América – governos e instituições / Dimensões / 2008

Um dossiê dedicado aos estudos americanos deve ser sempre bem vindo, tendo em vista as reconhecidas dificuldades enfrentadas por pesquisadores e estudantes de História da América. Ainda estamos longe de superar os problemas práticos e ideológicos, que se colocam em nosso caminho. Dificuldade de acesso às fontes e bibliografia, reduzida circulação de informações e da cultura das Américas em nosso meio, alunos vindos do ensino médio com pouco preparo, ausência de materiais didáticos adequados e, talvez como uma das origens dos problemas citados acima, uma certa tendência a considerar a área de História da América como um campo isolado, que so atrai o interesse dos especialistas. No campo das publicações, embora avanços consideráveis tenham sido feitos, continuamos carentes de traduções, especialmente de trabalhos importantes de história da América contemporânea. Nas estantes brasileiras, a Inglaterra e a França continuam muito mais presentes que o México ou o Peru. Todas essas antigas deficiências continuam presentes em nossa época.

Um dos males que consideramos mais prejudiciais é, não só o desinteresse pelo resto da América demonstrado no Brasil, mas, igualmente, a dificuldade em pensar a história do Brasil dentro do universo americano. Não só uma história comparativa, que seria só um ponto de partida. Seria importante um repensar de inúmeras questões da história brasileira em pontos-chave, como a formação do Estado, as relações de trabalho ou os modelos de vida política, dentro de uma verdadeira história comum da América. Empreendimentos desse tipo já foram feitos, como por exemplo nos estudos sobre escravidão na América colonial. Mas há todo um campo de possibilidades a ser explorado, o qual, inclusive, aumentaria o interesse internacional pelas pesquisas locais. Esta poderia ser uma valiosa expectativa para o futuro, embora sua execução pareça muito difícil no momento.

Apesar das dificuldades, é importante notar que vários passos foram dados para superar esse persistente quadro e esse número da revista Dimensões, publicação do Programa de Pós-Graduação em História da Ufes, demonstra alguns deles. É estimulante ver que a diversidade de temas aqui abordados reflete um aumento dos interesses de pesquisa dentro da comunidade de americanistas brasileiros. Todos os períodos, desde as sociedades pré-colombianas até a questão indígena no século XXI estão enfocados, abrangendo temas sobre os Estados Unidos, México, Cuba, Peru e Argentina. Especialmente valiosa é a constatação do crescente uso de fontes primárias e bibliografias mais amplas nas pesquisas de campo, acesso que sempre exige esforço extra dos pesquisadores diante da insuficiência de nossas bibliotecas e acervos. Fato também estimulante é a colaboração de nossos colegas estrangeiros, especialmente argentinos, cujas contribuições ampliam o diálogo entre as comunidades de pesquisadores dos países latino-americanos.

De uma forma geral, o bom número de artigos que recebemos reflete o crescimento da área, do qual vários sinais são visíveis. A realização regular e bem sucedida dos simpósios da Associação Nacional dos Pesquisadores e Professores de História das Américas – Anphlac, eventos que reúnem mais de duzentos pesquisadores a cada dois anos, demonstra a crescente atração que os estudos americanos exercem. A associação mantém uma revista on-line e um boletim periódico com informações sobre a área, iniciativas que precisam ser ampliadas para a criação de uma relação mais constante entre os pesquisadores. Entre os projetos importantes em andamento está o GT de Ensino de História da América, que está preparando novos recursos didáticos acessíveis on-line para professores e estudantes dos diversos níveis de ensino. A interação desses profissionais é fundamental para fortalecer nossa presença diante de outras áreas e integrar a reflexão sobre as Américas na corrente dos estudos históricos feitos no país.

A organização desse dossiê é uma contribuição dos professores de História da América da Universidade Federal do Espírito Santo, que estimula os estudos americanistas, seja através de nosso Laboratório de Estudos de História Política e História das Idéias – Lephi, ou com projetos de Iniciação Científica ou Mestrado. Felizmente, dispomos na biblioteca de nossa instituição uma seção de história da América de ótimo nível, o que nem sempre é fácil de reunir com os recursos disponíveis. Agora realizaremos o próximo simpósio da Anphlac em nossa cidade. Esperamos, assim, somar esforços com a iniciativa de outros colegas para que possamos superar de vez as barreiras que sempre prejudicaram nossa área.

Os Organizadores

GIL, Antonio Carlos Amador; SANTOS, Fábio Muruci dos. Apresentação. Dimensões. Vitória, n.20, 2008. Acessar publicação original [DR]

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