este número da Revista Outros Tempos é completado ainda com dois textos na sessão de artigos livres. O primeiro é de autoria de Mariléia dos Santos Cruz, e enfoca o professor e jornalista negro José do Nascimento Moraes (1882-1958) que, segundo a autora, destacou-se escrevendo crônicas, contos e poesias nos principais jornais maranhenses da primeira metade do século XX. A autora argumenta que Nascimento Moraes era um defensor da promoção da escolarização para os pobres e constantemente debatia os problemas políticos, sociais e educacionais maranhenses, devendo ser caracterizado como um intelectual da educação, uma vez que na sua trajetória profissional deixou vasta contribuição sobre temáticas relativas ao campo.

No segundo artigo, Arkley Marques Bandeira apresenta uma síntese de parte dos resultados obtidos na sua tese de doutorado, que tratou dos processos pré-coloniais relacionados à ocupação humana na Ilha de São Luís, no Maranhão, em sua longa duração. A pesquisa centrou-se em métodos da arqueologia para investigar cinco sítios arqueológicos, os sambaquis do Bacanga, Panaquatira e Paço do Lumiar e os sítios cerâmicos Vinhais Velho e Maiobinha I. Os resultados da pesquisa permitiram reconhecer os processos de formação do registro arqueológico, a espacialidade dos sítios e o contexto deposicional dos antigos assentamentos de diversos povos que ocuparam a Ilha de São Luís, desde 6.600 anos atrás, estendendo-se até os primeiros séculos do Brasil colonial.

Desejamos a todos(as), excelente leitura!

Antonio Evaldo Almeida Barros

Livio Sansone


BARROS, Antonio Evaldo Almeida; SANSONE, Livio. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 15, n. 25, 2018. Acessar publicação original [DR]

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Patrimônio, Identidades e Lugares de Memória / Outros Tempos / 2018

Este número da Revista Outros Tempos inclui o dossiê temático Patrimônio, Identidades e Lugares de Memória, relacionado à XVIII Fábrica de Ideias, realizada em São Luís-MA, de 18 a 31 de março de 2017, e coordenada pelos professores Antonio Evaldo Almeida Barros, Sérgio Figueiredo Ferretti e Livio Sansone.

Com o tema Patrimônio, Desigualdade e Políticas Culturais, a XVIII Fábrica de Ideias consistiu em um seminário internacional de pesquisa e pós-graduação, desdobrando-se também em uma disciplina acadêmica planejada e ministrada de forma interinstitucional, ao mesmo tempo em que foi um seminário com palestras ao público mais amplo. A XVIII Fábrica de Ideias foi resultado de parceria entre a Universidade Estadual do Maranhão, através do Programa de Pós-Graduação em História, a Universidade Federal do Maranhão, por meio dos Programas de Pós-Graduação em Políticas Públicas e em Ciências Sociais, e a Universidade Federal da Bahia, através do Centro de Estudos Afro-Orientais e do Programa de Pós-Graduação em Estudos Étnicos e Africanos, e ainda o Governo do Estado do Maranhão, representado pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação, e pela Secretaria de Igualdade Racial. Desse modo, dos nove artigos reunidos neste dossiê, sete deles foram produzidos por pesquisadores, docentes e discentes de programas de pós-graduação de diferentes instituições do Brasil que participaram da XVIII Fábrica de Ideias.

O dossiê Patrimônio, Identidades e Lugares de Memória inicia-se com o artigo “Confederate Monuments, Plantation-Museums and Slavery: Race, Public History, and National Identity”, de Stephen Small, o qual analisa dezesseis cabanas de escravos que foram incorporadas em três locais de turismo de patrimônio em Natchitoches, no noroeste da Louisiana. Os locais são Oakland Plantation, Magnolia Plantation e Melrose Plantation. O autor destaca a incorporação desses lugares de memória na lógica patrimonial, refletindo como a identidade nacional é expressa e articulada nesses lugares de memória e como tais lugares destacam e questionam a identidade nacional.

Em “O Tempo e o Medo: a longa duração da guerra em Moçambique”, Omar Ribeiro Thomaz dedica-se à percepção da passagem do tempo e o constante medo da desordem que se entrelaçam em narrativas e rumores conectados a diferentes momentos da história de Moçambique. O artigo sistematiza reflexões sobre a guerra e o medo da guerra em terras moçambicanas, fruto de um trabalho etnográfico realizado há quinze anos pelo pesquisador.

Monica Lima traz à discussão questões em torno de um Patrimônio Mundial da Humanidade – o sítio histórico e arqueológico Cais do Valongo –, situado na cidade do Rio de Janeiro. A questão central da autora no artigo “História, Patrimônio e Memória Sensível: o Cais do Valongo no Rio de Janeiro” é o significado deste sítio histórico como um lugar de memória, de memória sensível, do tráfico atlântico de africanos escravizados e seus descendentes nas Américas e, em especial, no Brasil. Ideias como violência, dor, sofrimento são levadas a termo para comparar o Cais do Valongo, espaço de resistência e afirmação de populações negras, a outros lugares do mundo onde também ocorreram tragédias humanas.

“Pensar o Dito e o Silenciado: Representações da Escravidão na Historiografia”, escrito por Celeste Silva Ferreira, debate as transformações historiográficas ocorridas no final do século XX que levaram a uma mudança metodológica no modo como a documentação sobre sujeitos escravizados é analisada. O artigo demonstra como o uso de diferentes fontes históricas, como correspondências oficiais ou pessoais, inquéritos, processos judiciais, testamentos, inventários, jornais e diários, passou a direcionar novos olhares e possibilidades interpretativas a partir das influências da chamada “virada linguística”. Ao abordar a historiografia brasileira sobre escravidão, o texto também enfoca a Lei do Ventre Livre (1871) e as mais recentes interpretações acerca dela.

Fernando Santos de Jesus e Valerie Gruber, em “O Mestre de Capoeira: Fortalecendo Filosofias e Práticas de (Re)Existência Negra perante Desigualdades Sociorraciais”, também tratam de um Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO, o qual contribuiria, em termos políticos mundiais, para a valorização e a visibilização da capoeira como prática de resistência negra brasileira. Diante de um olhar filosófico sobre a capoeira e destacando os saberes próprios dessa prática em articulação com o contexto da desigualdade sociorracial, o artigo trata de ressignificações em face das essencializações que envolvem a capoeira. Numa perspectiva sociogeográfica, os autores defendem a noção de pedagogia da (re)existência negra, através do trabalho do mestre de capoeira, o qual representaria um filósofo diaspórico que cria um espaço de possibilidades para coletividades marginalizadas.

“Tempos de Segregação (1948-94): Ensino de história, Políticas de Memórias e Desigualdades Sociais no Universo do Povo Zulu”, de autoria de Aldina da Silva Melo, tem como enfoque o ensino de história, as políticas de memória, as identidades e desigualdades sociais na África do Sul durante o Apartheid. A coleção de livros didáticos History for Today e algumas imagens e jornais encontrados no arquivo sul-africano Alan Paton Center e na biblioteca pública de Pietermaritzburg constituem as fontes examinadas no artigo, as quais possibilitam tratar das políticas educacionais presentes na África do Sul durante aquele regime, bem como sobre os modos como a(s) identidade(s) zulus foram construídas, pensadas e percebidas no período em questão.

Fábio Henrique Monteiro Silva ocupa-se com as representações do carnaval na capital maranhense entre os anos 1970 e 2000, discutindo as memórias de participantes notáveis dessa festa, através de lembranças de brincantes e organizadores locais. No artigo “Memória e Sensibilidade no Moderno Carnaval de São Luís”, utiliza, ainda, matérias de jornais maranhenses e o debate conceitual no campo da memória, a fim de evidenciar os modos de ver e fazer o carnaval na ilha de São Luís.

Desirée Tozi e André Luís Nascimento dos Santos argumentam que os pareceres e laudos antropológicos que instruíram os processos de tombamento de terreiros pelo Iphan, ao longo dos últimos 30 anos, reproduzem, como referência de “verdade”, as etnografias produzidas sobre os candomblés baianos na primeira metade do século XX. No artigo “História de um Legado: as Etnografias de Religiões de Matrizes Africanas no Discurso Patrimonial”, os autores defendem a tese de que a ausência de um recorte mais preciso e de uma análise mais ficcional dessas obras tem produzido um modelo de terreiro de candomblé que não encontra projeção nos processos de tombamento de terreiros que ainda se encontram em aberto na instituição da salvaguarda do patrimônio cultural brasileiro. O texto conjuga o exame da bibliografia etnográfica sobre terreiros na Bahia à análise de documentos dos processos de tombamento já finalizados pelo Iphan.

O artigo “Narrativas sobre a Cidade: Lembranças e Esquecimentos sobre Grupos Étnicos numa cidade do Rio Grande do Sul”, de Bibiana Werle, discute as representações memoriais contemporâneas do município de Estrela, no Rio Grande do Sul, trazendo à baila as narrativas comemorativas da cidade promovidas pelo governo municipal. A autora utiliza jornais locais e narrativas orais para demonstrar como, historicamente, as diversidades étnicas são apresentadas de forma desigual pelo poder público municipal nos patrimônios culturais do local. Destaca também que a composição étnica de Estrela foi marcada por conflitos identitários durante o Estado Novo (1937-45), o que configurou a produção de monumentos que apagam e excluem outras memórias.

Antonio Evaldo Almeida Barros e Viviane de Oliveira Barbosa apresentam o artigo “Estudos Africanos e Afro-Brasileiros em Perspectiva Extensionista”. Trata-se de um estudo de caso que enfoca um conjunto de programas e projetos de extensão universitária voltados para o campo dos Estudos Africanos e Afro-Brasileiros, particularmente, do Ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileiras, e para o âmbito da Educação para as Relações Étnico-Raciais, executados entre 2010 e 2018, no Estado do Maranhão, em parceria com secretarias de governos municipais e estaduais, e organizações da sociedade civil. Os autores partem do reconhecimento de que a instituição universitária tem sido mais inclinada a discursos e ideias do que a práticas, muito menos práticas de transformação social e que, a extensão, que ao lado da pesquisa e do ensino, constitui um dos pilares da universidade, tem a vocação prioritária de promover a interação entre a universidade e a sociedade. Para os autores, as ações de extensão executadas buscaram promover, sobretudo a partir de uma perspectiva humanista, a igualdade racial, e foram desenvolvidas considerando a relevância da história e das sociedades africanas para a formação do mundo contemporâneo e da humanidade, e as sinergias históricas existentes entre África e Brasil, enquanto territórios complexos e mutuamente interligados. Antonio Evaldo A. Barros e Viviane de O. Barbosa argumentam ainda que as ações de extensão executadas fundamentaram-se na possibilidade de construção de uma democratização epistemológica, buscaram alertar para o fato que o silêncio e a omissão comumente sustentam o preconceito e a discriminação na escola, bem como pretenderam evidenciar a história e cultura africana e afro-brasileira como ocasião privilegiada para se observar uma variedade de experiências sociais que apontam para a abertura ao mundo, à vida, para a inclusão e não a exclusão do outro, para a solidariedade na história.

O entrevistado desta edição é o Prof. Dr. Ibrahima Thiaw, um dos maiores especialistas em História e Arqueologia Africanas na atualidade. Thiaw é graduado em História (Universidade Cheikh Anta Diop, Dakar, Senegal, 1990 / 1), mestre em Etnologia e Sociologia Comparativa (Universidade de Paris-Nanterre, França, 1992) e em Antropologia (Universidade Rice, Houston, USA, 1995), e doutor em Antropologia / Arqueologia (Universidade Rice, Houston, USA, 1999). É professor da Universidade Cheikh Anta Diop e diretor do Institut Fondamental d’Afrique Noire (IFAN), com pesquisas no campo da arqueologia dos encontros globais, sobre os impactos do Atlântico e do Saara nas sociedades, processos de escravização e tráfico de escravizados, comemorações e políticas culturais. Destaca-se por seu envolvimento no trabalho de reconhecimento da Ilha de Goré como Patrimônio Mundial da Humanidade e por seu envolvimento em projetos sobre patrimônio no Senegal e em outros países africanos, como Guiné, Guiné-Bissau, Serra Leoa, Burkina Faso e Congo. Nesta entrevista, concedida a Viviane de Oliveira Barbosa, o professor Ibrahima aborda sua inserção acadêmica, seus interesses e projetos de pesquisa, especialmente em torno das políticas culturais e patrimoniais e dos lugares de memória.

A resenha deste número é intitulada Memória Política entre Silêncios e Narrativas: Transição democrática no Brasil e na África do Sul, de autoria de Wendell Emmanuel Brito de Sousa, e realizada a partir de leitura crítica do livro “Democracia e Estado de Exceção: Transição e Memória Política no Brasil e na África do Sul”, escrito por Edson Teles e publicado pela Editora Fap-Unifesp, em 2015. Wendell Sousa demonstra que o livro é fruto da tese de doutoramento defendida no ano de 2007 na Universidade de São Paulo e resulta, também, de anos de militância política e engajamento por parte do autor nas questões que envolvem os direitos humanos. Wendell Sousa entende que a obra sedimenta reflexões no campo da filosofia política, tratando sobre os (ab)usos da memória na assunção das novas democracias no Hemisfério Sul, ante a herança autoritária da ditadura militar no Brasil e do apartheid na África do Sul. Utilizando um método comparativo, o autor do livro analisa os casos brasileiro e sul-africano na tentativa de compreender os sentidos do passado, o que faria de sua análise algo além da filosofia política e próximo à História Social das Ideias, devido à análise contextual e atuação dos agentes nos processos de consolidação das novas democracias no Hemisfério Sul.

Este número da Revista Outros Tempos é composto também de três produções na sessão de artigos livres. O primeiro deles, “Migrações Internas e Conexões Sociais em um Contexto Colonial: Trajetórias de Imigrantes Portugueses na Vila de Paranaguá (décadas de 1770-1790)”, de André Luiz Moscaleski Cavazzani, investiga as formas de inserção de três imigrantes portugueses na vila paulista de Paranaguá, entre as décadas de 1770 e 1790, com ênfase nas formas de absorção de portugueses à vida social de uma vila colonial situada no extremo sul da Capitania de São Paulo. O autor sistematiza quatro argumentos em seu artigo: havia ocasiões nas quais o estabelecimento na vila de Paranaguá por um imigrante português era decorrente do insucesso da iniciativa de fixar-se em praça mercantil de maior porte; os portugueses radicados em Paranaguá possuíam conexões sociais e comerciais em distintas áreas do litoral Sudeste, notadamente a cidade do Rio de Janeiro; a manutenção dessas conexões criava uma dinâmica de absorção de caixeiros à vila de Paranaguá; e a constituição de vínculo com um compatrício era operacional para o jovem reinol enraizar-se na sociedade receptora.

No segundo artigo, de título “Raimundo José de Sousa Gaioso e os 200 Anos da Publicação do Compêndio Histórico-Político dos Princípios da Lavoura do Maranhão (1818): Notas Bibliográficas”, Romário Sampaio Basílio apresenta e analisa traços biobibliográficos acerca do português Raimundo José de Sousa Gaioso, autor da obra Compêndio históricopolítico dos princípios da lavoura do Maranhão, publicada, postumamente, em 1818, e vista como uma das mais importantes publicações sobre o Maranhão do primeiro quartel do século XIX.

Por fim, no artigo de Joseanne Zingleara Soares Marinho, “As Políticas Públicas de Proteção da Saúde Materno-Infantil no Piauí (1930-1945)”, é feita uma discussão sobre a administração dos poderes públicos piauienses a partir da criação de legislação e de órgãos de assistência à saúde de mães e crianças, entre 1930 e 1945. Objetivando demonstrar como a questão da saúde materno-infantil passou a ser tratada como responsabilidade do Estado, a autora utiliza um corpus documental composto de mensagens do governo do Piauí, de legislação estadual e de artigos de jornais impressos.

Acreditamos que este é um número com ricas produções e esperamos que todos(as) tenham uma ótima leitura!

Viviane de Oliveira Barbosa

Omar Ribeiro Thomaz.


BARBOSA, Viviane de Oliveira; THOMAZ, Omar Ribeiro. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 15, n. 26, 2018. Acessar publicação original [DR]

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História social da propriedade / Outros Tempos / 2017

O que é propriedade? Esta questão, aparentemente tão simples, tem por si só uma história e escrevê-la é uma das tarefas mais inglórias. Em 1841, ao publicar um livro com o título Qu’est-ce que la propriété?, Proudhon, um dos mais importantes pensadores anarquistas, criticava a ideia de propriedade, afiançando que ela era “le suicide de la société”. Ao advogar em defesa da posse, Proudhon trazia para debate uma questão que permeou toda a história da humanidade. O enfrentamento de tal temática aguçou o apetite da intelectualidade ocidental e suscitou a emergência de novas ideias e valores, traduzidos em inúmeras obras. Argumentos sobre a função e a necessidade histórica da propriedade foram muitas vezes respondidos com ilações que destacavam a relação entre propriedade e pobreza. Alguns autores procuraram desvelar a relação siamesa entre propriedade e liberdade, sendo a primeira responsável pela conservação da segunda, tal como destacara John Locke. Outros ainda, seguindo as trilhas inauguradas por Friedrich Engels, discutiram o processo histórico que permitiu a divisão social do trabalho e a propriedade dos meios de produção em sua relação com a formação da família monogâmica e o Estado. Enfim, a temática da propriedade ganha relevância no século XIX e sua problematização mantém-se acesa até os dias atuais. Mas, se há de fato uma história da propriedade, resultado de múltiplos dilemas que a própria ideia aciona (liberalismo & propriedade; socialismo & o fim da propriedade; propriedade individual & propriedade coletiva), não há como negar também que o desejo de sua superação não é menos antigo, como lembram-nos as belíssimas palavras de Thomas More, em Utopia.

Neste volume, a revista Outros Tempos apresenta o dossiê intitulado “História Social da Propriedade”, cujos artigos procuram iluminar exatamente a questão da propriedade em suas múltiplas dimensões, reunindo pesquisadores que tem se dedicado ao tema que, sem sombra de dúvida, se constitui em central na história da humanidade. Assim, no artigo Os Cayapó e a propriedade da terra em Sant’Anna do Paranahyba, sul de Mato Grosso a historiadora Maria Celma Borges (UFMS) analisou as ações dos Cayapó pelas estradas, roças e aldeamentos de Sant’Anna do Paranahyba, sul de Mato Grosso, e em suas proximidades, no século XIX., com ênfase nas práticas de enfrentamento e / ou negociação entre esses povos originários e os poderes locais e provinciais, com ênfase para o aldeamento e a propriedade da terra. A questão da propriedade da terra também é a temática do artigo Acesso à Terra, Propriedade e Agricultura em núcleos coloniais da Amazônia Oitocentista, do historiador Francivaldo Nunes Alves (UFPA), voltado para a análise da atuação dos agentes públicos na concessão de direitos de propriedade sobre a terra nas colônias agrícolas na Amazônia do século XIX. As questões em torno das fronteiras, é o tema do próximo artigo, A História do Brasil na Historiografia de Luís Ferrand De Almeida, da historiadora Margarida Sobral Neto (Universidade de Coimbra), que se propôs a analisar o contributo da obra historiográfica do historiador português Luís Ferrand de Almeida para o conhecimento da história do Brasil, em particular para a história da definição das fronteiras meridionais na época moderna. A seguir, no artigo As Vexações e Opressões dos Senhores Coloniais e a Constituição da Carta Régia de 1753 no Brasil Colonial: a tradição da Posse e o Justo Título, Carmel Alveal (UFRN) procurou explicar como a formação dos senhorios coloniais motivou a elaboração da carta régia de 1753. O dossiê continua caminhando pelo tema da propriedade, agora deslocando o foco para o setor minerador. O historiador português João Paulo Avelãs Nunes (FLUFC / Coimbra), no artigo Mineração Contemporânea em Portugal, Propriedade Pública e Iniciativa Privada: Concessões de Volfrâmio na Freguesia de S. Mamede De Ribatua, caracterizou o setor mineiro como um objeto particularmente relevante para analisar a problemática da propriedade e das correspondentes sequelas (diretas e indiretas) no Portugal Contemporâneo. A atuação estatal no sentido de fortalecer a grande propriedade agrícola no Brasil dos anos 1990 é o tema do artigo a seguir: Dirigismo do Estado Produtor ou Planejamento do Estado Promotor? A Reestruturação da Política Agrícola do Governo Collor, de autoria das historiadoras Monica Piccolo (UEMA) e Márcia Menendes Motta (UFF). Os dois últimos artigos do dossiê retornam ao mundo rural: em Fronteiras Dinâmicas: Propriedade de Terra e Trabalho Indígena nos Sertões Fluminenses (1800-1810), Marina Monteiro Machado (UERJ) refletiu sobre o processo de ocupação colonial do Rio de Janeiro na passagem do século XVIII para o século XIX, com um olhar específico sobre a construção de aldeamentos indígenas como estratégia para conquista de terra e controle da mão de obra dos grupos nativos. Por fim, o historiador Carlos Guardado da Silva (Universidade de Lisboa), no artigo Patrimônio Rural do Mosteiro de São Vicente de Fora (Lisboa): Séculos XII-XIII foi analisado o sistema de organização econômica e a gestão do aro rural, nomeadamente a evolução das relações que se estabeleceram entre o Mosteiro de São Vicente de Fora e os particulares, assim como a diversificação e a expansão do seu patrimônio rural, mais intensas junto da cidade de Lisboa.

O volume ainda conta com cinco artigos livres: Comportamentos Impostos ao gênero: representações da submissão feminina no Rio Grande do Sul na República Velha, de Daniel Luciano Gevehr (FACCAT) e Salete Rodrigues (FACCAT), O Sujeito Escravo e o Ensino de História: o infanticídio cometido por Maria Rita, de Roberto Radünz (PUC / RS) e Bruna Letícia de Oliveira dos Santos (Educadora Social do Colégio Murialdo), A Guerra do Paraguai sob a ótica do Visconde de Taunay, de Isadora Tavares Maleval (UFF / Campos dos Goytacazes), A escrita do Punk no Brasil no início da década de 1980: uma análise dos primeiros trabalhos, de Tiago de Jesus Vieira (UEG) e, por fim, A Elevação do Homem Rural: Institutos de Educação Rural e a Cooperação da Misereor, de Douglas Orestes Franzen (UPF).

Encerrando o volume, temos a resenha do documentário “TERRA de quilombos: uma dívida histórica”, dirigido por Murilo Santos Leonardo Leal Chaves (PPGHEN / UEMA) e a entrevista realizada com a historiadora da Universidade de São Paulo, Iris Kantor, que defende a aproximação entre a História e a Geografia, a partir da análise dos mapas históricos, como ferramenta para potencializar os estudos sobre a história social da propriedade.

Esperamos que as pesquisas publicizadas nesse volume da Revista Outros Tempos possam lançar novas luzes sobre a história social da propriedade. Boa leitura a todos!

Monica Piccolo (UEMA)

Márcia Motta (UFF)


PICCOLO, Monica; MOTTA, Márcia. [História social da propriedade]. Outros Tempos, Maranhão, v. 14, n. 23, 2017. Acessar publicação original [DR]

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Drogas na Américas: culturas, fiscalizações, repressões e ilegalismos / Outros Tempos / 2017

O continente americano é um verdadeiro laboratório de politização das drogas. Se é dele que emergem, historicamente, as primeiras experimentações de uma política proibicionista direcionada a certas substâncias, como o álcool nos Estados-Unidos (1919- 1933), é dele também que emergem hoje as primeiras experimentações de regulação do uso recreativo (Colorado e Nevada, nos EUA) e medicinal da maconha (em alguns países como a Colômbia, os EUA, o México e o Uruguai). Nesse mesmo continente foi declarada, em 1970, a “guerra às drogas” pelo presidente dos Estados-Unidos, Richard Nixon, mas é ainda desse continente que derivam hoje as críticas mais fervorosas em relação a essa guerra [1] . De fato, os efeitos nefastos dessa política bélica se fizeram sentir especialmente em diversos países do continente, levando a, entre outros, um enfraquecimento de alguns Estados, o fortalecimento das multinacionais do crime organizado, o aumento de mortes e contaminações ligadas à precariedade do uso de drogas advindos de sua ilegalidade, ou o aumento de discriminações e da população carcerária. A tal ponto que hoje assistimos a uma denúncia internacional desses efeitos, inclusive por ex-presidentes, como o brasileiro Fernando Henrique Cardoso, ou o colombiano C. Gaviria, os mesmos que, na época, implantaram essa política. E, ironia suprema da Historia, sendo os Estados-Unidos os que mais defenderam, nos anos 1910-20, um sistema internacional de drogas fundado na distinção entre fins legítimos (médico-científicos e farmacêuticos) e ilegítimos, permitindo a constituição de grandes monopólios farmacêuticos em matéria de drogas, é do mesmo país que emerge atualmente os maiores escândalos farmacêuticos ligados ao consumo abusivo e letal decorrentes de drogas prescritas e acessadas de forma legítima: milhões de dependentes de opioides, e milhares de overdoses por ano provenientes de abusos de drogas legalmente prescritas [2] . Eis aqui então uma ambivalência constitutiva do problema das drogas desde o início do século XX: quando destinadas a fins legítimos (médico-científicos) são um mal necessário, quando dirigidas a fins ilegítimos (recreativos), são um flagelo social.

A contemporaneidade e a ambiguidade da problemática das drogas em todo o continente americano justifica a necessidade da publicação, em uma revista de História, de um volume especialmente consagrado a essa questão. Pois as transformações políticas e sociais contemporâneas em matéria de drogas, os seus paradoxos e contradições aparentes, participam de processos de grande fôlego que devem ser analisados em sua complexidade histórica e também em sua variedade geográfica. A originalidade dessa publicação consiste, precisamente, em oferecer uma abordagem histórica que articula, ao mesmo tempo, uma perspectiva global das políticas internacionais sobre drogas e estudos micro-históricos que tratam de contextos geográficos e sociais específicos. Este volume concilia metodologias distintas e confronta assim reflexões mais abrangentes e teóricas sobre conceitos operantes do chamado “sistema proibicionista” com pesquisas etnográficas, realizadas nas realidades do cotidiano da Argentina, do Brasil, da Colômbia e do México. Nos cruzamentos entre macro-história e micro-história, ciências políticas, sociologia e antropologia se encontram pesquisadores, doutorandos e professores vindos de horizontes geográficos e metodológicos diferentes. E, como em uma polifônia, dialogam historiadores brasileiros e franceses; antropólogos da América do Sul e da Europa; assim como sociólogos e psicólogos argentinos, que trazem consigo bagagens repletas de experiências que proporcionam novas reflexões ao universo complexo das drogas. Dessa forma, a pluralidade de perspectivas que figuram nesse volume pode ser encarada como uma sala de espelhos na qual estariam situados, no centro, alguns referentes do campo, como “drogas” ou “proibicionismo”, de onde refletiriam e emanariam os diferentes sentidos que eles adquirem quando confrontados a uma série de realidades históricas e sociais distintas.

É exatamente o referente “drogas” que é situado no centro do artigo de FrançoisXavier Dudouet. Nele, o autor propõe uma investigação quase policial, que percorre as diferentes operações subjacentes de uma organização social global que distinguiria, no mundo inteiro, os usos sagrados dos usos profanos. A problemática das drogas não pode ser apreendida nem a partir de uma perspectiva substancialista, que pensaria as drogas como substâncias tendo propriedades específicas, nem a partir de uma perspectiva moral, que se focalizaria unicamente sobre os mecanismos sociais e morais que conduzem a sua proibição e repressão. Esta perspectiva moral, tende a ocultar o fato de que, na realidade, nenhuma droga é em si proibida e acaba por mascarar as distinções entre usos lícitos e ilícitos, realizadas pelo sistema de regulação das drogas tanto em uma escala nacional quanto internacional. São os processos históricos que conduziram à implantação dessa organização social global das drogas que são centrais em sua análise. Para isso, o autor começa a descrever as operações pelas quais os usos lícitos das drogas foram distinguidos dos ilícitos em nível dos diversos estados europeus no século XIX para, em seguida, mostrar como essas operações contribuíram para a construção, internacional, de uma economia lícita das drogas separada de sua economia ilícita, durante o século XX. Essa dimensão econômica é, posteriormente, aprofundada no artigo a fim de revelar a lógica monopolista que organiza os usos sagrados das drogas. Nessa trama, trata-se de revelar que por trás da crença na proibição das drogas se dissimula uma realidade mais difícil ainda de ser capturada: a monopolização dos usos lícitos.

Deslocando o foco para as Américas, o artigo de Thiago Rodrigues e Beatriz Caiuby Labate analisa os processos histórico-políticos do proibicionismo, a partir de uma perspectiva comparada entre os Estados-Unidos, México e Brasil. No artigo, trata-se de reinserir as bases repressivas e militares do proibicionismo dentro de um conjunto complexo de racionalidades biopolíticas, composto por cinco níveis de segurança: moral, sanitária, pública, nacional e internacional. Esses níveis são confrontados tanto com as particularidades das zonas geográficas em questão, quanto com os períodos históricos que percorrem o final do século XIX, até o século XX. Contrapondo-se a uma visão simplista do sistema proibicionista, o artigo demonstra as dinâmicas e as mutações dos pilares enraizados do sistema, situando e problematizando paralelamente os questionamentos atuais sobre o tema.

Dando continuidade ao tipo de reflexão que procura abranger as especificidades do sistema proibicionista, situando-a no contexto brasileiro dos anos 1930 a 1970, o artigo de Mariana Broglia de Moura busca complexificar uma visão que reduz o proibicionismo a uma política repressiva e que visa a interdição absoluta das drogas. Por meio de uma abordagem “positiva” são restituídas as diversas funções de controle, regulação e repressão que constituem o sistema proibicionista de drogas. É salientada, particularmente, a atividade de fiscalização de entorpecentes, analisada especialmente a partir das seguintes dimensões: controle estatístico, tributação e regulamentação profissional e regulação dos costumes. Por fim, é examinada a maneira como a formalização de um mercado legítimo de drogas vem acompanhado do desenvolvimento de um conjunto de ilegalismos, às margens do lícito e do ilícito.

A abordagem histórica, no que tange a dimensão ilícita do circuito de comercialização das drogas é feita no artigo de Alexandre Marchant. Nesse texto, o autor mostra que a continentalização e a mundialização do tráfico de drogas nas Américas, sistematicamente atribuídas aos cartéis colombianos e mexicanos dos anos 1980, têm origens mais remotas. De fato, elas têm suas raízes ancoradas no sistema implantado nos anos 1950 pelas máfias marselhesas exportadoras de heroína no continente, nos tempos da French Connection. Do sul ao norte do continente, criminosos franceses expatriados instituíram redes, itinerários e práticas que não desapareceram repentinamente com a queda da filial francesa, no começo dos anos 1970. Ao contrário, os cartéis recém-nascidos da cocaína buscaram integrar os antigos traficantes da French Connection, valorizando suas experiências, antes de aperfeiçoar seus métodos para conseguir novos equilíbrios entre o continente americano e europeu no tráfico internacional de entorpecentes, na virada dos anos 1980-1990.

A virada social dos anos 1980, na história política e social do tráfico de drogas no México, é analisada por Sabine Guez através de sua busca pelo “tempo da inocência”, momento de entusiasmo e de fascinação, assumidos e desenfreados pelos traficantes de drogas em toda sociedade, dentro de classes privilegiadas ou populares. É nesse período complexo que o negócio das drogas atinge seu apogeu, por meio da corrupção, constituindo um tipo de poder que articula altos e baixos escalões do México setentrional. Esse poder adquire uma força considerável, sobretudo, com o desenvolvimento prodigioso do tráfico de cocaína sulamericano e seu trânsito, via México, em direção aos Estados-Unidos. A autora percorre então esses rostos e vozes do presente que remetem ao passado dos anos 1980, articulando, para isso, um trabalho etnográfico e histórico-biográfico. É por meio dessa metodologia que ela interroga a autonomização dos traficantes em relação ao Estado, o mesmo que exercera um controle estrito e forte sobre eles. E defende a ideia de que esse movimento de autonomização dos traficantes é correlato às transformações sociais induzidas, na época, pela multiplicação das participações no tráfico.

A articulação entre história e etnografia também está presente no artigo de Beatriz Brandão e Jonatas Carvalho, que busca problematizar dois conceitos recorrentes – o de “política de drogas” e de “sociedade de controle” – enraizando suas análises tanto no concreto etnográfico do programa De Braços Abertos (Cracolânida-SP; 2014-2016), quanto na história política e social da implementação dos dispositivos de controle e repressão de drogas no Brasil. Nesse artigo, os autores trazem à história os processos e efeitos que são constantemente apagados e, por conseguinte, repetidos pelas políticas públicas em matéria de crack, sobretudo nessa região. Eles salientam a novidade do programa implementado pelo então prefeito da cidade de São Paulo, Fernando Haddad, e situam essas novas ordenações dos modelos de tratamento – como a Redução de Danos e as Comunidades Terapêuticas – dentro de uma história mais complexa de intervenções políticas, feitas na matéria a partir de práticas higienistas e compulsórias. A nova visão do crack trazida pelo programa é confrontada com quadros analíticos e conceituais, como os de “biopolítica” e “programas- pastores”, inserindo-o em uma nova tecnologia liberal da sociedade de controle, a qual está voltada, entre outros, ao controle dos fluxos e ao governo de si.

A atualidade dos dispositivos de acompanhamento de dependentes de drogas e das políticas de redução de danos é articulada, no artigo de Silvia Inchaurraga e Edgardo Manero, a uma reflexão mais abrangente sobre os mecanismos de poder e de controle subjacentes a esses programas. Consagrado à Argentina, esse artigo estuda os efeitos de uma política oficial em matéria de drogas nas últimas décadas, centrada na erradicação do consumo de drogas pela abstinência, no campo sanitário, e pela penalização, no campo legislativo. Tanto as políticas públicas como as principais instituições vinculadas à temática das drogas se sustentam a partir de uma lógica bélica, que instaura a discriminação dos usuários e a construção de uma alteridade social ameaçadora. Esse artigo, escrito por uma psicóloga, diretora do Centro de Estudos Avançados sobre Drogas da Universidade de Rosário, e por um sociólogo, nos dá acesso às principais questões colocadas atualmente no campo da Redução de Danos, na Argentina.

A história das lutas do movimento antiproibicionista colombiano e combinada com uma reflexão semântica e conceitual sobre o termo “pharmakon” nos é proporcionada pelo artigo de Andrés Gongorra, que realiza uma etnografia de grande fôlego (2013-2017), consagrada ao movimento canábico colombiano. O autor mostra como a proibição das drogas no país surgiu com um arranjo sanitário, moral e econômico para monopolizar a produção de remédios e venenos. O conhecimento assim produzido em torno da relação entre as pessoas e o pharmakon – desenvolvido principalmente por especialistas de segurança pública, economia política e saberes psi – desconheceu sistematicamente a agência política dos consumidores e pequenos produtores de drogas. Percorrendo a história da cannabis e de seus defensores, o autor descreve a luta para liberar a planta e permitir a sua reintegração nos espaços da embriaguez tolerada, dos remédios e da indústria.

A história reflexiva sobre as operações de distinção entre substâncias e usuários também encontra um espaço no artigo de Lucas Endrigo Brunozi Avelar, que examina – através de relatos do jesuíta português João Daniel, contidos na obra Tesouro Descoberto no Máximo do Rio Amazonas– como os portadores de uma ideologia religiosa de origem medieval descreveram a embriaguez dos povos indígenas na Amazônia do século XVIII. Nesse artigo, o autor revela as contradições e aproximações entre, de um lado, uma empresa de colonização fundada na produção e comércio de drogas e na tradição alimentar católica assentada no vinho e no pão; e, de outro, uma ideologia do abuso elaborada para dar conta da tradição indígena de ingestão de bebidas e substâncias extraídas da floresta.

As definições e redefinições das drogas na história e as correlações entre drogas e alimentos são tratadas a partir de uma entrevista conclusiva, realizada com o grande historiador do campo no Brasil, Henrique Carneiro, na qual são retomados, desde a antiguidade até hoje, os diversos saberes que se ampararam e contribuíram a forjar os diferentes sentidos atribuídos às drogas. Atributos de divindades, objetos de nomenclatura botânica, produtos secos do comércio do além-mar, fármacos, substâncias ilícitas são os diferentes sentidos aos quais são remetidos esse referente complexo que simplificamos por meio do termo “drogas”. Mas, mais do que um simples referente, as drogas são o objeto de diversas estratégias internacionais, como as comerciais e geopolíticas, tornando-se, na época moderna, os “principais vetores na expansão da navegação, do colonialismo, do escravismo, do consumo de massas e da revolução comercial e industrial”. Sobre a atualidade, o historiador faz um diagnóstico preciso e crítico, no qual localiza os pontos de fraqueza e de força do sistema, e aponta para as forças imanentes que atualmente representam um movimento capaz de desestabilizar alguns pilares do sistema até então enraizados. Por fim, com este conjunto de pesquisas queremos convidar os leitores a uma reflexão crítica e profunda sobre a temática das drogas nas Américas.

Desejamos a todos ótima leitura!

Notas

1. Ver por exemplo o relatório “Guerra às drogas” da Comissão global de políticas sobre drogasde junho de 2011, disponível no site: https: / / www.globalcommissionondrugs.org / reports / the-war-on-drugs /

2. Ver por exemplo : BBC Brasil, “Opioides causam um ‘11 de Setembro’ em mortes a cada três semanas nos EUA” 2 de Agosto de 2017.

Mariana Broglia de Moura

Helidacy Maria Muniz Corrêa


MOURA, Mariana Broglia de; CORRÊA, Helidacy Maria Muniz. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 14, n. 24, 2017. Acessar publicação original [DR]

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América Latina no Século XX: intelectuais, disputas políticas e representações do poder / Outros Tempos / 2016

Neste volume a revista Outros Tempos incluí o dossiê intitulado América Latina no Século XX: intelectuais, disputas políticas e representações do poder, que reúne análises especializadas sobre a história política e o patrimônio histórico do continente produzidas por pesquisadores brasileiros e hispano-americanos. Os artigos abordam temas diversificados a partir de problemáticas, métodos e documentação originais e em estreito diálogo com as perspectivas da história política renovada.

Em Uma nação de estrangeiros: a imigração na Revista de Derecho, Historia y Letras, Camila Bueno Grejo analisa como um setor da elite política e intelectual argentina tratou da questão da imigração no contexto dos debates pela definição da nacionalidade. Em seguida, Maria Antonia Dias Martins, no texto intitulado Jesús Silva Herzog: um intelectual entre o estado e a cultura, analisa a trajetória do economista mexicano Jesús Silva Herzog, enfatizando sua relação com o Estado e sua participação na criação de revistas e da editora Fondo de Cultura Económica. As duas análises trabalham na perspectiva da história dos intelectuais e contribuem com o mapeamento de espaços de sociabilidade e atuação política e cultural dos intelectuais latino-americanos na primeira metade do século XX.

Os historiadores Rolando Alvarez e Verónica Valdivia revisitam um tema fundamental da historiografia contemporânea do Chile: a questão da solidez democrática do país. No texto Repressão ou democratização? A classe dominante chilena frente a crise da dominação oligárquica (1918-1927), Rolando Álvarez aborda o contexto da crise do sistema oligárquico em Iquique, cidade de forte tradição operária localizada ao norte do país. O autor demonstra como os setores dominantes encontraram maneiras para utilizar a violência contra o movimento operários por meio de um sistema político baseado em uma paradoxal relação entre repressão e democratização. Em Subversão e coerção: Esquerdas e direitas nos inícios da democracia chilena do século XX, Verónica Valdivia problematiza a tese da democratização do Chile reavaliando o posicionamento das organizações operárias e de grupos liberais e conservadores a respeito dos direitos sociais e da coerção estatal.

Os artigos de Mayra Coan Lago e Fábio da Silva Sousa analisam as representações dos trabalhadores e o posicionamento de suas organizações sobre os acontecimentos internacionais da primeira metade do século XX. No texto intitulado Revisitando o mundo feliz: um estudo das múltiplas imagens sobre os trabalhadores no Primeiro Peronismo (1946-1955), Mayra Coan Lago demonstra como os discursos políticos de Juan Domingo Perón e de Evita Perón tentaram consolidar determinadas representações dos trabalhadores argentinos com o objetivo de aprofundar a aproximação do governo com esse setor social. Fábio da Silva Sousa, no texto Um cigarro para um amigo: a guerra civil espanhola na imprensa comunista mexicana, explora a visão do jornal comunista mexicano El Machete sobre a Guerra Civil espanhola (1936-1939), proporcionando elementos para a compreensão do impacto desse acontecimento europeu nos discursos e concepções políticas dos partidos comunistas da América Latina.

Por último, o artigo de María Laura Gili, Considerações sobre herança em Villa Nueva (Córdoba-Argentina) em termos de legados sociais, apresenta os resultados de uma pesquisa coletiva e interdisciplinar sobre o potencial cultural da cidade histórica Villa Nueva, localizada na província de Córdoba na Argentina. Trata-se de um trabalho pautado nos métodos da história oral e no diálogo entre história e antropologia, cujo objetivo central é dar visibilidade a determinadas heranças sociais identificadas na cidade e, assim, redimensionar seu valor histórico-cultural.

O presente volume conta ainda com os seguintes artigos livres: “Sem educação não há missão”: a introdução da formação jesuítica no Maranhão e Grão-Pará (Século XVII), de Karl Heinz Arenz; Elogio, imperialismo e dissimulação: os relatos franceses e a natureza brasileira no século XIX, de Luís Fernando Tosta Barbato; O Partido Conservador na província do Paraná: composição social, conflitos internos e transição de comando político em dois diretórios partidários (Curitiba e Paranaguá, 1876-1879), de Sandro Aramis Richter Gomes; Espectros de lutadores: história, memória e imprensa em Sobral / CE no início do século XX, de Jorge Luiz Ferreira Lima; e A invenção do Eldorado maranhense em narrativas de migrantes nordestinos (1930-1970): aportes teóricos metodológicos, de Márcia Milena Galdez Ferreira.

Além dos artigos e integrando a temática do dossiê, publicamos uma entrevista realizada pelas professoras Carine Dalmás e Elisa de Campos Borges com o professor Paulo Eduardo Dias de Mello sobre a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o ensino de História das Américas. Em seguida, apresentamos a proposta de análise documental “Pobre del cantor que no se imponga con su canción”: conexões transnacionais no álbum Trópicos, de Daniel Viglietti (1973), de Caio de Souza Gomes. E, por fim, as resenhas intituladas Transnacionalidad y contactos culturales en una historia de edición: el libro judío en Buenos Aires (Paulina Iglesias) e A história da América Latina sob perspectiva crítica (Romilda Costa Motta)..

Boa leitura!

Carine Dalmás

Elisa de Campos Borges


DALMÁS, Carine; BORGES, Elisa de Campos. [América Latina no Século XX: intelectuais, disputas políticas e representações do poder]. Outros Tempos, Maranhão, v. 13, n. 21, 2016. Acessar publicação original [DR]

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Imagem e imaginário colonial / Outros Tempos / 2016

O presente volume da revista Outros Tempos traz o dossiê intitulado imagem e imaginário colonial, com oito artigos de especialistas no campo da história cultural, da história visual do colonialismo e da história social da fotografia e do cinema. Todos os artigos versam sobre o binômio imagem e imaginário a partir de abordagens variadas e com base em diferentes suportes materiais às imagens, como a imprensa periódica ilustrada, a fotografia e o filme. Ora como fontes, ora como objetos de estudo, as imagens interpelam historiadores e demais especialistas em suas investigações sobre a visualidade do período colonial. Encontra-se no presente dossiê um conjunto de questionamentos sobre a representação imagética da alteridade em situação colonial, sobre aquilo que se busca ver e / ou exibir nos quadros do colonialismo e ainda sobre obnubilações e invisibilidade de certas práticas em territórios sob domínio colonial.

Nas últimas décadas, as imagens têm sido muito usadas em trabalhos acadêmicos que tratam do imperialismo e do colonialismo dos séculos XIX e XX. Filmes, fotografias, cartões postais, série de selos, cartazes, desenhos da imprensa e outros materiais iconográficos oferecem uma panóplia de recursos visuais. Algumas tendências no campo da história visual podem ser observadas em pesquisas sobre a produção e a circulação de imagens da África, da Ásia e da Oceania. Com o desenvolvimento das linguagens visuais modernas como a fotografia e o cinema, os historiadores têm também se interessado pelo balbuciar dessas práticas culturais nos confins dos impérios coloniais.

Os aportes de uma história visual do colonialismo são recentes. Algumas pesquisas nessa área têm contribuído para uma melhor compreensão acerca de uma economia visual e de sua relação com um imaginário colonial. Essa nova historiografia dialoga, igualmente, com os estudos pós-coloniais e com os estudos de gênero. Assim, as pesquisas realizadas têm dado mais ênfase às representações visuais e aos modelos de visualidade durante o colonialismo, com destaque para o agenciamento feminino.

Da lavra de Odile Goerg, professora de história da África contemporânea da Universidade Paris-Diderot, o artigo Visibilidade e invisibilidade dos cinemas na África colonial abre o dossiê. A autora de Fantômas sous les tropiques (2015) destaca em seu artigo as raras evidências das primeiras projeções cinematográficas no continente africano. No segundo artigo, a professora emérita da Universidade de Tours, Christine de Gemeaux, analisa a representação colonial da alteridade feminina no cinema a partir da narrativa da jovem Meg Gehrts sobre a sua viagem ao Togo entre 1913 e 1914. Ainda sobre cinema e colonialismo, Catherine Repussard, mestre de conferência na Universidade de Estrasburgo, trata do filme Tabu, de Friedrich W. Murnau, no terceiro artigo do dossiê. A autora de Utopies coloniales et Modernité (2016) demonstra o des / encanto de um dos principais cineastas do expressionismo alemão ao realizar um filme nos mares do Sul em 1931. De autoria de Maria do Carmo Piçarra, da Universidade de Lisboa, o artigo seguinte versa sobre a instrumentalização do cinema pela propaganda colonial portuguesa à época do Estado. A autora de Azuis Ultramarinos (2015) analisa no seu artigo alguns filmes que foram exibidos em exposições internacionais com o fito de afirmar e legitimar o regime ditatorial de Salazar.

Os próximos três artigos abordam o imaginário colonial por meio de fotografias conservadas nos “arquivos coloniais”. Nádia Vargaftig, professora da Universidade de Reims-Champagne Ardenne (URCA), tratou do acervo fotográfico da Companhia de Moçambique em seu artigo Construção visual de um território colonial. A autora de Des empires en carton (2016) discorre sobre algumas particularidades desse fundo fotográfico guardado na Torre do Tombo. No seu artigo A Souvenir of Lourenço Marques, a doutoranda Inês Vieira Gomes (Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa) analisa imagens de dois álbuns fotográficos. No penúltimo artigo, intitulado Fotografia e alteridade feminina na literatura colonial escrita por mulheres alemãs, a mestre em história cultural (Universidade Federal de Santa Catarina), Ana Carolina Schveitzer, analisa algumas imagens fotográficas de africanas em situação colonial. O último artigo do dossiê, de minha autoria, apresenta uma versão lusitana da Partilha da África por meio de imagens satíricas da imprensa periódica ilustrada de Lisboa.

Para as autoras estrangeiras convidadas a participar do presente dossiê é a primeira vez que seus trabalhos são publicados no Brasil. A revista Outros Tempos logra com este volume divulgar em nível nacional alguns resultados de pesquisas de especialistas reconhecidas em nível internacional. Além dos oito artigos, integra o dossiê uma entrevista com a organizadora do livro O império da visão (2015), a historiadora portuguesa Filipa Lowndes Vicente, atualmente, professora visitante na Brown University.

Fazem ainda parte do referido dossiê as resenhas de Matheus Serva Pereira, Priscila Maria Weber, Thiago Henrique Mota, e Taciana Almeida Garrido de Resende, respectivamente, dos livros Angola: história, nação e literatura (1975-1985); Nzinga Mbandi e as guerras de resistência em Angola (Século XVII); The Walking Qur’an: Islamic Education, Embodied Knowledge and History in West Africa; e, Encontros com Moçambique.

O presente volume conta ainda com os seguintes artigos livres: A contribuição da ciência da história na compreensão de políticas públicas educacionais: uma análise do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) – 2008-2012 (Suseli Cristiane Alves Camilo), As noções de progresso do Império à República: transformações recônditas em uma mesma terminologia (André Nunes de Azevedo), A modernidade e a pós-modernidade como gênese do fascismo: o caso dos velhos e novos integralistas brasileiros (Natália dos Reis Cruz) e Romaria na cidade de Panamá em Goiás: um novo olhar na devoção ao Divino Pai Eterno (Eloane Aparecida Rodrigues Carvalho; Mary Anne Vieira Silva; Eliézer Cardoso de Oliveira).

Boa leitura!

Sílvio Marcus de Souza Correa


CORREA, Sílvio Marcus de Souza. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 13, n. 22, 2016. Acessar publicação original [DR]

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África: gênero, nação e poder / Outros Tempos / 2015

É com grande satisfação que publicamos o presente volume da Revista Outros Tempos, com o dossiê intitulado África: gênero, nação e poder. Nos últimos anos tem sido perceptível o interesse crescente pelo campo dos chamados Estudos Africanos. Nosso intuito foi agregar pesquisadores do Brasil e de países do continente, cujos trabalhos versam sobre relações de gênero, nação e poder, nas mais diversas perspectivas de análise crítica.

No artigo A formação social do estado-nação e a crítica pós-colonial: o surgimento da história crítica em Moçambique, Milton Correia busca perceber como a academia moçambicana tem respondido às relações dinâmicas entre sociedade, história e política. Em Predadores: quando a literatura narra as relações de poder em Angola, Silvio de Almeida Carvalho Filho, a partir do romance escrito por Pepetela, discute como a literatura estrutura uma crítica sócio-política extremamente perspicaz da sociedade e dos estados angolanos contemporâneos. Carla Santos de Carvalho, no artigo A questão de gênero na agenda pública e política de Cabo Verde, analisa o papel das ONGs comprometidas com a igualdade de gênero e com a luta pela defesa dos direitos das mulheres em um contexto de invisibilidade feminina. Tatiana Raquel Reis Silva, em Mercado de Sucupira: práticas comerciais e cotidiano das rabidantes cabo-verdianas, discorre sobre as práticas comerciais, o cotidiano e as estratégias de lucratividade das rabidantes. Patrícia Godinho Gomes desenvolve uma abordagem preliminar sobre a evolução dos estudos de gênero na Guiné-Bissau em O estado da arte dos estudos de gênero na Guiné-Bissau. Viviane de Oliveira Barbosa examina os princípios da política segregacionista na África do Sul durante o regime do Partido Nacional, no artigo Políticas sociais e legislação no apartheid sul-africano. Antonádia Borges apresenta como mobilidade e circulação de pessoas ultrapassa as barreiras impostas pelo colonialismo em Hospitalidade e antropologia na África do Sul contemporânea.

O presente volume também conta com uma seção de artigos livres: Com zelo, inteligência e limpeza de mãos: Eugênio Freyre de Andrade e as Casas da Moeda na primeira metade do século XVIII, de Irenilda Cavalcanti; Colônia-Quilombo: retirantes cearenses e abolicionismo na Colônia Benevides (Pará 1877-1884), de Edson Holanda Lima Barboza; Espaço de religiosidade e traços da modernidade: memórias de moradores do Pântano do Sul (Florianópolis / SC 1970 – 1980), de Mariane Martins; Uma higiene moral e do corpo: educação moral e cívica, as atividades físicas, esportivas e de lazer durante a ditadura militar, de Reginaldo Cerqueira Sousa e História e Memória: quadro antigo do cemitério ecumênico São Francisco de Paula, de Bruna Frio Costa e Carla Rodrigues Gastaud.

Além dos artigos, ofertamos ao(a) leitor(a) uma entrevista realizada por Michelle Cirne Ilges com a professora Teresa Cruz e Silva, sobre A Agência do Codesria na produção das Ciências Sociais no continente africano. Duas análises de documento – Testemunhos de violência num registro judicial durante a ocupação colonial no norte de Moçambique (Fernanda do Nascimento Thomaz); e Luanda 4 de fevereiro de 1961: o olhar dos Estados Unidos (Fábio Baqueiro Figueiredo) – e uma resenha intitulada Identidades em questão: escravidão, liberdade e pertencimento no mundo atlântico (Daniela Carvalho Cavalheiro) fecham o volume.

Boa Leitura!

Tatiana Raquel Reis Silva

Teresa Cruz e Silva


SILVA, Tatiana Raquel Reis; SILVA, Teresa Cruz e. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 12, n. 19, 2015. Acessar publicação original [DR]

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O Congresso de Viena e a América portuguesa / Outros Tempos / 2015

O Dossiê O Congresso de Viena e a América portuguesa, ora apresentado pela Revista Outros Tempos, pode ser considerado como um dos desdobramentos do The Congress of Vienna and its Global Dimension (El Congreso de Viena y su dimensión global), realizado na Universidade de Viena, entre 18 e 22 de setembro de 2014.

Organizado pela Asociación de Historiadores Latinoamericanos y del Caribe (ADHILAC), o evento reuniu cerca de 200 pesquisadores de diversas partes do mundo, ocupados em refletir sobre o Congresso de Viena a partir de múltiplas possibilidades.

Nesse contexto, pesquisadores cujos trabalhos dedicavam-se às articulações entre o Congresso de Viena e a dinâmica política e econômica da América portuguesa vislumbraram a possibilidade de reunir esses trabalhos em torno de um dossiê.

O resultado pode ser conferido nessa edição da Revista Outros Tempos. O Dossiê O Congresso de Viena e a América portuguesa conta com artigos dos seguintes pesquisadores / instituições: André Augusto da Fonseca (Universidade Estadual de Roraima); Christian Cwik (University of the West Indies, St. Augustine Campus, Trinidad and Tobago); Luiz Alberto Couceiro e Rejane Valvano Corrêa da Silva (Universidade Federal do Maranhão); Michael Toussaint (University of the West Indies, St. Augustine Campus, Trinidad and Tobago); Vera Lúcia Vieira (Pontifícia Universidade Católica – São Paulo); e Wilma Peres Costa (Universidade Federal de São Paulo). A edição traz ainda outros produtos relacionados ao Congresso de Viena: um Estudo de Caso (Marcelo Cheche Galves / Universidade Estadual do Maranhão); uma resenha (Romário Sampaio Basílio / mestrando na Universidade Nova de Lisboa) e a entrevista com Dale Tomich, professor da Universidade Estadual de Nova York, em Binghamton, e referência nos estudos sobre a segunda escravidão.

Na seção de artigos livres, este número traz 7 artigos. Em ANTES DA PIANOLATRIA: flautas, violas e tambores nas práticas musicais da primeira metade do século XIX, Marcos Lobato Martins (Prof. Dr. UFVJM) foca a análise nas práticas musicais, especialmente a viola, os violeiros e as modinhas em Minas Gerais; em PARA ALÉM DAS FRONTEIRAS DO GRÃO-PARÁ: o peso das relações entre as províncias no xadrez da independência (1822-1825), o Prof. Dr. André Roberto de Arruda Machado (UNIFESPA) aborda relações entre províncias vizinhas e território em tempos de independência; em A OCUPAÇÃO DA TERRA NAS NARRATIVAS DE CARMO BERNARDES E JOSÉ MARIA AUDRIN: sertão dos vales do Araguaia e Tocantins (1900 -1950), Olívia Macedo Miranda Cormineiro (doutoranda em História SocialUFU) discute a ocupação da terra por sertanejos pobres no sertão dos vales dos rios Araguaia e Tocantins, a partir de uma incursão pela linguagem ficcional e memorialística; em “EU MORO COM MEUS PAIS”: as representações da família realizadas pela juventude roqueira da década de 1980, Gustavo dos Santos Prado (Prof. da FAG-PR e doutorando PUC-SP) aborda o movimento juvenil da década de 1980, com ênfase nos temas juventude e família; em BUMBA MEU BOI DO MARANHÃO NOS JORNAIS LUDOVICENSES: notícias da construção de uma inserção (1980- 2000), Júlia Constança Pereira Camêlo (Prof. Dra. UEMA) discute a política cultural relativa ao bumba-meu-boi no Maranhão através da imprensa; em A IGREJA CATÓLICA E AS DITADURAS DO CONE SUL (1960-1980), o Prof. Dr. Enrique Serra Padrós (UFRGS) apresenta uma introdução panorâmica da relação Igreja-Estado no período das ditaduras de segurança nacional do Brasil, Chile e Argentina; e, finalmente, a Prof Dra. Vera Lúcia Ferreira Vargas (UFMS) em HISTÓRIA E MEMÓRIAS REACENDIDAS: a apropriação Terena da escola aborda apropriação da escola pelos Terena no Mato Grosso do Sul, as ações realizadas para fortalecê-la junto à comunidade indígena e, principalmente, junto à sociedade envolvente.

Boa leitura a todos.

Christian Cwik

Marcelo Cheche Galves

Márcia Milena Galdez Ferreira


CWIK, Christian; GALVES, Marcelo Cheche; FERREIRA, Márcia Milena Galdez. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 12, n. 20, 2015. Acessar publicação original [DR]

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O colapso das ditaduras: rupturas e continuidades / Outros Tempos / 2014

Os cinquenta anos do Golpe Militar de 1964 desencadearam uma avalanche de eventos acadêmicos, publicações especializadas, programas televisivos e revisitação às memórias dos “vencedores” e dos “vencidos” em torno dos elementos explicativos do movimento que não só destituiu o presidente democraticamente eleito, João Goulart, como também instituiu um regime que perdurou no Brasil por mais de duas décadas. Esse intenso movimento de vistoria dos meandros da Ditadura Militar brasileira foi ainda intensificado pela atuação da Comissão da Verdade. Nesse frenesi explicativo, muitas foram as interpretações que se sobrepuseram. Historiadores, Cientistas Políticos, Jornalistas, entre outros “especialistas”, buscaram nas mais distintas dimensões as explicações para a brusca alteração institucional que se instalou no pós-1964. Questões como a atuação dos aparelhos repressivos, os fundamentos e crise do “milagre econômico”, a denúncia dos casos de tortura, o processo de anistia e de abertura lenta, gradual e segura, vieram a tona e romperam os limites do mundo acadêmico, passando a frequentar o cotidiano nacional. Emergem até mesmo dos agentes da repressão, em um claro processo de mea culpa, testemunhos que corroboraram as denúncias de presos e torturados nos porões da Ditadura.

Em meio a essa explosão de informações, o revisionismo historiográfico ganhou espaço. A Ditadura não é somente Militar, mas Civil-Militar. O regime só durou tanto tempo porque estava sustentado por um amplo apoio da sociedade brasileira. Diluem-se os sujeitos da História. Apagam-se as responsabilidades. Afinal, a “Ditabranda” nem durou tanto tempo assim. O fim do A.I.5 em 1979 seria, nessa perspectiva, o marco final do regime instaurado em 1964.

Os artigos que compõem o dossiê da Revista Outros Tempos, vol. 11, n. 17, O Colapso das Ditaduras: Rupturas e Continuidades, organizado pelos professores Monica Piccolo (UEMA) e Renato Lemos (UFRJ), caminham em outra direção. Em busca do entendimento do regime instaurado em 1964, e do processo que, vinte anos e um anos depois, levou à eleição indireta do primeiro governo civil desde 1960, e, finalmente, ao fim da ditadura em 1988, os sujeitos voltam à cena. As bases de apoio ao regime, identificadas. Os movimentos sociais que tiveram papel central no retorno dos militares aos quartéis, recuperados. A conceitualização do regime, problematizada. Os fundamentos da Transição, investigados. Os casos de tortura, analisados com novo corpus documental. Os alicerces do revisionismo, desnudados. As continuidades, pintadas com tintas tão fortes quanto as das rupturas. Outras realidades históricas, para que o caso brasileiro não seja considerado de forma insulada, analisadas.

O Dossiê, assim, inicia-se com as investigações acerca da atuação dos aparelhos repressivos e da Comunidade de Informações nucleada em torno do SNI. Eduardo Chaves, no artigo “Em sintonia fina: conversas entre velhos amigos da caserna” examinou a coleção de entrevistas intitulada “1964 – 31 de março: o movimento revolucionário e a sua história”, verificando como se deu a narrativa em relação ao golpe e a ditadura empresarial-militar iniciada em março de 1964 e como essa mesma narrativa foi sendo construída pela coleção a partir da elaboração das entrevistas marcadas pela elaboração de um parecer positivo sobre o passado recente do Brasil. Na mesma perspectiva, Mauro Teixeira, no artigo “Inês é Viva: testemunho e esquecimento durante a transição brasileira” trabalhou com as denúncias de sequestro, tortura e cárcere privado formuladas por Inês Etienne Romeu, em 1981, contra agentes dos órgãos de segurança brasileiros que a haviam capturado dez anos antes. Foram analisadas, ainda, as reações das elites militares e civis frente ao depoimento. A atuação dos órgãos repressivos também foi tema do artigo de Daniel Samways, “O Anticomunismo do Serviço Nacional de Informações na Ditadura Civil-Militar brasileira” no qual foi analisado o discurso anticomunista e de combate à subversão como uma das bases da regime ditatorial durante longos 21 anos de violência e terrorismo estatal, segunda a periodização adotada pelo autor. Combater os comunistas e sua doutrina, o comunismo, foi aqui caracterizado como uma das principais metas dos aparelhos repressivos e de informações que buscavam mapear e reprimir supostos subversivos, usando, em muitos casos, de métodos de tortura para obter informações. Neste sentido, a comunidade de informações, que tinha no Serviço Nacional de Informações seu principal órgão, buscou também reforçar uma imagem negativa do comunismo.

Ampliando geograficamente o foco de análise e debruçando-se sobre a atuação dos aparelhos repressivos na Argentina, Jorge Fernández, no trabalho “Recuerdos Imborrables: do Golpe ao Exílio, as marcas do Terrorismo de Estado nas memórias dos emigrados argentinos no Rio Grande do Sul” investigou a atuação do governo que, seguindo os preceitos da Doutrina de Segurança Nacional, implantou o Terror de Estado (TDE) deixando profundas sequelas nas subjetividades daqueles que se exilaram. Para tal aproximação foram utilizadas, como fonte privilegiada, as memórias daquele tempo na forma das narrativas (re)elaboradas por antigos emigrados e conjugadas na dinâmica do tempo presente. As relações entre História e Memória também estão presentes no artigo de Marcos Oliveira Tolentino, “Memória, Verdade e Justiça: apontamentos para uma história do movimento argentino pelos direitos humanos (1976-2004)” no qual foi investigada a trajetória do movimento argentino pelos direitos humanos que, embora exitosa, não esteve no centro da contemporânea produção acerca das memórias e da história da mais recente ditadura empresarial- militar. Consequentemente, pôde ser percebida a consolidação de uma memória do movimento que obliterou os conflitos. Pensando nisso, o autor buscou questionar o silêncio acerca da participação dos sobreviventes dos centros clandestinos de detenção na memória do movimento.

A discussão conceitual sobre o regime instaurado em 1964 foi o tema central do artigo de Felipe Demier, “A ditadura bonapartista do grande capital: a questão dos regimes políticos nas interpretações históricas” que abordou as análises produzidas pelas ciências sociais brasileiras que interpretaram a ditadura militar brasileira como um regime de natureza bonapartista. Nesse sentido, o texto buscou recuperar a importância da discussão sobre os regimes políticos – em especial, do bonapartismo – para o processo de investigação historiográfica acerca do processo político brasileiro contemporâneo.

Os últimos artigos do Dossiê debruçam-se especificamente sobre o processo de transição política, não só no Brasil, como também na Espanha e em Portugal. Recuperando a importância dos movimentos das classes trabalhadoras, Marcelo Badaró em “Os trabalhadores brasileiros e a contrarrevolução democrática” analisou a trajetória das lutas coletivas e das organizações constituídas pela classe trabalhadora urbana brasileira desde o período final da ditadura militar, avaliando o papel dos trabalhadores e as estratégias empregadas pela classe dominante para remodelar a forma de dominação de classes desenhada no processo “contrarrevolução democrática”, desde a década de 1980 até o presente. Na mesma linha de investigação, as especificidades do caso espanhol e o protagonismo da classe trabalhadora na Transição são retratados por Javier Tébar Hurtado no artigo “Franquismo y Antifranquismo en el final de la Dictadura española” que se propôs a construir uma aproximação do significado histórico do Franquismo e do Antifranquismo nos anos finais da ditadura. Foi questionado o “caráter amável” da ditadura através da análise da relação entre a “resistência ordinária”, a oposição da classe trabalhadora orientada e organizada, e os instrumentos repressivos ditatoriais. Também foram investigados os legados do franquismo e destacada a importância dos arquivos para o exercício de um dos direitos de cidadania: o conhecimento do passado.

O caso português é o tema do artigo de Raquel Varela, António do Paço e Joana Alcântara, “A Revolução dos Cravos: Revolução e Democracia, um debate” no qual foi realizada uma sistematização das principais características / causas da revolução portuguesa, argumentando que as mudanças sociais estão na origem das rupturas governativas e a incapacidade de acordos institucionais prende-se à inviabilidade de conjugação de projetos políticos impossibilitados pela dinâmica do movimento social, e não o seu inverso. Numa segunda parte do artigo foi analisado o impacto do processo contrarrevolucionário – o pacto social – iniciado a partir de Novembro de 1975 e consagrado na Constituição de 1976, mantido por causa da intensa conflituosidade herdada da revolução – 10 governos em 10 anos, entre 1976 e 1985. A Transição brasileira, em perspectiva comparada com a portuguesa, é tema do artigo de Valério Arcary, “O Outro 25 de Abril e as Diretas Já” no qual os (des)caminhos dos processos de transição dos regimes ditatoriais rumo à democracia no Brasil e em Portugal foram investigados a partir do pressuposto de que os movimentos 25 de Abril em Portugal e as “Diretas Já” no Brasil foram os mais destacados expoentes da mobilização popular nos dois países. Apresentou-se como fundamento a ideia de que nos dois países, seus planos de transição controlada “pelo alto” foram subvertidos pela mobilização “por baixo”. Assim sendo, os regimes ditatoriais, em que pesem as negociações desenvolvidas ao longo do processo, foram derrotados pelas forças sociais que entraram em cena e deslocaram as relações de forças vigentes até então.

Para encerrar essa radiografia dos regimes ditadoriais e seus respectivos processos de crise, Gilberto Calil no artigo “Elio Gaspari e o elogio da transição conservadora” dialogou diretamente com uma das obras sobre a ditadura que mais espaço conquistou na grande mídia. Analisou criticamente a interpretação do jornalista Elio Gaspari que considera que os generais Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva impulsionaram o processo de democratização, como hábeis condutores de um processo que superou desafios diversos e propiciou um avanço na transição para a democracia. Propôs, ao contrário, uma revisão crítica do projeto de abertura, da forma como se relacionou com os diferentes grupos políticos e do papel desempenhado pela repressão durante o período em foco, considerando que o projeto distensionista visava criar condições para uma transição que garantisse a consolidação e institucionalização do legado da ditadura e garantisse a impunidade aos agentes da repressão mesmo após a passagem do poder aos civis.

Esperamos que a leitura dos artigos apresentados possa não só lançar novas luzes sobre o regime ditatorial implementado no Brasil em 1964 e na Argentina em 1976 como também sobre o processos de Transição brasileiro e Ibérico. Quiça não tenhamos que esperar por mais meio século para que o revisionismo asséptico, monolítico e impessoal venha a ser definitivamente posto de lado em nome de uma História plural, ceifada por embates, repleta de sujetos e, principalmente, problematizada.

Monica Piccolo

Renato Lemos


PICCOLO, Monica; LEMOS, Renato. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 11, n. 17, 2014. Acessar publicação original [DR]

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Impressos, edição, circulação e leituras destes e de outros tempos / Outros Tempos / 2014

A Revista Outros Tempos chega aos dez anos de existência com muito a comemorar, mas também com enormes desafios. De um projeto experimental, iniciado em 2004, até aqui, muito se caminhou. Em 2008, tornou-se semestral, ano em que também foi instituída a prática dos Dossiês, organizados a partir das mais variadas temáticas e, a partir de 2013, contando com a participação de um organizador convidado de outra Instituição. Nesse número, o Dossiê Impressos, edição, circulação e leituras destes e de outros tempos conta com a co-organização de Giselle Martins Venancio, da Universidade Federal Fluminense.

Juntos, propusemos a construção de um mosaico a partir de pesquisadores de diversas Instituições, nacionais e internacionais, dedicados ao circuito que envolve o mundo da impressão e da leitura.

Na parte 1, denominada Geografias do livro: espaços, circulação e leitura na América e Europa, o foco recai sobre os espaços que os impressos ocupavam, como: a Livraria da Casa do Correio no Maranhão (Marcelo Cheche Galves) e o Gabinete Português de Leitura (Cesar Augusto Castro e Samuel Luis Velázquez Castellanos), ambos na cidade de São Luís; a Biblioteca do Liceu da Parahyba do Norte (Claudia Engler Cury) e do Conde da Ega, em Lisboa (Claudio Luiz Denipoti); ou ainda as ruas de Buenos Aires no final do Setecentos (Maria Verónica Secreto). Na parte 2, Histórias de homens e livros: coleção, edição e textos na América e na Europa, o leitor poderá acompanhar a trajetória de algumas coleções como: Bibliotheca Constitucional do Cidadão Brasileiro (Luiz Fernando Saraiva), Salgari (Nuno Medeiros), Brasiliana (Giselle Martins Venancio) e Reconquista do Brasil (Gisella Amorim Serrano).

Ainda no âmbito do Dossiê, apresentamos: duas resenhas (por Mariana Rodrigues Tavares, O que é um autor. Revisão de uma genealogia. Roger Chartier; e, por Valério Negreiros, A Feira dos Mitos: a fabricação do folclore e da cultura popular. Durval Muniz Albuquerque); um estudo de caso sobre um publicista radicado no Maranhão na transição do mundo luso-brasileiro (Yuri Costa); e, por fim, brindamos o leitor com a entrevista de Jean Yves Mollier (Os processos de edição: do século XIX ao XXI).

Na seção de artigos livres, mais diversa por concepção, apresentamos Brasis, de tempos e localidades distintas: no Oitocentos, a questão do trabalho no Cariri cearense (Ana Sara Ribeiro Parente Cortez Irffi) e a questão indígena na província de Goiás (Maria de Fátima Oliveira e Leandro Mendes Rocha); no século XX, os viajantes do Mato Grosso (Nataniél Dal Moro) e as identidades pantaneiras (Ilsyane do Rocio Kmitta), as lutas camponeses no Sul do Pará (Fábio Tadeu de Melo Pessôa) e o corporativismo no governo Vargas (Pedro Paulo Lima Barbosa).

Boa leitura!

Giselle Martins Venancio

Marcelo Cheche Galves


VENANCIO, Giselle Martins; GALVES, Marcelo Cheche. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 11, n. 18, 2014. Acessar publicação original [DR]

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Sertão: espaço de fronteiras, convergências e mundo divergente / Outros Tempos / 2013

A Revista de História Outros Tempos, em seu número 15, volume 14 continua sua reformulação iniciada no número anterior. Canal de diálogo permanente de pesquisadores, esta edição trás artigos de quase todas as regiões do país, além de um do Canadá e outro do Caribe.

Com a diversidade que lhe é peculiar, a Outros Tempos publica artigo de Márcia Medeiros e Tânia Zimmermann que nos mostram a representação da figura feminina em uma análise do Conto do Homem do Mar, da obra Os Contos da Cantuária de Geoffrey Chaucer. Já Roberval Santiago e Mariléia dos Santos Cruz nos conduzem ao universo da Escola. O primeiro autor desvela as tramas da (con)vivência no pátio escolar, e Mariléia dos Santos investiga a expansão escolar em Imperatriz, o segundo município maranhense mais importante, enquanto Roberto Borges nos mostra a importância da manihot esculenta crantz ou, simplesmente, a farinha de mandioca, presente na dieta de milhões de brasileiros, e expõe a implicância de João Daniel contra o plantio da maniva e a intransigente defesa do cultivo de trigo na Amazônia.

A sequência dos artigos que compõem o dossiê deste número dedica-se ao estudo do sertão. Verbete intrinsecamente ligado à nossa história, ao cancioneiro popular, às artes cênicas, consolidado na literatura, este termo esteve presente no imaginário de viajantes e catequéticos. Sertão, sempre em oposição ao litoral, à ordem, à civilização, em outras palavras, ao que estar por ser ocupado e dominado pelos saberes. Conceito presente em documentos oficiais relativos à América portuguesa pelo menos desde 1534, a exemplo da Carta de doação da Capitania de Pernambuco.

Este Dossiê é aberto por Albertina Vicentini com artigo O sertão em Inocência de Taunay que, em 1872 apresentava o sertão como uma categoria do pensamento social brasileiro. Rafael Chambouleyron escreve sobre a polissemia dos termos sertão e sertanejo na Amazônia colonial. Marcos Clemente se utiliza da expressão euclidiana “Terra Ignota” para falar das representações elaboradas sobre o cangaço e o sertão na primeira metade do XX. Gustavo Alonso chega ao sertão por meio da sonoridade, analisando a distinção entre música caipira e música sertaneja. Elaine Pereira Rocha biografa a “sertaneja Leolinda Daltro”, como a denominou Dunschee Abranches (1959). Leolinda catequizou índios pelo sertão de Goiás e os hospedou quando estes iam ao Rio de Janeiro. Tal acolhida lhe causou desafetos como Lima Barreto que se inspirou na professora para criar a personagem Florinda. Fátima Oliveira e Marcelo de Melo viajam pelo sertão a partir do olhar de um viajante, Auguste de Saint Hilaire. Analisando um sertão não cartografado e do que há para além dessa ideia geográfica Robson William Potier mostra a construção do sertão segundo os cordéis de João Martins de Athaíde, poeta e editor. Encerrando o dossiê, Nielson Bezerra analisa um sertão próximo ao Rio de Janeiro, na passagem do Império para a República, a partir de um corpus documental da Casa de Detenção. Apresentamos ainda nossa entrevista com o professor doutor da Universidade do Vale do Rio Doce, Haruf Salmen Espíndola, autor da obra Sertão do Rio Doce, publicada pela edusc / univale. Daniel Rincon Caires resenha o livro O Alufá Rufino: tráfico, escravidão e liberdade no Atlântico negro (c.1822- c.1853), escrito por João José Reis, Flávio dos Santos Gomes e Marcus Joaquim Maciel de Carvalho, em 2010.

Por fim, a capa desta edição é uma homenagem a todos (as) que fazem o Curso e a Pós Graduação de História. Após treze anos recebemos a tão sonhada sede.

A todos boa leitura!

Alan Kardec Gomes Pachêco Filho.

Helidacy Maria Muniz Corrêa.


PACHÊCO FILHO, Alan Kardec G.; CORRÊA, Helidacy Maria Muniz. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 10, n. 15, 2013. Acessar publicação original [DR]

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As ditaduras militares no Cone Sul / Outros Tempos / 2013

Organizada em conjunto com o Prof.Dr. Enrique Serra Padrós, a Revista de História Outros Tempos, neste número 10 volume 16, firma novas parcerias com pesquisadores de diferentes IES do Brasil e da América do Sul. De Aquidauana (MS), Vera Lúcia Vargas e Iára de Castro trazem uma nova história indígena do Brasil, protagonizada por John Monteiro, na qual mostram o índio como sujeito histórico. De Aracajú (SE), Dilton Maynard, investiga as efemérides do centenário de Delmiro Gouveia, considerado o modernizador dos sertões alagoanos e denominado o “Coronel dos Coronéis”. De Leopoldina (MG), Izabella de Sales e Arnaldo Zangelmi, analisam a formação de uma elite no sertão do São Francisco, no termo de Pitangui (MG), na primeira metade do século XVIII. De São Luís (MA), Monica Piccolo discute o processo de privatização brasileiro iniciado no Governo de Fernando Collor de Mello. Ainda de São Luís (MA), Henrique Borralho faz uma reflexão sobre o papel do conhecimento histórico para se fixar na compreensão das relações humanas, sua crise, transformação e importância da História. Além dos temas livres acima referidos e, às vésperas de completar meio século do Golpe Militar de 1964, a Outros Tempos trazem Dossiê dedicado às ditaduras militares instaladas no Cone Sul da América. De Santiago de Chile, Karen Donoso demostra uma faceta da ditadura liderada por Pinochet, instituindo políticas culturais cujo objetivo era manter o controle sobre a produção cultural, afastar qualquer influência marxista e promover a minimização do Estado, dentro de seu projeto neoliberal. De Córdoba (AR), Marta Philp analisa o “Proceso de Reorganización Nacional” e expõe o esforço feito pelos militares argentinos ao buscarem uma legitimação para suas ações sob a denominação de “democracia substancial a democracia dos melhores em oposição à demagogia”. De Buenos Aires, três pesquisadores nos brindam com reflexões sobre a ditadura argentina. Inés Nercesian aborda o “mapa politico regional” resultante do cerco das ditaduras no Cone Sul da América. Débora D’Antonio fundamentada em memórias e cartas de expresos políticos investigou as negociações feitas por esses indivíduos na prisão de Villa Devoto. Nicholas Rauschenberg apresenta a “teoria dos dois demônios” e as posições assumidas por duas intelectuais sobre o atual debate argentino em torno da justiça penal para os agentes do regime. A brasileira e estudiosa da ditadura chilena de Pinochet, Elisa Borges, de Diamantina (MG), se detém nos Cordones Industriales, para refletir sobre sua intrínseca ligação com a origem dos partidos comunista e socialista chilenos, desnudando a suposta existência de um “braço armado” do governo nas fábricas. De Porto Alegre, Enrique Padrós e Sílvia Simões examinam os procedimentos da ditadura brasileira nos eventos que antecedem o 11 de setembro de 1972, no Chile. Das barrancas do rio Araguaia, de Araguaína (TO), Euclides Antunes traz as memórias da Guerrilha do Araguaia. Por fim do Crato (CE), Sônia Meneses pesquisouas páginas da Folha de São Paulo para analisar as comemorações de 30 e 40 anos do Golpe de 1964.

O entrevistado deste número é o maranhense Manoel da Conceição Santos, um dos mais importantes líder camponês de toda a história do Brasil, radicado no município de João Lisboa(MA), para entrevista-lo contamos com a inestimável colaboração do escritor, historiador, advogado e editor Adalberto Franklin, a quem agradecemos publicamente. Caio Lima, de Natal, resenha o livro História, memória e violência patrocinada pelo Estado: tempo e justiça, escrito por Berber Bevernage, em 2012. De Dourados (MS), Eduardo Salgueiro resenha o livro Teoria e Metodologia em Debate: Maneiras de “Ver” e “Fazer” História, escrito por José D’Assunção Barros, 2013.

A capa desta edição da Outros Tempos é ilustrada com uma charge de Latuff (2010). Não podemos aceitar sob qualquer hipótese a ideia de apagar da memória das sociedades que habitam o Cone Sul da América, as atrocidades cometidas pelas ditaduras aqui instaladas.

A todos boa leitura!

Alan Kardec Gomes Pachêco Filho.

Enrique Serra Padrós.

(Organizadores)


PADRÓS, Enrique Serra; PACHÊCO FILHO, Alan Kardec G. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 10, n. 16, 2013. Acessar publicação original [DR]

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Poderes Locais na América portuguesa / Outros Tempos / 2012

Nesta edição (volume 09, número 14), a Revista Outros Tempos abre o debate com quatro instigantes áreas, a saber: cinema, teatro, literatura e história política. Usando uma escala de aproximação entre História, Antropologia e cinema Roseline Mezacasa analisa o filme boliviano “La Nación Clandestina” para discutir tensões e conflitos interétnicos que envolvem indígenas e não indígenas bolivianos. O foco é a relação entre a comunidade indígena Aymara e a não índia da Bolívia e o problema centra-se na permanência do colonialismo interno boliviano após os processos de independências. Aos conhecedores do filme, o artigo provoca a memória e estimula os sentidos na associação entre texto e imagem. Aos que ainda não assistiram ao filme, o texto incentiva pela leveza literária e profundidade analítica. Uma análise específica de uma comunidade indígena boliviana, mas nada restritiva. Para ambos, Roseline deixa um belo exercício de análise fílmica. Na segunda interlocução desse debate, Camila Maria Bueno Souza retira do teatro um substrato analítico para a História. Converge o diálogo entre o polonês Ziembinski e o crítico teatral Décio de Almeida Prado para refletir acerca do papel formador da crítica na década de 1950, chamando atenção para a historicidade da escrita e das encenações. Ainda contribuindo com as possibilidades históricas, Dorval do Nascimento se detém em uma obra de Nascimento Moraes para problematizar as relações entre campo literário e político. O agente no caso é um meio para uma reflexão a respeito das práticas e das circunstâncias que envolvem a produção e a atividade intelectual. O debate desta seção se encerra na perspectiva da história política com Maria Izabel Oliveira, Rodrigo Silva e Lucas Mariani Corrêa. A primeira faz uma analogia entre vida política e vida privada do monarca por meio do contextualismo linguístico e questiona um dos dilemas que envolvem o exercício do poder monárquico: a vida amorosa dos príncipes prejudicaria seu poder? O segundo autor centra sua discussão no processo de transferência da capital mineira. Finalizando a seção, Lucas Mariani se detém na Companhia de Viação São Paulo-Mato Grosso, na primeira metade do século XX para pensar a relação entre o processo de implantação da referida Companhia e as diretrizes políticas nacionais para a região.

O dossiê desta publicação trata dos Poderes Locais na América portuguesa. As atuais investigações historiográficas a respeito da temática proposta têm revelado que por trás da complexidade das relações locais está uma noção de poder ligado às ações, atividades, funções, pessoas e valores culturais (SHILS, 1970) que de alguma forma se circunscrevem a uma esfera institucional. É nessa perspectiva que os artigos dessa seção exploram assuntos tais como: as ações dos primeiros camaristas de São Luís na tentativa de consolidar o domínio português do território (Helidacy Corrêa); as atividades exercidas pela família Carneiro, na capitania de Pernambuco, Ceará e Rio Grande, para ascender socialmente e se manter no poder (Ana Lunara Morais); os discursos inacianos com vista a analisar as representações simbólicas que encerram os fundamentos escriturários das práticas missionárias (Roberta Lobão); as fugas de escravos e os debates entre autoridades ibéricas em torno da devolução de cativos na bacia platina (Hevelly Acruche) e, por fim, o dossiê encerra o debate sobre com uma reflexão sobre as estratégias utilizadas pela elite da capitania de São José do Piauí na instituição de seu poder (Rodrigo Fonseca). Com este dossiê, a Outros Tempos contribui para a ampla divulgação de pesquisas sobre os poderes locais em diferentes tempos e espaços na América portuguesa.

A partir deste número, a Outros Tempos trará aos seus leitores a seção Estudo de Caso, em substituição à seção Documentos. A proposta está bem explicitada no texto de Marcia Mello no qual a autora analisa o documento intitulado “Regimento que ha de guardar e observar o Procurador dos Índios do Estado do Maranhão”. Associando exercício de transcrição e de análise, a referida autora se detém no documento para examinar a política portuguesa traçada para os índios da América Setentrional. Por meio de duas resenhas, a Outros Tempos divulga a seus leitores as obras de Marcella Lopes de Guimarães e de Eduardo França Paiva, juntamente com Isnara Pereira Ivo e Ilton Cesar Martins que tratam, respectivamente, de assuntos teórico-metodológicos e de escravidão.

Por fim, convidamos nossos leitores a ler nossa entrevista com Maria Fernanda B. Bicalho, professora doutora coordenadora do Programa de Pós-graduação em História da Universidade Federal Fluminense, autora de diversos livros e artigos, especialista em História do Brasil voltada para o período colonial.

Cabe ainda uma ressalva: durante a produção deste e exemplar, a Revista Outros Tempos iniciou um novo projeto gráfico-editorial e no layout de nosso site com vista a dar mais suporte aos leitores na difusão dos textos. Assim, foram feitas algumas solicitações – apesar de não estarem contempladas nas normas de publicação até então vigentes – prontamente atendidas pelos autores deste volume. Tais inserções serão percebidas por nossos leitores e anunciam as reformulações pelas quais este periódico passa. Queremos publicamente agradecer a disponibilidade dos autores em colaborar.

Alan Kardec G. Pachêco Filho

Helidacy Maria Muniz Corrêa

Organizadores


PACHÊCO FILHO, Alan Kardec G.; CORRÊA, Helidacy Maria Muniz. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 9, n. 14, 2012. Acessar publicação original [DR]

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História e Cidade / Outros Tempos / 2012

O curso de História da Universidade Estadual do Maranhão tem o prazer de apresentar a estudantes, pesquisadores, historiadores e demais interessados o volume 09, número 13 da Revista Outros Tempos: pesquisa em foco, contendo artigos desenvolvidos a partir de variadas temáticas e abordagens históricas, notadamente, nos domínios da Teoria da História, História Política, História Social e História Cultural, além de um dossiê dedicado à História e Cidade.

A organização deste número traduz não só a consolidação de uma longa trajetória de trabalho desenvolvido pelo Curso História, mas, sobretudo, a força da renovação da historiografia brasileira. Os artigos aqui reunidos potencializam o debate historiográfico realizado por pesquisadores de diferentes programas de pós-graduações. Na primeira sessão da Revista, o diálogo se estabelece a partir das abordagens de Gilberto Cézar de Noronha sobre a importância da historicização das formas de representação do espaço. José Inaldo Chaves Júnior, com base nos atuais aportes teórico-metodológicos enfoca o processo politico-administrativo vivido pela capitania da Paraíba no início do século XVIII a partir das noções de redes, vínculos e tensões estabelecidas na América portuguesa. Valdinea de Jesus Sacramento se apropria dos instrumentais histórico-antropológicos para analisar as práticas repressivas empregadas pelos segmentos senhoriais e autoridades sul-baianas na destruição de quilombos oriundos no norte da Comarca de Ilhéus, durante as primeiras décadas do século XIX. Francisco Chagas Atanásio apresenta um exercício relacional entre História, literatura e memória para discutir as elabor-ações e percepções das experiências do coronelismo no Brasil. Com Isabel de Souza Lima Barreto, o debate se conecta com outras paragens, especificamente, Angola na década de 1970, para refletir acerca dos desafios enfrentados pelos migrantes angolanos no processo de adaptação ao Brasil.

Com uma proposta de debates aberta quanto às percepções espaciotemporais, o dossiê deste número ao mesmo tempo em que presta uma homenagem aos 400 anos da cidade de São Luís propõe ao leitor uma ampla e diversificada reflexão acerca da relação entre História e Cidade. Partindo da premissa de que o espaço urbano é o ambiente onde a pluralidade das experiências dos sujeitos históricos se encontra, confronta e / ou conforma, cada autor “construiu aqui sua cidade”. Cidades de ontem e de hoje muitas vezes desconhecidas, esquecidas e / ou ocultas dos leitores com personagens, instituições e atividades inexploradas, mas que por meio das problematizações eleitas conforme os pressupostos teórico-metodológicos de cada autor se reencontram e se confrontam com seu passado.

Carlos Gregório dos Santos Gianelli nos apresenta elementos conceituais que considera fundamentais para o entendimento da lógica urbana tais como: cultura, cultura popular, cultura de massa e indústria cultural. Jesus Marmanillo Pereira reflete sobre uma cidade estigmatizada e periférica. Daniel Rincon Caires revela os dramas de uma cidade histórica. José Maria Vieira de Andrade encontra em um agente literário motivos para enfocar as transformações de “sua cidade”. Magno Santos perspectiva uma cidade com base na dimensão da sociabilidade festiva religiosa para confrontar a noção de tradição e modernidade. Na mesma linha, Manuela Areias Costa reconfigura a cidade colonial de Mariana para compreender os limites das apropriações e transformações de elementos da modernização no município. Vanessa Meloni Massara encerra o dossiê, centrando-se na cidade de São Paulo para tratar da importância das infraestruturas para a qualidade de vida das cidades.

Cidades ressuscitadas pelo criterioso trabalho imaginativo de pesquisadores amantes do rigor científico.

Este volume presenteia o leitor com duas resenhas de obras que instigam pela temática e pela originalidade das abordagens. Por fim, a Revista Outros Tempos, além de contar sempre com o apoio do seu Conselho Editorial faz questão de agradecer publicamente aos pareceristas que gentilmente se dispuseram a colaborar com este número.

Helidacy Maria Muniz Corrêa

Coordenadora Editorial


CORRÊA, Helidacy Maria Muniz. Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 9, n. 13, 2012. Acessar publicação original [DR]

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História Atlântica e da Diáspora Africana / Outros Tempos / 2011

Um dossiê sobre Histórias Atlânticas e da Diáspora Africana é algo relativamente novo, pois enquadra uma grande quantidade de temas sobre a movimentação no Atlântico, sobretudo aquela da Diáspora Negra. O Antropólogo inglês Paul Gilroy publicou em 1993 o livro Atlântico Negro, que enfocava um Atlântico em movimento, um Atlântico vivo, um Atlântico do tráfico de escravos, um difusor de gente, ideias, músicas e elementos culturais. Ainda nos anos de 1960 e 1970 um agrupamento muito específico de pesquisadores dos estudos afro começou a utilizar o termo Midlle Passage, a passagem do meio, para referirem-se ao oceano Atlântico, espaço que separa, mas ao mesmo tempo interliga os continentes, países, ideias e informações através de seus portos.

O oceano Atlântico, portanto, possibilitou a existência da diáspora africana e através dele os cativos africanos incorporaram aspectos culturais, sociais, econômicos e políticos da vida no Brasil, nas Américas e no Mundo. Estes africanos no “Novo Mundo”, trabalhando no eito ou no espaço doméstico, sendo negro de ganho ou negro de fazenda, imprimiram marcas na cultura afro-americana, na agricultura, na culinária, nas práticas religiosas, língua, música, artes, etc. É a partir da necessidade de melhor compreender essas conexões nos dois lados do atlântico, que a Revista Outros Tempos lança o presente dossiê.

Na seção específica, podemos encontrar o trabalho de Rafael Chambouleyron MUITA TERRA… SEM COMÉRCIO: O Estado do Maranhão e as rotas atlânticas nos séculos XVII e XVIII; sobre o comércio para o Grão-Pará e Maranhão através do Atlântico, ligando o Estado a outras localidades do Império. Reinaldo Barroso Junior com o título ARROZ DE VENEZA E OS TRABALHADORES DE GUINÈ: A lavoura de exportação do Estado do Maranhão e Piauí (1770-1800) analisa a produção de arroz no Maranhão e a utilização dos trabalhadores africanos de Guiné, descritos como qualificados para o cultivo deste produto. Em seguida, o trabalho de Tatiana Raquel Reis Silva sobre o COMÉRCIO (TRANS) ATLÂNTICO das rabidantes cabo-verdianas, que discorre sobre a intensa movimentação econômica entre Brasil e Cabo Verde e O COMÉRCIO ILEGAL DE AFRICANOS NO SUL-FLUMINENSE: Os Souza Breves e suas fazendas, no qual o historiador Thiago Campos Pessoa analisa a relação entre o tráfico ilegal de escravos e a produção de riquezas da família dos Sousa Breves.

Destacamos, também, o artigo de Luiza Nascimento dos Reis O “CASO DOS SOUZA CASTRO”: Itinerários de dois pesquisadores do Centro de Estudos Afro-Orientais na Nigéria (1962-1963), sobre a trajetória de pesquisa do casal “Sousa Castro” na Nigéria. O trabalho de Fábio Pereira de Carvalho é uma análise da obra de Eugene Genovese relacionando-a ao mundo e a resistência escrava – E TOMARÃO LUGAR À MESA DO REINO DE DEUS: Eugene D. Genovese e o evangelho nas senzalas. Clara Farias nos apresenta A IRMANDADE DE NOSSA SENHORA DOS HOMENS PRETOS DO RECIFE E O GOVERNO DAS NAÇÕES E CORPORAÇÕES: uma análise das apropriações do cargo de governador dos pretos. O dossiê conta ainda com o trabalho de Fred Maciel e Marcos Sorrilha Pinheiro, sobre o Blues como uma manifestação cultural que consolidou a cultura afro-americana, intitulado BLUES: manifestação e inserção sociocultural do negro no início do século XX e, por fim, com a tradução do texto OS DOMÍNIOS DO PRAZER: a mulher escrava como mercadoria sexual, escrito por Hilary McD Beckles no ano de 2000, e traduzido por Elaine Pereira Rocha.

Antes, no espaço reservado aos artigos livres apresentamos pesquisas sobre o Brasil oitocentista, centradas nas províncias do Maranhão e Rio Grande do Sul, e sobre o Estado do Pará no início do século XX. Marcelo Cheche Galves analisa as COMEMORAÇÕES VINTISTAS NO MARANHÃO (1821-1823). O trabalho de Wheriston Silva Neris trata A PRODUÇÃO DO CORPO SACERDOTAL NO BISPADO DO MARANHÃO (XIX): formação seminarística e introdução de novos modelos disciplinares, referente a formação nos Seminários de Nossa Senhora das Mercês e Santo Antonio. Ainda no XIX, Sandor Fernando Bringmann nos apresenta o artigo “DOS ÚTEIS EFFEITOS DA SOCIABILIDADE E DAS VANTAGENS DA CIVILISAÇÃO”: a questão indígena e sua representatividade nos gabinetes provinciais do Rio Grande do Sul (1846-1870), que estuda as imagens criadas sobre os índios do grupo Kaingang, habitantes das regiões norte e nordeste do Rio Grande do Sul. A seção de artigos livres termina com o artigo de Fabrício Herbeth Teixeira da Silva A DISCIPLINA E SUAS NORMAS: a higienização da carne, a atuação dos açougueiros e marchantes em Belém na virada do XX.

Também faz parte do presente volume, os documentos referentes à Vila de Santo Antônio de Alcântara (Maranhão) do final do século XVII, apresentados por Daniel Rincon Caires e a resenha do livro “A hidra de muitas cabeças: marinheiros, escravos, plebeus e a história oculta do Atlântico Revolucionário”, de Sabrina Fernandes Melo.

Boa Leitura!!


Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 8, n. 12, 2011. Acessar publicação original [DR]

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Estudos de Gênero / Outros Tempos / 2010

A revista Outros Tempos apresenta neste número o dossiê Gênero, com um número expressivo de artigos de pesquisadoras de diferentes regiões do país, tratando de temas variados no campo dos estudos de gênero, desde o homoerotismo feminino, trabalho doméstico, chefia feminina de família, escrita de autoria feminina, educação, violência de gênero, até representações da moda feminina.

Tratando da violência de gênero, temos três trabalhos. A pesquisa de Cláudia Priori aborda a violência de gênero por meio da análise das queixas registradas na Delegacia Especializada na Defesa da Mulher, no município de Maringá, entre 1987 e 1996; o estudo de Mayana Hellen Nunes da Silva, trata de crimes passionais ocorridos no Maranhão, na década de 1950, utilizando como fonte os registros feitos nos jornais da época; já o trabalho de Tânia Regina Zimmermann aborda as representações de violência e relações de gênero contidas no romance Memorial de Maria Moura, da escritora Rachel de Queiroz.

A temática sobre família, reprodução social e trabalho doméstico encontra-se representada no estudo de Dolores Pereira Ribeiro Coutinho, sobre chefia feminina de família e produção da vida em Campo Grande – MS no final do século XX e no estudo de Soraia Carolina de Mello sobre o trabalho doméstico das donas de casa, utilizando as discussões feministas no Cone Sul, entre 1970 e 1989.

O trabalho de Rafaela Basso analisa alguns aspectos da escrita da história de Natalie Zemon Davis, historiadora norte-americana contemporânea, presentes no livro Nas Margens; já a pesquisa de Régia Agostinho da Silva aborda a autoria feminina no século XIX com um estudo sobre a atuação da escritora Emília Freitas no mundo da letras. A educação feminina em São Luís na Primeira República é o objeto central do artigo de Tatiane da Silva Sales, que apresenta imagens, discursos e representações sobre as mulheres nesse período e delineia algumas possibilidades para a emancipação feminina a partir da ampliação de oportunidades no sistema educacional. O artigo de Juscelina Bárbara Anjos Matos sobre imagens de mulher e representações da moda em Vitória da Conquista –BA, entre 1950 e 1965, aborda as relações de gênero e construções identitárias por meio da análise do vestuário feminino.

Por último, temos uma abordagem inovadora no estudo de Cristiane Demarchi sobre as imagens pictóricas da poetisa grega Safo, sob o pano de fundo do erotismo, onde a autora aborda o homoerotismo feminismo e o voyeurismo masculino. Todos esses trabalhos comprovam o grande crescimento dos estudos de gênero nos diversos campos das ciências humanas e sociais, representadas neste dossiê, com destaque para a área de História, bem como a qualidade das pesquisas que vêem sendo desenvolvidas no país.

Além do dossiê, a revista publica ainda neste número seis artigos livres, que versam sobre temáticas variadas. O estudo de André Dioney Fonseca trata da contribuição da Nova História Cultural aos estudos do movimento pentecostal no Brasil; Arlindyane Santos aborda as formas e estratégias utilizadas pelos oficiais camarários para reinventarem localmente a idéia de nobreza no Maranhão colonial, denominando-os de “Senhores do Senado”. A pesquisa de Jeane Carla Oliveira de Melo e Rita de Cássia Gomes Nascimento problematiza a presença feminina no trabalho filantrópico em relação à infância pobre da cidade de São Luís, através do estudo da atuação das chamadas Damas de Assistência no Instituto de Assistência à Infância do Maranhão na primeira metade do século XX.

A pesquisa de Tiago Kramer de Oliveira analisa a relação entre a obra Vigiar e Punir, do filósofo Michel Foucault, e a produção do conhecimento histórico, a partir da análise e críticas de vários teóricos. O estudo de Vitória Azevedo da Fonseca propõe considerações sobre as relações de alteridade estabelecidas entre o relato de Hans Staden e suas posteriores adaptações em releituras cinematográficas. Por fim, o artigo de Leandro Francisco de Paula destaca o recrutamento de pretos e pardos em Minas Gerais na segunda metade do século XVIII, no momento de intensificação dos conflitos luso-castelhanos nas partes meridionais da América portuguesa.

Este número da revista se completa com a resenha de um documento e dois filmes-documentários, além de uma síntese de tese de doutorado. O documento “Cerimônia de coroação de Dom João II, quando do falecimento, em 1481, de Dom Afonso V, rei de Portugal”, foi resenhado por Fabio Henrique Gonçalves. Já a resenha de Marta Gouveia de Oliveira Rovai aborda os dois documentários das cineastas holandesas Ilse Van e Femke van Velsen, em Fighting the Silence (2007 / 2008) e Weapon of War (2009 / 2010), que tratam da experiência dolorosa e traumática do estupro de mulheres no Congo. Por fim, a síntese da tese “Violência e Gênero em Notícias do Oeste Paranaense (1960-1990)”, de Tânia Regina Zimmermann, professora da Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul, cujo fio condutor, como destaca a autora, foram as representações sobre relações de gênero e violência na imprensa escrita e falada do Oeste do Paraná.

Finalmente, agradecemos aos que contribuíram para a publicação deste número da revista e para o sucesso do dossiê gênero, cujo crescimento da produção historiográfica com base nessa categoria de análise tem resultado em um debate fértil para o campo de conhecimento da História.

Convidamos a tod@s para uma prazerosa leitura.

Elizabeth Sousa Abrantes

Carlos Alberto Ximendes


ABRANTES, Elizabeth Sousa; XIMENDES, Carlos Alberto. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 7, n. 9, 2010. Acessar publicação original [DR]

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História e Educação / Outros Tempos / 2010

A revista Outros Tempos tem o prazer de disponibilizar, mais uma vez, o resultado de pesquisas desenvolvidas em todo o país. Na seção artigos livres desta edição, temas como: imigração, religião, política e economia são a tônica dos artigos de Marcelo Vieira Magalhães – Sair do Líbano chegar à capital maranhense: as esperanças dos “syrios” e as condições de vida dos viajantes; Monica Piccolo Almeida – A lenta construção do projeto privatista: a política econômica brasileira entre 1964-1974; Veronica de Jesus Gomes – Justiça e misericórdia na mesa do Santo Ofício de Lisboa: as penas dos padres sodomitas; Maria Izabel Barboza de Morais Oliveira – Bossuet: o rigor da realeza nos combates às rebeliões; Nielson Rosa Bezerra – Nos seios da escravidão: um olhar sobre alforrias negociadas por mulheres escravas. Freguesia de Santo Antônio da Jacutinga – Século XIX.

O dossiê sobre educação traz os artigos de Ernando Brito Gonçalves Junior – A educação pelo livro: uma análise do compêndio de pedagogia de Dario Vellozo (1907); Luciana Martins Castro – A contribuição de Nísia Floresta para a educação feminina: pioneirismo no Rio de Janeiro oitocentista; Elizabeth Sousa Abrantes – A educação da mulher na visão do médico e educador Afrânio Peixoto; Bárbara Barros de Olim – Imagens em livros didáticos de história das séries iniciais: uma análise comparativa e avaliadora; Franciane Gama Lacerda e Geraldo Magella de Menezes Neto – Ensino e pesquisa em história: a literatura de cordel na sala de aula; Thiago Rodrigues Nascimento – Memórias de professores de história: considerações sobre formação inicial e constituição do “saber docente”; Elizangela Barbosa Cardoso – Mães educadoras e profissionais: educação feminina em Teresina na primeira metade do século XX; Crislane Barbosa de Azevedo – Arquitetura e grupos escolares em Sergipe: uma relação entre espaço e educação na escola primária; Antonio José Barbosa de Oliveira – Uma universidade modelo para o Brasil: a educação superior e o projeto de construção da nacionalidade brasileira (1935-1945).

O documento deste número é a Lei complementar n° 20 de 1° de julho de 1974 e a criação de um estado: a fusão dos estados do Rio de Janeiro e da Guanabara, apresentado por Thiago Rodrigues Nascimento.

Apresentamos duas resenhas: a de Marcelo Cheche Galves, da obra A quebra da mola real das sociedades: a crise política do Antigo Regime português na província do GrãoPará (1821-1825). São Paulo: Hucitec / Fapesp, 2010. 321 p; obra de MACHADO, André Roberto. e Carlos Francisco da Silva Júnior, que resenhou Domingos Sodré, um sacerdote africano: escravidão, liberdade e candomblé na Bahia do século XIX. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. 463 p. Obra publicada por REIS, João José.

Também publicamos a Síntese de Sandra Regina Rodrigues dos Santos, Gestão colegiada e projeto político pedagógico: colégio de aplicação da Universidade Federal do Maranhão (1989 -1996).

Agradecemos aos que participaram deste número, enviando artigos, resenhas, documentos, sínteses, emitindo pareceres, sugerindo temas, fazendo a revisão dos textos, enfim, a todos aqueles que, de alguma forma, contribuíram para a edição da revista. Desejamos a todos uma excelente leitura.

Elizabeth Sousa Abrantes

Carlos Alberto Ximendes


ABRANTES, Elizabeth Sousa; XIMENDES, Carlos Alberto. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 7, n. 10, 2010. Acessar publicação original [DR]

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História e Literatura / Outros Tempos / 2010

História e Literatura: perspectiva de uma relação política e intelectual A Revista Outros Tempos neste número celebra a relação intelectual entre a História e a Literatura. Essa celebração desmitifica qualquer idéia de subalternidade entre essas áreas de estudo científico. Entre a História e a Literatura há uma cumplicidade intelectual. A História tem a intenção de refletir sobre os processos de transformações sociais entre o presente e o passado. A Literatura, entre outros interesses, expressa diferentes visões de mundo, oferecendo uma perspectiva coletiva para uma análise das mudanças ocorridas nas sociedades humanas, ao longo do tempo. Quando a relação entre História e Literatura é verificada, uma perspectiva simbólica de processos sociais pode ser construída. Contudo, não há simbolismo sem uma dimensão política. Nesse sentido, a escolha de um dossiê voltado para essa relação foi de fato uma escolha política do corpo editorial da revista.

A formação da identidade nacional brasileira foi forjada durante o século XIX. Em grande parte essa construção se deu através da produção historiográfica oitocentista e da literatura romântica do século XIX. Quando assumimos a posição política de celebrar a relação intelectual entre essas áreas de estudo, também, estamos afirmando que a sociedade brasileira precisa ser repensada. O Brasil resultou de um processo histórico que teve seus pilares nas transformações sociais oitocentista, desiguais, contraditórias e inacabadas. Essas realidades, muitas vezes, são justificadas por construções simbólicas forjadas por historiadores e literatos. Assim, repensar simbolismos literários e historiográficos do Brasil é, sem dúvida, fazer um exercício político sobre a realidade que desejamos transformar.

O Maranhão contou com produções historiográficas e literárias que justificavam interesses políticos voltados para a concentração do poder. Num olhar, mesmo que despretensioso, é possível perceber essas mesmas práticas políticas ainda hoje.

Entretanto, nem todos os intelectuais maranhenses se curvaram ao jogo da reprodução do poder. Já algum tempo, os orgulhos europeus maranhenses, elaborados pela literatura e pela historiografia anteriores, foram superados pelas novas concepções que vêm se apresentando em nossa universidade e em outras instituições. Isso é mais que uma esperança, um verdadeiro passo inaugural para continuar sonhando com uma sociedade diferente.

Esses estudos são agora prestigiados por esse número da Revista Outros Tempos, que se juntam aos esforços recentes de estudiosos da História e da Literatura no Maranhão e em outros lugares brasileiros, voltados para pensar a força política dessa relação. Desta forma, convidamos o leitor a desfrutar de uma prazerosa leitura e se engajar numa luta que é obrigação de todos nós.


Apresentação. Outros Tempos, Maranhão, v. 8, n. 11, 2011. Acessar publicação original [DR]

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Escravidão / Outros Tempos / 2009

Abrimos este número duplamente honrados: primeiro, em compartilhar com os nossos leitores e colaboradores a consolidação de nossa revista no cenário acadêmico nacional, em razão de sua requalificação para o estrato B3 do Qualis-Capes para a área de História; em segundo lugar, pela satisfação de apresentar um novo conjunto de reflexões através da publicação de novos artigos e do Dossiê Escravidão, este com textos centrados na escravidão africana.

Desta feita, daremos ênfase à presença do escravo na sociedade brasileira, compreendido aqui como um sujeito fundamental para a nossa constituição histórica, passando por espaços de sociabilidade como engenhos, fazendas, minas, cidades, plantações, fábricas, cozinhas, etc., assim como eixos econômicos atrelados a existência de uma monocultura exportadora. Sua vivência no âmago da formação brasileira influenciou diretamente a culinária, a religião, a música, a língua, as artes, etc. Em virtude disto, a Revista Outros Tempos – Pesquisa em Foco resolveu dedicar-se a este importante objeto da produção acadêmica brasileira.

Dentre os artigos do Dossiê Escravidão apresentamos, primeiramente, A Educação dos negros na sociedade escravista do Maranhão Provincial, de Mariléia Cruz, pelo qual podemos perceber a participação de negros livres, forros e escravos no processo de aprendizagem durante o século XIX. Já o trabalho de Newman di Carlo Caldeira – À margem da diplomacia: fugas internacionais de escravos do Brasil em direção à Bolívia (1822-1867) – percebe o escravo a partir de embates internacionais entre o Brasil e a Bolívia. Com relação ao transporte e comércio de cativos através do tráfico disponibilizamos o artigo de Marinelma Costa Meirelles: As conexões do Maranhão com a África no tráfico Atlântico de escravos na segunda metade do Século XVIII. Além destes, trazemos ainda uma discussão sobre o sistema escravista através da obra “O Mulato”, de Aluízio Azevedo, na produção de Leudjane Michelle Viegas Diniz: Olhares escravocratas nas Páginas de “O Mulato”. Para completar o Dossiê anexamos uma entrevista com Rafael Chambouleyron, professor da Universidade do Pará, em que discutimos alguns apontamentos sobre o processo de escravidão no Brasil e no meio norte-nordeste. E, por último, um documento transcrito pelo professor Reinaldo dos Santos Barroso Junior, referente ao assassinato de um sargento por um escravo no Maranhão de fins do século XVIII.

Na seção de artigos livres encontramos o trabalho de Antonio Evaldo Almeida Barros enfatizando a presença das festas na construção discursiva da identidade maranhense, com o texto Usos e abusos do encontro festivo: Identidades, Diferenças e Desigualdades no Maranhão dos Bumbas (c. 1900-50). A partir do trabalho de Claúdia Cristina Azeredo Atallah, intitulado Centro e periferias no Império Português: uma discussão sobre as relações de poder nas minas coloniais, enveredamos por importantes apontamentos sobre as relações de poder no império português. Apresentamos ainda o trabalho de Guilherme Queiroz de Souza sobre o processo de colonização do México-Tenochtitlán, com o título de Expansão da Fé e Proteção Espiritual: o papel dos clérigos no sentido cruzadístico da conquista de México-Tenochtitlán (1519-1521). Enquanto o artigo A contribuição da memória para o estudo de um processo imigratório específico: o caso dos sírios e libaneses em Juiz de Fora – MG (1890-1940), de Juliana Gomes Dornelas, discute a memória e o processo imigratório dos sírios e libaneses para o Brasil. E, por fim, um pouco de discussão sobre a atuação política de José Candido de Morais e Silva e sua presença na imprensa maranhense como redator do Jornal “O Farol Maranhense” através do artigo José Cândido de Morais e Silva: outras histórias (1828 – 1831), de Vicente Antonio Madureira.

Apresentamos ainda a resenha de Tatiane da Silva Sales referente ao livro Mulheres, Mães e Médicos: discurso maternalista no Brasil, de Maria Martha de Luna Freire, publicada pela Editora FGV.

Desejamos a todas e todos uma boa leitura!!!

Reinaldo dos Santos Barroso Junior

Rogério Veras


BARROSO JUNIOR, Reinaldo dos Santos; VERAS, Rogério. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 6, n. 8, 2009. Acessar publicação original [DR]

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História e Memória / Outros Tempos / 2009

Sobre a Memória e o esquecimento

Não poderia haver melhor frase para iniciar este número da revista Outros Tempos – Pesquisa em Foco que a frase de Milan Kundera em O livro do riso e do esquecimento de 1981: “A luta do homem contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento”. Neste número temos o orgulho de apresentar o dossiê História e Memória no qual são veiculados oito artigos que utilizaram o conceito de memória em seus trabalhos. Trabalhos como o de Jayme Ribeiro que percebe a utilização da memória acerca da Bomba Atômica por partes dos comunistas e dos não comunistas, ou, ainda, de Sonia Maria de Meneses problematizando as relações entre mídia, memória e esquecimento. Já os trabalhos de Carolina Cunha e Raquel França dos Santos Ferreira, examinam o acervo documental escrito, a primeira perscrutou as Memórias do frei dominicano Servando Teresa de Mier na tentativa de entender o ideário iluminista, enquanto a segunda examinou as crônicas de Antonio Maria, compositor e produtor pernambucano, para entender o imaginário carioca da década de 1950. Já Daniel Choma analisa não os escritos de determinado personagem, mas o acervo fotográfico de Armínio Kaiser, enquanto Rafael Hansen Quinsani analisa a memória a partir do filme Soldados de Salamina, de 2003. Fábio da Silva Souza, por sua vez, analisa a história e a memória da famigerada Revolução Mexicana, e Leonardo da Costa Ferreira discute a memória de luta política de Amadeu Amaral.

Para completar o Dossiê de História e Memória temos a transcrição de um documento cedido e comentado pela professora Júlia Constança Pereira Camêlo, na realidade, uma entrevista concedida em 1996, por Onofre Alves de Siqueira, o Bebelo, à Cléa Camêlo de Albuquerque, referente às Ligas Camponesas. E, por fim, uma entrevista com a historiadora e pesquisadora Ana Maria Mauad, responsável pelo Laboratório de História Oral e Imagem da Universidade Federal Fluminense.

Na seção livre, com artigos dos mais diversos assuntos, vocês leitores podem encontrar o artigo de Maria Regina Santos de Souza evidenciando as dificuldades enfrentadas por viúvas na petições de pensão de seus maridos mortos na Guerra do Paraguai, ou, ainda, o trabalho de Marili Peres Junqueira enfocando as relações diplomáticas entre Brasil e Itália no final do século XIX. Thiago Cavaliere Mourelle, discute as origens do trabalhismo através do interventor Pedro Ernesto. No artigo em co-autoria de Valter Fernandes e Victor Abril poderão encontrar ainda uma discussão sobre a complexa relação de poder existente no império português a partir do Rio de Janeiro.

O desfecho dos artigos esta por conta da antropóloga italiana Anna Casella Paltrinieri com o texto intitulado Imigração, raça e cultura: o ensinamento de Franz Boas publicado na revista italiana Quaderni del Premio Letterario Giuseppe Acerbi, em novembro de 2008, e traduzido, para essa edição, pelos professores Claúdio Zannoni e Maria Mirtes dos Santos Barros.

Além dos artigos os leitores poderão encontrar, ainda, duas resenhas: a primeira do historiador Rogério Chaves da Silva do livro História Viva – Teoria da História III: formas e funções do conhecimento histórico, do historiador alemão Jorn Rusen; e a segunda, de Régia Agostinho da Silva, sobre a obra Uma escritora na periferia do império: vida e obra de Emília Freitas, escrita por Alcilene Cavalcante.

Como podem observar, esse número está quase que exclusivamente dedicado à Memória, e a maior parte das colaborações surgiu a partir de historiadores, contudo, isso não significa dizer que esquecemos os outros pesquisadores e escritores acadêmicos, o espaço está aberto para todas as contribuições e continuamos aguardando seus trabalhos.

A todos, boa leitura!

Reinaldo dos Santos Barroso Junior


BARROSO JUNIOR, Reinaldo dos Santos. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 6, n.7, 2009. Acessar publicação original [DR]

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História da América / Outros Tempos / 2008

A revista eletrônica de História Outros Tempos chega ao seu quinto volume consolidada como um importante veículo de difusão do conhecimento, não só histórico, como de outras áreas que lhe são afins, exemplos de: geografia, antropologia, literatura, sociologia, arquitetura e urbanismo, entre outros.

Neste volume, algumas mudanças se processaram. A revista deixou de ser anual para ser semestral, incluindo um dossiê, prática inaugurada em 2007, com o lançamento do volume especial Dossiê História Política, conseqüência direta da realização do IV Simpósio Nacional de História Política, realizado na Universidade Estadual do Maranhão, em outubro daquele ano. Outra modificação editorial importante foi a publicação de documentos originais e inéditos. Para este volume, apresentamos o documento que relata as cartas do governador do Maranhão do século XVIII, Bernardo Pereira de Berredo (1718-1722), cujo objetivo é comparar tal conjunto documental com as tradições letradas do período, de iniciativa dos professores, Alírio Cardozo (UFMA) e Rafael Chambouleyron (UFPA). As modificações não param por aí. Ampliamos o conselho consultivo, corpo de pareceristas, com pesquisadores de várias Instituições de Ensino Superior do país, sobretudo, pelo aumento substancial de artigos que a revista vem recebendo a cada volume. Repaginada, ganhou uma nova feição visual com um sitio mais leve, de fácil navegação e funcionalidade, mais bonito, apresentando imagens do centro histórico de São Luís.

Os elementos de permanência para este volume, no entanto, dão uma dimensão de sua importância acadêmica. Continua a multiplicidade de objetos, a atenção para alunos recém-graduados, mestrandos e doutorandos de programas de Pós-Graduação de todos o país, bem como professores de várias Instituições.

O dossiê deste quinto volume é sobre História da América. Os artigos abrangem desde a relação entre a América colonial, articulando os conceitos de maravilhoso medieval e real maravilhoso, próprio à literatura latino-americana do boom da década de 1960 do século XX, passando pela perspectiva comparada dos movimentos Ejército Zapatista de Liberación Nacional , do México, e Movimiento Indígena Pachakuti , da Bolívia, pela identificação dos elementos do Surrealismo francês como vanguarda literária européia e do realismo mágico como um movimento de renovação da narrativa literária latino-americana, até a relação entre história e memória do Chile contemporâneo, sem esquecer, é claro, que os demais artigos que abordam a história do Brasil, como os que analisam a Academia Maranhense de Letras, as memórias sobre o município de Nova Iorque, interior do Maranhão, o nacionalismo na experiência democrática brasileira, a interpretação de processos e movimentos de identificação em curso entre moradores de um trecho do Centro Histórico de São Luís, os registros eclesiásticos de batismo e casamento na freguesia de Limoeiro (entre os anos de 1862 a 1872), província do Ceará, também fazem parte da história da América, afinal, a história do Brasil é também parte da história latino-americana, apesar da ideologia que tenta abastardar, fragmentar este país do resto do continente. A separação do dossiê é apenas visual e organizacional, para facilitar aqueles que quiserem acessar diretamente assuntos relativos à história do Brasil.

Por fim, o quinto volume encerra com uma resenha do egresso do curso de história da UEMA, Fábio Henrique Gonçalves Sousa, com a resenha: História universal da destruição dos livros: das tábuas sumérias à guerra do Iraque, de autoria de Fernando Báez, publicada no ano de 2006.

Á todos uma boa navegação.

José Henrique de Paula Borralho

Márcia Milena Galdez Ferreira.


BORRALHO, José Henrique de Paula; FERREIRA, Márcia Milena Galdez. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 5, n. 5, 2008. Acessar publicação original [DR]

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Religião e Religiosidade / Outros Tempos / 2008

A Revista Outros Tempos inaugura nesta edição sua nova periodicidade: a semestral. Seguimos publicando artigos referentes a pesquisas desenvolvidas na conclusão de cursos de graduação, ao longo de pós-graduações e na prática cotidiana de professores de IES.

Dando continuidade aos Dossiês Temáticos, apresentamos ao público leitor o Dossiê Religião e Religiosidade que engloba desde artigos que discutem teoricamente o conceito de campo religioso em Bourdieu ; passando por pesquisas de cunho comparativo acerca das concepções de morte no medievo e na atualidade; abordagem do Regulamento das Aldeias; linguagem carnavalesca ou burlesca nos sermões do Padre Antônio Vieira, na América Portuguesa; religião e religiosidades indígenas; até a análise dos usos e funções das imagens na perspectiva da Igreja Católica.

Artigos versando sobre temáticas variadas também compõem este volume: relação entre Irmandades Religiosas e práticas higienistas no Oitocentos; trabalho de rua no Maranhão da virada do século XIX para o XX; condição feminina e prisão na cidade de Fortaleza (1850-1889); diálogos entre História e Literatura na obra da escritora baiana Anna Ribeiro de Araújo Góes Bittencourt; estudo de crises do petróleo no final do século XX; e relação entre Hip Hop e resistência da juventude de periferia na São Luís contemporânea.

Na seção de Documentos publicamos um catálogo de referências acerca da História do Brasil Colonial e História do Maranhão Colonial disponível nos acervos da Universidade Estadual do Maranhão e da Universidade Federal do Maranhão, elaborado a partir de proposta de trabalho desenvolvida em Monitoria de Disciplinas do Curso de Graduação em História da Universidade Estadual do Maranhão. Inauguramos também a Seção de Entrevistas e, aproveitando o clima de discussão advindo dos 170 anos de deflagração da Balaiada, registramos o diálogo com o renomado historiador Mathias Röhrig Assunção, conhecedor profundo da temática em questão.

Boa leitura!

José Henrique de Paula Borralho

Márcia Milena Galdez Ferreira


BORRALHO, José Henrique de Paula; FERREIRA, Márcia Milena Galdez. Editorial. Outros Tempos, Maranhão, v. 5, n. 6, 2008. Acessar publicação original [DR]

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Outros Tempos | UFMA | 2004

Outros Tempos UFMA

A Revista eletrônica de História  Outros Tempos – Pesquisa em Foco (São Luís, 2004-),  publicada pela Universidade Estadual do Maranhão (UEMA),  é um periódico semestral  voltado para a divulgação de artigos inéditos, resenhas e estudos de casos produzidos por pesquisadores vinculados a IES e PPG, Mestres (apenas para Resenha), Doutorandos e Doutores.

As contribuições recebidas pelo periódico são submetidas a processo de avaliação do   Conselho Editorial. A revista Outros Tempos reúne textos em sessões dedicadas a temas livres, dossiês temáticos, resenhas e destina um espaço a entrevistas com pesquisadores relacionados ás áreas humanas.   A polí­tica editorial da Outros Tempos é divulgar as pesquisas na área de História, fomentar o debate  historiográficos em ní­vel de pós-graduação, possibilitar o acesso de professores e alunos de áreas congêneres e regiões distintas ao conhecimento produzidos por investigadores vinculados ao sistema nacional de pós-graduação, além de promover o intercâmbio com profissionais do exterior. Desde a sua fundação, a revista  se constituiu em um espaço de natureza transdisciplinar agrupando a  divulgação de resultados da pesquisa histórica, textos sociológicos, antropológicos e de outras áreas das Ciências Humanas.

Periodicidade semestral.

Acesso livre.

ISSN 1808-8031 (Online)

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