Dengue no Brasil: abordagem geográfica na escala nacional – CATÃO (Ge)
CATÃO, Rafael de Castro. Dengue no Brasil: abordagem geográfica na escala nacional. [Sn.]: Cultura Acadêmica; Editora da UNESP’, 2012. Resenha de: MAGALHÃES, Suellen Silva Araújo; MACHADO, Carla Jorge. Em busca de um elo entre geografia e saúde. Geografias, Belo Horizonte, 01 de Julho – 31 de Dezembro de 2013.
Lançado em 2012, o livro ‘Dengue no Brasil: abordagem geográfica na escala nacional’, editado pela Cultura Acadêmica/Editora UNESP, é uma publicação oportuna e bem vinda. O autor, Rafael de Castro Catão, é geógrafo graduado pela Universidade de Brasília em 2007 e mestre pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho em 2011. Sua experiência, entre outras, é nas áreas, de geografia da saúde e cartografia, o que lhe permite habilmente entremear esses conhecimentos na produção de um panorama e de um arcabouço teórico conceitual, marcado pelo pensamento geográfico, para o estudo da Dengue no Brasil.
O livro consta de três capítulos, antecedidos pelo Prefácio e pela Introdução; e sucedidos pelas Considerações Finais e Recomendações e pelas Referências Bibliográficas. O Prefácio, escrito pelo professor Raul Borges Guimarães da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, estabelece a premência de obras como a de Catão ante a crise do modelo hegemônico da epidemiologia clínica, a reemergência de uma gama de doenças infecciosas e o aumento da pós-graduação em geografia, a qual permitiu captar demandas sociais, entre as quais àquelas por melhores condições de saúde. Assim, abre o caminho para que o leitor se sinta desejoso de conhecer como o aporte da geografia pode contribuir para elucidar a temática de uma doença transmissível.
Na Introdução o autor relata mudanças socioespaciais ocorridas após a Segunda Guerra Mundial, que desencadearam um novo padrão de epidemias, quais sejam: mais frequentes e mais abrangentes.
Rafael Catão parte de Milton Santos e de sua teoria espacial para analisar mudanças socioespaciais da dengue, na tentativa – bem sucedida – de relacionar o padrão da doença, sua emergência e expansão mundial, além do surgimento e a intensificação de casos mais graves à mudança do período e a produção desse novo meio geográfico. Enfoca, ainda, o caso do Brasil, onde houve erradicação, mas posterior reinfestação e, deste modo, estabelece a questão chave do livro: se a consolidação e expansão do meio técnico-científico-informacional – um dos mais conhecidos conceitos na geografia no Brasil (MAIA, 2012) – e a ampliação dos processos de urbanização, aliados a expansão mundial da doença, forneceram as condições socioespaciais que fizeram a dengue emergir nos dias atuais como um dos principais problemas de saúde pública do país. É também na Introdução que o autor explica o impacto do sistema de técnicas aplicado à natureza e causador de mudanças à saúde utilizando, entre outros, o exemplo do uso de vacinas no auxilio da imunização. Comenta ainda sobre a expansão das fronteiras agrícolas e econômicas que permitiu e permite a expansão dos meios de transporte e das telecomunicações interligando lugares e pessoas com maior circulação da informação. O autor conclui, então, que a atual configuração no espaço geográfico da doença depende das relações interdependentes estabelecidas entre o homem (social e biológico, individual e coletivo, imune e suscetível) com os vetores (gênero Aedes), o vírus (sorotipos e genótipos) e o meio técnico-cientifíco-informacional, inovando acerca da tradicional tríade epidemiológica meio ambiente, agente, hospedeiro.
O Capítulo 1 ‘Dengue: Emergência e Reemergência’ perpassa pela etiologia da dengue em seus quatro sorotipos, pelas teorias acerca da origem geográfica dos vírus e de seus sorotipos e pelos principais vetores. Os ciclos de transmissão também são abordados dado que seu conhecimento é fundamental para que sejam tomadas medidas de saúde pública e de vigilância de saúde em escala global: o autor ressalta o ciclo urbano endêmico/epidêmico. Finalmente, o autor aborda a difusão mundial da dengue.
O Capítulo 2 ‘Difusão do dengue no Brasil’ trata, entre outros aspectos, do retorno do Aedes aegypti e da dengue ao território nacional: em 1976 o país foi reinfestado, permanecendo desta forma ainda hoje. Nesse capítulo está um belo e oportuno detalhamento cartográfico da reemergência da dengue no Brasil, o que permite ao autor estabelecer uma análise do conjunto do País, onde, após a dispersão geográfica do vetor, as interações espaciais existentes em áreas com circulação viral permitiram e mantiveram até hoje a entrada de novos sorotipos em áreas indenes e infestadas. O papel da cidade reside nesse contexto, ao concentrarem indivíduos e bens, com fluxo intenso e veloz, que difunde e mantém o vírus.
‘Uso do território e o dengue no Brasil’ é o Capítulo 3, que trata dos fatores determinantes da transmissão dos vírus da dengue e do papel do Estado na contenção de epidemias. Rafael Catão faz um relato elegante sobre as formas de abordagem desses fatores determinantes da dengue na literatura brasileira, bem como sobre as fontes de dados. O mapeamento dos determinantes em escala nacional e uma síntese da situação recente da dengue no território também são realizados. Ao final do capítulo, o autor faz uma proposta de tipologia da dengue para a primeira década do século XXI no Brasil: os locais com baixa notificação dos casos de dengue normalmente apresentam uma média de temperatura anual mais baixa, baixa densidade de povoamento, baixo índice pluviométrico, políticas públicas mais eficientes, população mais consciente e poucas rodovias de fluxo intenso que ligam várias cidades. Após o capítulo, seguem as Considerações Finais e Recomendações, nas quais o autor deixa claro que, para compreender em plenitude o fenômeno da epidemia da dengue, perguntas tais como: ‘qual o contexto do dengue em sua área de influência?’ ou ‘como foi o processo de consolidação do dengue nessa localidade?’ necessitam ser feitas e suas respostas procuradas.
Além disso, o autor faz uma comparação crítica da atuação das técnicas de cartografia de síntese e das técnicas de geoprocessamento.
Ao final do livro, fica em evidência a constatação de BARCELLOS (2000): epidemiologia e geografia têm em comum crises ocorridas pelo esgotamento de modelos teóricos ou crises advindas da superação desses modelos em razão de novas realidades. Uma das novas realidades é a reemergência de doenças transmissíveis no Brasil e no Mundo – como a dengue. A obra de Rafael de Castro Catão incorpora o espaço explicitamente na análise da dengue, tornando o elo entre a geografia e a saúde visível e utilizável a pesquisadores das mais variadas áreas do conhecimento.
Referências
BARCELLOS, Christovam. Elos entre geografia e epidemiologia. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v.16, n.3, Setembro 2000. Disponível em: http:// www.scielo.br/scielo. php?pid=S0102- 311X2000000300004 &script=sci_arttext
CATÃO, Rafael de Castro. Dengue no Brasil – Abordagem geográfica na escala nacional. São Paulo: Cultura Acadêmica/Editora UNESP, 2012.
MAIA, Lucas. O conceito de meio técnico-científicoinformacional em Milton Santos e a não visão da luta de classes. Ateliê Geográfico Goiânia- GO v. 6, n. 4 Dez/2012 p.175-196 Disponível em: http://www.revistas. ufg.br/index.php/atelie/article/view/15642
Suellen Silva Araújo Magalhães – Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG.
Carla Jorge Machado – Departamento de Medicina Preventiva e Social.
[IF]