História Ambiental: configurações do humano e tessituras teórico-metodológicas | Ilsyane Kmitta, Suzana Arakaki e Tânia Zimmermann

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Suzana Arakaki | Imagem: Dourados News

A obra História Ambiental: configurações do humano e tessituras teórico-metodológicas (2020) é uma coletânea de 7 textos, organizada pelas historiadoras Ilsyane Kmitta, Suzana Arakaki e Tânia Zimmermann, vinculadas à Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS-Amambai). O livro tem apresentação de Susana Cesco (UNIRIO) e reúne pesquisadores/as das regiões Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste em torno da História Ambiental com destaque, especialmente, aos desafios teóricos-metodológicos e políticos que envolvem este campo de pesquisa no Brasil. Além dos artigos, possui também uma entrevista com Paulo Henrique Martinez, colhida no ano de 2018 por ocasião da XVI Semana Acadêmica de História da UEMS (campus de Amambai).

Historia Ambiental Suzana ArakakiRessente-se, logo de início, de algumas considerações das próprias organizadoras sobre as circunstâncias de confecção da obra. É de praxe, em um livro de coletâneas, que pode, ou não, ter a apresentação de algum/a convidado/a, encontrarmos algumas palavras dos/as próprios/as organizadores/as de agradecimento e esclarecimento sobre as condições de estruturação do livro e seu conteúdo. Assim, ficamos sem saber, por exemplo, o porquê da inserção de uma entrevista realizada em 2018 em um livro publicado dois anos depois. O material começou a ser gestado nesse momento, no âmbito do evento mencionado no parágrafo acima? E quanto à motivação e importância da temática sob a qual foram reunidos os artigos e expresso no título da obra? Leia Mais

Joãosinho da Goméia | Inês Gouveia, Andrea Mendes, Nielson Bezerra e Marlúcia Santos de Souza

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Joãosinho da Goméia | Imagem: Brasil de Fato

O livro Joãosinho da Goméia é obra organizada sob o olhar de quatro pesquisadoras/es. Trata-se de uma coletânea voltada à memória, à palavra e à honra de um dos mais importantes nomes do Candomblé brasileiro: Joãosinho da Goméia. Babalorixá baiano do século XX, João Alves Torres Filho (seu nome de batismo) deixou um legado de conhecimentos afrodiaspóricos e lutas em prol do povo negro e para os saberes de uma religião que extrapola os limites impostos pelo pensamento opressor da colonialidade. Os quatro organizadores da obra – Inês Gouveia, Andrea Mendes, Nielson Bezerra e Marlúcia Santos de Souza –, especialistas nas áreas de Museologia, Patrimônio e História, se dedicam aos estudos sobre a África e suas influências no Brasil, observando como as implicações da africanidade são vistas, ressignificadas e vividas por nós brasileiros no cotidiano.

Joaosinho da Gomea LivroO livro é organizado em doze capítulos na forma de artigos escritos por pesquisadoras e pesquisadores que se debruçaram sobre a vida de Joãosinho da Goméia, observando a densa atmosfera cultural e religiosa negra que esta figura impôs à visibilidade do Candomblé no Brasil. Estes capítulos são divididos em duas partes. A primeira, intitulada “Memória e Representatividade”, abarca os seis primeiros capítulos e atrai o leitor para um plano imersivo na vida e na pessoa de Joãosinho da Goméia, evidenciando um homem negro envolvido com a causa cultural de seu povo e de seu tempo, conquistador dos espaços de luta e poder em prol de uma visão positiva de sua crença e suas práticas sociais e religiosas. Autoras e autores evidenciam um sacerdote que atuava nas múltiplas representatividades: homem negro, homoafetivo, artista e Babalorixá. É possível observar que qualquer tentativa de compreender Joãosinho da Goméia sem se atentar a estes marcadores será em vão, pois em todas as suas ações de vida enaltecia os valores e as lutas que a ideologia dominante cristã e heteronormativa ao seu redor repudiava, e por isso se tornara um ícone da luta e resistência subalterna de sua época. Leia Mais

Negacionismo: A construção social do fascismo no tempo presente | Karl Schurster, Michel Gherman e Óscar Ferreiro-Vázquez

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Karl Schurster, Michel Gherman e Óscar Ferreiro-Vázquez | Imagens: Resenha Crítica/Fósforo Editora/Resenha Crítica

Negacionismo: A construção social do fascismo no tempo presente, exemplifica a mais recente posição de profissionais das humanidades sobre esse fenômeno de massas e das redes, emergente na grande imprensa nos últimos dez anos. Trata-se de uma coletânea organizada por Michel Gherman, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Karl Schurster, das Universidades de Pernambuco (UPE) e de Vigo (Espanha) e Óscar Ferreiro-Vázquez, da Universidade de Vigo (Espanha), que assume a meta de combater o negacionismo, compreendido, inicialmente, como elemento do fascismo contemporâneo. Os pesquisadores que os acompanham são, majoritariamente, docentes do nível superior com atuação nas universidades federais do Rio de Janeiro (UFRJ), do Rio Grande do Sul (UFRGS), de Juiz de Fora (UFJF), Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), na Universidade de São Paulo (USP), Universidade Católica de Petrópolis (UCP), Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR) e na Escola Israelita Brasileira Salomão Guelman.

Negacionismo livroNos dez capítulos da obra, quinze profissionais definem negacionismo e demonstram a as ações de rejeição, ocultamento ou desresponsabilização do Holocausto, do Nazismo, do escravismo brasileiro, da identidade dos judeus progressistas e do conhecimento científico em gêneros/suportes como o artigo de jornal, livro de História, o filme histórico e as letras de música. A maioria privilegia a expressão-título (negacionismo), explorando-o no tríptico: definição/causa/terapia.

No primeiro capítulo – “(Para)traduzir a negação, as teorias da conspiração e o antissemitismo” –, negacionismo é a “tentativa sistemática de falsificação do passado-recente” (p.21), mediante as habilidades de descartar provas, “regenerar e limpar o presente de um passado indesejado” (p.31). Por essa definição, o antissemitismo é “uma vertente negacionista” (p.25) e a “teoria da conspiração” é o elemento aglutinador de grupos extremistas, que estigmatiza “grupos minoritários” e incentiva a violência física. Para Karl Schurster, Michel Gherman e Óscar Ferreiro-Vázquez, o papel dos acadêmicos é explicar como a “desinformação” afeta a o modo de os indivíduos lerem o mundo (p.21).

No segundo capítulo o perfil taxonômico dos textos se mantém, associado às primeiras medidas terapêuticas. Tratando de “Esquecimento, revisionismo e negacionismo: o assassinato da História”, Francisco Carlos Teixeira da Silva e Karl Schurster definem negacionismo com ação/habilidade/prática do Fascismo. O Fascismo é um fenômeno (ideológico) e uma patologia social (neurose) caracterizada pela atitude sistemática de esquecer, recalcar ou reprimir o passado que causa “dor intensa e repetitiva” (p.34-35). Na sociedade alemã, emerge do autoritarismo, etnocentrismo, da “frieza nas relações interpessoais” e da “falha na educação.” (p.62). No brasil, a ocultação, a censura política do ensino de História e reescritura da história (revisionismo) são os seus sintomas. Para os autores, negacionismo é também é a atitude de historiadores e governos evitarem nomear a recusa sistemática do passado doloroso do Holocausto e da Ditadura Milita como fascismo. A principal terapia, para a Alemanha e para o Brasil, é fazer o caminho inverso da neurose: recordar, exibir e superar o passado que causa dor. De modo residual, os autores também apresentam uma terapia epistemológica (e ética): hierarquizar o valor dos testemunhos (o prisioneiro e o carcereiro) e considerar em conjunto o depoimento dos que sofreram a violência.

No terceiro capítulo, a tentativa de definição se especializa. Para Luís Edmundo de Souza Moraes, que escreve “A negação negacionista do Holocausto, suas metamorfoses e a ilusão de ótica”, negacionismo é categoria que dá conta de um fenômeno dos anos 1980: negar e falsear conscientemente o passado e fraudar critérios de autoridade. É uma prática institucionalizada, um movimento de direita e uma “reação” sobre o sentido atribuído a determinado objeto. Visto diacronicamente, o negacionismo emerge em “forma-testemunho” e “forma-ciência”. Ele “não é passível de refutação”, não pode ser silenciado academicamente e o seu avanço ou retrocesso independe do trabalho melhor ou pior dos historiadores (p.105). Para Moraes, o sucesso do revisionismo se deve à demanda do público leigo por história narrativa e aos vícios da obstrução epistêmica (escrita ininteligível). O melhor combate ao negacionismo histórico, inspirado no caso francês, inclui: reformas nos currículos de formação de professores e pesquisadores, reforma nos currículos da educação básica e produção de novos materiais didáticos.

O quarto capítulo – “Revisionismo, doença infantil do negacionismo?”, escrito por Marcos Napolitano, define negacionismo como a “‘mentira organizada’ voltada para o apagamento e encobrimento de responsabilidades históricas […] sobre a violência do passado que envolveram perpetradores e vítimas, bem como seus herdeiros no presente” (p.112). As razões do sucesso do “negacionismo” e do “revisionismo” são, por exemplo, a falta de eficácia na “divulgação científica” universitária e a “falta de um jornalismo científico mais afinado com a pesquisa” (p.130). Isso explicaria, por exemplo o sucesso de “revisionistas recentes” como o de Elio Gaspari, Jorge Caldeira e Leandro Narloch. A terapia, segundo o autor, é a é a “busca da verdade histórica”, entendida como “um ponto de fuga identificável nas fontes e evidências gerados pelo passado, um compromisso ético e ontológico do historiador” (p.138).

O sétimo e o décimo capítulos encerram as iniciativas dominantemente definidoras de negacionismo. No texto de Arthur Lima de Avila – “Formas/fórmulas de negação e irresponsabilidade representacional: o caso Brasil Paralelo e o Negacionismo Histórico contemporâneo”, a categoria “negacionismo histórico contemporâneo” é comparada à categoria “revisionismo clássico”. A primeira (na qual se encaixa R. Faurisson), versa sobre o holocausto e é marcada por uma afirmação contrafactual (não houve holocausto), a despeito das provas materiais e testemunhos (“negação strictu sensu”). A segunda é marcada por operações narrativas de omissão de argumentos contraditórios e suavização da violência de determinados atores, resultando em um processo de desresponsabilização (“irresponsabilidade representacional”). Os filmes da produtora Brasil Paralelo são exemplos dessa narrativa (p.188). Para Avila, a causa do negacionismo contemporâneo é estrutural: “a transformação interior à racionalidade neoliberal”, ou seja, a “passagem tormentosa de um neoliberalismo progressista a uma versão francamente autoritária dele. (p.202).

Esse não é, contudo, o diagnóstico de Natalia Pasternak, que escreve “negacionismo da ciência e do Holocausto: estratégias e consequências”. A autora define negacionismo como “uma mentira que nega a realidade para promover ideologia, política ou religião”, que “mata democracias e pessoas.” (p.275). Implicitamente, a autora sugere que identificar suas estratégias é realizar o seu combate. Assim, deve o combatente reconhecer que o negacionista: evita a negação total do fato, empregando um “mas, veja bem…” (após a negação do negacionismo); põe fatos/detalhes fora do contexto (via omissão deliberada ou ignorância supostamente ingênua) para rejeitar tese consensuada entre especialistas; muda, continuamente, o objeto da negação (recentemente refutada); desafia os especialistas para o (falso) debate em busca de legitimação; e usa o ceticismo para questionar teses, fatos e evidências exploradas a exaustão, acusando os cientistas de rejeitarem esse valor secular empregado na ciência.

O quinto, o sexto, o oitavo e o nono capítulos, dominantemente, tipificam práticas ditas negacionistas. Em “Nazismo de esquerda? Considerações sobre o revisionismo ideológico sobre o nazismo no Brasil contemporâneo” (quinto capítulo), Michel Ehrlich compreende a declaração sugerida acima como exemplo de “revisionismo ideológico”, ao contrário de “negacionismo” (negação dos “fatos, acontecimentos concretos consolidados” (p.146). Contudo, diz o autor, mais importante que tipificar a proposição é denunciar os interesses que a fundamentam: desresponsabilizar o nazismo das violações de direitos humanos e minimizá-lo como parâmetro nos julgamentos futuros de crimes semelhantes praticados por membros do governo Bolsonaro. No capítulo seguinte (o sexto) – “A dupla negação dos judeus em tempos de Bolsonaro”, Michel Gherman e Gabriel Melo Mizrahi apresentam desdobramentos do negacionismo praticado pelo então deputado Jair Bolsonaro no Clube Hebraica, em 2017, pelo presidente da Federação Israelita do Estado do Rio de Janeiro (FIERJ), pelo chargista Latuff e o jornalista Shajar Goldwaser. As referências desses sujeitos aos judeus que reprovaram a presença de Bolsonaro na Hebraica, apesar de ideologicamente antagônicas, provocaram, ao menos no plano do discurso, um duplo apagamento da sua identidade: negados como judeus (por Bolsonaro e pela FIERJ) e negados como judeus de esquerda (pela imprensa), afirma o autor.

O oitavo e nono capítulos focam na constatação e na denúncia, são: “Negamos o que nos constitui e escondemos o que não suportamos ver: negacionismo da escravidão como estratégia de naturalização da violência, da exclusão, da exploração e da desigualdade racial” e “Negacionismo, revisionismo e discursos de ódio no tempo presente: a apropriação da narrativa sobre memória do Holocausto pelo rock neofascista.” No primeiro, Janaina Chrstiam Peranyon Lopes e Antônio Carlos Jucá de Sampaio consideram “negacionista” a prática de “naturalizar” e “reiterar” mecanismos geradores de “violência, exclusão e desigualdade racial”, expressa, por exemplo, nas tentativas de suavização da lei que pune os que exploram trabalhadores em condições análogas à escravidão (p.215). De forma semelhante, para Pedro Carvalho Oliveira, “negacionista” e “revisionista” é mensagem veiculada nas letras de músicas de bandas de rock ideologicamente orientadas pelo fascismo, na Alemanha, nos EUA, no Chile, na Argentina e no Brasil. Elas reiteram a ideia de que o holocausto não existiu e que os judeus conspiram para a extinção da raça branca. A intenção das bandas é desresponsabilizar os nazistas que atuaram na Segunda Guerra Mundial e de cultivar o ódio aos judeus.

Como pudemos observar, os autores fazem o duro trabalho taxonômico de domar as palavras do senso comum e torná-las instrumento epistêmicos de qualidade superior, sob a majoritária ideia de que os discursos sobre o passado têm consequências e que, por isso, os representadores do passado devem explicitar seus compromissos éticos, principalmente, quando esses desdobramentos implicam em ameaças à convivência em uma democracia liberal. Esse investimento, evidentemente, os põe em risco de cometer diferentes tipos de imperfeições. Os ruídos não aparecem nas causas e nas terapias, pouco abordadas no conjunto da obra: mudanças estruturais de combate à neurose, mudanças na formação profissional da história e produção de material didático competente para os escolares. As terapias circulantes em outras áreas, como o cinturão sanitário, a censura e a prisão não estão neste livro. As insuficiências, por outro lado, são majoritariamente no exame da palavra (negacionismo) e na tentativa de adequar a palavra à coisa (mentira, falsidade, neurose etc.).

Esse tipo de ruído aparece no primeiro capítulo, que não deixa claro o limite entre notícia falsa, negacionismo e teoria da conspiração e entre o valor heurístico de negacionismo, negacionismo histórico e antissemitismo. Também está claro se as elites ressentidas com as políticas de justiça social e os profissionais da História que se recusam a designar a política de negação do passado doloroso da ditadura militar brasileira partilham da mesma patologia mental e, ainda, se haveria um negacionismo irracional de leigos e um negacionismo racional de experts acadêmicos.

A necessidade de precisar os termos está expressa, indiretamente, por exemplo, no último capítulo, que ensina muito pelo testemunho autobiográfico. Ali, o negacionismo é “condição humana” (eu diria uma habilidade mental neutra), uma ação epistêmica e moralmente reprovável (um desvalor). A depender da situação comunicativa, várias combinações são possíveis. No depoimento, os nazistas, o bisavô da autora e o leitor acadêmico invocado no texto negam (negaram ou negarão) a realidade de alguma forma, demonstrando, respectivamente, ódio, prudência e indiferença calculada.

A entrada para o campo de concentracao de Auschwitz Birkenau. Foto ShutterstockWJC

A entrada para o campo de concentração de Auschwitz Birkenau | Foto: Shutterstock/WJC

Esse tipo de raciocínio não é comum na coletânea, o que explica a conurbação de negacionismos. No capítulo oitavo, os autores veem “negacionismo” em fatos qualitativamente distintos: (1) os empresários envolvidos em crime de “trabalho análogo à escravidão” rejeita, “a pecha de escravizadores” (p.213); (2) os lobistas do agronegócio se opõem à legislação antiescravista e lutam para excluir do dispositivo os conceitos de “jornada exaustiva” e de “condição degradante” (dentro das regras formais do jogo legislativo); e (3) diferentes agentes e grande parte da opinião pública aceita esse processo de “desregulamentação das relações de trabalho” (p.213, 226-228).

No capítulo quatro, que relaciona “revisionismo ideológico” e “revisão historiográfica”, adjetivação “ideológico” é inadequada porque não expressa paralelismo com a segunda categoria (que pode ser intencionalmente deflagrada por revisionismo ideológico). Consequentemente, as virtudes epistêmicas referidas (distanciamento ético, argumentação lógica e metodologia reconhecida), adiante denunciadas como descumpridas pelos revisionistas, não são vícios suficientes para separar a má pesquisa e escrita histórica de profissionais da História e a má pesquisa e escrita histórica de profissionais revisionistas, exemplificadas (estas últimas) pelos trabalhos de Hélio Gaspari, Jorge Caldeira e Leandro Narloch. Não são também suficientes para distanciar o trabalho desses revisionistas dos trabalhos “daqueles que fazem divulgação histórica” que são “autores progressistas oriundos do jornalismo”: Laurentino Gomes, Pedro Doria, Eduardo Bueno, Lira Neto, Mário Magalhães e Lucas Figueiredo. É importante registrar essa imprecisão porque o próprio autor reconhece gradações de tipo vário entre (e intra) “narrativas abertamente negacionistas” e “revisionismo ideológico” (p.118). No mesmo capítulo, a imprecisão das categorias contamina o esboço taxonômico: “Negacionismo e extrema-direita” ou “Negacionismo-raiz”, (2) “Revisionismo ultraliberal contra a ‘história politicamente correta’” e (3) “Utopia histórica regressiva/nostalgia conservadora”. Essa classificação repousa sobre assimetrias: a primeira classe é designada negacionismo e a segunda é designada revisionismo. O demarcador das duas primeiras é o referencial ideológico e o demarcador da última é a substância narrativa.

A instabilidade das definições leva também à instabilidade das teses, como ocorre no quinto capítulo. Ali, inicialmente, a declaração “o nazismo é uma ideologia de esquerda” não configura, segundo o autor, negacionismo porque não há negação de “fatos, acontecimentos concretos consolidados” (p.146). O autor, contudo, afirma adiante que a proposição “nazismo é de esquerda” é “uma das que mais distorce os acontecimentos históricos” (159), reafirmando o desvalor da quebra da correspondência entre fato e discurso sobre o fato que definiria o negacionismo. Em seguida, considerando tal proposição como um “revisionismo”, baseia-se na definição de J.-M. Gagnebin de que a “verdade do passado” é questão de metodologia e de ética. Por esta tese, o combate do negacionismo demandaria esclarecimento dos “valores” que “orientam a elaboração desse argumento” (Ehrlich, p.148). Em todo o tópico, contudo, o que o autor faz é apontar os vícios epistêmicos (omissão de informação contrária, de definições e/ou caracterizações confusas do fenômeno estudado), esquecendo o “valor” referido como objeto fundamental a ser buscado. Como não expande a definição de Gagnebin, o autor deixa implícita a ideia (do senso comum, inclusive) de que as normas de pesquisa e de argumentação (aparato epistêmico) estão na esfera do conhecimento (e distantes da dimensão ética).

No texto que denuncia duplo apagamento da identidade de judeus progressistas do Rio de Janeiro, os problemas da definição e da ausência de uma escala de progressão se mostram exemplares. É equivocado usar “negacionismo” para caracterizar a recusa de outras evidências que obriguem o articulista de esquerda a revisar a tese de que os judeus são “ricos, brancos e conservadores” (p.182). Penso ser (ou ser também) um caso de vício epistêmico cometido por um profissional do jornalismo e não de negacionismo de esquerda. O mesmo problema de aplicação da categoria aparece no julgamento do trabalho chargista Latuff sobre os judeus excluídos da reunião com Bolsonaro. O uso é indevido porque os autores tomam um gênero textual que tem fins e situação comunicativa específicos (a sátira) como elemento simétrico ao artigo de jornal (e, talvez, ao artigo acadêmico de um profissional da História). A charge não tem compromisso com a precisão dos fatos e nem é destinada a mentir ou a negar verdades factuais, característica que é compartilhada por seus consumidores. (Se se referisse aos usos descontextualizados, talvez tivesse razão).

O mesmo raciocínio pode ser aplicado à tipificação do gênero musical “rock” e de sua expressão adjetivada “rock fascista”. Se o rock é, como o autor do capítulo 12 afirma (historicamente rebelde e subversor de “valores estabelecidos”), negar é um marcador importante e epistemicamente neutro. A menção desse marcador (dispensável em sua argumentação) contamina duplamente a definição de negacionismo (negligência epistêmica das evidências e desresponsabilização dos nazistas) porque uma letra de música de uma banda de rock não é produzida com a meta de “reler o passado” segundo protocolos científicos. Além disso, a rebeldia e a contestação de valores não é prerrogativa das bandas situadas mais à esquerda do espectro ideológico.

A imprecisão da definição, por fim, gera um dúvidas pelo caráter lacunar do argumento. No quarto capítulo, o revisionismo é uma “mentira organizada” para falsear o acontecido. Mas o autor nada refere sobre a aplicação da categoria: trata-se de mentira textual/literal, mentira de interpretação ou de replicação anônima? Dizendo de outro modo, a mentira deve estar no âmbito da produção, da circulação ou do consumo? Exemplo do mesmo problema está no sétimo capítulo, que não esclarece as dimensões que as ontologias sugeridas por S. Freud e por W. Benjamin alcançam na sua definição de negacionismo: existe negacionismo “inconsciente”, como sugere o autor? (p.188). Omitidas as determinações ontológicas, a afirmação pode ser facilmente contraditada com a tese de que, nesse caso, se trata de mais um exemplo de vício epistêmico (um erro, uma negligência). A mesma indeterminação também enfraquece a caracterização (contraditável como simplista) de que uma marca da história disciplinar é o convencimento pela razão, enquanto a marca do negacionismo contemporâneo é o convencimento pelo afeto. (Ávila, p.200).

O balanço que faço da obra é, obviamente, positivo. Os objetos e objetivos dos textos estão focados, dominantemente, na expressão título (negacionismo) que é tornada categoria. Isso faz do livro obra rara: é teoria voltada para a prática e teoria aplicada ao tempo quente, no tempo quente. A desresponsabilização dos perpetradores do Holocausto, do escravismo e da ditadura militar, por exemplo, levada à cabo por diferentes profissionais e em vario gênero, a chamada à responsabilidade dos historiadores que negam a negação deliberada desses crimes, empregando eufemismos ou fugindo à discussão criteriosa sobre a categoria Fascismo e, ainda, a adoção de modelos psicanalíticos, que inverte a convencional prática de tomar a humanidade como base para a constituição do ser humano e a sugestão de que esse tipo de abordagem pode orientar escritas da história autodesignadas como “do tempo presente” demonstram o valor da empreitada e a razão de o profissional-cidadão adquirir e ler a obra.

Assim, por mais contraditório que possa aparentar, as insuficiências que apontei na obra a tornam instrumento virtuoso para a formação de profissionais da História. Lida a partir dessa perspectiva (como sempre tento fazer), as insuficiências remetem: (1) à omissão ou a imprecisão na definição das categorias tomadas por empréstimo ou criadas para construir os seus objetos; (2) às falhas de relacionamento (ou contraposições) entre essas categorias (semelhança, de causa/consequência, reciprocidade ou subsunção); (3) às ausências de parâmetros e/ou escalas para mensurar (3.1) a distância entre a obediência e desobediência de princípios e procedimentos metodológicos (entre atos diligentes e negligentes e entre falsidade consciente e inconsciente, (3.2) o efeito de uma declaração produzida/reproduzida em ambiente convencional (autoria reconhecida e facilmente auditável) e de uma declaração produzida e reproduzida em ambiente digital (autoria desconhecida, em circulação incontrolável e dificilmente auditável), (3.3) o grau de autoridade historiadora de declarar algo sobre o passado, considerando, por exemplo, o quanto o declarante deve possuir em termos de conhecimento, razão, crença ou evidências e (3.4) a instância de responsabilização da declaração historiadora (obediência a princípios ou consequências das declarações sobre o passado?).

Essas insuficiências, contudo, depõem sobre o estágio atual dos nossos cursos de Teoria da História (Metodologia, História da Historiografia, Introdução aos Estudos Históricos, entre outros). Estamos (essa é a minha hipótese) numa espécie de vazio epistemológico: de um lado, experimentamos o desprezo acrítico das normas disseminadas em manuais de Teoria e Metodologia Histórica produzidos por alemães, argentinos, belgas, brasileiros, chilenos, estadunidenses, franceses, holandeses e ingleses, entre a primeira metade do século XIX e a primeira metade do século XX (O que disse o autor? O que quis dizer o autor? Ele foi sincero? Ele era competente? Ele possuía motivos para mentir? Ele foi preciso?). Do outro, experimentamos o desinteresse pelo que se produziu analogamente, nos últimos 30 anos, em disciplinas como a Epistemologia, Epistemologia do Testemunho, Epistemologia Histórica e, ainda, a Filosofia da Linguagem, Lógica, a Axiologia e a Ontologia, no que diz respeito às ideias de declaração, evidência, prova e verdade.

Sumário de Negacionismo: a construção social do fascismo no tempo presente

  • Os autores
  • Introdução | Luís Alberto Marques Alves (CITCEM-FLUP)
  • 1. (Para)traduzir a negação, as teorias da conspiração e o antissemitismo | Karl Schurster, Michel Gherman e Óscar Ferreiro-Vázquez
  • 2. Esquecimento, revisionismo e negacionismo: o assassinato da História | Francisco Carlos Teixeira Da Silva e Karl Schurster
  • 3. A negação negacionista do Holocausto, suas metamorfoses e a ilusão de ótica | Luís Edmundo de Souza Moraes
  • 4. Revisionismo, doença infantil do negacionismo? | Marcos Napolitano
  • 5. Nazismo de esquerda? Considerações sobre o revisionismo ideológico sobre o nazismo no Brasil contemporâneo | Michel Ehrlich
  • 6. A dupla negação dos Judeus em tempos de Bolsonaro | Michel Gherman e Gabriel Melo Mizrahi
  • 7. Formas/fórmulas de negação e irresponsabilidade representacional: o caso Brasil Paralelo e o negacionismo histórico contemporâneo | Arthur Lima de Avila
  • 8. Negamos o que nos constitui e escondemos o que não suportamos ver: o negacionismo da escravidão como estratégia de naturalização da violência, da exclusão, da exploração e da desigualdade racial | Janaina Christian Perrayon Lopes e Antônio Carlos Jucá de Sampaio
  • 9. Negacionismo, revisionismo e discursos de ódio no tempo presente: a apropriação da narrativa sobre a memória do Holocausto pelo Rock neofascista | Pedro Carvalho Oliveira
  • 10 Negacionismo da Ciência e do Holocausto: estratégias e consequências | Natalia Pasternak

Resenhista

Itamar FreitasItamar Freitas – Doutor em História (UFRGS) e em Educação (PUC-SP), Professor do Departamento de Educação e do Mestrado Profissional em História, da Universidade Federal de Sergipe, e editor do blog Resenha Crítica. Publicou, entre outros trabalhos, Uma introdução ao método histórico (2021) e “Objetividade histórica no Manual de Teoria da História de Roberto Pirgibe da Fonseca (1903-1986)”. ID: https://orcid.org/0000-0002-0605-7214; E-mail: [email protected]


Para citar esta resenha

SCHURSTER, Karl; GHERMAN, Michel; FERREIRO-VÁZQUEZ (Org). Negacionismo: A construção social do fascismo no tempo presente. Recife: EdUPE, 2022. 278p. Resenha de: FREITAS, Itamar. Taxonomias na berlinda. Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n.7, set./out., 2022. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/taxonomias-na-berlinda-resenha-de-negacionismo-a-construcao-social-do-fascismo-no-tempo-presente-organizado-por-karl-schurster-michel-gherman-e-oscar-ferreiro-vazquez/>.

Do Fake ao Fato: des(atualizando) Bolsonaro | Bruna Klem, Mateus Pereira e Valdei Araújo

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Bruna Klem, Mateus Pereira e Valdei Araújo | Imagens: SBTHH/Varia História/Twetter

Há três anos a editora Milfontes lançou o livro Do Fake ao Fato: (des)atualizando Bolsonaro, organizado por Bruna S. Klem, Mateus Henrique de Faria Pereira e Valdei Lopes de Araújo. Uma leitura sem uso do fígado e do coração, após a vitória do Bolsonaro em 2018, serve à avaliação sobre o quanto os docentes das ciências humanas e sociais, representados naquele grupo de 16 autores, domina(va)m a respeito do tema.

Do fake ao fatoOs organizadores afirmam que o objetivo do livro é “pensar a história enquanto ela acontece”, afastando-se da ideia de que o presente se explica pelo próprio presente. Aqui emerge o filtro epistemológico e ideológico de dois deles, a categoria “atualismo” referido em três dos catorze textos que compõem a coletânea. Como recusa a um modo dominante e recente de relacionar-se com o tempo – a repetição do “status atual das sociedades capitalistas” (Pereira; Araújo), por exemplo –, os organizadores destacam os temas/questões do livro na introdução: a vitória eleitoral de Jair Bolsonaro, as desastrosas consequências do governo Bolsonaro e a natureza do bolsonarismo emergente e apoiador de Bolsonaro (Klem, Pereira e Araujo). Os organizadores, por fim, avisam que a sugestão do título não será cumprida, ou seja, não estão ali para esclarecer a verdade dos fatos. Leia Mais

Introdução aos estudos históricos | Lílian Lisboa Miranda

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Fernand Braudel | Imagem: Instituto Braudel

Os estudos sobre História da Historiografia costumam traçar uma cronologia acerca da institucionalização da História como ciência e como disciplina curricular na Europa. No livro Introdução aos estudos históricos, Lílian Lisboa Miranda segue essa estratégia, apresentando os principais conceitos e como eles foram desenvolvidos ao longo do tempo. Esse trabalho possibilita entender os caminhos que levaram à construção da disciplina História (de uma sociedade) com base no racionalismo europeu e na exaltação da ciência ocidental.

Introducao aos estudos historicosNo livro é apresentado o conceito de História como a ciência que produz conhecimento histórico. São destacados os procedimentos que precisam ser realizados pelo historiador para que o discurso seu produzido seja reconhecido cientificamente. Para o historiador desenvolver uma pesquisa é necessário observar os conceitos empregados no problema, na hipótese e no questionamento das fontes. Os conceitos históricos são fundamentais para identificar, descrever e classificar aquilo que se pretende conhecer. Além de mostrar as características de cada período historiográfico, a autora também contextualiza o ambiente histórico e aponta as motivações que embasam cada corrente teórica, sistematizadas por práticas e métodos em busca de especificidade.

Lilian Lisboa Miranda é Historiadora, Mestre e Doutora em História Social pela Universidade de São Paulo. Docente do Centro Universitário Fundação Santo André, São Paulo. Atua no ensino superior em cursos de graduação em História, Ciências Sociais e pós-graduação. É também autora de livros didáticos, paradidáticos e universitários. Assessora e consultora para redes públicas e privadas de ensino.

O livro de Miranda estabelece um panorama de forma didática apresentando procedimentos e métodos para o ofício do historiador. É uma excelente contribuição aos colegas que ainda estão frequentando a graduação em História. Ele auxilia iniciantes quando informa sobre conceitos básicos, pois a sua linguagem é simples, direta e clara. A escrita da autora também possui a qualidade da boa progressão textual, pois lista a proposta de cada capítulo e as considerações finais. Além disso, emprega as conclusões do capítulo anterior na introdução do capítulo seguinte. Então, pensando ainda nos colegas de graduação, o livro dirime dúvidas clássicas a exemplo da categorização de “escola metódica” e “positivista” como escolas historiográficas, dentro de uma estrutura de livro didático.

No capítulo 1 – “O ofício do historiador” –, Lilian Miranda questiona o que é História e qual a sua importância. Destaca que há muito tempo essas questões perseguem e mobilizam historiadores que refletem sobre seu ofício e a importância da História. A autora medita sobre a História como campo do saber científico, caracteriza as especificidades do ofício do historiador e demonstra as principais contribuições realizadas por historiadores de diferentes escolas historiográficas. Para falar sobre o conceito de História como ciência, Miranda comenta as ideias de H. White, E. Carr, P. Veyne, M. Bloch e E. Hobsbawm. Concluí ressaltando que o conceito de História é histórico e se transforma com o tempo. A autora defende que a História é diferente de Literatura, apesar de alguns pensadores falarem da proximidade, pois a sua produção depende de evidências e critérios teóricos e metodológicos científicos.

No capítulo 2 – “História: recortes temáticos, usos e fontes documentais” –, a autora discute questões relacionadas ao ofício do historiador, sua prática e a produção do conhecimento histórico científico. Ela ressalta que a produção do conhecimento científico exige conceitos, fontes históricas, método crítico, recortes temporais, espaciais e temáticos. O capítulo também apresenta os conceitos de tempo e espaço. Destaca que esses conceitos são polissêmicos e transformados pelo tempo, e que é tarefa básica tanto para o pesquisador quanto para o professor de História usar os conceitos históricos adequadamente. Miranda conclui o debate do capítulo afirmando que a História, enquanto prática e produção de conhecimento, possui uma série de procedimentos que precisam ser realizados pelo historiador para que seu discurso seja reconhecido cientificamente.

No capítulo 3 – “Conceitos fundamentais do fazer histórico” –, a autora aprofunda o debate sobre os principais conceitos utilizados pelos historiadores em sua prática, tais como: tempo, espaço, sujeito histórico, processo histórico e cultura. Ela também ressalta que os conceitos são ferramentas úteis para orientar a reflexão a partir de diferenças entre modelos conceituais e as realizações da realidade histórica. Além disso, aponta a importância de reconhecer os conceitos como algo imprescindível na produção do conhecimento histórico, tanto nas pesquisas acadêmicas quanto no espaço histórico escolar.

No capítulo 4 – “Escola Metódica” –, Lilian Miranda define o que é uma escola historiográfica, listando seus termos teóricos, temáticos e metodológicos. Ela informa que cada escola possui sua visão sobre o ofício do historiador, o universo histórico, ou seja, cada escola representa um paradigma. A autora estabelece a Europa como referência para o nascimento da ciência histórica no século XIX, sob a influência do positivismo e do historicismo e seus principais autores. Convém ressaltar que a autora diferencia o positivismo da escola metódica, alertando sobre o erro comum entre alguns historiadores que tratam os dois como sinônimos. Ela opõe-se a isso. Também conta que a escola metódica é a responsável por transformar o saber antigo da História em um conhecimento científico, realizado por profissionais nas universidades e pela sua difusão.

No capítulo 5 “O historicismo”, aborda essa corrente de pensamento histórico que se desenvolveu no século XIX, pelos recém-formados Estados nação, principalmente na Alemanha. Ela expõe que não é uma tarefa simples definir o historicismo, pois há, entre os especialistas, diferentes entendimentos. Para alguns teóricos, o historicismo é um método de escrever a História, outros consideram que é uma visão de mundo fundamentada em uma filosofia da História com implicações políticas. Miranda expõe que essa corrente de pensamento historiográfico surgiu em meio ao processo de formação do estado unificado alemão no século XIX e se contrapôs ao projeto universalista positivista francês.

No capítulo 6, “Materialismo histórico-dialético”, a autora discute a vertente historiográfica do materialismo histórico. Ela chama atenção para a importância dessa corrente de pensamento para a História e as Ciências Humanas e adverte sobre a complexidade teórica dessa vertente historiográfica, propondo-se apenas a tratar das ideias centrais.

Miranda reconhece Karl Marx e Friedrich Engels como criadores do materialismo histórico decorrente das transformações na Europa, no final do século XVIII e no XIX, em meio a era industrial. Também conta que uma das contribuições trazidas pelo materialismo histórico foi a ideia de que uma teoria só pode ser devidamente compreendida e apreendida quando está relacionada à prática histórica. Além disso, expõe a crise do marxismo no final do século XX, declarando que teóricos das Ciências Humanas têm buscado rever pontos da teoria do materialismo histórico para examinar questões que afligem as sociedades contemporâneas.

Marx e Engels teoria e pratica sempre andaram juntas Imagem IELA

Karl Marx e Friedrich Engels – teoria e prática sempre andaram juntas | Imagem: IELA

No capítulo 7, “Estruturalismo e escola dos Annales”, a autora reflete sobre a renovação historiográfica realizada pela escola dos Annales, seus pressupostos e “combates”, as especificidades das diferentes fases do movimento e os questionamentos trazidos pelo estruturalismo à História e a “resposta” fornecida pelos historiadores. Informa que o estruturalismo se desenvolveu no final do século XIX e início do XX, como corrente de pensamento que busca entender de que maneira o conhecimento se processa naquela área. Claude Lévi-Strauss criticou as Ciências Humanas, principalmente a História, ao vê-la deficiente em seus métodos, não podendo ser considerada uma ciência. Fernand Braudel respondeu à crítica por meio  do artigo “A longa duração”, escrito em 1948, na revista dos Annales, cuja escola correspondente é dividida em três fases: a primeira começa no início do século XX, com Lucien Febvre e Marc Bloch, que atuaram na edição e publicação da revista dos Annales, difundindo uma nova abordagem interdisciplinar da História no campo econômico e social. A segunda fase acontece após a publicação da obra Apologia da história ou o ofício do historiador, de Marc Bloch em 1944. Braudel tornou-se o sucessor de Lucien Febvre na liderança dos Annales, trazendo e inovações para a História, como uma nova forma de conceber o tempo e a valorização da cultura material. Esses seriam os aspectos básicos a serem compreendidos no estudo das civilizações ao longo do tempo. A terceira fase foi marcada pela geração de historiadores que se veem como herdeiros dos Annales. Não há um líder destacado, mas nomes importantes como Jacques Le Goff, George Duby, Jean-Claude Schmidt. O interesse do grupo era bastante vasto e alguns migram da história socioeconômica para o domínio sociocultural, outros para a história política e à narrativa histórica.

No capítulo 8, “Pós- Modernismo e História global”, Lilian Miranda delimita as principais correntes historiográficas que se estabeleceram em fins do século XX: a Nova História, o pós-modernismo e a vertente História global. Ressalta que a Nova História tem levantado controvérsias entre os historiadores. Alguns entendem que a escola faz parte dos Annales, outros defendem a sua especificidade. Ela analisa a Nova História ligada aos grupos da terceira e da quarta geração da escola dos Annales. Apresenta os finais dos anos 1960, momento de mudanças e a abertura de novas possibilidades e entendimentos na historiografia voltados para o universo da micro-história, como um marco para o surgimento dessa corrente. A autora compreende que integrantes da Nova História se dedicaram à modalidade da História das mentalidades e o interesse voltado para os aspectos da vida social e cultural. Em relação ao pós-modernismo é uma tarefa árdua apresentar uma definição, pois, entre os autores das Ciências Humanas, não há concordância quanto a isso. Miranda entende que o pós-modernismo seria um campo ou um circuito cultural, uma forma assumida pela cultura contemporânea, situando o pós-modernismo como fruto do mundo após o fim da Segunda Guerra Mundial e o surgimento de uma sociedade globalizada. O pós-modernismo, por fim, rejeita uma história total, enquanto a História global vai se voltar para certas regiões do planeta numa tentativa de produzir um conhecimento não eurocêntrico.

Não obstante ser um manual de formação inicial, o livro apresenta problemas de planejamento e execução da escrita e de comunicação dos elementos básicos de um trabalho científico. Considerando a destinação da obra, percebemos que o projeto editorial dificulta a busca imediata de autores e conceitos. Carece de índices remissivos, que evitem a leitura integral de um capítulo e busca de uma ou outra referência de demanda imediata.

Não bastasse essa falta, o livro não tem introdução. Isso, inicialmente, o torna confuso e não permite entender a proposta que a autora vai desenvolver ao longo da obra, embora, em cada capítulo, ela apresente um breve panorama do tema que será abordado. Pensamos ser um problema típico de arquitetura da informação/plano geral da obra, visto que também não há conclusão, o que deixa a impressão de ser um mero resumo ou relato das principais correntes historiográficas europeias. É certo que, em cada capítulo, Lilian Miranda apresenta a síntese da temática abordada, contudo, incorrendo no mesmo equívoco inicial, a obra não tem conclusão.

Como manual didático para alunos de graduação, o livro também é falho em termos de método. Não é apresentada a questão central do que será tratado ao longo da obra e para compreender o objetivo do livro é necessário lê-lo por completo. Também está ausente no livro o método utilizado na pesquisa, as fontes/autoridades, diálogo com a literatura especializada. O único autor citado, em termos de corrente historiográfica, é José D’Assunção Barros, que é um vulgarizador da ciência histórica.

Apesar dos erros crassos que apresenta, a obra pode ser lida tanto pelos alunos de graduação em História com por professores da educação básica, pois apresenta informações objetivas em relação ao ofício do historiador. Podemos citar, como exemplo, o reconhecimento dos conceitos como algo imprescindível na produção do conhecimento histórico e a ideia de que a História enquanto ciência é um saber produzido com base em procedimentos e métodos. Por essas razões, inclusive, a leitura desta obra evidencia a necessidade da discussão dos usos dos conceitos na prática pedagógica. Na condição de professores de História, aprendemos que é necessário atuar na defesa e no fortalecimento do ensino de História pautado no uso de procedimentos e métodos específicos à nossa ciência.

 Sumário de Introdução aos estudos históricos

  • Capítulo 1. O ofício do historiador
    • 1. A História e as suas muitas acepções
    • 2. Os primórdios da história da História
    • 3. Os múltiplos entendimentos sobre a História
    • Considerações finais
    • Referências
  • Capítulo 2. História: recortes temáticos, usos e fontes documentais
    • 1. Instrumentos do trabalho do historiador
    • 2. Fontes históricas e o trabalho do historiador
    • 3. Usos da História
    • Considerações finais
    • Referências
  • Capítulo 3. Conceitos fundamentais do fazer histórico
    • 1. O que é um conceito histórico?
    • 2. Conceitos históricos mais usuais
    • Considerações finais
    • Referências
  • Capítulo 4. Escola metódica
    • 1. O que é uma escola historiográfica?
    • 2. Panorama histórico do século XIX e o positivismo
    • 3. A escola metódica
    • Considerações finais
    • Referências
  • Capítulo 5. O historicismo
    • 1. O século da história e o contexto histórico na Alemanha na criação do historicismo
    • 2. Origens e definição do historicismo
    • Considerações finais
    • Referências
  • Capítulo 6. Materialismo histórico
    • 1. Karl Marx e Friedrich Engels: contexto histórico
    • 2. Princípios fundamentais do materialismo histórico
    • 3. Renovação do pensamento marxista
    • Considerações finais
    • Referências
  • Capítulo 7. Estruturalismo e escola dos Annales
    • 1. A escola dos Annales: a primeira fase
    • 2. A segunda fase dos Annales
    • 3. A terceira geração dos Annales
    • 4. Estruturalismo e os Annales
    • Considerações finais
    • Referências
  • Capítulo 8. Pós-modernismo e História global
    • 1. Nova História
    • 2. O pós-modernismo
    • 3. História global
    • Considerações finais
    • Referências
  • Sobre a autora

Resenhistas

Bruno da Silva SantanaBruno da Silva Santana é professor de História na Escola Estadual Xingó II (Piranhas/AL), mestrando em Ensino de História (ProfHistoria/UFS) e atuou como representante estudantil no PAAF-UFS colaborando com o projeto que instituiu o sistema de cotas na UFS. Entre outros trabalhos, publicou texto na coleção “Caminhadas de universitários de origem popular”. Currículo Lattes http://lattes.cnpq.br/5011284884643428. Orcid https://orcid.org/0000-0001-8474-1292. Rede social Instagram @bruno_historia; E-mail: [email protected]

Katia Maria S. LeiteKátia Maria S. Leite é professora de História do Ensino Fundamental no Colégio Amadeus (Aracaju-SE) e mestranda em Ensino de História (ProfHistória/UFS). Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/4386970258304180; Orcid: https://orcid.org/0000-0002-9400-4779; Redes sociais: Instagram @leite2243; E-mail: [email protected].br.

 

 


Para citar esta resenha

MIRANDA, Lílian Lisboa. Introdução aos estudos históricos. Cidade: São Paulo: Editora Senac, 2021. 118p. Resenha de: SANTANA, Bruno da Silva; LEITE, Kátia Maria S. A História como Ciência. Crítica Historiográfica. Natal, v.2, n.7, set./out., 2022. Disponível em <https://www.criticahistoriografica.com.br/a-historia-como-ciencia-resenha-de-introducao-aos-estudos-historicos-de-lilian-lisboa-miranda/>

Jörn Rüsen: teoria, historiografia e didática | Margarida Maria Dias de Oliveira, Francisco das Chagas Fernandes Santiago Júnior e Caio Rodrigo de Carvalho Lima

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Jörn Rüsen | Foto: Júlio Minasi//UnB Agência

Jörn Rüsen: teoria, historiografia e didática, publicado em 2022 pela editora Cabana, reúne os textos do “I Seminário Jörn Rüsen. Um balanço da obra de Jörn Rüsen: teoria, historiografia e didática”, realizado em 2015, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Os organizadores da obra são Francisco das Chagas Fernandes Santiago Júnior, Margarida Maria Dias de Oliveira e Caio Rodrigo de Carvalho Lima. Seu objetivo, para além de um balanço historiográfico sobre Jörn Rüsen, é fornecer subsídios para pensar o fazer histórico, o ensino de História na educação básica e a formação de profissionais de História em diálogo com a teoria da História.

Jorn Rusen Teoria Historiografia Didatica2Neste livro, percebi a existência de três grupos de ideias. No primeiro grupo estão textos do próprio Jörn Rüsen, nos quais expõe suas ideias, então, mais recentes. No segundo conjunto, há uma tendência em recorrer a uma narrativa sobre quem é Rüsen, qual é sua importância para a História e em qual contexto suas ideias ganharam força na Alemanha e no Brasil. Finalmente, um terceiro grupo de textos trata dos que utilizam suas ideias para pensar casos mais concretos. Leia Mais

Ensino de História: mídias digitais e o uso das imagens nos livros didáticos | Patrícia Cavalcante, Raimundo Nonato Castro e Leonardo Castro Novo

Detalhe de capa de Ensino de Historia midias digitais e o uso das imagens nos livros didaticos Imagem Galatea of the Spheres de Salvador Dali 1952
Detalhe de capa de Ensino de História mídias digitais e o uso das imagens nos livros didáticos Imagem Galatea of the Spheres, de Salvador Dali (1952)

O livro Ensino de História: mídias digitais e o uso das imagens nos livros didáticos, organizado por Patrícia Cavalcante, Raimundo Nonato de Castro e Leonardo Castro Novo, é uma coletânea de experiências de diferentes profissionais do ensino. O livro é organizado em dois capítulos que trazem os relatos e ideias dos autores sobre o ensino presencial e as imagens nos livros didáticos, discutidos de forma plural, de modo a possibilitar um diálogo entre leitor e escritor.

Ensino de historia Midias digitaisAmbos os capítulos têm sua origem nas discussões da 12.ª edição do Encontro de História da Associação Nacional de História (ANPUH-Pará), em formato virtual sob o tema: “Passado e Presente: os desafios da história social e do ensino de história”. Realizado entre os dias 2 a 4 de dezembro de 2020, o evento discutiu as problemáticas ligadas ao ensino e à pesquisa histórica, associados à especialidade da história social. Leia Mais

Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história | Renato Fontes de Souza

Banner da conta de Renato Souza no Linkdin. Catalan Map of Europe and North Africa presented to Charles V of France in 1381 de Abraham Cresques Imagem Meisterdrucker
Banner da conta de Renato Souza no Linkdin. Catalan Map of Europe and North Africa, presented to Charles V of France in 1381, de Abraham Cresques | Imagem: Meisterdrucker. No detalhe, Renato Fontes de Souza | Imagem: Linkedin

O livro Objetos Digitais de Aprendizagem: uma nova abordagem para o ensino de história foi escrito por Renato Fontes de Souza e publicado no ano de 2021, pela Editora Dialética. Como o próprio título sugere, o livro discute o uso de objetos digitais de aprendizagem, entendidos como recursos digitais que podem servir de ferramentas didáticas e apoiar a prática pedagógica de professores e alunos dentro e fora da sala de aula tradicional, a exemplo de animações, vídeos e jogos. No livro, o autor questiona: quais critérios os professores de História podem empregar para selecionar objetos de aprendizagem de História do Brasil para o Ensino Médio? Seu objetivo, contudo, não é indicar objetos digitais, mas sim, apontar os parâmetros que os professores de História podem usar para selecionar objetos digitais de aprendizagem que subsidiem o ensino/aprendizagem de História do Brasil no Ensino Médio, ajudando na construção de uma prática docente significativa para o aluno.

Objetos Digitais de AprendizagemRenato Fontes de Souza é mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e docente de História na educação básica há mais de 15 anos. A obra é o resultado de pesquisa de Mestrado no âmbito do Programa de Pós-graduação em Educação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e está disponibilizada tanto na versão impressa quanto na digital. Nesse formato, organiza-se em quatro capítulos, subdivididos em vários tópicos e subtópicos (além da introdução e apresentação do problema, objeto e objetivos da pesquisa). Leia Mais

Olhar Negro: patrimônio, museu e cultura afro-sergipana no campo do ensino de História | Marcelo Santos

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Museu de Arte Sacra de São Cristóvão – SE | Imagem: Abrajet

A Lei 10639/03 tornou obrigatório o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira, ampliando os desafios para o professor que deve pensar meios para implementação desse dispositivo, associando-o a outras temáticas e incorporando outras metodologias. Alguns autores defendem que uma maneira, para isto , é repensar o currículo que precisa ser de(s)colonizado. O professor Marcelo Santos, no seu Olhar Negro: patrimônio, museu e cultura afro-sergipana no campo do ensino de História (2021), nos presenteia com um grande passeio envolvendo esses quatro campos: Ensino de História, História, Cultura Afro-brasileira e Patrimônio. Assim, a obra é uma grande contribuição para os professores de História e demais interessados na lida com o patrimônio cultural, pois por meio dela vemos as irmandades, as devoções preferidas como a citada Nossa Senhora do Rosário e percorremos os corredores do Museu de Arte Sacra da bela cidade de São Cristóvão, em Sergipe. Assim, podemos aprender e refletir sobre novos meios de ensinar História e Cultura Afro-brasileira.

Olhar negroO trabalho é estruturado em três capítulos, além de introdução e considerações finais. No primeiro – “O museu como recurso didático: museologia e historiografia na prática do ensino da cultura afro-brasileira” –, Santos descreve as possibilidades do Museu de Arte Sacra de São Cristóvão (MASC) enquanto recurso didático para o ensino de História e Cultura Afro-brasileira, por meio dos objetos musealizados e das Irmandades que atualmente se encontram no acervo da instituição. Santos dialoga com alguns autores das áreas da Museologia e do Patrimônio, a exemplo de Cristina Bruno e Maria Célia Teixeira. Para isso, discorre sobre a história dos museus e sobre o museu como um espaço de educação escolar e não escolar, enfatizando a importância sobre o primeiro. No segundo capítulo – “Novos caminhos: patrimônio religioso e a cultura afro-sergipana” –, a meta de Santos é elaborar um itinerário por meio de igrejas que, inclusive, abrigaram Irmandades na cidade de São Cristóvão, tendo como referência espaços que contribuam com o ensino de Cultura Afro-brasileira. Lembra ao professor a necessidade de uma visita prévia e coloca algumas questões para a reflexão sobre a viabilidade da visita de estudos. Ele insere no Itinerário a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos, Nossa Senhora do Amparo, Igreja da Ordem Terceira e o Convento do Carmo, Igreja de Nossa Senhora da Vitória, Irmandade da Santa Casa da Misericórdia e Igreja e Convento de São Francisco. Esse percurso seria realizado antes de o discente entrar no MASC, abrigado na Igreja da Ordem Terceira de São Francisco. O autor justifica o motivo da presença de cada instituição no itinerário pela história do templo ou ainda por alguma imagem que esteja no MASC. No entanto, o Templo de Nossa Senhora da Vitória merecia uma melhor dedicação na justificativa. Santos conclui o capítulo afirmando que, por meio do itinerário proposto, é possível observar, na cidade, registros da vivência da população afro-sergipana, e que essa é também uma atividade “sensorial”. O autor também poderia ter inserido as praças no itinerário já que Serafim Santiago menciona locais em que mulheres negras vendiam seus quitutes. Leia Mais

Uma história feita por mãos negras | Beatriz Nascimento, organizado por Alex Ratts

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Beatriz Nascimento | Imagem: AdUFRJ

Nascida em Aracaju (SE), Maria Beatriz Nascimento (1942-1995)[1] produziu reflexões diversas e dispersas em artigos, entrevistas, roteiros cinematográficos sobre a história do negro no Brasil, ganhando visibilidade no debate historiográfico no país, nos últimos anos, por conta da publicação de seus textos em livros (Ratts, 2006; 2021), reveladores da atualidade de suas ideias sobre as relações raciais e de gênero. Graduada em História, em 1971, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ela contribuiu, decisivamente, para a rearticulação do movimento negro no Rio de Janeiro, seja “participando das reuniões no Centro de Estudos Afro-Asiáticos (CEAA), situado na Universidade Cândido Mendes (UCAM)”, seja criando coletivos como o Grupo de Estudos André Rebouças (GTAR), na Universidade Federal Fluminense (UFF). Ela cursou especialização em História do Brasil, na Universidade Federal Fluminense, ingressando no Mestrado Acadêmico, sem concluí-lo (Pinn; Reis, 2021, p. 3). Em 1995, o curso de Mestrado na Escola de Comunicação, na UFRJ, sob a orientação de Muniz Sodré, foi interrompido, abruptamente, por sua morte prematura. Grande parte dessa experiência de vida e trajetória acadêmica está no livro Uma história feita por mãos negras, organizado por Alex Ratts, e lançado em 2021.

Beatriz Nascimento Uma historiaA recuperação de suas ideias está vinculada à emergência das perspectivas decoloniais dos estudos de gênero e de raça no contexto da presença de governos de centro-esquerda no Brasil, entre 2003-2016, haja vista que os atuais “estudos sobre escravidão, o movimento social e operário, o tempo presente, a memória, a história da historiografia, dentre outras”, estão em conexão, consciente ou não, com as “pautas que emergiram da luta pela redemocratização no país, desde a década de 1970” (Pereira, 2022, p.31). Leia Mais