As cidades entre a memória, o imaginário e o patrimônio | Revista Latino-Americana de História | 2019

Ítalo Calvino (1990), em sua obra “As cidades invisíveis”, demonstra, a partir da literatura, como as cidades relacionam-se com variadas dimensões da experiência humana – a memória, o desejo, os símbolos, as trocas, os sonhos… todas essas representações podem descrevê-las, ou desvendar as múltiplas faces de uma mesma cidade. Cada urbe descrita revela uma vivência possível dentro de um universo de possibilidades que as mais diferentes e variadas cidades oferecem aos seus moradores.

Ao propor um dossiê envolvendo cidade, memória, imaginário e patrimônio, uma vasta gama de possibilidades foi aberta aos pesquisadores. Alternando temas, fontes, problemas, metodologias e abordagens, diversos artigos foram submetidos a Revista Latino-Americana de História. No entanto, todas as pesquisas apresentam a cidade como foco de análise e objeto de reflexão por parte dos autores. Leia Mais

História e Imagem / Ofícios de Clio / 2017

Em virtude do alargamento do campo documental e a partir da compreensão de que os vestígios históricos são representações do passado, as imagens, em suas variadas configurações, se consolidaram, nos últimos decênios, como uma fonte de pesquisa e objeto de análise dos pesquisadores. Historicamente, elas faziam parte do cotidiano dos indivíduos e das sociedades desde os tempos mais remotos – arte rupestre, pintura, escultura, ilustrações, fotografias, cinema, charges, gravuras, televisão, grafite, caricaturas, histórias em quadrinhos, entre outras – contudo, os historiadores negligenciaram o seu uso por muito tempo, uma vez que acreditava-se apenas no conhecimento obtido a partir do documento escrito – uma herança positivista e da escola metódica. Nesse contexto, as imagens eram utilizadas como meras ilustrações do texto, ou seja, o seu potencial não era explorado pelos estudiosos.

No entanto, a partir da Nova História, essa perspectiva foi gradativamente alterada e, com isso, o corpus documental dos historiadores foi expandido abarcando uma infinidade de fontes. Como afirmou Marc Bloch em seu livro Apologia da História, a diversidade dos testemunhos históricos é praticamente imensurável, na medida em que tudo que o indivíduo diz, escreve ou fabrica pode e, principalmente, deve informar sobre ele. Constatou-se que tudo tem uma história, logo o passado pode ser (re)escrito por intermédio de novos olhares e vestígios. Diante disso, o segundo número da Revista Discente Ofícios de Clio – ligado ao Programa de Pós-graduação em História e ao Laboratório de Ensino de História da Universidade Federal de Pelotas – propõe o Dossiê “História e Imagem” com o objetivo de reunir estudos que dialogam sobre a relação entre iconografia e a escrita da história. Dessa forma, os artigos reunidos nesse dossiê apresentam uma variedade de fontes imagéticas: cinema, fotografia, charge e história em quadrinho.

O doutorando do Programa de Pós-graduação em História Comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro Carlos Cesar de Lima Veras propõe em seu texto uma análise do filme “O Gabinete do Dr. Caligari”, lançado mundialmente em 1920, a fim de compreender a consolidação da República de Weimar na Alemanha pré-nazista e a sua relação com o expressionismo cinematográfico. O autor se debruça nas tensões existentes na política alemã a partir da “imagem-objeto” representada pelo filme. Além disso, o pesquisador apresenta uma discussão importante sobre a utilização do cinema como fonte histórica.

Em certa medida, o texto de Veras corrobora com o artigo de Thiago Soares Arcanjo que versa sobre a Alemanha, porém focaliza no período após a consolidação de Hitler no poder e os seus desdobramentos durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Para isso, o mestrando do Programa de Pós-graduação em História da Universidade do Vale do Rio dos Sinos utiliza como fonte a história em quadrinhos “Maus, a história de um sobrevivente”, publicada em 1986, por Art Spiegelman. O autor propõe uma análise mais aprofundada sobre a obra, além de problematizar – a partir dos conceitos de Tática e Estratégias extraídos de Michel de Certeau – o extermínio de indivíduos durante o regime totalitário.

O artigo de Mariana Couto Gonçalves propõe um debate acerca do uso da fotografia na história por intermédio da análise de uma série imagética extraída do Álbum de Pelotas (1922). A doutoranda do Programa de Pós-graduação em História da História da Universidade do Vale do Rio dos Sinos examina a particularidade da obra, além de discutir sobre o discurso de modernidade que permeia o referido vestígio. Por fim, fechando o dossiê, Fábio Donato Ferreira realiza uma abordagem a respeito das charges políticas impressas na Folha de São Paulo durante o mês de maio de 1978. A proposta do autor, mestre em história pelo Programa de Pós-graduação da Universidade Federal de Pelotas, pauta-se em traçar a posição do periódico com relação a organização do movimento grevista do ABC e sobre a ditadura civilmilitar que ainda estava vigente no território nacional.

É com extrema satisfação que a Revista Ofícios de Clio apresenta o Dossiê História e Imagem, que visa oferecer ao leitor um debate acerca da multiplicidade de fontes imagéticas, ampliando a possibilidade de diálogo e a compreensão acerca do passado.

Boa Leitura!

Mariana Couto Gonçalves – Doutoranda UNISINOS


GONÇALVES, Mariana Couto. Apresentação. Revista Discente Ofícios de Clio, Pelotas -RS, v. 2, n. 2, jan./jul., 2017. Acessar publicação original [DR]

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