História e culturas políticas / Varia História / 2002

Dando seqüência a um formato editorial iniciado a partir do número 25, quando Varia Historia passou a ser organizada pelas linhas de pesquisa do Programa de Pós-Graduação em História da UFMG, apresentamos a presente edição, cuja coordenação coube à linha “História e Culturas Políticas”.

Abre este número de Varia Historia um dossiê que reúne parte dos trabalhos apresentados no “Colóquio História e Culturas Políticas”, realizado pela linha em novembro de 2001. O evento reuniu pesquisadores da casa e convidados de outras instituições, com o objetivo de empreender esforço conjunto de discussão em torno desse campo de pesquisa que se configura instigante e inovador. De fato, nota-se vivo contraste entre a riqueza de possibilidades abertas pelo estudo das culturas políticas, que descortinam universo amplo de indagações a serem colocadas aos fenômenos políticos, e a relativa escassez de reflexões sobre o alcance- e eventuais limitações- do trabalho com essa categoria.

No dossiê, publicamos sete dos textos apresentados no Colóquio, amostra pequena mas significativa das discussões empreendidas. No texto inicial, a Prof. Eliana Regina de Freitas Dutra faz um balanço das definições e da história do conceito de cultura política, e ao mesmo passo, realiza inventário das principais tendências historiográficas que, a partir do diálogo com outras ciências sociais, têm se dedicado a esse campo de análise e pesquisa. A Prof. Carla Maria Junho Anastasia oferece algumas reflexões sobre a violência política e os motins na América portuguesa do século XVIII , além de analisar como, sob o impacto da edição da Lei da Boa Razão, que implicou o cerceamento de direitos costumeiros internalizados pelos vassalos da coroa, foram engendradas novas formas de ação coletiva.

O artigo da Prof. Kátia Gerab Baggio enfoca fenômeno político importante para compreender a América Latina contemporânea, a cultura política nacionalista. Ela privilegia os casos de México, Cuba e Porto Rico e procura apontar as representações nacionais construídas nesses países, respeitadas as nuanças e particularidades de cada situação. No seu texto, a Prof. Angela de Castro Gomes retoma o debate envolvendo as categorias populismo e trabalhismo, e apresenta interessante roteiro de análise. A proposta é pensar o populismo como um mito político, integrante do imaginário social brasileiro, e encarar o trabalhismo como uma tradição política pertencente ao campo do pensamento social / político. Compreender o “queremismo”, ou seja, o movimento que levou contingente expressivo de populares às ruas, em 1945, demandando a permanência de Vargas no poder, é o eixo do trabalho do Prof. Jorge Ferreira. Partindo da análise das crenças e valores daqueles trabalhadores, o autor procura explicar as razões da persistente popularidade do ditador que, paradoxalmente, via o regime que havia construído se esboroar.

O tema do Prof. João Trajano Sento-Sé é o brizolismo, força política preponderante no Rio de Janeiro dos anos 1980 e 1990. O argumento central do artigo é explicar a popularidade do líder gaúcho no Rio de Janeiro, que teria a ver com a capacidade do brizolismo de mobilizar certos aspectos da cultura política carioca. O Prof. José Antonio Dabdab Trabulsi, cujo texto encerra o dossiê, procura analisar as visões construídas pela historiografia européia do século XIX acerca da cidade grega antiga, mostrando como essas leituras eram informadas pela influência de culturas políticas contemporâneas como o republicanismo, o conservadorismo e o socialismo.

A revista traz ainda outros quatro artigos. O trabalho do Prof. Marcelo Cândido da Silva está centrado na análise da obra de um autor medieval, Gregório de Tours, historiador do reino Franco. A hipótese sustentada é que o texto, para além do conteúdo moralizante e religioso, pode ser usado como fonte para compreensão da história política merovíngia. Já o texto da Prof. Berenice Cavalcante tem como tema a obra política e intelectual de Afonso Arinos. Submetidos à análise da autora, os escritos do ex-Senador revelam um intelectual refinado, capaz de aliar uma notável faceta moderna à sólida formação clássica. Um confronto entre memórias de militares e militantes políticos de esquerda, atuantes nos embates dos anos 1960 e 1970, é o que nos apresenta o Prof. João Roberto Martins Filho. Do contraste entre essas falas, constata o autor a permanência do tema da tortura como pomo de discórdia entre as esquerdas e os militares. Fechando a edição, temos o artigo de Eduardo Flores Clair e Alba López Mijares, que revela faceta pouco conhecida das sociedades mineiras da Nova Espanha no século XVIII, qual seja, o cotidiano familiar e doméstico daqueles grupos sociais, em que afloram sentimentos e segredos íntimos e, também, a violência.

Rodrigo Patto Sá Motta

Heloisa Starling

(Organizadores)


MOTTA, Rodrigo Patto Sá; STARLING, Heloisa. Apresentação. Varia História, Belo Horizonte, v.18, n.28, dez., 2002. Acessar publicação original [DR]

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