Por que os líderes mentem: toda a verdade sobre as mentiras na política internaciona | John Mearsheimer

O livro “Por que os lideres mentem: toda a verdade sobre as mentiras na política internacional” é uma contribuição do renomado professor e pesquisador em Relações Internacionais da Universidade de Chicago, Dr. John J. Mearsheimer, o qual constrói uma abordagem pragmática sobre a mentira como ferramenta de governo por meio da identificação de suas motivações.

A obra é fruto das repercussões positivas de algumas palestras proferidas pelo renomado professor sobre o uso da mentira na política internacional e do amplo interesse observado na decisão do presidente George W. Bush em invadir o Iraque no ano de 2003, em função de suposta posse do governo de Saddam Hussein de armas de destruição em massa, que muito rapidamente, foi revelada como uma fática mentira para justificar as ações estadunidenses.

Embora acusações e crenças mentirosas sejam estratégias menos utilizadas pelos países na condução das relações exteriores em relação aos seus assuntos internos, haja vista os perigos de resultados negativos no balanço de poder internacional, o autor afirma que a mentira é aceitável na política internacional, uma vez que existem boas razões estratégicas para que ela resguarde determinados interesses nacionais.

Com base em um arcabouço nacional-realista, o livro aborda a mentira, por meio de uma leitura de resgate às concepções de manutenção e conquista de poder de Nicolau Maquiavel, a qual é estruturada em oito capítulos que focalizam a mentira como um meio estratégico plausível para construir a garantia dos interesses nacionais, mesmo sendo sua utilização eticamente criticável.

No primeiro capítulo, “O que é mentir?”, Mearsheimer faz uma breve definição sobre dizer a verdade, enganar, mentir, torção e omitir, concluindo que os líderes, ao recorrerem a algumas dessas qualificações, optam pela torção e a omissão à mentira, já que mesmo considerando ser uma boa causa, nenhum político procura a via menos reprovável pela ética coletiva.

O segundo capítulo, intitulado “Inventário de mentiras internacionais”, traz uma categorização do uso da mentira nas relações internacionais por meio da identificação de tipos ideais – Mentiras inter-Estados, difusão do medo, acobertamentos estratégicos, mitificação nacionalista, mentiras liberais, imperialismo social e acobertamentos deploráveis.

No capítulo três, “Mentiras entre Estados”, Mearsheimer argumenta que a razão de governantes e diplomatas mentirem, no jogo internacional, reside na tentativa para ganharem alguma vantagem estratégica para seus países, já que, em um mundo anárquico, esta estratégia acaba por ser uma das poucas saídas para garantir a própria segurança nacional, em especial, porque as mentiras contadas são mais frequentes em períodos turbulentos de guerra ao invés de momentos de paz.

A abordagem da “difusão do medo” pelos líderes de um país, no quarto capítulo, é discutida como um artifício para forçar o posicionamento dos cidadãos diante de determinada questão internacional do país. Embora o risco de perda de credibilidade seja claro, ao longo do tempo, o uso de alertas e comunicados sobre falsas ameaças à segurança nacional é uma recorrente estratégia para dar suporte ao aumento de gastos de defesa.

No quinto capítulo, “Acobertamentos estratégicos”, o autor analisa os motivos que levam líderes a mentirem, pois há dois públicos-alvo: a) o país do próprio líder, a fim de encobrir políticas falhas ou controversas e não derrubar a moral de um país em tempos de guerra, e, b) os outros países, quando as mentiras são contadas na tentativa de determinado país desviar as atenções ou não responder por possíveis questionamentos provenientes de outros Estados.

Adentrando nos “mitos nacionais”, título do sexto capítulo, o livro busca desmistificar a criação romântica dos nacionalismos, demonstrando que a despeito deles favorecerem os laços de identidade, solidariedade e construção dos Estados Nacionais, escondem, por traz dos símbolos e supostos heróis, mentiras idealizadas por determinadas elites a fim de conduzirem a formação sócio-histórica para determinadas trajetórias.

No sétimo capítulo, “Mentiras liberais”, Mearsheimer mostra a ligação direta entre as ideologias liberais em meio o direito internacional e o não cumprimento dessa lógica nos contextos das guerras ou de ameaças a outros países, haja vista que com o intuito de se mostrarem justos, muitos líderes, a favor dos princípios liberais, acabam escondendo, de seu povo, qualquer ação ou discurso de ilegitimidade que infrinja tal ideologia.

No último e maior capítulo da obra, “A desvantagem de contar mentiras internacionais”, o autor analisa os aspectos negativos da mentira, afirmando que independente do tipo de mentira utilizada por um líder, ela sempre irá afetar a política doméstica e exterior de seu país, razão pela qual se torna de grande importância que chefes de estado e cidadãos possam trabalhar com transparência para minimizarem a quantidade de mentiras em seus países.

Por fim, na “Conclusão”, a mentira é condenada, mesmo sendo aplicada em uma variedade de circunstâncias nos melhores dos interesses nacionais, uma vez que sempre surgem perguntas e questionamentos. Quem garante que estadistas e diplomatas não mentem quando estão em situações delicadas em relação a interesse relevante para seus países? Por mais estratégico que seja o uso da mentira, surge um discurso normativo para que ela não se banalize, evitando a descrença na política doméstica e internacional.

Com base nestas discussões, o livro demonstra que nos assuntos de high politics, o uso da mentira se configura como um fato nas relações internacionais, motivo pelo qual a obra pode ser considerada uma referência de leitura para acadêmicos de graduação e pós-graduação, bem como o público em geral, pois propicia uma reflexão de vanguarda sobre a psicologia da mentira e seu uso na política internacional dos Estados Nacionais.


Resenhistas

Emílio Bernardon Neto – Graduando em Relações Internacionais e pesquisador do Núcleo Amazônico de Pesquisa em Relações Internacionais (NAPRI) pela Universidade Federal de Roraima – UFRR. E-mail: [email protected]

Elói Martins Senhoras – Professor da Universidade Federal de Roraima – UFRR. E-mail: [email protected]


Referências desta Resenha

MEARSHEIMER, John. J. Por que os líderes mentem: toda a verdade sobre as mentiras na política internacional. Rio de Janeiro: Zahar, 2012. Resenha de: BERNARDON NETO, Emílio; SENHORAS, Elói Martins. Meridiano 47, v.15, n.142, p.69-70, mar./abr. 2014. Acessar publicação original [DR]

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