Cotidiano e política in memorian: Americo Augusto da Costa Souto / Fronteiras – Revista Catarinense de História / 2011

O Brasil republicano tem espaço destacado no número 19 de Fronteiras – Revista Catarinense de História, cuja capa apresenta trabalho fotográfico de Mariana Rotili da Silveira intitulado “Fé cega, faca amolada”, elaborado a partir de registro feito no centro de Florianópolis em abril de 2010.

No dossiê “Cotidiano e Política”, a Primeira República é enfocada em dois dos quatro artigos, os demais concentrando-se em duas décadas do período posterior – a de 1940 e a de 1970. As aproximações e os distanciamentos entre cotidiano e política são tratados com ênfases e perspectivas distintas nestes trabalhos, que apresentam experiências históricas marcantes em localidades do norte, nordeste e sudeste do país, atravessadas por dimensões dos mundos do trabalho, movimentos migratórios, trocas econômicas e culturais, projetos e ações políticas, atividades jornalísticas e circulação de impressos.

O primeiro artigo do dossiê, de autoria de Helder Remígio de Amorim, põe em destaque a cidade de Arcoverde, ponto nevrálgico de caminhos pelos quais circularam e circulam mercadorias no sertão pernambucano. Buscando examinar mais detidamente o comércio popular de alimentos nos anos 1970, o artigo fundamenta-se principalmente em fontes orais, salientando trajetórias de vida de bodegueiros que pontuam outros momentos históricos e diferentes espaços geográficos.

As transformações da cidade de Manaus na Primeira República, de modo a implantar uma “ordem burguesa”, são destacadas por Luciano Everton Costa Teles, que também examina a presença dos operários, além das representações e ações que com eles se ocuparam na Manaus republicana. Daí, também, a análise dos registros a este respeito contidos no periódico Vida Operária.

Geraldo Magella de Menezes Neto aborda em seu artigo as relações entre jornais e folhetos de cordel, tomando como referência crime ocorrido em 1942 (o “crime da praça da República”), na capital do Pará. Os fatos cotidianos e, em especial, os fait divers cobertos pela imprensa são examinados em sua passagem para a literatura popular, que no caso estudado foi feita pelo poeta Arinos de Belém. Trata-se de um estudo interessante sobre leituras e representações de aspectos do cotidiano feitos por impressos de perfil bastante diferenciado.

Fechando o dossiê, artigo de Luciana da Silva Santos mostra como eram estreitas as relações entre redes de abastecimento (em especial, de carne) e a vida político-partidária no Rio de Janeiro dos inícios republicanos. Põe em destaque um grupo político atuante na área rural da capital republicana (o “Triângulo”), que buscava apoiar sua linha de ação no controle da administração do Matadouro de Santa Cruz e na defesa do abastecimento regular de carne verde, sem escassez ou carestia.

Nas resenhas, quatro livros são colocados em destaque. Julia Uzun apresenta livro organizado por Adrián Ascolani e Diana Gonçalves Vidal, que focaliza projetos educacionais elaborados e desenvolvidos no Brasil e na Argentina nos séculos XIX e XX, em um exercício de história comparada. Já Adelson André Brüggemann detém-se em livro de Peter Beattie (Tributo de sangue) que aborda a trajetória do Exército brasileiro entre 1864 e 1945. Na resenha de Daniela Pistorello são tratadas as relações entre preservação e turismo em Angra dos Reis e Paraty, a partir do livro Entre ilhas e correntes, de Aline Vieira de Carvalho. Na última resenha, Felipe Matos põe em destaque o relato biográfico de Rubens Borba de Moraes registrado em Testemunha ocular (recordações).

Entre os artigos do dossiê e as resenhas, foi reservado espaço para homenagear o Prof. Américo Augusto da Costa Souto, historiador que foi professor na Universidade Federal de Santa Catarina por vários anos, tendo também atuado no então Núcleo Regional de Santa Catarina da Associação Nacional de História, e que faleceu em 9 de agosto de 2011, poucos meses antes de completar 80 anos.

Antecedido por texto de Norberto Dallabrida que apresenta brevemente o historiador catarinense Américo Augusto da Costa Souto, é republicado nessa homenagem, em edição revisada, o artigo Estudos: os vários ritmos da evolução histórica (modelo didático baseado nas teorias de F. Braudel), originalmente editado no primeiro número da Revista Educação e Ensino de Santa Catarina, de julho de 1972. Trata-se de artigo que sistematiza a interpretação do Prof. Américo acerca das ideias braudelianas sobre o tempo histórico, propondo uma aplicação para o ensino de História Moderna e História Contemporânea na graduação em História.

Aos autores, nossos agradecimentos por colaborarem com a revista. Aos leitores, nossos votos de uma boa e proveitosa leitura.

Janice Gonçalves – Editora de Fronteiras – Revista Catarinense de História


GONÇALVES, Janice. Editorial. Fronteiras: Revista catarinense de História. Florianópolis, n.19, 2011. Acessar publicação original [DR]

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