Inovar o ensino e a aprendizagem na universidade – IMBERNÓN (EA)

IMBERNÓN, Francisco. Inovar o ensino e a aprendizagem na universidade. São Paulo: Cortez, 2017. 128 p. Resenha de: GOULART, Sheila Fagundes; BOLZAN, Doris Pires Vargas. Inovação e protagonismo na universidade. Em Aberto, Brasília, v. 32, n. 106, p. 191-195, set/dez. 2019.

O filósofo espanhol Francisco Imbernón lançou, em 2012, a obra Inovar o ensino e a aprendizagem na universidade, cuja temática é a qualificação dos processos de ensino e de aprendizagem desenvolvidos em instituições de ensino superior. O autor busca alternativas ao modo tradicional de transmissão do conhecimento acadêmico e social ao apresentar sua argumentação acerca do aprimoramento da educação realizada nessas instituições. Ele prescreve um caminho a ser trilhado pelo professor universitário, a fim de que consiga transformar a aula “transmissora de conhecimento” em uma aula “magistral”, incentivando a participação dos alunos nas propostas de seu trabalho pedagógico.

Ao longo dos 19 capítulos, Imbernón nos leva a visualizar a importância dos métodos e das técnicas para a qualificação do processo de ensino desenvolvido nas universidades. O autor pontua a necessidade de uma mudança no sentido da transmissão de conhecimentos acadêmicos e sociais, exigindo que o estudante assuma o protagonismo deste processo ao realizar uma aprendizagem “ativa”. Nessa direção, percebemos três focos convergentes, que são priorizados para a inovação do ensino: o primeiro está na aula expositiva e na importância em torná-la “magistral”; o segundo apresenta o estudante como um “ser” capaz de mobilizar a prática docente; e o terceiro, por fim, trata da formação e do desenvolvimento profissional do professor. Aqui podemos afirmar que a organização do ensino implica um evidente compromisso com a aprendizagem, uma vez que o reconhecimento das demandas da dinâmica pedagógica pode favorecer os processos de aprender dos estudantes.

Partimos do ponto em que Imbernón lança a hipótese de que o envolvimento dos estudantes nos processos de ensino e de aprendizagem os torna capazes de consolidar conhecimentos de forma significativa. Assim, a aprendizagem passiva apontada pelo autor – cujo centro do processo é o professor – precisa transformarse em aprendizagem interativa, na qual o estudante assume também o protagonismo no ensino, colocando-se como participante cooperativo na aula ministrada pelo docente.

Para que esse processo de ensino se torne significativo, o professor precisa se desprender da ideia de que o domínio científico do conteúdo que oferta garante uma aula expositiva ou magistral capaz de levar o estudante a estabelecer relações entre o que aprende na universidade e os desafios do mundo na contemporaneidade.

Assim, uma aula expositiva permite a interação entre alunos e destes com seus professores. Esse processo interativo e mediacional é capaz de promover a interlocução no espaço pedagógico, motivando-os a trabalharem e a refletirem sobre os conteúdos desenvolvidos, de modo que suas competências e suas habilidades sejam aprimoradas ao extremo. Nesse modelo de aula proposto pelo autor, a argumentação e a explicação são componentes de destaque. A argumentação, segundo Imbernón, é um modo de explanação do conteúdo científico que pode levar o estudante a alcançar saberes distintos daqueles que tinha, chamados, comumente, de conhecimentos prévios. Tais conhecimentos se desenvolvem juntamente com os conhecimentos atitudinais e procedimentais. A explicação, por sua vez, pode ser considerada como a forma “adequada” de argumentar, ou seja, ela é a própria didática. Nesse sentido, podemos afirmar que a relação conteúdo e forma constituise em duas faces do processo de ensino.

Com início, desenvolvimento e conclusão, a aula expositiva rompe com a inércia estabelecida pela visão de uma atividade transmissora de conhecimento.

Por meio de perguntas, exemplos, mudanças de assunto, recursos variados, o professor estabelece uma relação de reciprocidade com os estudantes. O início de uma aula magistral deve apresentar elementos que envolvam os estudantes, despertando-lhes o interesse sobre o assunto que ainda não conhecem ou dominam.

Para que tenham o desejo de apropriar-se do conteúdo a ser trabalhado e, também, para que organizem a temática a ser desenvolvida, os estudantes precisam ser mobilizados a se envolverem nas atividades de ensino propostas pelo professor. Este, por sua vez, tem a incumbência de inquietar o aluno por meio de questionamentos e problematizações, despertando a curiosidade e a imaginação necessárias ao processo de aprendizagem. Nessa primeira etapa, Imbernón desenvolve os conceitos de retroação positiva ou descritiva, retroação avaliativa e efeito primazia como elementos orientadores da estruturação inicial da aula. Ao destacar esses conceitos, leva-nos a refletir sobre a importância de valorizarmos o estudante, colocando-o como corresponsável pelo êxito da sua formação, pois um modo de organização que faz o estudante interessar-se pelo processo de aprendizagem resulta no reconhecimento da necessidade de construir novos saberes acadêmicos e sociais.

O desenvolvimento de uma aula é considerado a parte central de todo o processo. Nesse momento, o professor precisa estar atento a sua turma, uma vez que é necessário considerar o tempo e o modo como cada estudante se mobiliza para aprender. Além disso, ao apontar possibilidades de elaboração do conhecimento, cria condições para que o grupo compreenda o assunto tratado, tendo nas atividades um suporte para seu trabalho. Por fim, o encerramento da atividade precisa ser realizado com tranquilidade e sintetizar o que foi trabalhado na aula magistral.

Ainda no primeiro foco, há pequenos capítulos que problematizam as normas de conduta adotadas por professores, destacando a aula expositiva como um processo de comunicação que existe em função da relação professor-estudante. Há também a definição de pautas para a elaboração de um roteiro de aula. A primeira pauta apontada por Imbérnon é a “análise da situação de comunicação”, que incide na observação do contexto em que a aula magistral será desenvolvida; já a segunda, chamada de “delimitação do tema e coleta de informações”, consiste na delimitação do assunto a ser trabalho e na busca por dados que auxiliem em seu desenvolvimento.

Por último, o autor destaca que, para a “elaboração do plano” de aula, é necessário refletir acerca do que queremos que os estudantes aprendam, sobre o quanto eles podem aprender e como podemos facilitar essas aprendizagens.

Em nossa categorização, pontuamos o papel do estudante como o segundo foco tratado por Imbernón. Nos capítulos que compõem a metade da obra, o autor explicita as estratégias para a participação dos alunos em sala de aula, o trabalho em grupo como uma possibilidade metodológica e o estudante como mobilizador do trabalho docente. Esses pontos fomentam a ideia de que as instituições de ensino superior devem primar por aulas nas quais as competências e as habilidades sejam desenvolvidas em detrimento da memorização e da repetição mecânica. Cabe salientar que, segundo o autor, não há modelos metodológicos bons ou ruins, mas práticas de sucesso ou não, realizadas com base em determinado modelo. Nesse sentido, o que importa são as concepções de ensino e de aprendizagem de cada professor. Portanto, o docente precisa revisitar suas concepções a respeito da formação para propor aulas motivadoras, capazes de incentivar a criatividade e a autonomia do estudante. Outro aspecto que precisa ser considerado nesse processo é a perspectiva de inovação pensada a partir da transformação dos modelos tradicionais de ensino, potencializados pelo acesso à tecnologia da informação e da comunicação desenvolvidas na educação superior.

Nesse contexto, não há como o professor reproduzir as mesmas condições e nuances de um ensino tradicional, uma vez que a condução do processo educativo não é unilateral, ou seja, ela acontece como consequência das relações estabelecidas entre todos os seus envolvidos. Logo, para que o estudante assuma o protagonismo do processo formativo é necessário, além do empenho do professor, que ele deseje e, também, se reconheça como capaz de autoformar-se. Cabe a ele construir sua autonomia, neste caso, desprender-se do aval docente, para elaborar saberes a partir de suas necessidades, tornando-se responsável pela sua própria aprendizagem e desenvolvimento.

No terceiro foco delineado, tratamos do desenvolvimento profissional docente. Para Imbernón, o conceito de desenvolvimento profissional não pode ser confundido com o de formação permanente, uma vez que este se dá pelas experiências vividas no contexto laboral e pode possibilitar ou não o progresso na vida profissional dos professores. Ao qualificar sua prática pedagógica, revistar suas crenças e aprimorar os conhecimentos relativos à docência, o professor colabora para o seu progresso profissional e, ainda, coopera para o desenvolvimento coletivo das instituições de ensino nas quais atua. Além disso, o autor registra que o conceito de inovação é uma mistura de “formação e contexto”, logo é preciso que o docente perceba a formação permanente como um elemento dinâmico, que resulta em melhorias sociais, capazes de estabelecer novos modelos relacionais.

Portanto, para que o professor possa contribuir para as mudanças necessárias à inovação do ensino e da aprendizagem, é preciso que busque alternativas para a sistematização qualitativa do trabalho, ampliando as possibilidades de produzir inovações, mobilizando, assim, as concepções docentes sobre esses processos. Nessa perspectiva, a obra de Imbernóm leva-nos a compreender que a educação deve estar intimamente relacionada às mudanças e aos incrementos do contexto social. Logo, o professor precisa transformar sua prática docente, colocando-se como profissional capaz de produzir conhecimento com os estudantes, aberto às novas tecnologias e ao modo de ser e de estar dos demais sujeitos do processo educativo.

A contribuição do autor não marca profícua expressão na área da inovação do ensino e da aprendizagem. Entretanto, ele apresenta de forma bastante didática diretrizes aos professores universitários, que podem contribuir para a qualificação das atividades desenvolvidas na educação superior. Isso porque a qualidade de uma instituição depende das formas de organização do trabalho pedagógico e da sua repercussão no contexto sociocultural dos estudantes. Para que se estabeleça um processo formativo que resulte no desenvolvimento do professor, seja no âmbito pessoal, seja no profissional, é preciso romper com a visão linear da prática educativa.

Observamos que a obra de Imbernón apresenta diretrizes nada complexas, cabendo ao professor universitário aproveitá-las como possibilidade de tornar seu trabalho dinâmico e mobilizador do outro.

Com a intenção de mostrar a importância de desenvolver processos metodológicos que contribuam para a qualidade do ensino e da aprendizagem promovido nas universidades, Francisco Imbernón leva-nos a perceber que é necessária uma mudança epistemológica nos modelos de formação. É imperativo transformarmos os processos acadêmicos, em que a transmissão dos conhecimentos, a memorização e a prática unilateral levam ao posicionamento passivo de estudantes.

A construção de uma aula unitária, na qual o professor dirige seu discurso ao grupo, como unidade, já não tem mais espaço. A possibilidade de avançarmos em direção a uma atividade pautada em perspectiva relacional, na qual estudantes e professores protagonizem os processos de ensinar e de aprender, é a chave de uma dinâmica pedagógica mais eficiente e exitosa, capaz de favorecer a inovação da aula universitária.

A clássica obra de Imbernón problematiza o campo da formação de professores e serve de possibilidade para redefinirmos ações de formação continuada, focando na importância de um desenvolvimento profissional docente marcado por processos auto e interformativos.

Sheila Fagundes Goulart – É doutoranda em Educação na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: [email protected].

Doris Pires Vargas Bolzan – É professora do Programa de Pós-Graduação em Educação e do Departamento de Metodologia do Ensino (PPGE/CE/MEN) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: [email protected].

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