Deslocamentos, Oralidades e Intolerâncias / Revista Trilhas da História / 2013

A Revista Trilhas da História chega ao quarto número mantendo ininterruptamente a periodicidade semestral. A quantidade e a qualidade dos textos recebidos, e a diversidade de instituições de pesquisa de que se originam os autores, demonstram o acerto do quadro docente e discente do Curso de História do CPTL / UFMS em lançar o periódico no segundo semestre de 2011, mesmo diante das adversidades do trabalho em uma instituição federal periférica.

A Revista agora está indexada na base Latindex, o que permite vislumbrar a inscrição no sistema de avaliação de periódicos Qualis / CAPES. As trilhas percorridas até aqui reforçam os objetivos iniciais da Revista de ser um espaço aberto às contribuições de pesquisadores experientes no ofício da História e áreas afins que contribuem na seção “artigos”, como também lugar em que alunos da graduação possam apresentar os caminhos iniciais de suas pesquisas na seção “ensaios”, se expondo para a crítica, algo necessário para o ensino-aprendizagem na graduação.

Os artigos e ensaios deste quarto número, inscritos no dossiê “Deslocamentos, Oralidades e Intolerâncias”, abrangem um longo período histórico, do século XVI à atualidade, bem como diversos problemas de pesquisa: gênero, religiosidade, história indígena, cotidiano, microhistória, história das ideias, economia, cultura, e fontes para a História.

O artigo de Wallas Lima e Edson Silva “Intolerância e sexualidade: a Inquisição em Pernambuco Colonial (1593-1595)” analisa o tema da sexualidade a partir de relatos de homens e mulheres acusados de sodomia e fornicação na capitania de Pernambuco. A análise dos autores coloca em evidência as relações da Igreja e a população colonial.

Em “Hierarquias, fortunas e artigos importados em Belém (1840-1870)”, as autoras Mábia Sales e Leila Mourão apresentam uma análise instigante que transita entre a economia e a cultura, a vida pública e a privada, o micro e o macro. A partir dos inventários do Centro de Memórias da Amazônia, as autoras analisam a circulação de mercadorias e de cultura, entre a Europa e o Pará, e a composição da riqueza de parte da elite da cidade portuária de Belém no XIX.

O texto de André Rego “Deslocamentos espaciais de índios nas aldeias e vilas indígenas da Bahia do século XIX” aborda o deslocamento de núcleos indígenas pressionados pela configuração fundiária e a demanda pela mão de obra. O estudo demonstra que a forma da relação com as comunidades indígenas no Império seguia os preceitos do que regia a legislação da Colônia.

No artigo “Capoeira, do crime à legalização: uma história de resistência da cultura popular” os autores Albert Cordeiro e Nazaré Carvalho apresentam uma história da capoeira no Brasil, com base na pesquisa bibliográfica. A narrativa histórica compreende a manifestação da capoeira na Bahia, no Rio de Janeiro e no Pará, desde a colônia ao início do século XX, quando a prática é legalizada pelo Estado.

Priscilla Silveira em “„Doces memórias…‟: produção de doces na Usina Oiteirinhos em Sergipe durante a trajetória de Dona Baby (1954-1968)”, destaca as doces delícias da culinária pernambucana e sergipana por meio de um estudo da oralidade. Trata-se de uma história da alimentação, da tradição alimentar, a partir da história de vida de uma personagem nordestina.

No artigo “A presença batista em Mato Grosso” Ademar Silva narra uma história da Igreja Batista em Mato Grosso, especialmente a migração de batistas para o sul do estado, em vinculação com São Paulo, entre as décadas de 1910 e 1940. Importa ao autor, também, compreender a imposição da moral religiosa batista às mulheres.

Em “De volta para o princípio: ensaio sobre o resgatar identitário” o geógrafo Júlio Ribeiro apresenta uma discussão teórica da identidade do ser socioespacial. No interior de uma tradição teórica testada de longa data, o autor trava embate com as certezas da mundialização e do capital, colocando a questão da identidade / neo(des)identidade no lugar de polêmica que o conceito requer.

Diovana Thiago propõe uma reflexão sobre o saber científico nas ciências humanas, com destaque para a História. A autora concentra-se na crítica ao método tomado como formatador e limitador do exercício do pensamento, especialmente para a ciência História, e na necessidade de o discurso do historiador se abrir para além da área, para fora do domínio acadêmico.

O artigo de Rubens Correa “Parâmetros teóricos e políticoinstitucionais das independências no mundo hispano-americano” apresenta a história da historiografia do processo de independência dos estados hispanoamericanos. O autor aponta para as abordagens da Nova História Política que compreendem os movimentos de independência a partir das dinâmicas políticas internas às colônias, na relação com a metrópole.

A seção dos graduandos, “ensaios”, inicia com o texto de Iara Silva, “Cristianização da Nova Terra: os jesuítas e a catequese na Colônia”. A autora parte de documentos reproduzidos no todo ou em partes pela historiografia, para estudar a catequização dos povos originários e colonos por parte da Companhia de Jesus, na América Portuguesa.

Rogério de Paula em “Breves considerações sobre a agropecuária e o mercado interno de víveres na América Portuguesa (séculos XVII e XVIII)” apresenta um ensaio de história econômica conjugado à história demográfica, com o objetivo de compreender o comércio de víveres e a produção de gêneros de subsistência na colônia.

No ensaio “Estudos migratórios: as fontes orais e a busca de uma epistemologia histórica”, Nelson de Lima Junior discute a metodologia da história oral e a sua contribuição para o estudo da migração.

A seção “resenhas” traz a apresentação construída pela graduanda Rejane Rodrigues da obra de Elciene Azevedo “O direito dos escravos: lutas jurídicas e abolicionismo na província de São Paulo”, da Editora da UNICAMP. O livro contribui para se entender o processo que envolve a luta abolicionista em São Paulo nas últimas décadas do século XIX.

Na sequência, o graduando Charles Asssi apresenta a coletânea de textos organizada por Mirian Claudia Lourenção Simonetti “Assentamentos rurais e cidadania: a construção de novos espaços de vida”, das Editoras Cultura Acadêmica e Oficina Universitária. Trata-se de obra coletiva que traz estudos acerca dos movimentos sociais, da reforma agrária e de assentamentos rurais, na perspectiva da Geografia, da História, da Sociologia, da Economia e da Agronomia.

O professor Geraldo Menezes Neto, da Rede de Educação de BelémPA, destaca o livro de Mark Curran “Retrato do Brasil em cordel”, publicado pela Ateliê Editorial. O livro é um estudo fora do âmbito acadêmico que contribui para se entender a história desta manifestação literária popular.

Por fim, a seção “fontes” traz o texto da graduanda Mariely Sousa intitulado “Gregório de Matos: uma análise da Bahia e da América Portuguesa por meio de suas poesias”. A autora compreende a literatura como fonte para a História, para tanto discorre sobre a obra de Gregório de Matos, contextualizando-a na América Portuguesa, especificamente na Bahia de fins do século XVII.

Vitor Oliveira

Inverno de 2013.


OLIVEIRA, Vitor. Apresentação. Revista Trilhas da História. Três Lagoas, v.2, n.4, jan. / jun., 2013. Acessar publicação original [DR]

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