Motivação para ensinar e aprender: teoria e prática – SCHWARTZ (C)

SCHWARTZ, Suzana. Motivação para ensinar e aprender: teoria e prática. Petrópolis: Vozes, 2014. Resenha de: CAMPOS, Paulo Tiago Cardoso de. Conjectura, Caxias do Sul, v. 21, n. 3, p. 660-665, set/dez, 2016.

O ponto de partida para a elaboração da obra de Suzana Schwartz incluiu uma pesquisa realizada no início de seu doutorado, a qual apurou este resultado: 75% dos 200 respondentes a um questionário, todos professores-alfabetizadores, declararam ser a “falta de motivação para aprender” a razão para a não aprendizagem de seus alunos. A autora afirma que há estudos que revelam decréscimo de motivação para a aprendizagem entre o início da Educação Básica e o quinto ou sexto ano. Na obra, a autora ocupa-se de questões que a inquietam intelectualmente, como: O que leva os alunos ao interesse e esforço para aprender, e em que medida isso depende deles ou do ambiente que os cerca, incluindo a sala de aula e o professor, em especial? Quais são as consequências da ausência de motivação, ou, ainda, da desmotivação, para a aprendizagem? De que maneira a motivação se relaciona com o trabalho docente?

A definição geral de motivação mais destacada pela autora considera que, inicialmente, há motivos ou metas que as pessoas definem (como, por exemplo, a busca de qualificação profissional), enquanto motivação é o processo através do qual os motivos surgem, se desenvolvem e mobilizam comportamentos. É aquilo que produz energia inerente às ações e aos meios de executá-las, e é afetado por fatores cognitivos e afetivos, tendo-se em vista experiências anteriores dos sujeitos, crenças e valores e aspectos contextuais (alguns desses sob controle do professor).

O livro divide-se em dois capítulos: o primeiro deles, Motivação para ensinar e aprender e o conceito de motivação, inicia reforçando os questionamentos já apresentados acima, e se encaminha para uma discussão teórica sobre motivação e sua relação com a aprendizagem.

Apresenta, na condição de aproximadamente (ou análogo a) indicadores do conceito de motivação para a aprendizagem: interesse, envolvimento, esforço, concentração e satisfação com os resultados. A autora ressalta que é preciso diferenciar valores de metas que dirigem as ações do aprendiz, sua capacidade cognitiva, os conhecimentos prévios, os esquemas de pensamento que as desencadeiam e a influência de fatores contextuais que contribuem ou inibem a aprendizagem. A motivação, assim, vai além do conceito psicológico, uma vez que, nas atividades escolares, há um contexto em que ocorrem situações de aprendizagem e que inclui curiosidade, interesse do aprendiz em relação ao curto ou longo prazo de sua vida e atenção mantida e retroalimentada ou construída.

A seguir, Schwartz discute mais detalhadamente o conceito de motivação, seguindo uma linha mais ou menos cronológica, enfatizando que não há consenso entre os autores quanto ao mesmo. Nesse detalhamento, ao todo, são apresentadas dez posições teóricas resumidas, mais influentes e afetas ao tema do livro. As linhas teóricas iniciais, mais simplificadoras, que remontam aos anos 40-50, como as de Skinner e Pavlov e também a de Hull, foram fortemente questionadas e se mostraram insuficientes para dar conta dos diversos aspectos que permeiam a questão da motivação, pois eram defensoras da motivação como articulada com o esquema estímulo-resposta visando a “hábitos desejáveis”, e com a relação necessidade-incentivo.

Dada a insuficiência das teorias acima, ocorreu um encaminhamento para elaboração de teorias motivacionais de enfoque cognitivo, que incluíram a perspectiva intrínseca, de que a conduta é intencional, e os comportamentos são escolhidos, e seu contraponto (motivação intrínseca), em que as avaliações escolares motivam/desmotivam com esquemas prêmios-castigos e demonstrações explícitas de aprendizagem, nas quais muitas vezes o aprender é visto como cópia ou repetição de combinações de elementos fornecidos prontos pelo professor. Finalmente, há a motivação internalizada, que reflete automotivação e internalização de valores e crenças, para muito além de atender às exigências de pais e professores ou do prazer em desenvolver atividades escolares.

A seguir, a autora examina a teoria das metas, segundo a qual, as metas de aprendizagem referem-se a ser mais competente, e as metas de execução a aparecer como mais competente. A escolha por uma delas reflete certo sentido do que se entende por inteligência, e também afeta a própria motivação, pois há tarefas mais desafiadoras e mais difíceis, ou menos desafiadoras e mais fáceis, as quais os alunos mais hábeis ou os mais lentos podem desejar ou recusar, tendo-se em vista a motivação subjacente a elas, sua experiência anterior com tarefas complexas ou mais simples, bagagem inicial de conhecimentos e habilidades e sua autoestima como aprendizes. Em continuação, o quarto grupo de teorias (teorias motivacionais baseadas no alcance do êxito) se alicerçam na ideia de aproximação (êxito) ou evitação (vergonha) ao longo da experiência do aprendiz.

Do ponto de vista das teorias baseadas na expectativa-valor que a autora procura mostrar a articulação entre essas e as motivações extrínseca e intrínseca: por que as pessoas se envolvem com algumas tarefas e com outras não? Ou é pelo que espera receber em troca (extrínseca) ou pelo que espera desenvolver-se como pessoa (intrínseca), ou, quando não se envolve, não foi tocado por nenhuma dessas razões.

Uma sexta posição teórica é a das teorias motivacionais baseadas na percepção de autoeficácia. Essas teorias se baseiam em fatores cognitivos, em que se estabelece a diferença entre a expectativa de realizar uma tarefa (eficácia) e a expectativa quanto ao resultado disso. A expectativa de autoeficácia revela-se importante à aprendizagem, e o professor exerce um papel central, devendo ele, portanto, potencializar isso nos alunos.

A teoria da autovalorização ou atribuição diz que, se no processo de aprendizagem houver muito peso para critérios como “boas notas”, há o risco de discriminação dos que não as conseguem, ou dos que as conseguem; no primeiro caso, por parte de professores; no segundo, dos alunos (bullying). Ambos os casos são condenáveis, e essa ênfase desempenho pode ser superada com foco mais no sentido e no significado do aprendizado, no prazer de aprender, enfim, em razões positivas. Outro aspecto central dessa teoria é o “desamparo aprendido”, ou seja, a desmotivação para a aprendizagem gerada por um meio escolar em que resultados de aprendizagem não atingidos repetidas vezes, mesmo com dedicação e estudos, podem desestimular o aprendiz ou mecanizar suas ações escolares, reduzindo seus esforços somente para passar nas provas, ncaminhando o aluno para o insucesso e reprovações.

Finalmente, a autora apresenta as teorias sociocognitivas da autorregulação do ensino e aprendizagem, a teoria da autodeterminação e as teorias motivacionais voltadas ao interesse. As primeiras destacam a importância da crença na autoeficácia, na atribuição causal e em metas estabelecidas em comportamentos direcionados ao acompanhamento da tarefa. Seria preciso conjugar os componentes cognitivos e afetivo-emocionais visando à melhoria no rendimento escolar. Alunos autorregulados aprendem mais e melhor, dirigem ativamente seu pensamento, são auto-observadores e avaliadores e se voltam para resultados de aprendizagem. A teoria da autodeterminação confere importância ao papel da motivação intrínseca desempenhado por atividades desafiadoras em que os aprendizes sentem-se competentes e autodeterminados; e, de forma geral, essa teoria enfatiza a autodeterminação pessoal e a otimização dos desafios e atividades estimulantes, com reflexos na aprendizagem, tanto em consonância com objetivos de curto ou longo prazo. Por último, há as teorias motivacionais voltadas ao interesse, as quais sustentam que, uma vez motivados, os interesses dos alunos se refletem na atenção e no envolvimento com atividades didático-pedagógicas. Dado que existem diferenças entre interesses individuais e situacionais, há aspectos controlados pelo professor para mobilizar os alunos para desejar saber, pensar produtivamente e mobilizar e utilizar conhecimentos prévios. Outro ponto positivo é o professor fixar metas atingíveis e desafiadoras, de modo que os alunos se percebam como aptos a atingi-las.

A apresentação das referidas teorias está relacionada com o Capítulo 2: Motivação na prática docente. De que forma, os professores podem criar um ambiente de aprendizagem mais motivador? A autora sugere a explicitação do planejamento das atividades, com o despertar, já na aula inicial, da curiosidade nos alunos, sobre para que servem ou o emprego dos temas a serem estudados na vida dos aprendizes, detalhamento da avaliação focada na aprendizagem, etc. Além disso, a preparação de tarefas desafiadoras, que mobilizem os alunos e que sejam compatíveis com o nível de dificuldade e com a execução por parte dos aprendizes. Outro ponto é a necessidade de não existência de alunos/colegas preferidos concomitantemente à exclusão de outros. A percepção de exclusão do espectro de atenção do professor e/ou dos demais alunos prejudica a aprendizagem e desmotiva os alunos menos preferidos (há dados do MEC no texto reforçando isso).

Sobre conhecimentos prévios, a autora esclarece um importante aspecto: o professor não deve se reduzir a perguntar: “O que sabem sobre tal tema” e, depois, conduzir uma aula tradicional. Deve, sim, ir trazendo, aos poucos, termos e aspectos sobre o tema, sondando se são conhecidos dos aprendizes e incorporá-los ao que já conheciam sobre o tema. É como uma soma simultânea à organização do que já existia e do que a aula incorporou, em termos de conceitos, teorias, etc. Do mesmo modo, a condução da ativação dos conhecimentos prévios, assim como as tarefas propostas e a avaliação devem ser concebidas visando à autonomia da aprendizagem. Isso pode ser conseguido mediante explicitação da utilidade/utilização dos temas abordados na aula, atribuição de significado à aprendizagem e de uma real atitude de diálogo na aula, com abertura para indagações e narrativas de experiências ou curiosidades sobre os pontos da aula, e não apenas declarar que está à disposição para isso, mas subliminarmente censurar questionamentos, comentários e intervenções dos alunos.

Enfim, estratégias, procedimentos e orientações (resumidas acima) procuram ir ao encontro de aspectos práticos de como levar a cabo atividades docentes motivadoras da aprendizagem dos alunos, em consonância com as teorias examinadas no Capítulo 1.

De modo geral, o texto da autora é claro, bem-escrito e, como visto, possui no Capítulo 2 orientações práticas para o trabalho docente. No entanto, algumas lacunas podem ser identificadas. Por exemplo, o não esclarecimento do que se entende por interesse dos alunos; outra é a não incorporação (se for possível) da discussão sobre o papel desempenhado pelas famílias e empresas para aumentar a motivação dos alunos, especialmente em se considerando o Brasil. Outro aspecto é a suposição incorporada, ao longo do livro, de emprego dos mesmos métodos de estudo, por parte dos alunos que aprendem e vão bem e dos que, apesar de estudarem, não conseguem sucesso no seu desempenho acadêmico.

Talvez uma investigação a respeito desse último tema revele elementos novos à discussão da autora. Mais um aspecto é o exame de muitas teorias, o que ocupa espaço considerável no texto, sem um exame mais detalhado a respeito de seu poder explicativo no Brasil e/ou em diferentes níveis da educação. Apenas um quadro-síntese é apresentado no final do Capítulo 1, o um extrato de cada uma e dos autores principais.

Em suma, o livro, apesar desses pontos, merece atenção e consideração, pois, na sua extensão reduzida (75 páginas), se constitui numa leitura útil e orientadora. A nosso juízo, uma atividade interessante seria discuti-la em conjunto com obras como a de Rafael Porlán, Construtivisno y escuela (Madri: Díada, 2000), importante lição à área da aprendizagem através da resolução de problemas; outra obra é a de Marcos Masetto, Competência pedagógica do professor universitário (São Paulo: Summus, 2003), livro que analisa importantes estratégias de aprendizagem, forças e limitações de cada uma. Possíveis questões que podem emergir após a leitura do livro são: Um aluno desmotivado se educa? Pode alguém se considerar educado, se não sabe organizar seu próprio pensamento? Qual a função da motivação, visando à autonomia da aprendizagem nessa tarefa? Seria um exercício agradável e instrutivo. Obra recomendável para leitura e reflexão.

Suzana Schwartz é graduada em Pedagogia. Mestre e Doutora em Educação pela PUCRS. Pós-Doutora pela Faculdade de Psicologia da Universidade Autônoma de Madri. Atualmente, é professora-adjunta na Universidade Federal do Pampa Unipampa, campus de Jaguarão – RS. Participa de grupos de pesquisa na área de educação, coordena projetos de pesquisa, extensão e formação de professores. Professora permanente no Programa de Mestrado Profissional em Educação da Unipampa. Autora de diversos artigos publicados em revistas e anais de congressos, além de autora do livro Alfabetização de jovens e adultos: teoria e prática (Editora Vozes) e coautora do livro Avaliação e erro construtivo libertador (EDIPUCRS)

Paulo Tiago Cardoso de Campos – Contador. Mestre em Economia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor na Universidade Federal de Viçosa (UFV), Viçosa – MG. E-mail: [email protected]

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