Competência discursiva e gêneros textuais: uma experiência com o jornal de sala de aula – BALTAR (C)

BALTAR, Marcos. Competência discursiva e gêneros textuais: uma experiência com o jornal de sala de aula. Caxias do Sul: Educs, 2006. Resenha de: FARENZENA, Deline. Desafio ao tradicional. Conjectura, Caxias do Sul, v. 14, n. 2, p. 255-261, Maio/Ago, 2009.

Ao mesmo tempo que os professores falam e propõem aos seus alunos atividades de produção textual, devem se instrumentalizar acerca de aspectos que envolvem a produção de um texto. É por isso que produzir textos não é tão simples quanto parece, pelo menos não da maneira como nos propõe Marcos Baltar – professor no Departamento de Letras da Universidade de Caxias do Sul – RS. Para ele, produção textual abrange, entre outros aspectos, leitura e escrita de gêneros textuais diversificados e, em especial, o desenvolvimento da competência discursiva.

Nesse seu livro Competência discursiva e gêneros textuais: uma experiência com o jornal de sala de aula, resultado de sua Tese de Doutorado, realizado na Universidade Federal do Rio Grande Sul (UFRGS), sob a orientação do Professor Dr. Paulo Coimbra Guedes, o autor se refere às contribuições que o jornal pode trazer ao ensino de línguas e, dessa forma, dirige-se tanto àqueles que desenvolvem pesquisas a respeito da linguagem quanto aos que estão, de alguma forma, ligados à educação.

As duas partes que compõem o livro: percurso teórico e jornal de sala de aula complementam-se entre si. Da primeira, fazem parte os capítulos sobre competência, gêneros textuais e ações pedagógicas, essas necessárias ao desenvolvimento da competência discursiva escrita. Nessa parte, destacam-se os estudos de Hymes, cujo objetivo é compreender a capacidade dos indivíduos como membros de uma comunidade linguística. Sendo assim, considera o contexto, o que o torna diferente de Chomsky. Destacam-se, também, as contribuições da linguística, da sociologia e da psicologia em relação ao desenvolvimento dos estudos sobre gênero, havendo espaço também para tratar do interacionismo sociodiscursivo, proposto por Bronckart. Quanto às ações pedagógicas, dá maior importância à pedagogia de projetos, em que o foco deixa de ser o ensino e passa a ser a aprendizagem.

Da segunda parte, extraem-se dois capítulos: “O processo histórico-metodológico da pesquisa”, em que o autor relata a própria experiência e o trabalho realizado em duas escolas; e “Os gêneros textuais do jornal de sala de aula”, em que explicita qual é a relevância de desenvolver um trabalho com gêneros, bem como os resultados da pesquisa.

Além disso, um grande ponto a favor, nesse livro, é terem sido anexados os jornais produzidos em sala de aula nas escolas onde desenvolveu a pesquisa. Sobre isso, é válido comentar que uma proposta como essa traz inúmeros benefícios ao processo de ensino e aprendizagem da língua materna, tornando-a enriquecedora, pois, de certo modo, ela se afasta dos moldes tradicionais de produção textual, que objetivam apenas atribuir uma nota e que, portanto, dissociam a produção de seu uso real da linguagem, que é a comunicação. Nesse sentido, Freire (1996, p. 18) já defendia que “transformar a experiência educativa em puro treinamento técnico é amesquinhar o que há de fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu caráter formador”.

Também merece destaque a escolha feita por Baltar, ao optar em realizar a construção de um jornal que, além de reunir uma vasta diversidade de gêneros, é também um “suporte” para esses. Além disso, por meio da produção dessa obra, percebe-se que novos gêneros surgiram, frutos da atenção que os alunos dedicaram aos próprios assuntos escolares. Desse modo, percebe-se, ainda, o quanto um trabalho como esse pode gerar um envolvimento maior dos alunos, fazendo com que se sintam responsáveis pela sua produção e que se comuniquem mais no próprio grupo e com os outros. Sem dúvida, a proposta de Baltar pode ser considerada uma forma de tornar o ensino de língua mais real e, portanto, mais significativo àqueles que a estudam.

Diante disso, não há como finalizar esta análise sem indicar que tal obra cabe muito bem aos professores que desejam dar início à realização de um trabalho com jornal em sala de aula, uma vez que o jornal permite não somente a leitura e a produção de gêneros diversificados, como também o contato com o mundo externo, repleto de acontecimentos, e, dentre eles, cita desde os problemas sociais até os progressos da ciência e os avanços tecnológicos, que precisam ser encarados pelo aluno para que se torne um ser muito mais crítico e autônomo em relação ao que acontece ao seu redor.

É por isso que, voltando ao professor e, mais precisamente, ao papel que desempenha, Freire (1996) destaca que o educador tem o dever de reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão, fazendo-o sair da comodidade. E reforça que essas condições implicam ou exigem a presença de educadores e educandos criadores, instigadores, inquietos, rigorosamente curiosos, humildes e persistentes. E talvez seja justamente esse objetivo, dentre outros, que o trabalho de Baltar visa a alcançar, bem como, talvez sejam esses comportamentos ou atitudes desse tipo que seu livro busque despertar ou seria provocar?

Referências

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. p. 304. (Coleção Leitura)

Deline Farenzena – Mestranda no Programa de Mestrado em Educação da Universidade de Caxias do Sul (UCS).

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