História da saúde e das doenças: sujeitos/ saberes e práticas | Fênix – Revista de História e Estudos Culturais | 2021

Os anos de 2020 e 2021 marcaram profundamente a vida das pessoas de diferentes lugares do planeta. A pandemia de Sars-coV-2 (Covid-19) invadiu o espaço público, os corpos das pessoas e dizimou uma enorme parcela da população, especialmente a mais pobre.

A primeira grande pandemia do século XXI, embora precedida por outras manifestações epidêmicas como o Ebola e o H1N1, tomou proporções que só podem ser comparadas às da gripe “espanhola”, no início do século XX. Em 1918, a imprensa informava que o vapor Demerara, proveniente da cidade inglesa de Liverpool e que passou pelos portos do Recife, Salvador e Rio de Janeiro na primeira quinzena de setembro, registrou passageiros infectados a bordo, com cerca de cinco óbitos (SOUZA, 2009, p. 102). Era a chegada da doença ao Brasil. Leia Mais

História da saúde e das doenças: instituições, discursos e relações de poder / História – Debates e Tendências / 2021

BARRIERE Professores da Faculdade de Medicina História da saúde e das doenças

A saúde e as doenças não podem ser pensadas como conceitos estanques, a complexidade que envolve o estar são ou doente tem uma relação direta sobre como as sociedades interpretam e assimilam esses dois estados. Assim, a conceituação também está envolvida nas relações de poder, nas disputas discursivas que dizem respeito aos diversos comportamentos referentes à multiplicidade de doenças existentes.

O saber médico precisa ser problematizado nos diversos contextos, possibilitando ver como os discursos se articulam e garantem a sua condição de existência. Neste sentido, as representações sociais sobre as doenças estarão diretamente relacionadas com os mecanismos de controle, definição e exclusão dos indivíduos em diferentes conjunturas históricas. Leia Mais

História da saúde e das doenças / Vozes Pretérito & Devir / 2013

A revista de História “Vozes, Pretérito e Devir”, vinculada à Universidade Estadual do Piauí, chega à sua segunda edição trazendo o dossiê temático História da Saúde e das Doenças, tema esse que vem ganhando terreno nas investidas de historiadores de diferentes vertentes teórico-metodológicas.

Para refletirmos sobre a produção historiográfica nessa área, destacamos o caso do clássico livro “As doenças tem história”, organizado por Jacques Le Goff [1], publicado no Brasil em 1985. Como nos sugere o título da publicação, a tese central dos diferentes artigos que compõem o livro é que a história das doenças seria a história das práticas e sentidos que os homens atribuem a elas. Nesse sentido, as doenças são problematizadas menos em sua possível essência biológica, como incursão natural, e mais em função dos significados que os homens produzem historicamente em torno das mesmas, na maneira como as sociedades se organizam e / ou desorganizam em função delas ao longo do tempo.

A obra organizada por Le Goff é especialmente importante para nossa apresentação, pois, embora não seja a precursora no assunto, nos fornece uma excelente amostra da produção historiográfica nessa temática, a qual pode ser pensada em duas tendências matriciais. A primeira encara a doença como um fato social capaz de promover rearticulações e rupturas em determinados mecanismos através dos quais as diferentes sociedades se regem. Na segunda, é como artefato cultural que esse objeto de estudo – a doença – se encontra problematizado: ela passa a ser encarada como uma construção histórica. Nesta perspectiva, há uma preocupação maior com suas representações, com os discursos que informam o que é a doença, quais seus sintomas e formas de tratamento.

No Brasil esse campo de pesquisa começou a se desenvolver na década de 1980 e de lá pra cá temos trabalhos vinculados às duas tendências acima explicitadas. Contamos com como exemplos de significativa expressividade os trabalhos de Jurandir Freire Costa [2], mais ligados às abordagens culturais, e os de Sidney Chalhoub [3], de uma vertente mais social. Também não podemos deixar de ressaltar as três edições organizadas por Dilene Raimundo Nascimento intituladas “Uma História Brasileira das Doenças” [4], que, atualmente, nos proporcionam o contato com as mais diversas pesquisas em todo o Brasil.

Inspirados por tais tendências, apresentamos nesta edição, artigos que oferecem abordagens temáticas em amplas pluralidades, desde discussões sobre o HIV / AIDS – a partir da perspectiva do materialismo histórico – no nordeste brasileiro, como também abordando a citada doença enquanto uma “construção” imagético-discursiva. Contamos também com produções que falam sobre as epidemias, os saberes médicos, as políticas públicas para tramento materno-infantis, aborto, intelectuais que produziram saberes em torno das doenças, entre outras questões.

Na seção dos artigos livres ressoam diferentes vozes que problematizam desde o discurso legal e sua constituição histórica no estado piauense até as crônicas sobre o carnaval. Das desordens dos vice-reinados ao “desbunde” da década de 1970. Também não foi deixada de lado a questão dos retirantes e escravizados da seca do final do século XIX no nordeste. Portanto, diferentes pretéritos são postos em análise.

Na seção dedicada às resenhas são apresentadas, a partir de uma descrição minuciosa, duas obras. A primeira delas de autoria do medico psiquiatra, e uma das principais referências do movimento antimanicomial no Brasil, Edmar Oliveira. No livro “A incrível história de Von Meduna e a filha do sol do Equador”, o autor escreve sobre a história das instituições psiquiátricas e das medidas de tratamento das doenças mentais no Piauí. A segunda obra analisada trata-se de uma série de artigos reunidos e publicados sobre o título: “História e Historiografia: exercícios críticos”, do consagrado escritor Jacques Revel. Nela, o autor desenvolve uma abordagem sobre as concepções teóricas, os intelectuais e as propriedades epistemológicas que permearam o campo da historiografia no século XX.

Finalizamos essa edição com uma importante seção que abre espaço para a divulgação do resumo expandido de duas monografias de graduados em História, as quais versam sobre a construção da memória em torno da Batalha do Jenipapo, no Piauí, e dos catadores de caranguejo no litoral do nordeste, numa abordagem nitidamente influenciada pela antropologia.

Aproveitamos a ocasião para agradecer a todos os envolvidos direta e indiretamente com a publicação desta edição, em especial à professora Drª. Dilene Raimundo do Nascimento que gentilmente fez a divulgação da chamada para os artigos do dossiê temático e nos brindou com um artigo de sua autoria.

À todos desejamos uma proveitosa leitura.

Notas

1. LE GOFF, Jacques (org). As Doenças tem história. Lisboa: Terramar, 1985.

2. COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar. Rio de Janeiro: Graal, 1979.

3. CHALHOUB, Sidney. Cidade febril: cortiços e epidemias na corte imperial. São Paulo: Cia das Letras, 1996.

4. NASCIMENTO, Dilene Raimundo do, et al. Uma história brasileira das doenças. Rio de Janeiro: Mauad X, 2006.

Felipe da Cunha Lopes


LOPES, Felipe da Cunha. Apresentação. Vozes Pretérito & Devir. Teresina, v.2, n.1, 2013. Acessar publicação original [DR]

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