Humanidades digitais pós-coloniais/decoloniais e o ensino de história | CLIO – Revista de Pesquisa Histórica | 2022

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Humanidades digitales  | Imagem: Projects Grinugr

O presente dossiê teve como propósito disseminar diferentes experiências, práticas e abordagens sobre o Ensino de História em suas relações com as Humanidades Digitais. Uma busca nas principais plataformas permite concluir que esta última expressão tem ganhado espaço nos debates do campo nos últimos anos, conquanto outras opções terminológicas (TIC’s, TDIC’s, NTE, ODA’s, História Digital etc.) por vezes ocultem produtivos diálogos ou até mesmo propostas que se dirigem para direções opostas.

Dito isso, vale alertar que, ao optar por este ou aquele em suas reflexões, os(as) autores(as) nem sempre conferem a historicidade do termo, o que formataria uma crítica de seus propósitos de criação e uso. Consequentemente, iniciativas ingênuas e bem intencionadas podem ser usadas (e não raro são) em projetos educacionais e/ou políticos que se afastam das intenções originais de seus criadores i. Leia Mais

XIII Jornada de História Antiga – Temas, Fontes e Métodos / Nearco – Revista Eletrônica de Antiguidade / 2013

História Antiga no Brasil – perspectivas sobre temas, objetos e pesquisa

Mediante os estudos recentes sobre a produção brasileira, da área de História Antiga, foi possível notarmos uma ampliação deste campo histórico nas universidades públicas e privadas. Ao dialogarmos com os escritos do pesquisador Pedro Paulo A. Funari, na coleção de textos didáticos Repensando o Mundo Antigo, nº47-2005, podemos indicar que para além da formulação de textos em nosso idioma, também houve um crescimento das traduções de documentos históricos e de publicações estrangeiras, o que possibilitou o acesso para muitos estudantes.

Em nossas concepções, a referida ampliação ocorreu devido a elementos como: o uso da internet para pesquisas de livros, artigos, e podemos acrescentar o próprio acesso as documentações conservadas no exterior. Também chamamos atenção para o aumento da massa crítica interessada em Antiguidade, que seria oriunda de espaços como a indústria cinematográfica e os periódicos infanto-juvenis (quadrinhos) com temáticas relacionadas com o mundo antigo.

Apesar do grande desenvolvimento da História Antiga, em terras brasileiras, nós ainda enfrentamos alguns entraves nas produções científicas. Assim salientamos que em muitos casos, assumimos uma posição mais de consumidores da produção estrangeira, do que produtores de publicações na área. Contudo, as pesquisas nacionais existentes têm nos mostrado um trabalho de total qualidade e que está atenta a reflexões teóricas e metodológicas aplicadas ao documento, a partir de suas problemáticas. Segundo Fábio Faversani, em Entrevista para o Jornal Philía nº32 – 2009, há uma necessidade no Brasil de que os profissionais de História Antiga comecem a valorizar as produções nacionais e também se leiam. O historiador citado assinala que a utilização da historiografia brasileira, nos cursos de graduação, não se iguala ao quantitativo de livros que são elaborados, pelos especialistas nacionais. Faversani nos convoca a superarmos tais obstáculos, a fim de fomentarmos os debates de forma enriquecedora, inserindo os nossos estudos na prática de ensino e pesquisa.

A partir de tais reflexões mencionadas surgiu a oportunidade de estabelecermos uma parceria entre o Programa de Pós-graduação em Letras Clássicas da UFRJ, o NEA / UERJ e o POIEMA / UFPel para a elaboração de um evento sobre ensino e pesquisa em História Antiga. Ratificamos em nosso escrito, que o trabalho coletivo entre os centros de pesquisa é uma iniciativa fundamental para o desenvolvimento acadêmico no Brasil. Assim a XIII Jornada de História Antiga – Temas, Fontes e Métodos da UFPel foi desenvolvida, em um clima de comprometimento e fraternidade entre os integrantes, no período de 21 a 23 de janeiro de 2013.

A publicação, neste volume da NEARCO / 2013.2, apresenta os textos resultantes de comunicações realizadas durante a jornada, assim coroa com êxito os objetivos que levaram a selar nossa cooperação nesta edição da jornada, sendo, certamente, a primeira de várias outras experiências de cooperação acadêmica a serem desenvolvidas entre estes grupos.

No dossiê podemos verificar artigos como o de Alessandra Serra Viegas, com o texto O amor de Aquiles: de quem é o coração do herói mais belo da Ilíada de Homero? Pátroclo ou Briseis? A autora convida a todos os leitores para revisitarmos a Ilíada de Homero, a fim de refletirmos sobre os diversos níveis que integravam as relações interpessoais no período Arcaico da Hélade e analisarmos os processos sócioculturais helênicos como o da Philía. Outro texto que podemos ressaltar é o de Carolyn Souza Fonseca da Silva, que chama atenção para uma temática tão cara as sociedades ocidentais, que é a democracia, através do artigo Sólon na democracia e na cidadania de Atenas no século VI a.C.. Silva objetiva analisar a figura de Sólon e os pressupostos democráticos da sociedade grega, em especial a pólis ateniense, que atuava sob a alcunha do princípio da isonomia – termo precursor da democracia e que representava a igualdade perante a lei.

Ainda nos estudos helênicos podemos contar com a contribuição de Alair F. Duarte, em Uma análise sobre os cultos religiosos e a projeção do poder marítimo ateniense através do porto do Pireu no século V a.C.. O autor destaca a área portuária do Pireu na pólis dos atenienses, como um lugar cosmopolita no V séc. a.C. Na região havia culto para divindades locais e estrangeiras, assim como a circulação de navios e pessoas de diversas etnias mantendo uma intensa interação sociocultural. Agregamos ao nosso dossiê os estudos desenvolvidos por Jussemar W. Gonçalves e Matheus Barros da Silva, em a Tragédia Grega e o Político. Os pesquisadores apontam que o Teatro Grego no decorrer do V século a.C., retratou em cena questões que diziam respeito à pólis.

Como o século V a.C. foi um momento histórico de grandes transformações na Hélade, podemos lançar olhares sobre outras regiões. O artigo de Luis Filipe Bantim de Assumpção intitulado O discurso de Xenofonte e o processo de formação na Esparta Clássica contribui para os estudos atuais sobre a historicização da sociedade espartana. Sendo assim, Assumpção analisa o discurso de Xenofonte acerca do processo de formação espartano, por meio das críticas e comparações que o mesmo estabelece com a sociedade ateniense do V século a.C.. Ao passarmos para os estudos do século IV a.C. podemos somar as pesquisas elaboradas por Fabio Vergara Cerqueira e Eduarda Peters, com o texto Mulheres em Atenas, no século IV a.C. O testemunho do Contra Neera, de Demóstenes. O presente texto discorre sobre a vida de algumas prostitutas e concubinas que se tornaram famosas pelos bens e prestígio que conquistaram em Atenas, e objetiva, através de relatos da época, demonstrar como era a vida de então, especialmente da mulher do período e de seu papel na sociedade.

O dossiê também conta com a colaboração de Otávio Zalewisk, com o artigo Literatura helenística com roupagem judaica: o caso da Carta de Aristeas a Filocrates. O artigo nos apresenta os processos de interações culturais entre gregos e judeus no período que ficou conhecido como helenístico. Marcello de Albuquerque Maranhão, em Recuperando historiadores fragmentários: o problema da recuperação da História da Sicília grega em Timeu demonstra aos historiadores possibilidades de análise sobre documentos históricos fragmentários, como no caso dos escritos de Timeu.

Agregamos ao grupo de textos que visa problematizar o campo teórico aplicado aos estudos helênicos, o artigo A sociologia do conhecimento como suporte metodológico para uma análise da tessitura sociopolítica de Sociedades Antigas de Luis Fernando Telles D`Ajello. A partir das propostas de Berger e Luckmann, D’ Ajello trata desta área do conhecimento como um plano metodológico para a compreensão da construção social da realidade. Outra análise importante que integra nosso dossiê foi sobre a guerra, no artigo elaborado por Fabio Vergara e Ricardo B. da Silva, A guerra na política grega, formas de combate e constituições políticas na Grécia Antiga. Os autores salientam que a guerra é e foi um importante definidor cultural, e, nesse aspecto, veremos no texto como as constituições políticas das principais póleis gregas foram influenciadas pelo caráter guerreiro de suas sociedades.

O evento contou com contribuições no campo dos estudos romanos, como os que foram elaborados por Deivid Valério Gaia e Diego Rosa em Análise da fonte Commentarii de Bello Gallico, de Julio Cesar. Neste artigo foi abordada uma visão sócio-política sobre o processo de expansão romana pela região da Gália transalpina, além das expedições pela costa sul da atual Inglaterra e através das margens germânicas do rio Reno entre os anos 58 a.C e 51 a.C. com base em uma interpretação da obra “Commentarii De Bello Gallico” (Em português, “Comentários sobre a Guerra Gálica”), escrita pelo próprio César durante esta campanha. Ainda sobre os estudos envolvendo a figura do cidadão romano, Júlio César, podemos ressaltar a participação no dossiê de Kassia Amariz Pires, Adriana Mocelim de Souza Lima e Etiane Caloy Bovkalovski com o artigo A Vida de Júlio César sob a visão de Plutarco e Suetônio (século I d.C.). O artigo apresenta uma comparação dos escritos de Plutarco e Suetônio sobre a vida de Júlio César. As autoras analisaram através de fontes, os discursos dos pensadores clássicos e apresentaram estudos atuais sobre a composição de seus livros.

Marcos Antonio Collares nos brinda com uma preciosa reflexão teórica aplicada aos estudos romanos, com o texto História Antiga e documentação textual: considerações sobre temas e contextos-formas. No referido artigo, Collares tece algumas considerações sobre a constituição de temas e no trato com os mais diversos documentos textuais legados da Antiguidade. Quanto ao Império Romano no século IV d.C. coube aos pesquisadores Deivid Gaia e Gustavo S. Ribeiro, produzir o texto intitulado os Aspectos econômicos na obra “A Vida de Santa Melânia”: o impacto das doações. O objetivo do artigo foi o de analisar o contexto histórico, onde Santa Melânia, a Jovem, viveu. Procurando compreender a situação complexa em que se encontrava a sociedade romana no século IV d.C., os autores apontaram suas primeiras impressões sobre os impactos econômicos causados pelas volumosas doações feitas por Melânia durante suas viagens pelo Mediterrâneo. Como fonte, os mesmos recorreram à biografia de Santa Melânia, a Jovem, escrita por um homem chamado Gerontius durante o século V d. C.

Encerramos o dossiê através do artigo História e Egiptomania de uma pirâmide em Caxias do Sul (1984-2006) de Wellington Rafael Balem e Cristine Fortes Lia. O trabalho analisa traços culturais da antiguidade egípcia re-significados em um edifício piramidal de Caxias do Sul, RS, ao longo de seus usos. Trata-se de uma réplica, reduzida em escala, da pirâmide de Quéops, que sediou o Centro de Pesquisas Metafísicas (1984-1996) e a Rosacruz, AMORC (1997-2006). A temática aborda-se à luz da egiptomania.

Além do dossiê ainda expomos em nossa edição, a contribuição de três artigos na sessão de temas livres. Desta forma apresentamos o texto de Fábio Feltrin de Souza intitulado de O paradoxo do tempo nas Histórias de Heródoto. Souza propõe uma aproximação com a filosofia e a sofística dos séculos V e IV, investigando o que considerou como “desvio operado no pensamento grego” e a emergência de uma experiência do tempo, em que chronos e aion, dessacralizados, passaram a conviver de maneira paradoxal. Outra participação que devemos destacar neste volume é a de Andréia Tamanini, com o artigo Livia para os íntimos: imagem e estratégia sobre camafeus. A autora frisa que a análise dos camafeus busca observar as transformações que as representações de Livia sofreram desde a vitória sobre Marco Antônio e Cleópatra, e a subsequente instituição do principado, até a morte da imperatriz. Desta forma Tamanini aponta para uma crescente “divinização” da imagem de Livia, que foi subsumida numa tipologia iconográfica que vai do que chamaremos da mater mundi à imperatrix aeterna.

No que tange as práticas mágicas no Império Romano, o NEARCO apresenta o artigo de Luis Augusto Schmidt Totti em A magia em um texto técnico agronômico da Antiguidade Romana: o Opus Agriculturæ, de Paládio. No artigo o autor apresenta algumas receitas expostas por Paládio, denominadas de remedia, para a proteção da propriedade rural e da horta contra pragas e fenômenos climáticos, como o granizo e os nevoeiros.

Em suma os editores deste volume ratificam a necessidade do trabalho em conjunto para o desenvolvimento do campo histórico no Brasil. O ato de caminhar em conjunto em nossa área de estudo, nos propiciará ir mais longe do que se ficarmos isolados. Uma boa leitura a todos

Carlos Eduardo da Costa Campos – Docente e o coordenador da área de Estudos Romanos do Curso de Especialização em História Antiga e Medieval da UERJ. O mesmo integra o corpo de docentes do Curso de Especialização em Educação, Patrimônio e Cidadania – CEPEC / SP. Campos é membro do Núcleo de Estudos da Antiguidade, coordenando a área de atividades de extensão e publicações. Campos também atua como pesquisador do membro do grupo Arq. Histórica / UNICAMP e Atrium / UFRJ.

Deivid Valério Gaia – Professor de História Antiga na Universidade Federal de Pelotas e doutorando em História Econômica e Social pela École des Hautes Etudes en Sciences Sociales – Paris, sob a orientação de Jean-Michel Carrié (dir. E.H.E.S.S.), Jean Andreau (E.H.E.S.S) e de Norberto Guarinello (USP) em cotutela com a Universidade de São Paulo.

Fábio Vergara Cerqueira – Professor Associado do Departamento de História da Universidade Federal de Pelotas, atuando nas disciplinas de História Antiga. Na mesma universidade, integra o Programa de Pós-Graduação em História e o Programa de Pós-Graduação em Memória Social e Patrimônio Cultural. Atua ainda como membro do Polo Interdisciplinar de Estudos do Mundo Antigo, do Laboratório de Estudos da Cerâmica Antiga, do Laboratório de Antropologia e Arqueologia, do Museu Etnográfico da Colônia Maciel. Editor da publicação “Cadernos do LEPAARQ. Textos em Antropologia, Arqueologia e Patrimônio”. Bolsista Produtividade CNPq.

Maria Regina Candido – Professora associada da área de História Antiga da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. A mesma integra o Programa de Pós-Graduação da UERJ e o Programa de Pós-Graduação em História Comparada da UERJ. Candido atua como coordenadora do Núcleo de Estudos da Antiguidade, o Curso de Especialização em História Antiga e Medieval da UERJ e o Curso de Especialização em Educação, Patrimônio e Cidadania – CEPEC / SP.


CAMPOS, Carlos Eduardo da Costa; GAIA, Deivid Valério; CERQUEIRA, Fábio Vergara; CANDIDO, Maria Regina. Editorial. Nearco – Revista Eletrônica de Antiguidade, Rio de Janeiro, v.6, n.2, 2013. Acessar publicação original [DR]

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Periodização histórica – debates e questionamentos / Nearco – Revista Eletrônica de Antiguidade / 2013

 Como historiadores nos deparamos com um problema constante em nosso ofício: explicar determinadas periodizações históricas, para contextualizarmos o objeto de pesquisa. Como profissionais que lidam com o homem no tempo e no espaço devemos ter em mente que uma categorização temporal é o produto de um lugar social específico, o qual visa elaborar um discurso de normatização para que os eventos passados possam ser inteligíveis as necessidades atuais. Deste modo, o presente dossiê intitulado de “Periodização histórica – debates e questionamentos”, da Revista NEARCO 2013.1 pretende lançar novos olhares para os recortes temporais, afim de desnaturalizar tais sistematizações, que em muitos casos passam por despercebidas. A empreitada foi árdua, contudo como diz um antigo provérbio: caminhando sozinho podemos chegar em algum lugar, contudo caminhando em conjunto chegaremos mais longe. De tal forma recorremos aos nossos parceiros de longa data para formularmos esta publicação, que comemora os nossos quinze anos de democratização do saber a sociedade. As temáticas contidas nesta edição perpassam pelas demarcações históricas da Antiga Mesopotâmia, passando pelo período denominado de Antiguidade Tardia e findando com o recorte intitulado de Medievo.

A pesquisadora Katia Pozzer explicita que no mundo antigo, diferentes sistemas de contagem do tempo foram utilizados, segundo as regiões e a época. Os gregos, por exemplo, contavam os anos a partir da primeira olimpíada, os romanos a partir da fundação de Roma. No que tange aos habitantes do Oriente Próximo, os mesmos se referiam aos anos dos reinados de seus soberanos ou aos nomes de seus dignitários. O calendário das civilizações antigas era baseado no ritmo das atividades agrícolas e religiosas e era marcado por intervalos de tempo naturais, dados pelo deslocamento do sol no horizonte, pelo ciclo das colheitas e pelo movimento da lua. Assim a autora pretende analisar o calendário mesopotâmico, o qual era composto de um ano solar, com meses lunares e de um dia solar. Já o Prof. Dr. André Bueno visa em seu artigo problematizar a questão da relação entre tempo e história na China Antiga. Bueno para dar conta de sua proposta se utiliza dos textos de Confúcio (-551 a -479) e Sima Qian (-145 a -85), que são considerados como os dois principais fundadores da historiografia chinesa. O trabalho do autor, além de inovador, nos possibilita conhecer sobre um importante campo, que ainda apresenta certa escassez de produção no Brasil.

As nossas análises sobre as periodizações também envolveram outras regiões orientais como da Antiga Índia. O texto produzido pelo Prof. Dr. Edgard Leite foi direcionado nos convida a desenvolver algumas questões teóricas sobre os problemas de periodização da Índia antiga. O referido pesquisador nos aponta as dificuldades que envolvem a comparação com processos históricos fundadores que são verificados no Ocidente, assim o mesmo destaca o papel da Revolução Neolítica no entendimento das grandes transformações estruturais na história. Além da Índia Antiga, os nossos escritos buscaram refletir eventos que envolveram a sociedade Persa. Em virtude do exposto recorremos ao Prof. Dr. Vicente Dobroruka que analisou a apocalíptica persa. Assim o referido estudioso frisa em seu artigo os diferentes usos das periodizações históricas num apocalipse persa conhecido como Zand-i Wahman Yasn (ZWY). Em sua proposta enfatiza-se que ao longo do apocalipse citado são utilizadas matrizes diferentes dos temas tradicionais dos metais, das idades do mundo e dos impérios mundiais.

Ao nos direcionarmos para os estudos que envolvem a sociedade helênica buscamos o apoio da Prof.ª Dr.ª Maria Regina Candido. A referida helenista focou em seu artigo nos estudos que envolvem o período entre 1200 a 800 antes de nossa era, cujo resultado foi à emergência da polis. O período ora é identificada como Idade do Bronze, Tempos obscuros, Idade Media dos gregos ou simplesmente Dark Ages pela historiografia anglo-americana. Os pesquisadores afirmam que o termo se deve ao “retrocesso cultural” e econômico que ocorreu na região helênica como ausência da escrita, dificuldade em estabelecer assentamentos e assim como a perda dos contatos e rotas comerciais no Mar Egeu. Sendo assim, a autora almeja analisar os termos junto a historiografia, além de expor como o conceito tem sido aplicado, os seus possíveis significados e criticas junto aos pesquisadores helenistas. Complementando os estudos helênicos, nosso dossiê contou com a participação do pesquisador Luis Filipe Bantim de Assumpção. O autor salienta que as periodizações são sistematizações acadêmicas passíveis de um processo de historicização. Desse modo, o mesmo objetiva analisar a maneira como as periodizações históricas de “Arcaico, Clássico e Helenístico” foram desenvolvidas para dar conta das especificidades existentes nas sociedades helênicas.

No que tange ao recorte histórico denominado de República Romana, nosso dossiê teve como autora a Prof.ª Dr.ª Claudia Beltrão da Rosa. A especialista argumentou que a periodização tradicional dos estudos históricos é um modelo que, como todos os modelos, deve existir em benefício da análise e da interpretação dos dados, e não o contrário. Logo, a autora frisa que algumas questões sobre a pertinência do modelo monarquia / não monarquia para o estudo da religião romana na “República”, assim como o período denominado de republicano necessitam ser estudados pelos pesquisadores, a fim de contextualizar seu objeto de pesquisa. Além dos escritos de Claudia Beltrão da Rosa, os pesquisadores Gilvan Ventura da Silva e Carolline da Silva Soares foram vitais nas análises que envolvem a periodização romana. Assim o artigo de Silva e Soares é voltado para refletir os limites e possibilidades dos conceitos mais comuns utilizados para definir o sentido das transformações operadas no Império Romano a partir da morte de Cômodo (192), transformações estas que culminaram na redefinição do sistema imperial romano e, do ponto de vista da longa duração, na sua gradual desagregação à medida que avança o século V.

Ao nos depararmos com a periodização da sociedade islâmica recorremos ao estudioso Ian Morris, o qual indica que as sociedades que formavam o império islâmico emergiram na Antiguidade Tardia. Para o autor a fragmentação política e espiritual de tal área imperial ocorreu entre c.700-950, o que decididamente constituiu as comunidades medievais sob comando das dinastias islamizadas. Seguindo pela perspectiva cronológica chegamos aos escritos da historiadora Renata Rozental. As reflexões da autora são voltadas para a formação de consciências históricas entre os judeus da Idade Média. Desta forma, Rozental salienta que a memória apresenta-se como instrumento narrativo e configura-se como parte da nova identidade judaica entre os séculos XIV-XVI. Neste estudo é possível perceber o uso social do tempo como campo legítimo de estudo do historiador.

Além das sociedades mencionadas podemos ressaltar pesquisas como as de Dominique Vieira Coelho dos Santos e Renan Marques Birro, que analisam respectivamente a sociedade Céltica e Nórdica, as quais o modelo de periodizações históricas tradicionais não são apropriados para as suas especificidades culturais. Dominique Vieira Coelho dos Santos apresenta uma reflexão acerca do modo pelo qual os historiadores produzem suas narrativas sobre os celtas a partir da construção de formas e periodizações. Logo, o artigo convida ao leitor a repensar as periodizações e seus usos, além de contribuir para novas perspectivas sobre a História da Irlanda. No caso de Renan Birro, o mesmo destacou que a utilização de temporalidades (ou eras) para o Estudo da Europa Nórdica (compreendida sem limites muito estritos como os atuais países Nórdicos, o Leste da Alemanha e o Leste Europeu) foi empreendida como um exercício didático para simplificação dos estudos e detecção de tendências artístico-estilísticas, culturais, sociais e tecnológicas durante a Antiguidade e o Medievo. Todavia, Birro ressalta que os avanços da Arqueologia, de estudos comparativos e micro-analíticos tem pulverizado esse panorama conforme a observação minuciosa de regiões específicas. Assim, o autor se propõe realizar uma breve retrospectiva até a quase reinvenção das palavras “Viking” e “Era viking” no contexto do nacionalismo, pós-colonialismo e na busca de identidade da Inglaterra vitoriana no século XIX e seus usos através das últimas centúrias.

Quanto ao aspecto teórico o dossiê conta com os estudos do historiador João de Oliveira Ramos Neto. O referido autor apresenta de forma introdutória as concepções de tempo histórico em Durval Muniz de Albuquerque Júnior, François Hartog, Reinhart Koselleck, Antoine Prost, José Carlos Reis e Paul Ricoeur, propondo um breve debate entre eles na tentativa de compreender a relação do historiador com o tempo que oscila entre a concepção natural e a concepção filosófica. No artigo são tratados temas e conceitos como calendário, estrutura, conjuntura, fato histórico e regime de historicidade.

Além do dossiê, a revista apresenta a sessão de artigos livres que contém a produção de Jorge Durbano. O presente artigo visa debater sobre as funções institucionais e administrativas que um cidadão ateniense no período clássico deveria executar para o acesso e manutenção de seu cargo na polis de Atenas. Além do referido texto, a revista NEARCO também expõe a resenha efetuada por Guilherme Keller Fragomeni da obra Medeia- Mito e Magia, de autoria da helenista Maria Regina Candido. O referido trabalho visa apresentar os principais pontos que constituem o livro sobre um dos personagens históricos mais debatidos na história.

Em suma, o conselho editorial da Revista NEARCO deseja a todos uma boa leitura!

Carlos Eduardo da Costa Campos – Membro do Núcleo de Estudos da Antiguidade, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, na linha de pesquisa: Religião, Mito e Magia no Mediterrâneo Antigo. O mesmo atua como docente do Curso de Especialização em História Antiga e Medieval, CEHAM – UERJ. E-mail: [email protected]

Maria Regina Candido – Docente associada em História Antiga e coordenadora do Núcleo de Estudos da Antiguidade, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. A mesma atua como membro da coordenação do Curso de Especialização em História Antiga e Medieval, CEHAM – UERJ e como Professora do Programa de Pós-Graduação em História da UERJ e do Programa de Pós-Graduação em História Comparada, da UFRJ.


CAMPOS, Carlos Eduardo da Costa; CANDIDO, Maria Regina. Editorial. Nearco – Revista Eletrônica de Antiguidade, Rio de Janeiro, v.6, n.1, 2013. Acessar publicação original [DR]

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