Lugares de professores: vivências, formação e práticas docentes nos anos iniciais do ensino fundamental | Antonio Carlos Pinheiro

Como toda obra, o livro Lugares de professores: vivências, formação e práticas docentes nos anos iniciais do ensino fundamental, revela as pinceladas, contextos e ideias do autor. Antonio Carlos Pinheiro, atualmente é professor Associado I da Universidade Federal da Paraíba, atuando na graduação e no Programa de PósGraduação em Geografia.

Na contextualização do livro, objetiva-se compreender o papel da docência e os conflitos existentes no espaço escolar, diagnosticando problemas e sugerindo ao leitor uma reflexão sobre sua própria formação e prática docente, levando-o muitas vezes ao “déjà vu” de contextos e fatos escolares vividos por alunos e docentes. O primeiro lembrete se refere à mudança da nomenclatura para as fases de educação brasileira, visto que a “[…] Escola de Educação Infantil, Ensino Fundamental de 9 anos (não mais séries) e o Ensino Médio, todas juntas constituem o Ensino Básico” (PINHEIRO, 2012, p. 29).

O livro é dividido em cinco partes que indicam os passos da pesquisa. Na introdução, capítulo I, o autor revela suas inquietações e motivações para a investigação do tema, ressaltando seu percurso profissional enquanto professor da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e da Universidade Federal de Goiás, e se pergunta sobre a dinâmica estruturante em sala de aula.

Os discursos e práticas dos professores inquietam Pinheiro (2012), apresentando a seguinte questão: o que levam as escolas, mesmo de espaços distantes a se assemelharem em algum aspecto? Seu segundo passo é necessariamente caracterizar a pesquisa mediante a escolha da metodologia, os critérios, objetivos, o público alvo definido e a dinâmica da escola que envolve estes profissionais. Isso caracteriza o capítulo II, considerações sobre a pesquisa.

O capítulo III, Formação escolar e profissional dos professores, narra e discute a trajetória escolar dos professores entrevistados desde sua infância e iniciação estudantil nos anos iniciais até sua entrada no magistério. Discute-se posteriormente a prática docente dos professores as experiências construídas ao longo dos anos, sua afirmação enquanto profissional, os parâmetros que regem seu trabalho pedagógico, a gestão da sala de aula e a rotina e aprendizagem entre outros temas. No capítulo IV, o autor relaciona a questão ao Ensino de Geografia na visão e na prática dos professores dos anos iniciais do Ensino Fundamental.

A investigação de Pinheiro (2012) produto da pesquisa do pós-doutorado realizado na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo, no ano de 2011, revela uma um estudo de caráter qualitativo, baseado em uma metodologia ainda pouco utilizada na Geografia, entretanto bastante conhecida na área de Educação, a Metodologia Autobiográfica.

A História de Vida como procedimento metodológico, auxilia o pesquisador a refletir sobre as narrativas e experiências pessoais de quatro professores que tiveram sua formação inicial no curso de Magistério de nível médio e egressos do curso de Pedagogia da Universidade Federal de São Paulo – Campus Guarulhos, onde trabalhou de 2008 a 2012.

Fábio (23 anos), Júlia (29 anos), Paulo (30 anos) e Marina (47 anos), nomes fictícios criados por Pinheiro (2012), são sujeitos da trama que revelam as histórias da vida real destes professores. O contexto social desde os anos iniciais até a entrada no magistério é considerado por Pinheiro (2012) para argumentar as práticas promovidas e praticadas por eles em sala de aula.

São professores de contextos sociais e históricos distintos, embora próximos. Marina com maior experiência de vida é citada como exemplo quando se discute a questão do ensino e aprendizagem na época da ditadura militar brasileira. Pinheiro (2012) se faz participante na trama de modo a envolver o leitor naquela realidade vivida. Destaca a influência da cartilha Caminho Suave, largamente utilizada por décadas no Brasil, na formação desses professores.

O autor ressalta o modo como se organizava os métodos de alfabetização e práticas escolares, refletindo sobre a própria rotina do tempo-espaço escolar enquanto fatores de pacificação do corpo, dos (co)mandos incorporados neste espaço, sugerindo a reflexão sobre a forma e função dos artifícios de ensino-aprendizagem e da organização da escola na atualidade.

Outro fator de grande importância neste livro é a discussão da prática docente e dos saberes entre professores e alunos e alunos e alunos, em muitos casos a hierarquia realizada entre os que sabem e os que não sabem torna-se parâmetro para (des)envolver as atividades com os discentes. A prática do professor é revelada também nestas circunstâncias, no próprio modo de fazer do cotidiano escolar, a experiência com os alunos a “rotulação” entre alunos bons e ruins, o recurso didático utilizado, o modo de percepção da vida pelo próprio aluno e pelo docente.

A prática docente está relacionada diretamente ao trabalho do professor e como em qualquer outra profissão seu exercício é complexo e cheio de desafios, configurandose no momento em que cada professor encontrará seu modo de saber-fazer, resultando na construção da personalidade deste profissional. O fato repercute nos mecanismos criados pelo professor para se adequar a sua realidade profissional, a maneira que trabalha, que defende suas ideias e suas práticas, sua orientação sexual, entre outros fatores, configura a identidade do professor. A autodefinição do ser professor, a partir das experiências e práticas relacionadas às histórias de vida e das vivências, do modo que aprendeu é repensado por Pinheiro interpretado sob o referencial de Maurice Tardif. Ser professor é volta-se para a efetivação da sua profissão. A segurança e estabilidade financeira representam, na voz dos professores, uma confissão das alegrias, satisfações e permanência na área de educação.

Para discutir a formação dos professores, também é necessário questionar como eles ensinam. Pensar estes modelos é intencionar o planejamento e avaliação em sala de aula. Nesse contexto Paulo separa os alunos por níveis de aprendizagem, Júlia trabalha com uma colega buscando alternativas para dinamizar as aulas, Marina organiza os alunos por dificuldades que possam apresentar, dando-lhes atividades diferenciadas, por fim, Fábio prefere não confrontar a estrutura escolar seguindo a rotina de atividades escolares. Sobre a rotina da sala de aula, afirma o autor:

Uma questão colocada para todos os entrevistados foi como concebem a rotinização das atividades docentes para a aprendizagem dos alunos. Todos os professores consideraram que é uma prática central da escola onde trabalham e acreditam que a mesma constitui um papel preponderante para a aprendizagem dos alunos (PINHEIRO, 2012, p. 103).

Como os alunos aprendem? Como produzir uma aprendizagem significativa? A partir da leitura do texto o leitor poderá compreender que a avaliação serve para reelaboração do saber-fazer do professor e para identificar a aprendizagem dos alunos, entretanto disciplinas como a Geografia são avaliadas pelo processo, como afirma Paulo.

As brincadeiras, a família, as questões de gêneros também são fatores complementares que permite a aproximação de alunos e professores e seu desenvolvimento em classe. Não é de hoje que é sabido que as disciplinas que enfatizam a leitura da língua materna (Português) e a Matemática têm maior carga horária na matriz escolar. Com base nos depoimentos dos professores, nota-se que a Geografia entre as Ciências Sociais e as Ciências da Natureza se firma enquanto saberes complementares no cotidiano escolar.

Aprofundando-se na discussão do ensino de Geografia, no capítulo IV, três pontos são destacados: o primeiro as noções básicas de espaço. Analisa-se a formação escolar e nos leva a recordar as comuns das atividades de lateralidade e localização. Paulo em seu relato demonstra a execução de uma atividade que pretendia mapear as salas de aula da escola, entretanto por falta de planejamento e sem necessariamente referir-se a um aporte teórico-metodológico, seu trabalho foi frustrado devido ao descontentamento dos colegas docentes e da própria direção da escola em decorrência da “bagunça” dos alunos nos corredores, como relatou o professor.

No segundo ponto, os professores destacaram que há uma diferenciação entre os dois primeiros anos (1º e 2º) de Ensino Fundamental dos outros três últimos (3º, 4º e 5º ano), para todos eles a questão da maturidade dos alunos relacionada ao pouco domínio da leitura e escrita são fatores primordiais para o desenvolvimento do ensino-aprendizagem de Geografia.

A importância e dificuldades, discutidas no terceiro ponto, podem ser relacionadas a uma construção de uma visão crítica da realidade, inserida na escola, a compreensão teórico-conceitual da Geografia são destacados pelos professores como obstáculos neste processo educativo.

Cada leitor ao fim da obra considerará os pontos mais significativos para si enquanto sujeitos sociais. Aos graduandos, não apenas de Geografia, o texto demonstra os percursos e a importância de uma formação permanente enquanto ser-professor, aos docentes permite a reflexão sobre sua própria história de vida e como realiza seu trabalho.

Como todo conhecimento social, sugiro ao leitor não se prender as páginas do livro de Antonio Carlos Pinheiro, mas superá-las, refletindo sobre sua própria formação, sobre sua prática docente, o diálogo entre os conhecimentos, em especial, da Pedagogia e da Geografia tornam-se ainda mais necessária, pois conhecer é também traçar caminhos para pensar a prática de formação e profissional.


Resenhista

David Luiz Rodrigues de Almeida – Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Geografia (PPGG) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Professor substituto no curso de licenciatura em Geografia da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), campus Cajazeiras. E-mail: [email protected]


Referências desta Resenha

PINHEIRO, Antonio Carlos. Lugares de professores: vivências, formação e   práticas docentes nos anos iniciais do ensino fundamental. São Paulo: Porto de idéias, 2012. Resenha de:  ALMEIDA, David Luiz Rodrigues de. Revista Brasileira de Educação em Geografia. Campinas, v. 8, n. 15, p. 308-312, jan./jun. 2018. Acessar publicação original

Deixe um Comentário

Você precisa fazer login para publicar um comentário.