A cidade que dança: clubes e bailes negros no Rio de Janeiro (1881-1933) | Leonardo Affonso de Miranda Pereira

O livro aqui resenhado é resultado de mais de uma década de pesquisa realizada por meio da lente cuidadosa da história social. O historiador Leonardo Pereira apresenta ao público leitor uma pesquisa sofisticada, com ampla utilização de fontes conhecidas e inéditas, orais e escritas. Combina questões caras ao público especializado que se interessa por cultura, política, trabalho e sociedade, ou seja, pela história complexa da sociedade no sentido atribuído por Eric Hobsbawn.1 É capaz de proporcionar para aquela leitora e aquele leitor que não são versados na ciência histórica elementos fundamentais para compreender como a dança e a música, no seu aspecto vivencial, transformado e recriado por gentes negras de origens populares, tão caras ainda hoje à cidade do Rio de Janeiro, têm uma trajetória que remonta ao fim do regime escravista e, sobretudo, às primeiras décadas da República. Leia Mais

Os carnavais de rua e dos clubes na cidade de São Paulo: Metamorfoses de uma festa (1923-1938) – SILVA (H-Unesp)

SILVA, Zélia Lopes. Os carnavais de rua e dos clubes na cidade de São Paulo: Metamorfoses de uma festa (1923-1938). São Paulo: Editora UNESP; Londrina: Eduel, 2009, 304p. Resenha de: BARREIRO, José Carlos. História [Unesp] v.28 no.1 Franca  2009.

Nas últimas décadas, o carnaval brasileiro tem sido objeto de reflexão por parte de antropólogos, historiadores e estudiosos em geral devotados à temática da cultura. Contudo, a bibliografia sobre o tema é ainda surpreendentemente restrita, razão pela qual o livro de Zélia Lopes da Silva sobre o carnaval paulista nas décadas de 20 e 30 surge em boa hora. Sempre mobilizada para o tema do carnaval e de todo o seu universo simbólico arrebatador, a decisão da autora de enveredar-se por este caminho surgiu ainda quando realizava pesquisas para sua tese de doutoramento sobre os anos 1930. Zélia percebeu, através da documentação analisada, que havia naqueles anos um profundo interesse dos contemporâneos pelo carnaval. Tal interesse vinculava-se, dentre outros aspectos, ao debate em curso, iniciado nos anos 1920, entre segmentos intelectuais preocupados com a identidade do país, que discutiam sobre as conveniências ou não da institucionalização e nacionalização do carnaval. A autora, então, não teve dúvida em relação à pertinência do tema e desenvolveu-o como tese de livre-docência, transformado-a agora em livro editado pela Edunesp/Eduel.

A escassez de bibliografia sobre o tema já justifica por si um estudo desta natureza, principalmente em se tratando do carnaval de São Paulo, sobre o qual as pesquisas são ainda mais escassas. Mas não é somente aqui que reside o credito principal a ser atribuído ao trabalho de Zélia. A densa documentação, árduamente trabalhada e interpretada pela autora desperta no leitor especializado um grande interesse, sobretudo quanto ao método interpretativo aplicado na análise do material iconográfico – telas de pintores, caricaturas, capas de revistas e fotografias. Já na introdução do livro, as análises e interpretações da caricatura “Carnaval” de Belmonte e a representação de Sátiro, semideus, habitante das florestas e companheiro inseparável de Dionísio, extraídas das revistas A Cigarra, de 1923, e Fon Fon, de 1927, dão mostras do trabalho que será desenvolvido ao longo de todo o livro. Estas experiências são recentes no âmbito da historiografia, e, via de regra, as imagens aparecem nos trabalhos apenas como ilustração. É preciso advertir, contudo, que o trabalho especializado da análise de densa documentação escrita e iconográfica, envolvendo a aplicação de conceitos e métodos específicos não é empecilho para o leitor não especializado. A concepção gráfica, a farta ilustração colorida, a fluidez do texto e a beleza das imagens desvelam aspectos instigantes da festa símbolo do Brasil, que poderão ser usufruídas de forma muito prazerosa, independentemente do interesse pelo método historiográfico aplicado para a análise do objeto.

Vale a pena destacar pelo menos duas circunstâncias que valorizam sobremaneira o livro de Zélia. Primeira, a análise da festa popular carnavalesca não está dissociada das configurações sociais e políticas mais amplas vividas pela sociedade brasileira da época. De fato, o tenso quadro político e social vivido pelo Brasil naqueles tempos precisou ser levado em consideração, para que o carnaval da época pudesse ser entendido em suas verdadeiras dimensões. Lembremos que as balizas cronológicas definidas pela autora para seu estudo, que se circunscreveram aos anos de 1923 a 1938, envolveram situações delicadas do ponto de vista político. Os anos de 1923 inauguraram o governo de Artur Bernardes, que tomou posse sob os ruídos militares de 1922. Embora sufocados, esses motins alteraram a rotina dos folguedos carnavalescos de 1923, impondo regras duras aos foliões e maior controle ao seu movimento. Os foliões de 1938 também sofreram as sequelas do golpe de estado de 1937, que não censurou apenas os órgãos de imprensa, mas igualmente a “circulação livre” dos possíveis pândegos que conformaram a efetividade dos festejos do carnaval. Em decorrência, o ano de 1938 marcou certo refluxo do carnaval em São Paulo, notadamente o de rua. As drásticas medidas que foram tomadas pelas autoridades de Segurança Pública cercearam a movimentação dos foliões que, para caírem na folia, teriam de se submeter às rígidas exigências e proibições acionadas por essas autoridades.

A segunda circunstância que merece destaque no livro refere-se ao fato de que as reflexões vão muito além das afirmações que viraram lugar-comum em vários estudos sobre o carnaval, analisado quase sempre sob o prisma da dicotomia carnaval de elite versus carnaval popular. A autora enfrenta complicações analíticas mostrando que o carnaval paulista define-se através de múltiplos cenários e influências além de criações e redefinições de espaços diversificados de sociabilidade. Isto implica a ausência de fronteiras rígidas entre as características da festa praticada por segmentos populares e aquela praticada pelos setores mais elitizados da sociedade. De fato, do ponto de vista dos espaços ocupados, os palcos das festanças carnavalescas nem sempre eram os mesmos para os dois segmentos. Mas isso não impedia que em alguns momentos houvesse a inserção de segmentos populares nos circuitos do carnaval elegante, assim como, da mesma forma, os segmentos das elites frequentavam os redutos do carnaval popular de rua. O carnaval do Brás é um exemplo típico desse embaralhamento, que acabava por produzir mútuas influências. É claro que esse processo não foi linear, e, tampouco, isento de tensões. Pesadas interdições recaíam duramente sobre as sociedades e blocos populares, cobrando, além da obrigatoriedade do registro oficial, que seus membros devessem ser revistados mesmo antes da saída às ruas, ainda na sede de suas entidades. Nesse sentido, as regras gerais nem sempre tiveram uma aplicação universal, uma vez que tais cuidados não foram extensivos às sociedades carnavalescas elegantes.

Enfim, apesar das rígidas e frequentes intervenções oficiais, principalmente sobre os blocos populares, é preciso considerar, diz Zélia, que a desobediência por parte dos foliões nunca deixou de fazer parte do acontecer carnavalesco. As ruas eram teimosamente invadidas por grupos, blocos e mascarados, mesmo que tivessem que se sujeitar às rígidas imposições legais ou simplesmente desobedecer a elas.

Apesar disso, intervenções oficiais no sentido de estabelecer um modelo único para o carnaval destruíram algumas de suas formas espontâneas, principalmente através de medidas acionadas pelo Estado no início dos anos 1930, abrindo caminho para o modelo do carnaval/show exibido em diversos espaços públicos.

José Carlos Barreiro – Professor Doutor – Departamento de História – Faculdade de Ciências e Letras – UNESP – 19806-900 – Assis – SP – Brasil. E-mail: [email protected].

Between the Flags: One Hundred Summers of Australian Surf Lifesving – JAGGARD (PHR)

JAGGARD, Ed (Ed). Between the Flags: One Hundred Summers of Australian Surf Lifesving. Sydney: UNSW Press, 2006. 262p. Resenha de: CORNWALL, Jennifer. Public History Review, v.14, 2007.

Ed Jaggard, in the editorial introduction to Between the Flags: one hundred years of Australian surf lifesaving, acknowledges that, with a few exceptions, the ninety or so Ed largely amateur individual histories of surf lifesaving clubs produced to date have kept to ‘a familiar script’ of self-affirmation – ‘progress, mateship, self-help, legendary stories, competition success and notable acts of bravery’. While celebratory in part, this history of the surf lifesaving movement, the largest volunteer-based organisation in Australia, offers a comprehensive examination and critique of the subject. The book is a collection of chapters exploring particular themes of the movement’s history, including its origins in the emergence of Australian beach culture, the development of surf lifesaving techniques and technologies, courageous rescues, the place of surf lifesaving as a national and international sport as well as an examination of club culture.

The eleven contributors represent an impressive line up of academics and other writers either involved in the lifesaving movement or with an interest in Australian beach culture and sport. Among them are Professor Douglas Booth, who has written extensively about the history of Australian beach culture, and Nancy Cushing, a lecturer in Australian history at the University of Newcastle (one of the three female writers). Leia Mais