Homo Zappiens: educando na era digital – VEEN; VRAKKING (C)

VEEN, W.; VRAKKING, B. Homo Zappiens: educando na era digital. Trad. de Vinícius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2009.  Resenha de: PETARNELLA, Leandro; GARCIA, Eduardo de Campos. Conjectura, Caxias do Sul, v. 15, n. 2, p. 175-179, Maio/Ago, 2010.

A sociedade está em permanente metamorfose. Na atualidade, a força motriz das transformações sociais são as novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Por consequência, educar crianças que se desenvolvem em uma sociedade alicerçada nessas novas tecnologias se torna uma tarefa tão difícil quanto arriscada, uma vez que essas enfrentam dificuldades em se ajustar ao sistema educacional atual, dadas suas íntimas relações com a tecnologia.

Partindo das considerações acima, Wim Veen e Ben Vrakking tecem no livro Homo Zappiens: educando na era digital, suas reflexões sobre um tema atual e polêmico: o papel da escola e da educação em uma sociedade tecnológica. Reflexões essas delineadas em 137 páginas, divididas em seis capítulos: “Tempos de Mudança” como primeiro capítulo; “Conhecendo o Homo Zappiens” como segundo capítulo; “Entendendo o caos” apresentando o terceiro capítulo e como quarto capítulo “Aprendendo de maneira divertida”. “Parando a montanha russa” (5º capítulo), antecede o sexto e último capítulo “O que as escolas poderiam fazer”.

No primeiro capítulo “Tempos de mudança”, os autores discorrem sobre alguns momentos nos quais a sociedade se viu diante do terror do bug do milênio, apresentando de forma fácil a necessidade de um novo saber sobre o velho conhecimento, para que se resolvam os problemas tecnológicos atuais. Segundo os autores, o bug do milênio levou o homem a refletir sobre sua consonância vivencial com a tecnologia, em vista de que a mesma se tornou uníssona em seu cotidiano juntamente com suas responsabilidades vitais. Por meio dessa necessidade, pode-se entender por que os autores denominaram a nova geração como Homo Zappiens.

Para exemplificar a denominação e levar o leitor à reflexão, os autores propõem uma narrativa ficcional, cuja personagem é nominada como Jack. A figura dramática de Jack, ambientalizada numa situação cotidiana, se vê num cenário tecnológico cujos objetos que o circundam conduzem sua vida. Nesse cenário, encontram-se aparelhos que se tornaram íntimos demais para nos desvencilharmos de seus objetivos, ou seja, aquilo que há três mil anos era algo impulsionado pelo músculo-força-cinética hoje é tecno-mecânica-elétrica.

Por meio de Jack podemos perceber que, com o desenvolvimento tecnológico, aquilo que no passado era usufruto de alguns, hoje se massifica transcendendo fronteiras, tempo e espaço. Os autores exemplificam essa facilidade de comunicação colocando Jack numa situação corriqueira: A personagem Jack encontra-se atrasada para o trabalho e parada no trânsito, a metros de distância de seu local de trabalho. Jack, então, se comunica por meio de um celular com sua secretária e, logo em seguida, atende um cliente, tudo isso por meio de um click.

Não é só o click que nos leva às facilidades na comunicação, mas tudo o que nos cerca: televisão, rádio, computador, etc. O fato é que não basta reconhecer que a tecnologia facilita o cotidiano do homem, mas que essa tecnologia, como parte da vida do homem, faz desse homem mais homem na representação social; melhor dizendo, um homem mais sábio, atualizado, antenado, zap. Em outras palavras: a tecnologia que se apresenta é parte da personalidade, de uma essência humana tecnológica, pois o homem contagia-se e se torna complacente com a tecnologia, passando, com o uso dela, a administrar seu “eu”. Desse modo, o tempo passa a ser um estimado bem, que iminencia um tempo em que viver os segundos e produzir nos segundos faz a diferença. Nessa perspectiva, o tempo deve ser administrado de forma orbital e tecnológico, pois, no labore, a postura perante qualquer equipe de trabalho deverá desenvolver e reconhecer o capital humano como meio para se dilatarem as possibilidades de crescimento. O Homo Zappiens se revela como um ser tecnologizado, cujo cotidiano faz dele alguém renovável, flexível como os autores tratam no capítulo seguinte.

No segundo capítulo “Conhecendo o Homo Zappiens”, os autores explanam sobre o comportamento das crianças que representam esses sujeitos, cujo cognitivo é delineado pelas tecnologias e suas convergências. O Homo Zappiens, sendo sujeito hodierno, age de forma dispersa ao olhar dos educadores, que, porém são, na verdade, multifuncionais, o que os leva a observar de forma rápida alguns diferentes meios tecnológicos, tais como, o celular, o MSN, a televisão, o rádio, etc. Nesse aspecto, as gerações tecnologizadas se concebem como a geração de rede, a geração digital, a geração instantânea e, entre tantas outras nominações, a cibergeração. Nessa perspectiva, os Homo Zappiens, por meio de um click, acessam e navegam instantaneamente em qualquer lugar e em qualquer tempo e, nesse navegar, plugam-se em jogos interativos, salas de bate-papo, ciberencontros, etc.

A diferença entre o Homo Zappiens e as outras gerações, segundo os autores, é concebida por meio do modo como ambos se relacionam com as tecnologias: os Homo Zappiens se tornam íntimos da tecnologia, porque aprendem numa relação de intimidade que se contextualiza pela prática e pela experimentação da tecnologia, enquanto as outras gerações se submetem às instruções para depois efetuar operações tecnológicas. Desse modo, as novas gerações têm um desenvolvimento tecnocognitivo enquanto às outras gerações, o real se baseia na instrução para a aprendizagem.

Dando continuidade a ideia de Homo Zappiens, o terceiro capítulo: “Entendendo o caos”, aborda a forma como as crianças da atual geração se familiarizam com a tecnologia. Sendo essa facilmente utilizada no cotidiano dos indivíduos, os Homo Zappiens visualizam na tecnologia uma possibilidade de socialização, o que ocorre por meio de jogos de LAN e mensagens instantâneas, ou seja, aquilo que para muitos (de gerações passadas) pode ser considerado um caos. Para os autores é o desenvolvimento da habilidade icônica, a de tarefas múltiplas, de zapear e a de colaboração que diferencia o Homo Zappiens dos demais sujeitos de gerações passadas. Entendamos por meio da ideia dos autores que, enquanto as gerações passadas assistiam a filmes observando a história e a interpretação, os Homo Zappiens decifram e compreendem como cada cena foi elaborada. Decifrar a tecnologia empregada é o grande desafio da tecnogeração, isto é, para ela construir o conhecimento. O mesmo ocorre, por exemplo, com o processo de leitura, cujos olhos atentos aos  vários ícones nas páginas da NET saciam a ânsia de aprender desses indivíduos, pensadores digitais.

Avançando o pensar, no quarto capítulo: “Aprendendo de maneira divertida”, os autores apresentam o homem como alguém que entende o aprender e o concebe por meio de uma verossimilhança entre o jogar. A interação virtual ou real tem como essência a potencialidade investigativa. Assim, para os autores, aprender é a capacidade de observar o meio e seu entorno, é adaptar-se às transformações ocorridas, é retransformá-lo. Desse modo, o Homo Zappiens vê e vive a interação por meio do contato e do convívio com a tecnologia-interativa ou a interação-sócio-humana. Mesmo porque o novo nada mais é que velhos processos reprojetados por novos meios, novas ferramentas.

Diante do contexto até aqui apresentado, os autores referem que o processo de aprender pode advir de duas concepções: a primeira proposta parte do senso comum e concebe a aprendizagem como um processo permanente no cotidiano de cada indivíduo; a segunda propõe que a aprendizagem se efetive por meio de níveis e que nem sempre a experiência evidencia aprendizagem. O Homo Zappiens aprende de forma que sua autonomia se evidencie, inclusive, por meio da escolha daquilo que se quer aprender e como se quer aprender. Nesse aspecto, podemos considerar que a nova geração fica atenta ao que aprende, por que aprende e, principalmente, como aprende, sendo essa forma a força motivadora da conduta dos Homo Zappiens, conforme relatam os autores no quinto capítulo Parando a montanha russa.

No sexto e último capítulo: “O que as escolas poderiam fazer”, os autores propõem que a escola, sendo meio para sistematização da educação e da aprendizagem, deve atender aos interesses e às necessidades da sociedade, entre esses: a necessidade de acompanhar ou preconizar as tecnologias inerentes aos avanços da sociedade. Partindo dessa concepção de escola, os autores propõem uma leitura da metodologia utilizada na educação atual, meio de poder que linearmente se desenvolve para que as pessoas se tornem emergentes, o que denota transformar-se de dominado em dominante. Assim, se concebe a escola como um espaço que se apropria das tecnologias e evolui para que essas estejam a serviço da emancipação do homem como sujeito autônomo, que se permite experimentar o novo a todo instante.

Nessa proposta de cenários educacionais, os autores propõem uma reflexão sobre quatro eixos cênicos: inovação, marketing, perseverança e melhoria o que implica uma maior liberdade de escolha no trajeto educacional de cada indivíduo. Os respectivos eixos devem ser construídos por meio de um novo design pedagógico, cujos professores devem ficar atentos aos desafios do novo a todo instante, sendo esse novo não só conhecer as novas tecnologias, mas dar espaço às novas atitudes educacionais, dentre elas, a atitude de confiar nos alunos no que tange ao fazer, ao querer e ao cumprir com liberdade, tendo como vértebra educacional o talento e a habilidade do Homo Zappiens, de estar imerso naquilo que faz, quando se apaixona pelo que faz. Desse modo, a organização e a formatação das avaliações devem, também, se modificar para dar espaço a mudanças significativas, mudando matérias em temas, avaliações em desafios, escrita em imagens…

Transformando as reflexões em um tecido orgânico, no comentário final, os autores propõem uma reflexão sobre os assuntos abordados, não esperando que o leitor aceite passivamente as ideias explicitadas no livro, ao contrário, recorrem sabiamente a todo critério de liberdade apresentado no decorrer do livro Homo Zappiens: educando na era digital, para concluir que, enquanto a geração Homo Zappiens for julgada por meio dos velhos paradigmas, nunca compreenderemos como essa geração brinca e se comunica, o que, na verdade, representa uma fonte de informações para que possamos lidar com nosso futuro digital e criativo.

Referências

VEEN, W.; VRAKKING, B. Homo Zappiens: educando na era digital. Trad. de Vinícius Figueira. Porto Alegre: Artmed, 2009. 141 p.

Leandro Petarnella – Professor na Universidade Nove de Julho (Uninove/SP). Mestre. Doutorando em Educação pela Universidade de Sorocaba (Uniso/SP) e em Administração pela Uninove/SP. Desenvolve pesquisas relacionadas à tecnologia e ao cotidiano escolar. E-mail: [email protected]

Eduardo de Campos Garcia – Professor na Universidade Nove de Julho (Uninove/SP). Mestrando em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo. Especialista em Magistério do Ensino Superior pela PUCSP. E-mail: [email protected]

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