Descobrir | Tzvetan Todorov

Tzvetan Todorov foi um filósofo e linguista búlgaro, com formação acadêmica na Universidade de Sofia, Bulgária. Influenciado pelo seu instrutor Roland Barthes, um dos mais respeitados teóricos do estruturalismo (método no qual elementos da cultura humana devem ser entendidos em face de sua relação com um sistema ou estrutura mais abrangente), o pensamento de Todorov direciona-se para a filosofia da linguagem, numa visão estruturalista que a concebe como parte da semiótica (saussuriana).

Todorov foi professor da École Pratique Des Hautes Etudes, da Universidade de Yale, diretor do Centro Nacional de Pesquisa Científica de Paris (CNRS) e dirigiu o Centro de Pesquisa sobre as Artes e a Linguagem da mesma cidade. Ele produziu vastas obras na área de pesquisa linguística e teoria literária e que estão hoje traduzidas em vinte e cinco idiomas. Em sua obra: “A conquista da América: A questão do outro”, Tzvetan Todorov analisa a conquista da América sob a questão do outro, a qual ele estabelece como unidade de ação a percepção que os espanhóis têm dos índios nesse contexto de conquista, além de expor suas pesquisas a respeito do conceito de alteridade, existentes na relação de indivíduos pertencentes a grupos sociais diversos, cujo objeto central justifica-se na própria situação do autor, que é imigrante na França, um país onde supostamente a relação entre nacionais e estrangeiros é historicamente marcada por um xenofobismo não declarado.

Seu livro se divide em quatro partes: “I-Descobrir”, “II-Conquistar”, “III-Amar” e “IV-Conhecer”; e, em cada uma delas, utiliza trechos de textos de autores que serão seus próprios personagens nessa história. Tzvetan Todorov tenta reconstruir, com uma narrativa dinâmica, o ambiente da conquista pela análise do outro, do “índio”, na qual ele se baseia em personagens históricos como Cristóvão Colombo para descrever os acontecimentos.

A primeira parte: “I-Descobrir”, é subdividida em três: “A descoberta da América”, “Colombo hermeneuta” e “Colombo e os Índios”. No subtítulo “A descoberta da América”, Todorov relata que o principal motivo que o levou a escolher estudar a descoberta do outro foi o sentimento de estranheza o qual ocorreu quando os espanhóis se chocam culturalmente com os indígenas.

Ele inicia nos propondo uma questão: “O que levou Colombo a partir? O que o motivou a conquistar a América?”. Ao analisar as cartas de Colombo, inicialmente acha-se que ele estava à procura de ouro, entretanto, ao prosseguirmos em seus relatos, Colombo deseja propagar o nome do Papa e o seu evangelho, pois ele se preocupava muito mais com a expansão do cristianismo do que com o ouro.

Em sua obra, Todorov nos mostra os relatos do próprio Colombo, o qual vê sua viagem como uma missão divina, na qual, ao ir em direção à China por uma via “Direta”, como assim imaginara ao partir, Colombo pretendia encontrar o ouro que lá “nascia”, para que, munido de fundos pudesse cumprir sua missão: “Partir em cruzada e libertar Jerusalém!”. Um ponto que chama atenção na narrativa de Todorov é a passagem na qual ele diz que Colombo não era um homem moderno, e que no desenrolar da descoberta, os fatos levariam a isso, como se o homem que faria nascer um mundo novo já não poderia fazer parte dele. No segundo subtítulo “Colombo hermeneuta”, Todorov revela três esferas que dividem o mundo de Colombo: a natural, a divina e a humana, entretanto, segundo ele, elas não poderiam ser analisadas em um mesmo plano.

Ele continua com trechos das cartas onde, segundo ele, Colombo usava a estratégia de interpretação finalista (a qual o sentido final é dado imediatamente) e por isso, baseado em crenças religiosas, interpreta de forma mítica todo o cenário, pensando ter achado o paraíso terrestre e que tal paraíso só poderia ser encontrado por vontade divina. Logo após, enxergando os indígenas como seres míticos como, por exemplo, sereias e homens de só um olho.

Quanto à esfera natural, Todorov, relata como a relação de Colombo com a natureza o ajudou em suas navegações e como era, até então, a única forma de comunicação realmente eficaz com os indígenas. Ele também evidencia como Colombo se utiliza de diversos superlativos para endeusar a natureza e torna-la ainda mais fascinante.

Todorov ressalta também que a estratégia finalista de interpretação utilizada por Colombo passa a ser preponderante, pois ele passa a não tentar procurar a verdade, mas a confirmar as ideias que já tinha formado de antemão. Já na esfera humana, Todorov destaca a relação do descobridor com os nomes, pois, como Colombo pensava, o nome deveria estar de acordo com a qualidade ou utilidade das coisas. Nesse sentido, ele escolhe nomes às ilhas à medida que vai descobrindo-as, em função do sentido que representam em sua descoberta. Do mesmo modo ele age com a língua indígena, ignorando toda interpretação real, pois para ele as palavras não eram nada mais que a imagem das coisas.

Já no terceiro subtítulo “Colombo e os Índios”, Todorov, através dos escritos do próprio conquistador, nos diz que Colombo vê os índios como parte da paisagem. O que chama a atenção de Colombo, inicialmente, é a nudez indígena, pois esperava encontrar, no paraíso terrestre, pessoas cultas, pois para ele pessoas nuas não tinham cultura, costumes ou religião.

Baseando-se nessa ideia de que a nudez representava a falta de religião, ele vê a oportunidade para uma inscrição espanhola e cristã nos indígenas. Colombo, em seu choque e admiração a eles, descreve-os de antemão como belos e inocentes e em outros momentos como maus e covardes, interpondo sempre suas convicções às características dos povos mesoamericanos, dificultando assim, discernir a realidade da visão que gostaria de passar.

Nesse sentido, “A conquista da América: A questão do outro” é uma excelente leitura para compreender a conquista da América e um pouco da visão de Colombo sobre os povos mesoamericanos. Os relatos e descrições contidos na obra nos revelam um lado mais detalhado do contexto da conquista e desconstrói vários conceitos e ideias intrínsecos à visão europeia e que antes eram tidas como verdades absolutas.

Como é possível observar, a conquista espanhola foi um acontecimento revolucionário e que abalou toda estrutura mesoamericana da época, trazendo à Europa uma nova concepção de mundo, além de relatar o choque cultural sofrido por ambas as partes e o desejo que levou a Espanha a uma imposição da língua, religião, cultura e principalmente a busca por poder e unificação.


Resenhista

Mariana Cunha Fontes – Graduanda em História, Curso de Licenciatura pela Universidade Federal de Ouro Preto. E-mail: [email protected]


Referências desta Resenha

TODOROV, Tzvetan. Descobrir. In: TODOROV, Tzvetan. A conquista da América: a questão do outro. 2 Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. Cap. I. Pag. 3-48. Resenha de: FONTES, Mariana Cunha. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Pará. Belém, v. 06, n. 01, p. 87-89, jan./ jun. 2019. Acessar publicação original [DR]

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