Polegarzinha – Uma nova forma de viver em harmonia, de pensar as instituições, de ser e de saber | Michel Serres

A leitura da obra Polegarzinha – Uma nova forma de viver em harmonia, pensar as instituições, de ser e de saber, de autoria de Michel Serres, pensador francês, trouxe-nos como possibilidades o exercício de pensar o papel da tecnologia na construção de novas sociabilidades e na atualização de interrogações que constituem a condição humana. A principal problemática abordada pelo autor trata de como os adolescentes enviam as mensagens SMS com os polegares e habitam o mundo virtual. Associado a dinâmica das mídias digitais no processo de formação dos adolescentes e jovens, Serres (2015, p.12) abre o livro com uma interrogação filosófica: “Antes de ensinar o que quer que seja a alguém, é preciso, no mínimo, conhecer esse alguém. Nos dias de hoje, quem se candidata à escola, ao ensino básico, à universidade?”

Essa pergunta implica alguns questionamentos, quem é esse novo aluno, que cria outros mundos por meio do virtual? Que literatura e que história eles estão construindo na imediaticidade do tempo, que corre veloz, esquecendo das tradições dos antigos? Serres propõe três horizontes temáticos para pensar o fenômeno que ele mesmo denominou de Polegarzinha: I – Polegarzinha; II – Escola; III – Sociedade. Esses horizontes propõem um modo de pensar a Educação, como um fenômeno complexo que abarca as aulas, a sala de aula, o digital, os professores, a avaliação desses pelos alunos, etc. Assim, a Educação é pensada pelo prisma da Polegarzinha como um desafio, sim um desafio que não se pode resolver a penas sendo otimista como o autor Michel Serres. Leia Mais

A polegarzinha: uma nova forma de viver em harmonia e pensar as instituições, de ser e de saber – SERRES (REi)

SERRES, M. A polegarzinha: uma nova forma de viver em harmonia e pensar as instituições, de ser e de saber. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2013. Resenha de: PINHEIRO, Daniel Silva; FIORELLI, Marilei Cátia. Revista Entreideias, Salvador, v. 1, n. 1, p. 113-116, jan./jun. 2012.

Os juvenis e jovens que ocupam as carteiras escolares na atua¬lidade se distinguem de seus antecessores por alguns motivos que chamam a atenção: conhecem os derivados, mas não os insumos utilizados em sua produção; não vivenciaram grandes guerras no Ocidente; tem sua longevidade em ascensão e seu próprio nasci¬mento foi meticulosamente programado.

Ambientando-se na França, Michel Serres começa seu texto tecendo argumentos para por em evidência quem são os alunos, a escola e a sociedade dos dias de hoje em que todos os “dedos das mãos” e toda a atenção voltam-se para os meios digitais, as tecno¬logias e seus aparatos. De maneira criativa, ele utiliza a expressão “Polegarzinha” justamente para enfatizar a agilidade com que tanto meninas quanto meninos utilizam seus dispositivos móveis para acessar a internet e os conhecimentos que ali encontram-se disponíveis – a opção por utilizar-se do termo no feminino para referir-se aos dois gêneros, sugere também esse efeito um tanto quanto generalizante que é característico dessa geração e mesmo da própria rede.

O preâmbulo, exposto pelo autor, dá conta de uma revolução digital que faz com que a relação pedagógica se altere tendo em vista especialmente a presença da Polegarzinha. Nesta primeira parte do livro, Serres busca situar quem é este novo indivíduo social, mencionado suas particularidades e conveniências. De acordo com ele, a Polegarzinha e o Polegarzinho manipulam várias informações ao mesmo tempo: “por celular tem acesso a todas as pessoas, por GPS a todos os lugares, pela internet a todo saber” (p. 19). Assim, é como se não mais habitassem o nosso espaço, o nosso mundo. Mas há ainda outra diferença que os singularizam – “Não tem mais a mesma cabeça” (p. 21). Serres apresenta então, uma série de descompassos presentes no cotidiano da Polegarzinha. Ele identifica que a própria consti¬tuição familiar se alterou já que a idade da mãe avançou 10 ou 15 anos na geração do primeiro filho, revelando que os pais dos alunos mudaram de geração. “Acompanham menos os filhos?” (p. 15), interroga-se ele. Além disto, o autor constata que os docentes hoje, ensinam a esses jovens em estruturas que datam de uma época onde não se reconhecem mais: “prédios, pátios de recreio, salas de aula, auditórios, laboratórios, os próprios saberes… Estruturas que datam de uma época, que enquadravam-se num tempo em que seres humanos e o mundo eram algo que não são mais”. Incluso nesse panorama de defasagem está a postura dos professores de “presunção de incompetência” (p. 63) para com os estudantes. Na contemporaneidade, no entanto, há uma grande probabilidade de os alunos investigarem previamente na internet os conceitos, o que recoloca esta relação e deve reverberar numa “presunção de competência” (p. 64), segundo Serres. Tendo em vista que este cenário social sofreu alterações nos modos de construção do conhecimento, o autor indaga-nos com três questões: O que, a quem e como transmitir? Seu objetivo com isto é destacar a relação da pedagogia com a evolução tecnológica. O saber tinha como suporte o corpo do professor-erudito, “uma bi¬blioteca viva: esse era o corpo docente do pedagogo” (p. 25). Com o avanço do tempo, surgem os rolos de pergaminho, livros, imprensa, e agora a rede internet: “a evolução da dupla, suporte-mensagem, é uma boa variável da função ensino” (p. 25).

Assim, Michel Serres apresenta um paralelo entre o surgimento da impressão e o das mídias atuais – onde já está tudo transmiti¬do, de certa maneira. A principal questão agora é como o aluno consegue assimilar o saber, assim distribuído. Uma de suas justi¬ficativas para esta observação é que com os livros e a imprensa a memória sofreu uma mutação – agora o conhecimento não precisa estar “armazenado”. Ele recorre, para fortalecer este argumento, a Montaigne, que prefere “uma cabeça bem constituída a uma cabeça bem cheia” (p. 27).

Serres conclui esta parte inicial se perguntando por que as coisas ainda não mudaram? Culpa a si próprio e os outros filósofos. E diz que gostaria de ter 18 anos para poder reinventar, recriar tudo, como os Polegarzinhos.

Na segunda parte do texto, cujo título é “Escola”, Michel Serres tenta compreender a cabeça da Polegarzinha ou o vazio que paira em seu lugar, citando a lenda de Saint Denis – que foi decapitado por soldados antes de chegarem ao topo da colina onde deveria ocorrer a execução. Saint Denis então pegou sua própria cabeça e, carregando-a, seguiu caminhando até o destino final. Utilizando-se dessa folclórica referência, Serres elabora uma interessante me¬táfora: a Polegarzinha senta em frente ao seu computador, como se sua cabeça estivesse à frente dela com as informações todas lá. Não precisa ocupar seu espaço dentro da cabeça com os dados, mas com as conexões desses dados, as faculdades mentais, é como se “nossa inteligência saísse da cabeça ossuda e neuronal” (p. 36); “nossa cabeça foi lançada a nossa frente, nessa caixa cognitiva objetivada” (p. 36). Novamente recorrendo a Montaigne, Serres entende que as redes possibilitam que a cabeça esteja mais bem constituída do que cheia e desta forma, como nunca antes, a Polegarzinha consegue “voltar sua atenção para a ausência que se mantém acima do pescoço” (p. 37). É neste espaço vazio, onde circula o ar, o vento, ou melhor ainda, onde em uma pintura clássica de Saint Denis há uma pequena luz, que se pode encontrar o ponto onde “reside a nova genialidade, a inteligência inventiva, a autêntica subjetividade cognitiva” (p. 37). No lugar do espaço vazio, antes cabeça, agora há o tumulto de vozes. A Polegarzinha ouve cada vez menos os professores porta-vozes. E ouve cada vez mais a todos os ruídos, todas as emissões de todos os pontos da rede. Trocam o silêncio, imobilidade e prostração dos modelos que denomina de “instituições-caverna”, pela balbúrdia ruidosa, descentralizada.

Serres afirma que a Polegarzinha procura encontrar o saber na sua máquina, e não mais nas bibliotecas e livros já previamente organizados, classificados, metrificados, hierarquizados. Que a difu¬são do saber não pode mais se dar com exclusividade em nenhum campus universitário. O conhecimento agora circula pelas redes, emitido e compartilhado por milhares de anônimos.

Na parte final, nomeada como “Sociedade”, Serres discute de maneira mais detida o espaço social onde a Polegar¬zinha está inserida, com a presença das tecnologias digitais e as constantes mudanças políticas, sociais e cognitivas potencializada por elas. O mundo social da polegarzinha aponta para questões de trabalho. Há uma busca e ao mesmo tempo um tédio, causado por um certo “roubo de interesse” (p. 65) de uma sociedade comparti¬mentada demais, sem o espaço inventivo, que restringe o espaço antes disposto para as utopias. A Polegarzinha, no entanto, não consegue dizer ao certo o que está ocupando este lugar, isto porque, aparentemente, tudo está proposto, transmitido. As relações nas redes sociais digitais, em que se contam aos milhares os amigos da Polegarzinha, são alvo de críticas pelos adultos que questionam estes números e estes conceitos de ami¬gos virtuais. Mas é uma maneira nova, única, pura das redes, que pertence a eles, à geração dos pequenos polegares. E o processo foi constituído sem base em exemplos anteriores, das sociedades, dos pais divorciados, dos partidos políticos e igrejas. São outras construções sociais. O caminho é apontado, novamente, por vozes que ecoam pelas redes. Estas parecem dar o tom de, quem sabe, uma época, de um segundo período oral, fruto da mistura – quem sabe um remix – com os escritos virtuais. Michel Serres, como poucos filósofos, ouve esse novo período oral que o virtual emana.

Daniel Silva Pinheiro – E-mail: [email protected]

Marilei Cátia Fiorelli – E-mail: [email protected]

Acessar publicação original

The Digital Revolution and the Coming of the Postmodern University – RASCHKE (CSS)

RASCHKE, Carl A. The Digital Revolution and the Coming of the Postmodern University. London: RoutledgeFalmer, 2003. 129. Resenha de: GRIFFITH, Bryant. Canadian Social Studies, v.39, n.2, p., 2005.

There is a definite disadvantage to writing an academic book concerning the future and a double disadvantage if it concerns the internet. It is almost always wrong. Such is the case with Carl Raschke’s The Digital Revolution and the Coming of the Postmodern University. When I first read the text I kept looking at the publication date wondering if Raschke had written it before the 2001 crash of hopes and dreams for a wired world; but he did not, or at least it was not published until 2003.

Despite these rather serious drawbacks the book deserves to be reviewed to draw attention to what can happen when we choose to dream about possible futures without remembering where we are and how we got here. That past, as R.G. Collingwood reminded us, is a reenactment of both the insides and the outsides of ideas, or to put it into ordinary language, the fusion of how my mind makes sense of minds in the past. This understanding is a way of knowing one’s self so it is not a minimum ontological claim. We make sense of the past by constructing analogies based on the way that we make rational decisions about our own actions, so one could argue that the past and present are fused in a continuous process of self understanding. Knowing who we are right now and what we think is tied to that process.

I believe that Raschke needs to be reminded of this. Far too often his ideas are much like Collier’s magazine, which presented fantastically utopian ideas about space travel and the colonization of distant galaxies. By that I mean these ideas, like most futurism, seem destined to the bin of what might or might not happen rather than a reasoned argument based upon the presuppositions of our present.

Let me examine some of Raschke’s thoughts and comment upon them. He states the architecture of digital communications necessitates a new understanding of the structures and ‘space’ of knowledge itself. This new knowledge space is consonant with the philosophical slant on the theory of representation, language, and symbolic exchange that has come to be called ‘postmodernist'(p. viii). I think Raschke is right about some of this. To understand digital communications it helps to see the world in the way that some postmodernists describe, that is a non-linear, fragmented narrative. Modernists, as a group, have tended to view history as the unfolding of a grand narrative with definite causes and effects. This has led to the critique of exclusionary voices as Other and to the attack on concepts such as ‘progress’. But this is hardly news. I cannot think of a school district, even in the state of Texas where I presently live, that has not abandoned the Eurocentric school of thought and which does not acknowledge, even implicitly, the concept of difference. Also, even though I think Raschke is right here, I am not sure there is the necessary connection to which he alludes. It might be the case, for instance, that a breakdown in modernism, or a paradigm shift, has occurred allowing us to perceive a different set of presuppositions to make sense of the world.

Raschke claims that such knowledge may be called ‘hyper’ knowledge, because like hyperspace in post-Newtonian cosmology [it] extends the directions and dimensions of knowledge per se in ways unanticipated even a generation ago (p. viii). The matrix for these new extensions of knowledge is what we call the ‘hyper’ university, which in no way resembles the ‘physical’ university (p. viii). The necessity to accept these two points escapes me completely. I would suggest that Raschke’s use of Wittgenstein’s category mistake, of thinking that a university is comprised of grounds and buildings rather than a term to describe the relationship between entities, really applies to Raschke himself (p. ix). Let me explain. For most of us the university is, like the word ‘curriculum’, the totality of experiences which occur both on and off campus. Ask anyone who has been to Oxford about the Friday pub sessions where serious academic conversations occur over much beer. I believe that most graduates from there would tell you that these have been some of the best learning moments of their university experience. In short, I am not sure that there are many universities which define themselves by their grounds and buildings.

Raschke claims that the new university is no longer a school. It is a place of distributed leaning, wherein communication takes place over content, inquiry is prior to instruction, results rule over rules (p. 11). He argues that both the postmodern economy and the postmodern university are built on mobile capital, mobile work forces, and mobile or ‘just-in-time’ inventory and distribution systems (p. 11). I believe I am correct in understanding this to be an argument for a post-fordist educational system where critical thinking is replaced by just-in-time adaptability. If I am correct then I completely disagree with Raschke. My understanding of a wired university is one with infinite possibilities to extend what Robert Putnam has characterized as the growth of social capital. In Bowling Alone Putnam (2000) expresses his concern with the digital revolution’s ability to foster truly open conversation. He feels that Information Technology might make us more private, passive and possibly exclusionary instead of open, conversational and community based. Putnam describes the breakdown of social capital through an analysis of civic engagement in a range of activities in the twentieth century. The fact that we bowl alone, learn alone and spend far less time in human interaction has led to a growing sense of distrust in contemporary society. Surely what our universities need to do is to remember that they have historically been the repositories of social capital, or the ways in which we have interacted to build an intellectual community. Most of us probably went to university to make friends, learn content and get a job in that order. In the process we became the embodiment of the presuppositions that define who we are as a society.

In the past 900 years, the approximate age of the university in western society, the institution has served as the birthing place of several revolutions and paradigm shifts. I see this process continuing in a form quite distinct but not separate from the present. The future, although new and unseen by us, is an ongoing process based upon understanding ourselves and the ideas upon which we have constructed our sense of what we call ‘real’. When one looks back over the shattered IT dreams of the last four or five years one might think that Raschke would have done better here to skip his ‘big picture’ claims and concentrate on the smaller but more significant bits that fit in between them, such as how the neo-modern university can retain its independence from business and government, or how IT enhances problem-based constructive learning. One hopes that Raschke will take his interesting and challenging ideas and apply them to more concrete and historical contexts. Perhaps those are topics for another book.

References

Collingwood, R.G. (1946). The Idea of History. London: Oxford University Press.

Putnam, R.D. (2000). Bowling Alone. New York: Simon Schuster.

Bryant Griffith – College of Education. Texas A University, Corpus Christi. Corpus Christi, Texas, USA.

Acessar publicação original

[IF]