Representações e imaginário político nas Américas | Revista Eletrônica da ANPHLAC | 2006

Este quinto número da Revista Eletrônica da Associação Nacional de Pesquisadores de História Latino-Americana e Caribenha (ANPHLAC) é mais um passo no cumprimento de nossas metas: divulgar as pesquisas em História da América Latina e do Caribe que se realizam no Brasil, e estimular o intercâmbio entre pesquisadores, professores e outros estudiosos da área.

Apresentamos aqui o Dossiê: “Representações e imaginário político nas Américas”. Luiz Estevam de Oliveira Fernandes e Anderson Roberti dos Reis, estudantes de pós-graduação da Unicamp, abrem nosso dossiê com “Os conflitos e as possibilidades de paz: as concepções políticas de Motolinía e Mendieta no México do século XVI”. Os autores examinam os relatos de dois missionários franciscanos, Toribio de Benavente Motolinía e Jerônimo de Mendieta, buscando identificar como ambos retrataram os conflitos em curso na Nova Espanha do século XVI. O propósito do ensaio é mostrar quais foram os conflitos percebidos, e quais foram as soluções propostas, buscando identificar as concepções políticas e morais de Motolinía e Mendieta, expostas respectivamente no início e no fim do “século de ouro” da evangelização da Nova Espanha. Sugerimos tomar desde aqui a problemática da construção de memórias (franciscana, neste caso), como um fio de quipu andino, ferramenta imaginária muito adequada para os leitores ativos de nossa revista.

O segundo texto, “O México na ‘Polêmica do Novo Mundo’: humanismo, catolicismo, história natural e ilustração”, de Beatriz Helena Domingues, professora da UFJF, focaliza um personagem central da Geração Jesuítica Mexicana de 1750” – Francisco Javier Clavijero – e sua participação na chamada “Polêmica do Novo Mundo” desencadeada pelos escritos de Buffon, De Pauw, Raynal, Robertson e outros expoentes das ciências e letras da Ilustração. A autora concentra-se nas Disertaciones Históricas, que aparecem no quarto volume da Historia Antiga de México de Clavijero. O ensaio mostra como, para rebater as enfáticas teses daqueles autores acerca de uma suposta inferioridade da América, Clavijero conciliou a tradição escolástica e as Luzes, numa coexistência eclética entre tradição e modernidade, escolástica e ilustração: singular combinação de argumentos teológicos e naturalistas com o racionalismo universalista iluminista.

Em seguida, Eduardo Scheidt, que é professor das universidades Severino Sombra e Gama Filho, apresenta “Debates historiográficos acerca de representações de nação na Região Platina”. O ensaio problematiza a tradição historiográfica que limita os estudos regionais ao interior do espaço delimitado pelas fronteiras nacionais, e compara as representações de nação presentes na produção historiográfica relativa à Região Platina em três países: Argentina, Uruguai e Brasil. O autor contrasta a “historiografia tradicional” – entendida, sem nenhuma conotação negativa, como o conjunto de obras que tomam a nação como já existente na Região Platina desde a época da independência – e as tendências da historiografia recente, tomando como principal referencial para esse corte epistemológico a obra do historiador argentino José Carlos Chiaramonte.

O dossiê se encerra com “Misionalia Hispánica. Missão em revista e memória em construção (1944 – 1989)”, de Eliane Cristina Deckmann Fleck, professora da Unisinos. O artigo examina as cinco décadas de existência da revista Misionalia Hispánica, avaliando os marcos gerais que orientaram os textos por ela divulgados. O propósito maior é estudar a construção narrativa de uma memória histórica da atuação daquelas ordens religiosas cuja atuação missionária foi significativa na América, na África e na Ásia. O texto, que se concentra num corpus historiográfico institucional – inicialmente franquista, hispanista e missionário; e sempre católico, até o final da série –, convida-nos a aprofundar certas questões incontornáveis no vasto mundo das representações e dos imaginários construídos a propósito da(s) América(s): qual a importância da catolicidade no processo histórico de produção/recriação de identidades e alteridades?

Além do dossiê, este número 5 da Revista Eletrônica da ANPHLAC contém 2 artigos e uma resenha.

“A Comuna de La Paz (1971) e o controle operário da mineração”, de Everaldo de Oliveira Andrade, que é professor na Universidade Guarulhos, focaliza a participação dos mineiros bolivianos na Assembléia Popular, ou Comuna de La Paz. O autor discute o sentido desta experiência do movimento operário boliviano – em que se destaca o protagonismo do Partido Obrero Revolucionario, trotskista – a partir do contexto histórico aberto pela revolução de 1952, e examina o alcance de suas propostas à luz dos textos de Lênin, Trotski e Gramsci, relativos ao controle da produção pelo proletariado como alternativa de poder. Embora o texto não proponha explicitamente nenhum “link” com a situação social e política da Bolívia contemporânea, nosso quipu andino – ferramenta imaginária de leitura – foi concebido justamente para registrar, reunir, comparar, lembrar e mesmo compreender, por provisoriamente que seja, a realidade (identidade?) mutável da América.

“Nas trincheiras da mídia: a utilização da internet na divulgação do EZLN”, do mestrando José Gaspar Bisco Junior, da UFJF, examina as vias alternativas que o Exército Zapatista de Libertação Nacional (Chiapas, México) utiliza para difundir seus ideais e propostas. O recurso à Internet, à literatura e à mídia em geral evidenciam grande criatividade na produção e circulação das informações referentes à guerrilha e na difusão da cultura maia. O autor aponta como essa inventividade no emprego dos meios de comunicação contemporâneos e na acumulação de um importante capital simbólico explicaria a repercussão das mensagens da guerrilha zapatista entre as camadas mais jovens da população. Numerosos “links” indicados nas notas de rodapé podem ser usados como outros fios de nosso alegórico kipu andino!

Completamos esta edição com a uma resenha muito oportuna: “Néstor García Canclini e a questão do moderno na América Latina”, de Bruno Peron Loureiro, graduado em Relações Internacionais pela Unesp de Franca.

Agradecemos aos autores e a todos os pareceristas que colaboraram com o presente número e desejamos a todos uma ótima leitura.


Organizador

Jaime de Almeida – Departamento de História – UnB.


Referências desta apresentação

ALMEIDA, Jaime. Apresentação. Revista Eletrônica da ANPHLAC, n. 5, 2006. Acessar publicação original [DR]

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