Between Empires, Arabs, Romans and Sasanians in Late Antiquity – FISHER (RMA)

FISHER, Greg. Between Empires, Arabs, Romans and Sasanians in Late Antiquity. Oxford: Oxford University Press, 2013. 254p. Resenha de: FUNARI, Pedro Paulo. Revista Mundo Antigo, v. 4, n.7, jun. 2015.

One of the main challenges to scholars is to explain the Muslims revolution, dating from the first decades of the 7th c. AD, from the Hegira in 622. This is so for several reasons, not least the fact that there is a lack of documents in Arabic script prior to that period, but also because it is apparently difficult to figure out the Arab upsurge from the relative obscurity of the previous centuries. Greg Fisher, associate professor at Carleton, Canada, has studied this intricate subject under the supervision of professor Averil Cameron, in Oxford, resulting in this volume published at Oxford University Press. From a theoretical standpoint, Fisher considers that religious, linguistic, ethnic, and cultural identities are a core research interest in studies of Late Antiquity. Then, the author stresses the importance of the study of the sources, as the Greek and Syriac ancient authors, as well as archaeological and epigraphic data form the foundation of the study. Third, and less intuitive, is an anthropological comparative approach, including colonial American history, such as borderland studies about Spanish colonizers, missionaries, Native Americans, British and French in North America. He emphasizes that the borderlands framework offers a flexible way to approach the engagement between empires, peripheries, and frontiers, encouraging us to view history of people such as the Jafnids from a macro historical perspective which is not confined to the context of the ancient world. A key concept is “in-between”, for people living in the outskirts of empires. Leia Mais

Ambiorix. La résistance des Belges face aux Romains. Racontée aux enfants… et aux grands qui l’ont oublié | Dominique Bockstael

Dominique Bockstael é professor e tradutor de latim em Bruxelas, e assíduo leitor da obra de Júlio César; baseado nela publicou em 1960 um livro sobre Ambiorix, intitulado O javali das Ardenas (cognome do personagem), e refez agora esse texto para inseri-lo numa coleção de vários títulos sobre a História da Bélgica contada às crianças. O caráter didático transparece não só no estilo romanceado, mas também nas notas explicativas, nos mapas de povos gauleses, nas imagens, completadas por uma cronologia e um breve dossiê sobre o modo de vida dos gauleses; no final são ainda listados, com endereços, os museus históricos da Bélgica, particularmente os galoromanos.

A narrativa segue fielmente o texto de César no De Bello Gallico (livro 5, cap. 24 a 41; livro 6: 2 a 43; livro 8: 24 e 25), sem uso aparente de outras fontes. Vejamos a história. Júlio César submeteu os celtas das Gálias, porém a conquista e ocupação do território não se processou facilmente: a resistência à invasão foi seguida em toda a parte de revoltas contra Roma. Ou como diriam as aventuras de Astérix e Obélix: “Toda a Gália está ocupada pelos romanos… Toda? Não! Uma aldeia habitada por irredutíveis gauleses resiste ainda e sempre ao invasor.” De fato depois da vitória decisiva contra Bogduognat e os nérvios em 57 a.C. César estabeleceu na Gália Belga sete legiões reforçadas por cinco coortes; elas impuseram o domínio romano sobre a confederação dos povos belgas, que se estendia entre os rios Reno e Sena. Mas o próprio Júlio César dizia: “De todos os povos da Gália os belgas são os mais fortes” e a revolta eclodiu em 54 a.C. liderada pelo rei dos eburões, Ambiorix.

A coligação gaulesa, reunindo guerreiros de diversos povos, infligiu aos romanos uma derrota esmagadora em Aduatuca (atual Tongeren ou Tongres, um pouco ao norte de Liège). Mas Cícero – o irmão do orador e político – que comandava a legião acampada entre os nérvios, apelou a Júlio César, então a caminho da Itália; César retrocedeu e derrotou os belgas, perseguindo e massacrando os fugitivos. Apenas Ambiorix e uns poucos fiéis companheiros de armas conseguiram se refugiar na floresta, onde nunca foram encontrados. E por alguns anos Ambiorix permaneceu na esperança e na lenda como aquele rei que um dia voltará das brumas para, qual Dom Sebastião, libertar seu povo – até ser esquecido por muitos séculos.

O livro de Bockstael relata essa rebelião transpondo para uma linguagem romanceada a Guerra da Gália na explícita intenção, presente no subtítulo, de tornar acessível às crianças belgas um dos fatos fundadores da sua identidade nacional. Mas o texto não se limita a expor campanhas militares e batalhas, e aproveita as narrações fictícias para descrever a vida quotidiana dos belgas: como eram as casas, quais os trabalhos domésticos, o papel das mulheres na guerra, as relações de família, as virtudes admiradas, o que se comia e bebia, onde e como se dormia, os trabalhos do campo.

O fio condutor da ação é o pequeno grupo que se forma em torno de Ambiorix e que ao final vai compor a escolta que se esconde com ele na floresta; esta é a trama de ficção com diálogos e detalhes que dão vivência ao desenrolar do romance. Mas a didática e a imaginação literária têm uma direção doutrinária e ideológica: defender a unidade e a identidade da Bélgica atual; o teor da empolgação da narrativa e dos adjetivos é não apenas patriótico e épico, mas ufanista: os belgas são (caps. II a IV) intrépidos e dispostos a todos os riscos na revolta contra o opressor; seus valorosos guerreiros são heróicos, seus chefes indomáveis, e na luta morrem como bravos. Em contrapartida (ibidem) os romanos são cruéis, brutais, ladrões gananciosos que pilham tudo o que encontram; a vergonhosa rapina dos legionários não poupa sequer os tesouros sagrados; foi com assassinatos e incêndios que eles sujeitaram, humilharam e ultrajaram um povo altivo e livre, atacado sem motivo; e os gauleses que se aliam aos romanos são traidores detestados e infames. Daí a sede de vingança dos que escaparam dos ataques das legiões, vingança que acorda as virtudes ancestrais, desperta a raiva e acende a coragem.

O bardo canta louvores aos valorosos filhos dos nobres, “de um povo orgulhoso e forte cujas vitórias ressoarão por toda a Gália”. É neste estilo encomiástico que prossegue toda a primeira parte do livro (até ao capítulo VII); mas já aqui se assinala o ponto fraco dos gauleses: estão divididos na oposição ao dominador, não têm disciplina, não têm um plano de ataque, suas ações são isoladas e sem envergadura. O texto abre assim o caminho para uma segunda parte (caps. VIII a XIV e epílogo) em que aparece o ponto de vista do adversário e dominante: a inteligência e tática de comando, e o valor dos legionários; os soldados extenuados e feridos são, perante Júlio César que lhes passa revista, heróicos e firmes combatentes, e o comandante se emociona com os “belos legionários” estropiados mas de pé no seu posto, e lhes diz que o Senado e o povo romanos lhes devem “ a mais bela conquista da sua história” (95). A partir do cap. X a derrota total é inevitável, e começam a ser acusados aqueles que compactuam com os romanos: eles são pérfidos, traidores, usurpadores; Júlio César conseguiu até que certos gauleses menos escrupulosos ajudassem as legiões a pilhar os bens dos vencidos. Os legionários, quase sem oposição, destroem tudo, arrasam as povoações, e para os sobreviventes só existe a servidão ou a morte: “é o fim do mundo” (cap.XII, 113, e 117).

O patriotismo desta narrativa, que pode parecer um tanto ingênuo e excessivo, tem seu sentido numa Europa que aboliu as fronteiras e onde a identidade nacional precisa ser reforçada (aos olhos de muitos); como a Bélgica vive há um século a fratura de sua unidade nacional, devido à luta dos flamengos contra o poder dos valões, a identidade começa pela unidade. Por isso o autor insiste em usar os nomes que assinalam a existência secular de uma entidade que antecipa a nação, referindo-se ao povo em geral ora como gauleses, ora como belgas, e lembra, sempre que vem a propósito, que o território onde se desenrola a ação se chamava Gália Belga; marca a cada página a diluição das diferenças entre os povos que compõem a coligação belga: nérvios, aduatas, eburões, trevinos… todos se uniram contra o invasor, todos são “filhos de brenn” isto é nobres guerreiros gauleses. Na trama da história, eles são belgas e, longinquamente, lançaram as raízes da Bélgica moderna. Assinale-se ainda que o fato de a Bélgica ser um país novo (sua independência data de 1831) obriga a um certo esforço, perante as nações milenares da Europa, de procurar antepassados e origens tão antigas quanto as dos outros.

O recuo até aos belgas é estratégico, pois quando no século IV a.C. eles entraram na região depois chamada Flandres já traziam uma importante miscigenação germânica – curiosamente o autor não o assinala – sinalizando assim, na convivência atual entre valões e flamengos, um objetivo de unidade nacional, se não étnica. É importante destacar que foi só depois da independência que os belgas “descobriram” o seu herói Ambiorix, através do poema de Joannes Nolet de Brauwere van Steeland, datado de 1841; e a primeira estátua ao herói nacional foi erigida em Tongeren (Atuatuca Tongorum) em 1866 (inaugurada em 5 de setembro). Aliás, os eburões eram etnicamente mais germânicos do que celtas, e numa pesquisa de 2005 Ambiorix o gaulês goza de mais popularidade entre flamengos (germânicos) do que entre valões (de língua e cultura francesa). Como disse João Ameal: cada povo escolhe os antepassados que quer e lhe convêm. Ambiorix foi convocado, a posteriori, a unificar a Bélgica – à custa dos romanos; ele não imaginava, quando se refugiou na floresta, que sua ação ia ser tão importante e de tão longo prazo.

João Lupi – Departamento de Filosofia UFSC. E-mail: [email protected]


BOCKSTAEL, Dominique. Ambiorix. La résistance des Belges face aux Romains. Racontée aux enfants… et aux grands qui l’ont oubliée. Fléron: Éditions Jourdain Le Clercq, 2005. Resenha de: LUPI, João. Brathair – Revista de Estudos Celtas e Germânicos. São Luís, v.7, n.2, p. 169-171, 2007. Acessar publicação original [DR]