Educação de Mulheres no Brasil e em Portugal (séculos XIX e XX) / Cadernos de História da Educação / 2018

A educação escolar primária, secundária e universitária, bem como o trabalho escolar de mulheres preceptoras (século XIX) e de mulheres professoras primárias (século XX), foi objeto de estudo de pesquisadoras do Brasil e de Portugal, integrantes do Projeto de Pesquisa Educação de Mulheres no Brasil e em Portugal (séculos XIX e XX), que é parte do Grupo de Políticas e Organizações Educativas e Dinâmicas Educacionais da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, da Universidade de Coimbra, e que tem o apoio institucional do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS20), da Universidade de Coimbra (Portugal).

Com o título Educação de Mulheres no Brasil e em Portugal (séculos XIX e XX), presente Dossiê é composto de cinco artigos de professoras pesquisadoras da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, da Universidade Tiradentes de Sergipe, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, da Universidade de Coimbra, da Universidade Estadual do Ceará e da Universidade Pontifícia Católica do Paraná. Em seu conjunto, todos esses trabalhos visaram reconstituir a história da educação de mulheres e de mulheres educadoras, nascidas nos séculos XIX e XX, que estudaram e / ou trabalharam em lugares e tempos distintos, com níveis de estudos diferenciados, além de pertencerem a classes sociais desiguais, marcadas por suas divisões e suas diferenças.

Para reconstituir a história da educação dessas mulheres, que se sucedem e que se renovam a cada geração, pesquisamos em diários, cartas, anúncios e matérias de jornais, revistas de educação e de instrução destinadas às famílias, entrevistas orais, relatos educacionais e legislação educacional. Enfim, fontes documentais que induzem a questionamentos vários sobre a educação de mulheres e / ou sobre o trabalho educacional de mulheres educadoras, além de possibilitar a desmitificação de certos dogmas e estereótipos consagrados pelo senso comum ou mesmo pelas generalizações que “ganharam” notoriedade.

No artigo “Preceptoras estrangeiras para educar meninas nas casas brasileiras do século XIX”, Maria Celi Chaves Vasconcelos começa por registrar a chegada de mulheres europeias no Brasil, com a finalidade de trabalhar como preceptoras nas casas das elites oitocentistas, para então discutir as práticas de educação que desenvolviam para ensinar, particularmente, meninas. A educação das meninas, a cargo dessas preceptoras, era considerada uma distinção social, inclusive considerando-se o fato de que se baseava em modelos escolares análogos aos europeus.

No texto “A educação em nível primário da professora Isabel Doraci Cardoso (1940- 1944): uma história da educação vista de baixo”, Raylane Andreza Dias Navarro Barreto analisa o processo de formação escolar da professora sergipana Isabel Doraci Cardoso, que fez o seu curso primário, entre o final dos anos de 1930 e meados de 1940, numa Escola de modalidade Isolada. Bem marcante, nesse texto, é o modo como se vai delineando o estabelecimento das fronteiras entre as condições materiais e as educacionais experienciadas, pelo sujeito dessa vivência, uma revelação que se sobressai de sua narrativa.

No trabalho “Educação em nível secundário de moças de Natal e de Coimbra (1941- 1948)”, Marta Maria de Araújo e Cristina Maria Coimbra Vieira refletem sobre as dimensões formativas e autoformativas da educação secundária de Petronila da Silva Neri, no Ateneu Norte Riograndense (Natal-Brasil), e de Maria Isabel Dinis Pedroso de Lima Gonçalves Neves, no Liceu Nacional Infanta D. Maria (Coimbra-Portugal), no período de 1941 a 1948. A análise histórica a que procederam as autoras revela que a formação escolar completa e uniforme, e igualmente a autoformação das estudantes Petronila da Silva Neri (Natal-Brasil) e Maria Isabel Neves (Coimbra-Portugal) foram análogas às interações intergeracionais e às interações intrageracionais, o que confirma estarem em articulação com os propósitos formativos universalizáveis.

No texto “Educação formativa de uma líder política cearense: Maria Luiza Fontenele (1950-1965)”, Lia Machado Fiuza Fialho e Vitória Chérida Costa Freire discorreram sobre o processo formativo na educação familiar, primária, secundária e universitária, bem como sobre a inserção política de Maria Luiza Fontenele, professora, educadora, política – a primeira mulher prefeita de uma capital brasileira – a cidade de Fortaleza-Ceará. Em sua pesquisa, as autoras constatam que a educação secundária, no Liceu do Ceará, ocorreu em concomitância com a formação política de Maria Luiza, iniciada no Grêmio Estudantil e na Juventude Estudantil Católica. Sua educação superior, na Universidade Federal do Ceará, no curso de Serviço Social, como atestam as autoras, favoreceu o engajamento no Movimento Estudantil e a atuação sociopolítica.

No artigo “Aspectos de trajetórias de professoras rurais no Paraná (1957-1979)”, Rosa Lydia Teixeira Corrêa analisa aspectos da trajetória de professoras que atuaram em escolas primárias com turmas multisseriadas na zona rural, no município de Bocaiúva do Sul, no Estado do Paraná, entre os anos de 1957 e 1979. Essas professoras com incipiente formação inicial e a gradativa formação profissional em curso normal regional, exerciam múltiplas funções, sendo inclusive, elas próprias, que, em certas situações, assumiram os encargos financeiros decorrentes da aquisição de material escolar para seus alunos.

Essa reconstituição favoreceu a construção de um conhecimento histórico sobre a educação de mulheres e sobre o trabalho escolar de mulheres educadoras no Brasil e em Portugal (Séculos XIX e XX), que possibilita, necessariamente, a compreensão das singularidades, das diversidades, das semelhanças, das diferenças intranacionais e internacionais, além do que é particular e universal na educação das mulheres educadoras que escolhemos para pesquisar, e até de outras mulheres com suas variabilidades de condições educacionais sociais e materiais.

Marta Maria de Araújo – Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo. Professora Titular do Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Brasil). Líder do Grupo de Pesquisa “Estudos Históricos Educacionais” (UFRN / CNPq) e pesquisadora do “Grupo Interdisciplinar de Pesquisa, Formação (Auto) Biografia e Representações (GRIFAR / UFRN)”. E-mail: [email protected]

Cristina Maria Coimbra Vieira – Doutora em Ciências da Educação (Psicologia da Educação) pela Universidade de Coimbra. Professora Associada na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra (Portugal). Investigadora do Centro de Estudos Interdisciplinares do Século XX (CEIS 20). Vice-Presidente da Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação (SPCE) e Vice-Presidente da Associação Portuguesa de Estudos sobre as Mulheres (APEM). E-mail: [email protected]


ARAÚJO, Marta Maria de; VIEIRA, Cristina Maria Coimbra. Apresentação. Cadernos de História da Educação. Uberlândia, v. 17, n.2, maio / ago., 2018. Acessar publicação original [DR]

Acessar dossiê